Por: André | 01 Março 2013
De Gänswein a Balestrero passando pelo IOR. Uma análise das nomeações decididas por Bento XVI na fase final de seu pontificado. Nem todas eram obrigatórias. Serão de obstáculo ou de ajuda para o futuro Papa?
A reportagem é de Sandro Magister e publicada no sítio Chiesa.it, 27-02-2013. A tradução é do Cepat.
Durante as últimas e dramáticas semanas do pontificado de João Paulo II, naquele momento sem voz e extremamente fragilizado, houve algumas nomeações que suscitaram perplexidade. É o caso de Angelo Comastri, atualmente cardeal, como coadjutor do arcipreste da Basílica de São Pedro.
Ou a aceitação da renúncia do cardeal Miguel Obando Bravo como arcebispo de Manágua, publicada, junto com outros 23 disposições pontifícias, nos últimos dois dias de pontificado, estando o papa Karol Wojtyla já moribundo.
Sem contar com o fato de que circulou insistentemente o rumor, não isento de fundamento, de uma tentativa – não concretizada – de substituir in extremis o secretário de Estado, Angelo Sodano, pelo cardeal Giovanni Battista Re, nessa época prefeito da Congregação para os Bispos, a mesma que, por sua vez, havia disposto com sucesso a renúncia de Obando Bravo.
Também ao final do pontificado de Bento XVI não faltam, e não faltarão, observações críticas sobre suas nomeações de fim de pontificado. Embora ninguém possa jamais refutar o fato de que estas nomeações foram feitas por um papa realmente “demissionário” porque está debilitado pela idade, mas sempre no pleno exercício de seus poderes e, sobretudo, no pleno uso de suas faculdades físicas, mentais e espirituais.
Dito isto, é, certamente, interessante analisar quais foram as últimas decisões que o papa Joseph Ratzinger tomou no governo da cúria romana e quais deixará para o seu sucessor, embora seja bom sempre recordar, este último será plenamente livre para confirmá-las ou não no começo ou no transcurso do seu pontificado.
Apesar dos rumores desencadeados pelo chamado “vatileaks”, Bento XVI não castigou em absoluto os seus mais estreitos colaboradores, senão que em todo o caso os fortaleceu também para o futuro.
É nesta chave que se pode ler a nomeação de seu secretário particular Georg Gänswein como arcebispo e prefeito da Casa Pontifícia. Quando isto aconteceu, em 7 de dezembro passado, não faltou quem fez notar a inédita anomalia de um eclesiástico que assumia em si mesmo o duplo cargo de secretário e de prefeito da Casa Pontifícia. Mas o papa, com toda a probabilidade, já sabia que esta anomalia não duraria muito tempo.
Em relação também às questões econômico-financeiras, parece que Bento XVI desejava deixar ao seu sucessor um Instituto para as Obras de Religião, o IOR, dirigido por uma “governança” clara, já sem as insanáveis contradições internas produzidas com Ettore Gotti Tedeschi como presidente do Conselho de Superintendência laico.
É nesta chave que é preciso ler a nomeação do alemão Ernst von Freyberg no posto de Gotti Tedeschi e a renovação da Comissão Cardinalícia de Vigilância no “banco” vaticano, que viu a inevitável saída do cardeal Attilio Nicora – pedida pelo Moneyval porquanto era incompatível com seu cargo de presidente da Autoridade de Informação Financeira –, mas não a do cardeal Jean-Louis Tauran, voz autorizada – também crítica – da clássica escola diplomática vaticana.
O cardeal secretário de Estado, Tarcisio Bertone, foi confirmado pelo Papa como membro e presidente da Comissão Cardinalícia do IOR. O purpurado salesiano conseguiu, além disso, que um cardeal de sua estreita confiança, Giuseppe Versaldi, se converta em delegado pontifício na Congregação dos Filhos da Imaculada Conceição (Concepcionistas), proprietária em Roma de duas importantes estruturas de saúde que se encontram à beira da falência por má gestão.
A última fase do pontificado foi marcada também pela crescente importância na cúria romana dos Focolares.
Além do prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e das Sociedades de Vida Apostólica, o cardeal brasileiro João Braz de Aviz, os seguidores de Chiara Lubich já tinham dois pontos fortes na Secretaria de Estado, com os arcebispos Angelo Giovanni Becciu, que ocupa o cargo de substituto, muito importante também no período do conclave, e Luciano Suriani, uma espécie de chefe de pessoal da cúria, com um papel influente em especial nas nomeações e nas substituições dos núncios.
É preciso assinalar como significativo também a nomeação do novo subsecretário desta Congregação, na pessoa do padre Friedrich Bechina, de 47 anos, austríaco, muito estimado no departamento pontifício. Ele é membro da família espiritual A Obra (Das Werke), da qual é membro também a irmã Christine, religiosa que assiste o irmão de Bento XVI, Georg Ratzinger, em suas passagens por Roma.
Mas a nomeação que mais chamou a atenção da imprensa nos últimos dias foi a do jovem e brilhante subsecretário dos Assuntos Exteriores vaticano, Ettore Balestrero, como arcebispo e núncio da Colômbia.
A nomeação em questão, amadurecida pouco antes do Natal, adquiriu uma dimensão particular porque foi publicada depois do anúncio da renúncia pontifícia e justamente nos dias em que o eclesiástico era objeto de artigos hostis no jornal La Repubblica.
É uma nomeação importante e difícil de decifrar.
Nos três anos de serviço, Balestrero conquistou a confiança tanto do secretário de Estado como do departamento pontifício. Isto lhe provocou não poucas invejas, sem contar com o fato de que foi sobretudo ele quem inovou na política internacional de seu cargo: de uma aproximação mais “soft” a atitudes mais intransigentes em questões eticamente sensíveis.
Agora, aos 46 anos, é enviado a um país importante, convertendo-se assim no mais jovem entre os núncios e entre os bispos italianos. Mas ao mesmo tempo é obrigado a deixar Roma para ir a um país distante. Os veteranos da cúria defendem que um posto, embora menor, na Secretaria de Estado tem mais importância do que uma nunciatura, mesmo prestigiada, como provaram as carreiras dos grandes Agostino Casaroli e Achille Silvestrini, que percorreram seu próprio “cursus honorum” sem nunca deixar o Palácio Apostólico.
De qualquer modo, no Vaticano se faz notar que a nomeação de Balestrero para a Colômbia tem um ilustre antecedente.
Em 1975, o então assessor (equivalente ao subsecretário de Assuntos Exteriores) Eduardo Martínez Somalo, no cargo desde 1970, foi nomeado por Paulo VI, quando tinha tão somente 48 anos de idade, arcebispo e núncio de Bogotá. Tratou-se somente de um afastamento provisório. Em 1979, efetivamente, o novo papa João Paulo II chamou-o a Roma como substituto na Secretaria de Estado, cargo que deixou posteriormente em 1988 porque foi promovido a cardeal prefeito da Congregação para o Culto Divino.
A comparação entre Balestrero e Martínez Somalo é sem dúvida sugestiva. Mas é óbvio que por enquanto limita-se somente à primeira fase, e nada pode garantir que evolua em um sentido análogo. Com efeito, tudo dependerá de quem será o próximo papa e de quem será o próximo secretário de Estado.
O pontificado de Bento XVI termina então com uma série de nomeações significativas, mas também com uma designação que falta.
Com efeito, permanece vazia a cadeira de secretário da Congregação para o Instituto da Vida Consagrada e das Sociedades de Vida Apostólica, dicastério que ainda deve tirar conclusões da espinhosa e contraditória visita apostólica às religiosas dos Estados Unidos.
Após ter avaliado a hipótese de um bispo norte-americano, ultimamente parecia que se pensava na promoção de um religioso dos Estados Unidos, com toda a probabilidade um dominicano.
Mas, neste tema, o papa Ratzinger quis deixar o campo totalmente livre para o seu sucessor.
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As últimas nomeações de Bento XVI antes da renúncia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU