“A educação popular, no século XXI, tem como tarefa primordial repensar o nosso lugar e nossas relações neste planeta. Considerando-se seres superiores, acreditávamos que seria possível viver destacados do ambiente. O aquecimento global, a crise ambiental, enfim, o novo regime climático, vem para nos recordar algo que é da nossa essência como seres de relações: somos terráqueos, umbilical e existencialmente vinculados à terra. Nosso destino está ligado ao destino da Terra”, escrevem André Langer, doutor em sociologia, e Jonas Jorge da Silva, mestre em ciências sociais, membros do Centro de Promoção de Agentes de Transformação – CEPAT.
O artigo foi originalmente publicado na série Lendo & Refletindo, do Observatório Nacional de Justiça Socioambiental Luciano Mendes de Almeida – OLMA, em dezembro de 2023.
“Arranjem um jeito de molhar todos os dias a sua esperança,
como se ela fosse uma inocente arvorezinha” (Paulo Freire)
No século XXI, o grande desafio da educação popular pode ser o de romper com um paradigma em que os humanos se compreendiam como separados dos não humanos e onde a natureza era vista como ameaça constante e inimiga a ser permanentemente dominada, pois se compreendiam a si mesmo como “senhores e dominadores da natureza” (Descartes). A liberdade humana é uma conquista que dependia basicamente da subjugação da natureza. Esta liberdade (entenda-se do homem europeu, branco) é inversamente proporcional ao domínio da natureza e de outros povos através da escravização, da colonização, mediante a qual se procedia à destruição dos modos de vida mais harmoniosos e amigos com os demais seres vivos.
Ainda que persista certo saudosismo em relação a experiências populares de lutas e resistências do século passado, que tinham como horizonte a emancipação e a transformação social, na medida em que avançamos no século atual, surgem novos desafios que questionam as velhas formas de pensar e agir. Aumenta a nossa percepção de que “alguma coisa está fora da ordem, fora da nova ordem mundial”, como nos lembra bem Caetano Veloso, com sua linda canção “Fora de ordem”. A magnitude e a complexidade dos problemas atuais exigem respostas discernidas em meio à incerteza de uma era.
Emergência climática, guerras, violência, esgarçamento das bases de convívio social, precarização das relações de trabalho, deslocamentos forçados, isolamento social, com altas doses de depressão, ansiedade e narcisismo, são algumas das características marcantes desse mal-estar contemporâneo. Já não basta a análise geopolítica das crises que se retroalimentam: econômica, política, ecológica, energética, alimentar, entre outras. Nas palavras do filósofo Franco Berardi (2022), “temos que entender o que está acontecendo em um nível muito mais profundo: o nível das inversões de desejo, o nível da mutação psíquica diante de uma aceleração caótica dos processos sociais”.
Acrescenta-se a este rol de desafios os desenvolvimentos tecnológicos como inteligência artificial, nanotecnologias, robótica, internet das coisas, smartphone e outras ferramentas digitais que também impactam diretamente em uma nova subjetividade. Para o filósofo francês Éric Sadin (2022), o presente isolamento social, permeado pelo que chama de telessociabilidade cada vez mais integral, representa “uma ruptura civilizacional”.
Pode-se dizer que está em curso o acelerado descarrilamento da locomotiva ufanista de ordem, progresso e desenvolvimento conduzida por avanços tecnocientíficos dissociados da reflexão filosófica, ética e humanista. Paradigmas estruturantes da modernidade (objetividade, racionalismo, lógica, neutralidade, mecanicismo) são confrontados com seus próprios limites e consequências: o escancaramento de que os atuais modos de ser, conviver, conhecer, produzir e consumir são uma grave ameaça para a espécie humana e seu projeto de civilização. Na figura de linguagem utilizada por Pablo Servigne (2021), badalado colapsista francês: “Nossa civilização é um carro sem freios e com o volante travado”.
Desse modo, ganha lugar comum a ideia de que o futuro da experiência humana na Terra é cada vez mais incerto. Em entrevista, o sociólogo espanhol Manuel Castells (2023) avaliou que “o mundo entrou em uma fase sem futuro”. Em sua opinião, “podem existir muitos futuros em nível individual, mas não há nada previsível, porque oscilamos, agora de forma séria, cientificamente, entre a extinção da habitabilidade no planeta, não do planeta, mas da nossa capacidade de vivê-lo, a desintegração moral e social em grande parte do mundo e a crescente hostilidade entre grupos humanos, com o racismo, a xenofobia, o ódio”.
Diante de um cenário como este, cabe perguntar: que proposta de educação popular passa a ser emergente? Como se deixar interpelar por uma conversão radical nas formas de pensar, estar e incidir no mundo? Quais são os limites e as oportunidades presentes para a construção de laços de solidariedade, empatia e reencontro entre humanos e de humanos com não humanos?
Ao se restringir ao racional, lógico e dedutivo, o método cartesiano ignorou a dimensão mítica, imaginativa e poética do ser humano, produzindo a fragmentação, a separação e a exclusão. Para o pensador francês Edgar Morin, a fragmentação significa a barbárie do pensamento. “Nossa civilização separa mais do que liga. Estamos em déficit de religação e esta se tornou uma necessidade vital” (MORIN, 2005, p. 104), reconhece.
“Os progressos da informação e dos conhecimentos são acompanhados por avanços da ignorância devida à fragmentação e a separação do saber em compartimentos. A crescente impossibilidade dos cidadãos de ter acesso ao controle e à reflexão sobre os conhecimentos científicos ou técnicos relativos à vida de cada um leva ao enfraquecimento democrático na própria raiz da democracia” (MORIN, 2003, p. 242), critica Edgar Morin.
Nessa direção, a tecnociência se apresenta como a quintessência de um determinado modo de ser e estar no mundo. Como diz o filósofo Manfredo de Oliveira (2016, p. 131s): “Nessa ‘cultura antropocêntrica’ a totalidade da existência humana é marcada pela técnica. A realidade técnica, a produção técnica e seus produtos apresentam-se aqui como o modelo de interpretação da totalidade do ser, o critério para o que deve valer como real e verdadeiro. Por se fazer, assim, a efetividade fundamental da automediação do ser humano no mundo, a técnica transforma profundamente a forma de entender a vida humana, as maneiras de pensar e de agir atingindo até as esferas mais familiares e privadas da vida, os hábitos e costumes, as instituições e os valores, a história, a sociedade, o cosmo, o mundo em que o ser humano vive, compreendendo e agindo”.
A isso o Papa Francisco chama de “paradigma tecnocrático” na Laudato Si’ (FRANCISCO, 2015, n. 101, 109) e identifica nele a “raiz da crise ecológica” que vivemos atualmente. Constata que o problema fundamental deste paradigma é “o modo como realmente a humanidade assumiu a tecnologia e o seu desenvolvimento juntamente com um paradigma homogêneo e unidimensional”, no qual “sobressai uma concepção do sujeito que progressivamente, no processo lógico-racional, compreende e assim se apropria do objeto que se encontra fora” (n. 106). Na relação sujeito-objeto reside, em última instância a ânsia de transformar os demais seres vivos em objetos, daí em recursos que podem ser explorados inescrupulosamente em todos os recônditos da Terra e transformados em mercadorias para a satisfação dos desejos (ilimitados) de consumo de uma pequena parcela da população mundial.
Nesse sentido, aumenta cada vez mais a consciência de que o paradigma moderno concebia a Terra como globo terrestre entre outros astros. O modelo mecânico, originado na experiência de Galileu, dava sustentação a este modo de habitar a Terra, concebida como um corpo inerte, portanto, feito de objetos, de coisas, que não têm vontade própria e que, portanto, estão à mercê dos humanos. Esta separação entre natureza e cultura leva a que os humanos sejam considerados os únicos agentes na Terra. Realiza-se aquilo que Protágoras prefigurara: “O homem é a medida de todas as coisas”.
Há basicamente três atitudes subjacentes a esta maneira de ver o mundo (TAVARES, 2023), que são as seguintes: a exterioridade, a superioridade e a instrumentalidade. A exterioridade é caracterizada pela separação entre natureza e cultura. A superioridade é marcada pela ânsia de, pelo fato de sermos seres que sabem que sabem, nos considerarmos superiores aos demais seres vivos. A instrumentalidade é decorrente das atitudes anteriores: tudo está indiscriminadamente a nosso dispor.
Os humanos arvoraram exclusivamente para si a condição de atores neste planeta: “Quando se sustenta que existem, de um lado, um mundo natural e, de outro, um mundo humano, propõe-se simplesmente dizer, após o fato, que uma porção arbitrária dos atores será despojada de toda ação e que outra parte dos mesmos atores, também arbitrária, será dotada de uma alma (ou de uma consciência)” (LATOUR, 2020a, p. 101).
Esta visão pavimentou o caminho para a exploração desenfreada de todos os recursos naturais em todas as latitudes da Terra e os extrativismos ainda hoje existentes, sempre em conformidade com as políticas econômicas do crescimentismo. Pavimentou, igualmente, pelo colonialismo e o machismo, o domínio de outros povos (negros, indígenas, minorias étnicas), o que resultou quase sempre no seu extermínio ou destruição de seus estilos de vida, e das mulheres. Portanto, uma das características deste paradigma é o de ser extremamente violento tanto em relação aos seres vivos como em relação às outras pessoas. Tornamo-nos seres de fratura, não de fraternidade.
Frente às atitudes de exterioridade, superioridade e instrumentalidade do paradigma fraturador moderno, devemos cultivar três outras atitudes, em sintonia com o paradigma do cuidado: a relação de pertença, a relação de dependência e a atitude do cuidado (TAVARES, 2023). Como terranos, pertencemos à Terra, nossa condição de vida. Antes de mais nada, a crise climática que vivemos, nos lembra da nossa extrema dependência das condições gerais de habitabilidade da Terra. Não vivemos sobre a Terra, mas com a Terra.
Segundo Bruno Latour (Cf. 2020; 2022), trata-se de uma mudança de cosmologia. É preciso deixar para trás um mundo pensado como “objetos galileianos”, para adentrar em um mundo de “agentes lovelockianos”.
Nesse sentido, o paradigma do cuidado, este dos agentes lovelockianos, compreende a Terra como uma particularidade. A atenção recai sobre a sua singularidade: não há outro planeta como a Terra, com as condições de habitabilidade que só a Terra reúne. Portanto, se não cuidarmos da Terra como nossa casa comum, não temos, enquanto humanidade, para onde ir, apesar das muitas tentativas de fuga para outros planetas. O cientista britânico James Lovelock é, junto com a bióloga Lynn Margulis, o idealizador da teoria de Gaia, segundo a qual, na Terra, é “preciso considerar os seres vivos como agentes que participam plenamente dos processos de gênese das condições químicas e até, em certa medida, geológicas do planeta” (LATOUR, 2020, p. 93).
O Antropoceno, esta nova era geológica que se inaugura justamente pela intervenção dos humanos na Terra, chama-nos à responsabilidade de cuidar de todos os seres vivos, à sororidade, outra palavra para fraternidade. Ou seja, trata-se de construir uma nova relação entre humanos e não humanos, não mais marcada pelas atitudes do paradigma moderno, mas agora pelas atitudes do paradigma do cuidado. É preciso reconhecer que “o sistema Terra em nada mais se assemelha a uma moldura. Suas respostas à interferência antrópica excessiva em seus equilíbrios tornam-no, cada vez mais, um ator incondicional da trama histórica” (MARQUES, 2023, p. 41).
Uma das consequências disso é que já não podemos mais pensar a “crise social” separada da “crise ambiental”, pois são “uma única e complexa crise socioambiental” (FRANCISCO, 2015, n 139). A concretização disso é que somos chamados a praticar a “ecologia integral” na perspectiva de Francisco: “uma verdadeira abordagem ecológica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nos debates sobre o meio ambiente, para ouvir tanto o clamor da terra como o clamor dos pobres” (LS 49). As preocupações com a sanação das desigualdades sociais devem andar de mãos dadas com a sanação dos problemas ambientais.
Felizmente, de muitas e variadas formas e territórios, emergem iniciativas que encarnam outros estilos de vida mais plurais e que substituem a relação sujeito-objeto pela relação de cuidado e que trazem novas cosmovisões, mas sobretudo cosmosensações. Este novo paradigma emergente deve ser o horizonte no qual se move uma educação popular em sintonia com os desafios do tempo presente. Para isso, ela precisa tematizar os seus contornos e ajudar os educandos a identificá-los nas práticas e vivências dos novos sujeitos que são seus portadores: povos indígenas, comunidades tradicionais e quilombolas, movimento de mulheres, entre outros.
É preciso ter presente que nem sempre falamos de novos estilos de vida no sentido de que nasceram há pouco. Com frequência, falamos daqueles sujeitos que historicamente resistiram e sobreviveram ao colapso e por isso estão em condições de nos ajudar “a adiar o fim do mundo”, justamente porque o “futuro é ancestral”, como diria Ailton Krenak.
O novo paradigma, que aqui denominamos de paradigma do cuidado e que é embrionário, nasce de uma necessária revolução antropológica, ou seja, emerge da recuperação da compreensão de que humanos e não humanos habitam e compartilham a mesma Terra, que é a casa comum de todos os seres vivos.
Disso se depreende que a educação popular, no século XXI, tem como tarefa primordial repensar o nosso lugar e nossas relações neste planeta. Considerando-se seres superiores, acreditávamos que seria possível viver destacados do ambiente. O aquecimento global, a crise ambiental, enfim, o novo regime climático, vem para nos recordar algo que é da nossa essência como seres de relações: somos terráqueos, umbilical e existencialmente vinculados à terra. Nosso destino está ligado ao destino da Terra.
O amor ao próximo, que se expressa na caridade interpessoal e no compromisso político (Cf. CACCIARI; MARTINI, 2003, p. 27-37), também exige o amor ao mundo (Cf. LATOUR, 2022), pois são inseparáveis. Quem ama o mundo o deve amar na sua inteireza. O mundo, a sua materialidade, deve se constituir em objeto de nosso amor, amor que passa pela rematerialização do nosso pertencimento à terra de mil maneiras. Pois, como podemos odiar, destruindo, o que é a nossa condição de vida? Não se destrói o que se ama. Pelo contrário, cuida-se, cria-se com os seres amados uma relação de amizade, de pertença e sororidade. Como escreve Paulo Freire (2022, p. 77), “não creio na amorosidade entre mulheres e homens, entre os seres humanos, se não nos tornamos capazes de amar o mundo”.
Do exposto até aqui, depreende-se que toda educação, e mais ainda a educação popular, necessita aquilo que Edgar Morin chama de “reforma do pensamento” em estreita relação com a prática. “Nosso modo de conhecimento fragmentado produz ignorâncias globais (cegueiras). Nosso modo de pensamento mutilado conduz a ações mutilantes” (MORIN, 2013, p. 183). Isso porque “os modelos de pensamento influem realmente nos comportamentos” (FRANCISCO, 2015, n. 215).
O desafio de discernir os sinais de nosso tempo requer uma verdadeira conversão na maneira de pensar. “A reforma do conhecimento exige a reforma do pensamento. A reforma do pensamento exige um pensamento que possa religar os conhecimentos entre si, religar as partes ao todo, o todo às partes, e que possa conceber a relação do global com o local, do local com o global” (MORIN, 2013 p. 184). Para Morin, pensar é ligar, porque, como já citamos, para ele a fragmentação é a barbárie do pensamento. Pensar é também proteger-se dos autoenganos.
Dentro desse propósito, na linha do Papa Francisco, a educação popular, para que seja integral, deve se dar a tarefa de trabalhar para integrar três linguagens: “a da mente, a do coração e a das mãos. A educação deve mover-se nestes três caminhos. Ensinar a pensar, ajudar a ouvir bem e acompanhar no fazer, ou seja, que as três linguagens estejam em harmonia; que a criança, o jovem, pense aquilo que sente e faz, sinta aquilo que pensa e faz, e faça aquilo que pensa e sente. E deste modo, a educação torna-se inclusiva porque todos têm um lugar, inclusive também humanamente” (FRANCISCO, 2019, p. 88).
Estes são, portanto, os desafios fundamentais da humanidade: “saber ver, saber pensar, saber pensar seu pensamento, saber agir, e isso não somente para si, mas para a tarefa mais grandiosa jamais encontrada pelo homem: a luta simultânea contra a morte da espécie humana e a favor do nascimento da humanidade” (MORIN, 2010, p. 65).
Esta maneira de conceber a educação popular requer que o próprio educador se torne centro de atenção e questione a sua ação no processo educativo. Para ele também podem ser de grande ajuda as reflexões que o Papa Francisco (FRANCISCO, 2017) dirigiu à comunidade de escritores da revista La Civiltà Cattolica, de Roma. Nesta conversa, destaca três palavras. São três “Is” que remetem a três atitudes básicas que, parafraseando, um educador popular deve cultivar.
O primeiro “I” é Inquietação. Francisco pergunta: “O coração de vocês conservou a inquietação da busca? (...) Temos grandes visões e impulso? Somos audazes? Ou somos medíocres e nos contentamos com reflexões de laboratório?”.
O segundo “I” é Incompletude. O educador popular não pode ter a pretensão de saber tudo e, consequentemente, se fechar à realidade. Deve cultivar um “pensamento aberto” diante de uma realidade em permanente transformação. Do contrário, não estará “vigilante” para captar os “sinais dos tempos”.
O terceiro “I” é Imaginação. Não é próprio de um educador popular render-se ao estado do tempo presente, cair na armadilha do “pensamento único”, da “realpolitik” e, portanto, capitular diante da tarefa de, pela educação, ajudar a descortinar outros mundos possíveis, ou, como diria Paulo Freire, a criar “inéditos-viáveis”.
Destas atitudes nasce um educador que se percebe a si mesmo como sempre inacabado, em busca, inconformado e em movimento para apreender os apelos que a realidade lhe faz. Assume a tarefa de semear “as sementes que eram nossas e as que não eram nossas” e transformar “as nossas mentes em roças” (BISPO DOS SANTOS, 2023, p. 15), na esperança da colheita, que é sempre futura. E com o alerta de que nós “somos criaturas do velho sistema que, não obstante isso, queremos construir o novo sistema” (MORIN, 2010, p. 65, citando aqui G. Lekey).
Acreditamos que, sem exagero, se pode dizer que a educação popular é a prática das utopias, dos sonhos, das esperanças. Nenhum educador se dá ao trabalho de semear as sementes do jardim do paradigma do cuidado se não estiver imbuído da esperança de que a colheita virá, por suas mãos ou de outras.
Evidentemente, qualquer pessoa que se entrega à ação educativa sabe que os tempos são difíceis e que as utopias estão em baixa. As políticas neoliberais, a erosão da democracia, a ausência de perspectivas para as juventudes, a efervescência de ideias de direita e as catástrofes climáticas são como uma espessa névoa que ensombrece a nossa visão e obstaculizam muitas perspectivas e saídas.
Mas não nos cabe escolher os desafios que somos chamados a enfrentar. Pois, como nos alerta Paulo Freire, “não há mudança sem sonho, como não há sonho sem esperança” (Apud FREITAS, 2019, p. 439). Até porque “a morte do sonho e da utopia (...) implica a imobilização da História na redução do futuro à permanência do presente” (FREIRE, 2022, p. 142). E nada pode ser pior do que viver sem a perspectiva de futuro.
Assim sendo, “uma das tarefas políticas que devemos assumir é viabilizar os sonhos que parecem impossíveis” (Apud FREITAS, 2019, p. 438). Crer que não se pode fazer nada, que se está de mãos atadas, também não é realista. Por isso, a utopia é o verdadeiro realismo do educador e uma vacina contra o fatalismo neoliberal.
Nesta mesma linha está Francisco: “A esperança convida-nos a reconhecer que sempre há uma saída, sempre podemos mudar de rumo, sempre podemos fazer alguma coisa para resolver os problemas” (FRANCISCO, 2015, n. 61). As mudanças que sonhamos não vêm das elites, mas da teimosia e articulação dos sujeitos historicamente excluídos, daqueles que historicamente viveram – e vivem – o colapso, mas que não perderam a esperança.
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