"Para construir este futuro, devemos desmantelar a lógica do barateamento do capitalismo: mão de obra barata, saúde barata, dinheiro barato, guerra barata, vida barata. A crise climática não é um fracasso humano, mas um sucesso capitalista. É hora de todos desafiarmos e alterarmos esse sucesso. Unindo o proletariado, o femitariado e o biotariado, podemos forjar um mundo onde a vida, e não o lucro, dita as regras; um mundo onde a rede da vida floresce."
O artigo é de Jason W. Moore, publicado por El Salto, 04-09-2025.
Jason W. Moore é historiador ambiental e economista político. Coordena a Rede de Pesquisa sobre Ecologia-Mundo (World Ecology Research Network) em torno do que ele chama de Capitaloceno. É autor, junto com Raj Patel, de A History of the World in Seven Cheap Things (California University Press, 2018) e O capitalismo na trama da vida (Traficantes de Sonhos, 2020).
A crise climática não é culpa da humanidade, mas sim do capitalismo. Esse sistema, uma máquina que tece poder, lucro e o mundo vivo em uma única tapeçaria, tem destruído os ecossistemas do planeta e, com eles, o bem-estar humano. Sua insaciável sede por riqueza busca transformar toda a vida em uma oportunidade de lucro, com consequências aterrorizantes. Desde as chacinas coloniais do século XVI até os ecocídios e genocídios do século passado, o império capitalista saqueou a Terra e seus habitantes. Essa busca incessante por lucro alimenta a crise climática capitalogênica; não "causada pelo homem", mas pelo capital. Esqueçam, portanto, o termo "antropogênica". É capitalogênica.
Para entender essa crise, precisamos de uma nova perspectiva de classe. Não basta dizer "mude o sistema, não o clima"; há um sistema, e a classe capitalista o governa. A classe é mais do que o poder corporativo, mas vale a pena mencionar que, de acordo com o relatório mais recente da Carbon Majors (2024), 78 corporações são responsáveis por 70% de todas as emissões de gases de efeito estufa desde 1854. Esses plutocratas e gângsteres têm nome e endereço, assim como suas contas bancárias.
Enquanto isso, a maior parte da esquerda abandonou a análise de classe ou, como no importante livro de Matt Huber, O Clima como Guerra de Classes, retornou ao economicismo social-democrata. É evidente que o sistema salarial — onde os trabalhadores vendem sua força de trabalho por um salário — é um campo de batalha crucial. Mas os salários são apenas um fio em uma rede mais ampla de poder, lucro e vida. É uma rede em que o trabalho remunerado está vinculado ao não remunerado.
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Marx observou certa vez que os trabalhadores ingleses estavam sobre um "pedestal" de trabalho escravizado. Ele não estava brincando, e os pedestais não param por aí: também são o "trabalho feminino" não remunerado, a servidão por dívida, o trabalho migrante e o trabalho silencioso das florestas, da terra e dos rios. Cada dólar extraído de um trabalhador assalariado é construído sobre uma apropriação mais profunda e vasta: a degradação da própria vida, humana e não humana, para além do salário.
O trabalhador real nunca foi apenas um operário de fábrica atado a um salário. Focar exclusivamente nos salários — o que os marxistas da velha guarda chamavam de "economicismo" — leva ao desastre político, da mesma forma que os socialistas europeus apoiaram a Primeira Guerra Mundial ou, mais recentemente, quando os social-democratas ocidentais apoiaram a austeridade neoliberal e as guerras eternas dos Estados Unidos. Anti-imperialistas como Rosa Luxemburgo defendiam uma visão mais ampla e dialética. Até mesmo Lenin, escrevendo em O Desenvolvimento do Capitalismo na Rússia (1899), alertou contra uma "interpretação excessivamente estereotipada... da proposição teórica de que o capitalismo requer o trabalhador livre e sem-terra." A classe é mais complexa e dinâmica do que o economicismo admite.
A sobrevivência da classe trabalhadora sempre dependeu de um delicado equilíbrio entre o salário e o trabalho não remunerado. Os acadêmicos chamam isso de "lar semiproletário" e é a realidade básica para a maioria das famílias trabalhadoras. Como todo trabalhador sabe, esse delicado equilíbrio depende do trabalho não remunerado, muitas vezes realizado por mulheres, que quase sempre também são assalariadas. São as mulheres proletárias que, com seus esforços biológicos, emocionais e físicos, mantêm o sistema salarial funcionando.
O femitariado não são apenas as mulheres, mas todas as pessoas que realizam o trabalho de cuidado feminizado e não remunerado que sustenta a vida diária.
Para cada grama de "mais-valia" que os capitalistas extraem das pessoas trabalhadoras, existe um "excedente de gênero" oculto que reproduz a força de trabalho. Essa dinâmica — vamos chamá-la de dialética do proletariado e do femitariado — tem definido o capitalismo desde o seu início.
O femitariado não são apenas as mulheres, mas todas as pessoas que realizam o trabalho de cuidado feminizado e não remunerado que sustenta a vida diária. Isso não é uma lei natural; é uma invenção capitalista. Cozinhar, limpar, criar filhos e fornecer apoio emocional: em cada oportunidade, o femitariado consegue trabalhadores assalariados, homens e mulheres, prontos para a fábrica, o escritório ou o trabalho informal. Enquanto isso, o trabalho feminizado é desvalorizado como "natural". No entanto, é a espinha dorsal da sobrevivência do capitalismo. Sem esse trabalho não remunerado — os sociólogos o chamam de "segundo turno" —, o Senhor Rico não pode obter lucro e o sistema entra em colapso.
Não são apenas os humanos cujo trabalho não remunerado torna possíveis os enormes lucros. O capitalismo nunca prosperaria sem um terceiro pilar de trabalho: o biotariado. É uma ideia que pego emprestada do poeta Stephen Collis. A ideia de um biotariado não é uma fantasia pós-humanista. Plantas, micróbios e cavalos são postos a trabalhar para o capital. Mas não da mesma forma que o trabalho humano. O que nos une, proletários e biotarianos, é uma subordinação compartilhada à fantasia capitalista: que toda vida e todo trabalho podem ser reduzidos a uma peça intercambiável, insumos para a acumulação sem fim que nos degrada a todos. O biotariado não é um objeto a ser trancado e explorado; é o pulso vital do planeta. Não precisamos de teorias complexas para reconhecer o que qualquer pessoa que tenha passado tempo em um jardim ou trabalhado com animais entende: há vida e trabalho além da condição humana. O capitalismo não conseguiria passar um dia, um minuto, um segundo sem esse trabalho.
O biotariado, então, não são apenas as plantas ou os rios. É o solo que cultiva nossos alimentos, as florestas que armazenam carbono, os corpos humanos que trabalham, cuidam e dão à luz. O capitalismo reduz esse pulso à Natureza Barata. O pulso da criação da vida se rebela contra ele. Quando Marx descreveu que os trabalhadores se sentiam humanos apenas em seus momentos "animais" — comendo, dormindo, amando — ele apontava para a condição biotariana do proletariado. Quando ele escreveu sobre as "patologias industriais" que transformam o sangue operário em capital, ele compreendeu a união violenta do proletariado e do biotariado. A lição? Um socialismo que ignora o femitariado e o biotariado ignora a essência da solidariedade. Como os Industrial Workers of the World (IWW) expressaram: "Ferir um é ferir todos." Não é de se admirar que Marx tenha citado o padre comunista Thomas Münzer: "As criaturas também devem ser libertadas."
O proletariado planetário é um todo dialético: toda classe trabalhadora é proletária, feminitária e biotariana. Não se trata de compartimentos estanques; são realidades entrelaçadas na rede vital do capitalismo. Se a mudança climática é capitalogênica, conclui-se que a crise climática é um produto do trabalho, alienado e violado por nossos senhores plutocratas. Isso é radicalmente diferente de ver a mudança climática como um conflito entre "humanos" e "natureza"; essa tem sido a visão de conquistadores, clérigos e capitalistas ao longo dos séculos. A crise climática reflete cinco séculos de luta entre a burguesia imperialista e o proletariado planetário. O argumento do Capitaloceno afirma essa realidade essencial contra o Antropoceno.
O mito do Antropoceno culpa todos os humanos pelo caos climático, como se fôssemos igualmente culpados, como se o planeta tivesse contraído um caso típico do vírus humano. O problema é muito pior do que culpar as vítimas da crise climática capitalogênica. O Antropoceno nada mais é do que a expressão mais recente do projeto civilizador nascido no século XVI. Seus esquemas do "Homem" contra a "Natureza", seus argumentos a favor da "lei natural", foram traduzidos em políticas de barateamento e subordinação de trabalhadores e camponeses. Hoje, o mito do Antropoceno encobre golpes como os "Green New Deals" e soluções tecnológicas como a geoengenharia, prometendo salvar o planeta sem afetar o capitalismo.
A tese do Capitaloceno, por outro lado, aponta para o verdadeiro culpado: um sistema instaurado em 1492 quando os impérios europeus roubaram terras comunais e colonizaram povos. Na Inglaterra, os camponeses foram expulsos de seus campos para trabalhar por salário, tornando-se o proletariado, embora ainda cultivassem modestos jardins rurais para sobreviver. Nas Américas, as plantações e as minas escravizaram milhões e arrasaram florestas, explorando o biotariado. O femitariado — mulheres e cuidadoras — manteve esses sistemas funcionando com trabalho não remunerado, desvalorizado sob o mesmo signo da Natureza. As origens da crise climática se encontram nas origens do capitalismo e na criação de um proletariado planetário.
A questão do proletariado planetário é o coração pulsante da luta de classes na rede da vida. Nenhuma política climática revolucionária pode evitá-la. A criação do proletariado planetário foi muito mais do que econômica; foi ecológica, política e ideológica. Sua exploração construiu o capitalismo e sua lógica destrutora do planeta. O ambientalismo dominante, mesmo em suas expressões de esquerda, obscurece essa verdade. Eles se obcecariam com os gases de efeito estufa — "Parem de extrair petróleo" — mas ficam em silêncio sobre a luta de classes que transformou o carvão e o petróleo em combustíveis fósseis. Os recursos, a poluição, os alimentos: não são apenas "coisas"; são produtos do trabalho na rede da vida.
No século XIX, a Revolução Industrial impulsionou a mudança climática capitalogênica a toda velocidade. As fábricas de carvão queimaram os restos fossilizados do biotariado, enquanto os trabalhadores assalariados labutavam arduamente e o femitariado gerava e mantinha mão de obra barata. Esse padrão persiste hoje: as minas de lítio no Salar de Uyuni da Bolívia destroem ecossistemas, os trabalhadores com baixos salários enfrentam uma precariedade implacável, e os cuidadores, muitas vezes mulheres, mantêm as famílias unidas sem compensação. A crise climática — que desencadeia inundações, incêndios florestais e ondas de calor — é capitalogênica, impulsionada por um sistema que trata as pessoas, os cuidados e a biosfera como "coisas baratas" para saquear. E com muita frequência, os ambientalistas se alinham a essa lógica. O problema não são as coisas ruins, mas o sistema de poder e lucro que transforma o rico mosaico da vida em objetos para serem estraçalhados, comprados e vendidos.
A narrativa do Antropoceno evade essa verdade. Pior ainda, é um apoio acadêmico às "soluções" climáticas da elite que fazem o proletariado planetário pagar a conta. Décadas de golpes verdes — compensações de carbono e captura de carbono, baterias e ecovigilância provenientes do cobalto congolês, políticas de "emissões líquidas zero" apoiadas pela deslocalização industrial — são suficientes para revelar a mentalidade da classe de Davos. O silêncio da esquerda diante desses golpes permitiu que a direita populista rotulasse as políticas climáticas da elite como uma farsa, e eles não estão totalmente errados. A superclasse planetária tem usado o ambientalismo como arma para impulsionar a austeridade, espremendo trabalhadores e camponeses enquanto protege sua riqueza. O Capitaloceno, por outro lado, expõe um sistema que prospera arrancando os humanos da terra, de suas ferramentas, de suas famílias e de seu bem-estar emocional e espiritual, justificando assim a exploração do proletariado, do femitariado e do biotariado. Mas essa separação é uma mentira. Os humanos e todas as redes da vida estão unidos, e sua relação pode ser reimaginada. Uma política climática democrática coloca os trabalhadores assalariados, os cuidadores e o planeta vivo em seu centro.
Minha proposta — o proletariado planetário — é uma proposta para um novo pensamento, que vai além da sabedoria convencional do marxismo e do ambientalismo. Ela parte da criatividade e interdependência de toda a vida — humana, animal, vegetal, solo — e nomeia a violência que o capitalismo inflige nessas redes.
O proletariado planetário — essa fusão de proletário, feminitariano e biotariano — ilumina um caminho a seguir. Não se trata apenas de trabalhadores que recebem um salário, cuidadores que mantêm as famílias unidas ou ecossistemas que geram vida. Os movimentos operário, feminista e ambientalista ainda não encontraram o que os une: o trabalho e a luta pela emancipação da jaula de ferro do capital. O trabalho é os três momentos: entrelaçados, explorados e se erguendo juntos.
Imaginemos a trabalhadora de armazém em Memphis, Tennessee, trabalhando para o império da Amazon. Ela é proletária, trabalhando arduamente em turnos de 12 horas por salários miseráveis, com seu corpo desgastado por tarefas repetitivas sob vigilância. Ela é feminitária, correndo para casa para cozinhar, limpar e cuidar de seus filhos, trabalho não remunerado que mantém sua família — e a força de trabalho do capitalismo — à tona. E ela é biotariana, com sua saúde corroída pelo ar poluído dos centros de logística próximos, da mesma forma que o rio Mississippi se afoga com os despejos industriais.
Essa luta de classes, entrelaçada com o trabalho assalariado, o trabalho de cuidados e a construção de vidas, expõe a mentira central do capitalismo: que humanos e natureza podem ser desmembrados, mercantilizados e descartados. Para construir este futuro, devemos desmantelar a lógica do barateamento do capitalismo: mão de obra barata, saúde barata, dinheiro barato, guerra barata, vida barata. A crise climática não é um fracasso humano, mas um sucesso capitalista. É hora de todos desafiarmos e alterarmos esse sucesso. Unindo o proletariado, o femitariado e o biotariado, podemos forjar um mundo onde a vida, e não o lucro, dita as regras; um mundo onde a rede da vida floresce.