O Credo, ontem e hoje. Artigo de Fulvio Ferrario

Foto: Pontifício Instituto Superior de Direito Canônico

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01 Outubro 2025

"Em suma, no ano de Niceia, creio ter aprendido isto: nunca é demais a criatividade evangélica ao expressar a fé. Mesmo os grandes símbolos da antiguidade não dizem tudo e nem sempre são expressos da maneira que a nós pareceria mais clara. Também se distanciam da linguagem bíblica", escreve Fúlvio Ferrario, teólogo italiano e decano da Faculdade de Teologia Valdense, em Roma, em artigo publicado por Riforma, 03-10-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o artigo.

A leitura, nestas colunas (Riforma n. 37, 29/9, p. 5), de um texto que pretende se apresentar como um Credo me levou a repensar nas celebrações do Concílio de Niceia realizadas este ano, no 17º centenário do evento. Como pastor valdense e professor de teologia, fui convidado a falar sobre o assunto em contextos muito diversos, permanecendo, devo dizer, bastante surpreso com o interesse por um tema que, pelo menos à primeira vista, não parece estar no topo das prioridades do debate público.

Na comunidade evangélica que frequento, o chamado Credo Apostólico é recitado regularmente durante os cultos dominicais. Ele é diferente do Credo Niceno (-Constantinopolitano: aquele em uso na Missa Católica), mas compartilha, além de seu conteúdo central, a linguagem extremamente arcaica, como é óbvio tratando-se de textos antigos. Estranhamente, a terminologia dos Credos dos primeiros séculos me causa mais embaraço agora, que sou idoso, do que na minha juventude. Naquela época, eu pensava que, como as palavras antigas encarnam uma história de fé compartilhada, elas deveriam ser mantidas na liturgia, e que o problema fosse, quando muito, explicá-las. Um tanto presunçosamente, até escrevi um livro com essa finalidade. Hoje, porém, considero inadequado presumir que toda a comunidade deva ou possa ler o meu livro ou outros sobre o assunto: seria melhor, creio eu, professar a fé com palavras mais simples para nós, mais "nossas".

Mas o que é um "Credo"? É uma tentativa de expressar resumidamente (o termo "símbolo", às vezes usado como sinônimo nas igrejas, significa algo como "juntar") a essência da fé cristã. Segundo o Novo Testamento, essa essência não é uma série de conceitos, mas uma história, a de Jesus de Nazaré, a partir da qual a Igreja compreende a história de Deus com a humanidade.

Um Credo, portanto, busca expressar, em poucas palavras, quem Cristo é para nós hoje e, a partir disso, fala do Deus de Israel como de um Pai (ou mesmo Mãe: desse ponto de vista, há uma analogia entre os dois nomes), que revive e renova a história de Jesus por meio de sua presença, chamada "obra do Espírito Santo". Por essa razão, a estrutura dessas expressões da fé cristã é geralmente trinitária. Especialmente com a Reforma Protestante, torna-se essencial expressar o significado de Jesus diante de desafios específicos, diferentes daqueles de Niceia ou Constantinopla.

Assim, acontece, por exemplo, que um aspecto antes resumido em uma única expressão ("para nossa salvação" ou mesmo, no Apostólico, como no Novo Testamento, "por nós") ocupe muito espaço naquelas que são chamadas de "confissões de fé" da Reforma, tornando-se "o artigo (isto é, o capítulo) sobre a justificação". E a Reforma produz dezenas de confissões de fé, em base local: não porque a fé seja diferente na França e na Escócia, mas porque o contexto torna úteis palavras diferentes. Dois elementos são constantes:

a) trata-se sempre de falar de Deus e do mundo a partir da história de Jesus e de seu significado;

b) a confissão de fé, ou o Credo, são produtos coletivos, eclesiais.

Também pode acontecer, no entanto, que um grupo de trabalho, um curso de catecismo ou um indivíduo sinta a necessidade de expressar a fé com suas próprias palavras. Sem um consenso eclesial, trata-se obviamente de uma simples contribuição ao debate; muitas pessoas duvidam que seja sábio usar esses textos no culto, porque a comunidade não pôde expressar previamente sua concordância. Também é verdade, porém, que a própria pregação convida a um "Amém" comunitário (embora geralmente quem prega o diga sozinha ou sozinho, para sinalizar que terminou, como o lendário "ich habe fertig" de Trapattoni na Alemanha).

Nas maneiras apropriadas e com o devido senso de responsabilidade, o culto evangélico permite espaço de criatividade. Em suma, no ano de Niceia, creio ter aprendido isto: nunca é demais a criatividade evangélica ao expressar a fé. Mesmo os grandes símbolos da antiguidade não dizem tudo e nem sempre são expressos da maneira que a nós pareceria mais clara. Também se distanciam da linguagem bíblica. Portanto, deduzo que nós também podemos, e talvez devamos, falar da história de Jesus com a liberdade que ela mesma gera.

Por fim, o texto mencionado no início pede um esclarecimento: na igreja cristã, o que importa é sempre a história de Jesus e a nossa, por ser entrelaçada com a dele. Se for outra história, sem Jesus, então também se trata de uma outra fé.

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