16 Julho 2019
O próximo Sínodo da Amazônia poderia abrir caminho para novas formas de governo na Igreja. E não apenas favorecer a experiência de padres casados.
O artigo é de Jesús Martínez Gordo, publicado por Settimana News, 07-07-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
A pedofilia na Igreja, o acesso das mulheres ao ministério ordenado, a reforma da cúria e o sínodo da Amazônia são os grandes desafios para Francisco neste ano. E se é verdade que enfrentou corajosamente o primeiro deles e que a reforma da cúria do Vaticano parece estar bem encaminhada, também é verdade que não encerrou o debate sobre o acesso das mulheres ao diaconato e, portanto, ao sacerdócio.
Depois do verão, é a vez do Sínodo da Amazônia; um encontro em que retornam à mesa três referências capitais do pontificado do Papa Bergoglio: a preferência pelos pobres e as periferias do mundo, a reforma das comunidades cristãs e a criação de um novo modelo de governo da Igreja.
Víctor Codina é um dos teólogos especialistas, nomeado por indicação da Rede Eclesial Pan-Amazônica e coeditor do documento preparatório do Sínodo do próximo outubro.
Nesse texto, escrito após consultar 100 mil pessoas de 170 etnias indígenas e nove países da região, sustenta-se que os problemas que afetam a Amazônia sejam: a violência sistemática na forma de violação dos direitos humanos, especialmente em relação às mulheres, o tráfico de drogas, a disseminação do consumo de drogas, a destruição das culturas, as migrações forçadas, o tráfico de seres humanos e os assassinados de líderes indígenas e populares.
Parece-me - como disse muito bem Víctor Codina - que os cidadãos do Primeiro Mundo estejam interessados no debate que se abriu sobre padres casados, mas - por favor - não deixem que as árvores vos impeçam de ver a floresta da tragédia humana e ambiental que estão provocando os interesses de grandes multinacionais com a busca compulsiva de recursos naturais (madeira e metais), a construção de infraestruturas (pântanos e estradas), a grilagem de terras e, naturalmente, a poluição do solo, das águas e do ar.
No signo dessa "urgência maior" deve ser entendida a proposta de uma Igreja de rosto amazônico, ou seja, uma Igreja que defenda o território e a vida de seus membros, feminina, descentralizada, descolonizada, promotora das vocações indígenas e habilitada a ordenar sacerdotes "indígenas", "respeitados e aceitos por sua comunidade, mesmo que já tenham uma família estável e constituída".
As reações em algumas Igrejas do Primeiro Mundo não se fizeram esperar: o card. W. Brandmüller e a extrema direita dos EUA definiram o documento preparatório e a proposta de ordenar sacerdotes casados o fruto de uma conspiração subversiva encorajada pela Igreja alemã para abolir o celibato.
Aqui está - eu respondo a eles - uma cortina de fumaça com a qual esconder a "urgência maior", tão presente no sinal de alarme de Víctor Codina.
Mais razoável, parece-me, o que declarou o card. W. Kasper: a partir de agora, caberá a cada conferência episcopal "decidir se é favorável" a implementar algo semelhante ao que será debatido - e provavelmente aprovado - no próximo Sínodo e que, naturalmente, será submetido à aprovação do Papa.
E também o que foi dito por François Glory, missionário no Brasil há trinta anos e por Antônio José Almeida, um estudioso do problema.
Para o primeiro dos dois, "a ordenação de homens casados pode fortalecer o clericalismo", porque as comunidades de base amazônicas funcionam graças à divisão dos diferentes serviços realizados por equipes de leigos. O surgimento dessa nova modalidade poderia acabar por concentrar tudo de novo no padre, mesmo que casado. Com essa proposta - conclui – não se resolve o problema.
Pode ser resolvido - ressalta, por sua vez, Antônio José Almeida - se forem promovidos os “sacerdotes da comunidade” que, casados (ou não), reforçam a corresponsabilidade das equipes de leigos nos setores da anunciação, do culto e da caridade ou da justiça, de maneira especial, devido à presença dos cristãos nas periferias do mundo e a comunhão eclesial. Em suma, quando se favorece um novo modelo de padre que - nos antípodas daquele que predomina na maioria das Igrejas do Primeiro Mundo - celebra os sacramentos para que sustentem a missão e a comunhão eclesial.
Em última análise, neste Sínodo se recupera uma forma de governo que, embora possa parecer "revolucionária" para muitos, é muito tradicional: as comunidades propõem alternativas que o papa ratifica, se considerar a instância fundada.
À luz dessa prática (de baixo para cima), pode se abrir uma época em que aumentará o número de Igrejas que desejem diagnosticar sua situação e debater seu planejamento futuro.
A Alemanha decidiu seguir esse caminho. Mas quando o farão os bispos, pelo menos aqueles do País Basco? Não perco a esperança de que algo similar aconteça entre nós; embora existam aqueles que, considerando as decisões de caráter econômico que recentemente estão sendo feitas, pensam que eu esteja pedindo a lua.
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“Padres da comunidade”, casados ou não - Instituto Humanitas Unisinos - IHU