Por: Jonas | 21 Dezembro 2012
Um balanço das últimas nomeações na Cúria Romana. Mais poderes ao secretário do Papa. Mais cargos aos Focolares e à Comunidade de Santo Egídio. Um corte no Conselho Pontifício da Cultura. O estranho caso do novo decano da Rota.
A reportagem é de Sandro Magister, publicada no sítio Chiesa, 19-12-2012. A tradução é do Cepat.
Na próxima festa da Epifania, Bento XVI consagrará bispo, junto a outros prelados, monsenhor Georg Gänswein, seu secretário particular desde 2003, nomeado há pouco prefeito da Casa Pontifícia.
Gänswein conservará o cargo anterior e continuará vivendo no departamento pontifício. Isto significa que, depois do vendaval do Vatileaks e da condenação do mordomo Paolo Gabriele, Bento XVI – com um gesto que parece não ter precedentes – confirmou e, inclusive, redobrou sua confiança em relação a seu colaborador mais próximo.
Ao se observar os últimos pontífices, nota-se que jamais ocorreu que um eclesiástico assumisse os cargos de secretário particular e de prefeito da Casa Pontifícia. Efetivamente, com João Paulo II, o secretário particular e prefeito Stanislaw Dziwisz apenas se tornou prefeito “adjunto” e foi nomeado bispo em 1998, aos 59 anos de idade, para, posteriormente, em 2003, ser elevado à dignidade de arcebispo.
O fato de um secretário do Papa se tornar bispo não é uma novidade. No entanto, antes do pontificado de Karol Wojtyla, esta nomeação chegava sempre no transcurso do pontificado posterior. Assim ocorreu com o secretário de Pio XII, Carlo Confalonieri, eleito arcebispo de Áquila em 1941, aos 48 anos de idade, e cardeal em 1958; bem como com o secretário de João XXIII, Loris Capovilla, nomeado bispo de Chieti em 1967, aos 52 anos de idade; e com o de Paulo VI, Pasquale Macchi, nomeado prelado de Loreto em 1998, aos 65 anos de idade.
Gänswein foi rapidamente nomeado bispo aos 56 anos e meio, ou seja, numa idade ligeiramente menor do que a de Dziwisz. Contudo, com foi visto, Confalonieri e Capovilla eram mais jovens no momento de sua nomeação episcopal.
Foi com João Paulo II que o seu secretário foi eleito bispo durante o pontificado, com um procedimento que levantou críticas mais ou menos veladas dentro e fora das paredes da Cúria Romana. Talvez poucos imaginassem que Bento XVI pudesse imitar seu predecessor neste campo. Todavia, procedeu justamente deste modo.
Desta forma, até hoje, a Cúria Romana não sofreu em absoluto essa reestruturação e esse enfraquecimento que não poucos prognosticavam, no começo do pontificado de Joseph Ratzinger. Este ano, o único escritório até agora suprimido foi o da Pontifícia Comissão para os Bens Culturais da Igreja.
Fortemente desejada pelo cardeal Gianfranco Ravasi, esta supressão teve como consequência a destituição do vice-presidente desta Comissão, o abade beneditino Michael John Zielinski – considerado muito tradicionalista pelo próprio Ravasi -, que se tornou um simples diretor num escritório da Congregação para o Culto Divino.
Poucos advertiram esta insólita destituição, assim como passou sem nenhum tipo de comentário a promoção da doutora Daniela Leggio a diretora de um escritório na Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica. É a primeira vez que uma leiga alcança essa distinção numa congregação romana (que conta, por outro lado, com a presença de uma religiosa como subsecretária, desde o ano de 2004). No passado, uma leiga chamada Paola Fabrizi chegou a ser diretora num escritório no Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, sendo que atualmente outra leiga, Maria Cristina Carlo-Stella, é diretora de escritório na Fábrica de São Pedro.
O ano de 2012 marcou a chegada na Cúria de um representante de primeiro nível da Comunidade de Santo Egídio, o bispo Vincenzo Paglia, como presidente do Pontifício Conselho para a Família, precisamente ao mesmo tempo em que o fundador dessa própria Comunidade, Andrea Riccardi, era ministro na Itália, também vinculado à área da família. Paglia, que segue carreira rumo ao cardinalato, num próximo consistório, já mostrou ter uma atitude menos intransigente que seus predecessores, os cardeais Alfonso López Trujillo, colombiano, e Ennio Antonelli, focolar.
Atualmente, os Focolares são o movimento eclesial mais representado na cúpula da Cúria Romana, graças também à nomeação, no último mês de novembro, de dom Angelo Vincenzo Zani como secretário da Congregação para a Educação Católica e como arcebispo (também será consagrado pelo Papa no dia 6 de janeiro). Zani se junta com outros filhos espirituais de Chiara Lubich presentes no Vaticano: o cardeal João Braz de Aviz, prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica; o arcebispo Luciano Suriani, diretor do Escritório do pessoal da Cúria, e o arcebispo Giovanni Angelo Becciu, substituto da Secretaria de Estado, sobre cujas mãos passam todas as práticas mais delicadas do governo da Santa Sé.
Em 2012, foi afastado da Cúria Romana o arcebispo Joseph William Tobin. Após apenas dois anos como secretário da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada, foi enviado novamente à sua pátria para dirigir a diocese, não cardinalícia, de Indianápolis. Até agora, Tobin não foi substituído. A partir do perfil de seu sucessor se compreenderá, entre outras coisas, qual poderá ser a linha do dicastério em relação às religiosas progressistas dos Estados Unidos. A visita apostólica que foi promovida pelo cardeal Franc Rodé, com a chegada do sucessor focolar Braz de Aviz e do próprio Tobin, parece ter acabado num beco sem saída.
Este ano, também se afastou de Roma Charles J. Scicluna, o inflexível promotor de justiça da Congregação para a Doutrina da Fé nos processos contra os chamados “delicta graviora”, entre os quais está o abuso sexual perpetrado por clérigos contra menores de idade. Scicluna foi nomeado bispo auxiliar de sua ilha natal, Malta, e ainda não foi anunciado quem será o novo promotor de justiça do ex-Santo Ofício. Em todo caso, ele poderá continuar fazendo sentir sua voz e sua influência em Roma. Pouco depois de sua consagração episcopal, chegou-lhe a sua nomeação como membro da Congregação para a Doutrina da Fé, caso raro para um simples bispo auxiliar, com um papel deste nível na Cúria.
Sempre relacionado com a política judicial da Congregação para a Doutrina da Fé, será interessante verificar qual será a atitude do novo prefeito, o arcebispo alemão Gerhard Ludwig Müller, sucessor do cardeal estadunidense William J. Levada, que esteve em perfeita sintonia com a linha intransigente de Scicluna.
No ano de 2012, viu-se também a nomeação do novo decano da Rota Romana: dom Pio Vito Pinto. Nomeação surpreendente por vários motivos, entre eles pelo fato de que o próprio Pinto – como se infere dos documentos tornados públicos pelo ex-mordomo do Papa – parece ter desempenhado um papel não indiferente na alimentação dessas acusações (infundadas) de homossexualidade que fizeram deflagrar, no ano de 2009, o caso de Dino Boffo.
Pinto, que posteriormente foi nomeado também presidente do Tribunal de Apelação do Estado da Cidade do Vaticano, fez-se notar recentemente pelo elogio desproporcional que atribuiu ao cardeal secretário de Estado do Vaticano, Tarcisio Bertone, numa conferência pronunciada em sua presença, no dia 8 de novembro, durante a inauguração do ano acadêmico 2012-2013, dos estudos na Rota Romana.
Nessa conferência, Pinto, ao exaltar a peculiaridade dos raros secretários de Estado não diplomáticos de carreira e pertencentes a congregações religiosas, assemelhou Bertone com a figura de um de seus predecessores do século XIX, o barnabita Luigi Lambruschini, secretário de Estado de Gregório XVI.
Ele se esqueceu que numa entrevista concedida à revista “Trenta Giorni”, no ano de 2006, ao escutar o nome deste predecessor, Bertone reagiu exclamando: “Por caridade, não comparem comigo o cardeal Lambruschini, que deve ter sido um homem santo, mas foi também, politicamente, um reacionário radical!”
Até aqui mencionamos algumas das nomeações mais significativas na Cúria, desse ano que está para terminar. Entretanto, no ano de 2012, também tiveram confirmações que, como de costume, não foram anunciadas no boletim da Sala de Imprensa, mas somente nas “Acta Apostolicae Sedis”, a gazeta oficial vaticana.
A seguir apresentamos as últimas confirmações registradas nas Atas:
- No dia 9 de junho, o cardeal Leonardo Sandri foi confirmado por mais cinco anos como prefeito da Congregação para as Igrejas Orientais;
- No dia 9 de junho, o bispo João Ignacio Arrieta, da Opus Dei, foi confirmado por um quinquênio como secretário do Pontifício Conselho para a Interpretação dos Textos Legislativos;
-No mesmo dia, o cardeal Jean-Louis Tauran foi confirmado, por um período análogo, como presidente do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-Religioso;
- No dia 19 de junho, o arcebispo Claudio Maria Celli foi confirmado, por cinco anos, presidente do Pontifício Conselho das Comunicações Sociais;
- No mesmo dia, o cardeal Francesco Coccopalmerio foi confirmado presidente do Pontifício Conselho para a Interpretação dos Textos Legislativos, “até que complete os 75 anos”;
No dia 3 de julho, o padre Anthony Ward foi confirmado subsecretário da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, com a fórmula “donec aliter provideatur”: até que se disponha o contrário.
Quanto ao Instituto para as Obras de Religião, o “banco” vaticano, que desde o dia 24 de maio de 2012 carece de um presidente, a escolha do sucessor do deposto Ettore Gotti Tedeschi está se centrando num não italiano, “de provada capacidade e de fama fulgurante”. Uma escolha que não é fácil, vista a tempestade judicial que se desatou, dias passados, na Alemanha sobre a cúpula do Deutsche Bank, do qual o atual presidente interino do IOR, Ronaldo Hermann Schmitz, foi administrador delegado.
No ano de 2013, também é prevista a nomeação de um “prelado” que faça a ligação entre o IOR e a Comissão Cardinalícia de Vigilância, cargo vacante desde 2010. E para a presidência da Autoridade de Informação Financeira é previsto que o cardeal Attilio Nicora deixe o espaço para um sucessor.
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Balanço das nomeações na Cúria Romana em 2012. Promoções, destituições e surpresas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU