05 Agosto 2025
"O que o cânone condena não é a fé, o sinal, a figura ou a virtude, mas a afirmação de que a fé, o sinal, a figura ou a virtude são autossuficientes", escreve Andrea Grillo, teólogo italiano, em artigo publicado por Come se non, 03-08-2025.
Em um artigo que publiquei recentemente, um leitor atento apontou que se poderia extrair dele uma "polarização" que ele não encontrou no Concílio de Trento. Creio que a observação é pertinente e requer o devido esclarecimento.
Duas passagens clássicas da tradição tridentina são o cânone sobre ex opere operato e o cânone sobre a presenza reale. Tanto a eficácia dos sacramentos em geral quanto a eficácia da Eucaristia são traduzidas na forma jurídica do cânone da condenação, por uma diferença, expressa em ambos os casos pelo advérbio "tantummodo" ou pelo adjetivo "sola", expressões não marginais que tendem a ser removidas, obliteradas e esquecidas na recepção do texto. Examinemos primeiro as duas proposições, em seu sentido literal, para compreender como elas levaram a desenvolvimentos que contradizem parcialmente o texto conciliar original e, em seguida, para compreender como a polarização moderna foi fomentada por essa recepção unilateral dos textos tridentinos.
Os dois cânones tridentinos que acabei de citar são facilmente citados incorretamente. Vamos lê-los em seu texto original:
Si quis dixerit, per ipsa novae Legis sacramenta ex opere operato non conferri gratiam, sed solam fidem divinae promissionis ad gratiam consequendam suficiente: anathema sit.
Si quis negatiter, in sanctissimae Eucharistiae sacramento contém veri, realiter et substancialiter, corpus et sanguinem una cum anima et divinitate Domini nostri Jesu Christi ac proinde totum Christum; sed dixerit, tantomodo esse in eo ut in signo vel figura, aut virtute: anathema sit.
Se os considerarmos no seu sentido literal, eles excomungam qualquer um que diga que:
a) o dom da graça ocorre somente pela fé na promessa divina e não ex opere operato
b) a presença verdadeira não é real e substancial, mas é apenas como um sinal, figura ou virtude
O que é excomungado é a posição daqueles que excluem o papel do ex opere operato e a dimensão substancial da Eucaristia.
Se lermos atentamente o texto do cânone, não nos justificamos em traçar uma polarização clara, como a que se desenvolveu na "recepção" dos dois cânones, a ponto de levar o catolicismo a se identificar com uma leitura dos sacramentos em geral inteiramente desequilibrada pelo ex opere operato (reduzindo a fé quase a um acidente) e uma leitura da Eucaristia inteiramente focada na dimensão substancial (sem atenção às formas rituais acidentais). O que o cânone condena não é a fé, o sinal, a figura ou a virtude, mas a afirmação de que a fé, o sinal, a figura ou a virtude são autossuficientes.
O que aconteceu na longa recepção dos séculos posteriores a meados do século XVI? Não o ditame tridentino, mas o tridentinismo dos séculos XVII, XVIII e XIX produziu um efeito polarizador objetivo. Uma leitura dos cânones tridentinos que ignora o "único" que caracteriza as definições (sola fide e tantummodo in signo...) esquece a lógica original do texto e introduz uma nova polarização: a entre "ser" e "sinal", a entre "substância" e "figura". Esse fenômeno é objetivamente ainda mais favorecido por novas interferências. Embora, a partir de meados do século XVI, as Congregações Romanas tenham começado a desempenhar um papel central de orientação e controle para toda a Igreja, sua organização era dominada pela jurisdição do Santo Ofício sobre o conteúdo dogmático, enquanto a Congregação dos Ritos se preocupava com a disciplina e a resposta humana ao dom da graça.
A separação entre santificação e culto nos sacramentos, reafirmada pelas autoridades romanas, é um fator muito sério no desenvolvimento de uma polarização entre as formas do sacramento e as formas da fé. Uma leitura fortemente apologética dos cânones tridentinos obliterou a sutileza com que a condenação dessas proposições foi formulada de forma muito restritiva. A fé não é irrelevante para os sacramentos em geral, nem o sinal, a figura e a virtude são irrelevantes para a realidade substancial da Eucaristia.
A redução do sacramento à "eficácia ex opere operato" e da Eucaristia à "transubstanciação" não são fruto de uma leitura fiel dos cânones tridentinos. Precisamente por serem leituras reducionistas dos cânones, que buscavam impedir precisamente formas de prática e teoria consideradas capazes de introduzir uma redução grave da tradição, elas, de fato, introduziram uma polarização mais pronunciada e dilacerante, tanto para a doutrina quanto para a experiência.
Somente com a Reforma Litúrgica, começamos a redescobrir a necessidade de correlacionar ex opere operato com ex opere operantis e de interpretar a substância real da Eucaristia como uma relação com o sinal, o símbolo, a figura, o rito e a virtude. Mas, após séculos de polarização, isso não é fácil de pensar nem de viver hoje. Apesar da reforma litúrgica, continuamos a experimentar presença e figura, eficácia e culto de forma cindida. As coisas são colocadas diante dos nossos olhos, mesmo que não as possamos ver. E elas afetam a maneira como batizamos, a maneira como crismamos, a maneira como presidimos ou participamos da Eucaristia, a maneira como ouvimos confissões, ungimos os enfermos e a maneira como ordenamos e celebramos matrimônios. Todo o âmbito do "sacramento" ainda é frequentemente coberto por um espesso manto de "preconceitos tridentinos", que erroneamente atribuímos ao Concílio de Trento, mas que muitas vezes decorrem de uma recepção unilateral de seus ditames.
Uma oposição estrutural entre conteúdo dogmático e forma ritual, entre santificação e culto, entre substância e acidentes, é fruto de uma recepção desequilibrada da tradição. A construção de um modelo diferente, iniciada com o ML e formalizada pela SC e pela Reforma Litúrgica, deve aspirar a uma nova síntese dogmática. Sua tarefa é superar falsas polarizações, isto é, despolarizar a experiência e a doutrina da Igreja sobre os sacramentos e a Eucaristia.
Uma leitura atenta dos marcos do passado nos ajuda a compreender como muitas das polarizações não se encontram nos textos originais (Agostinho, Tomás de Aquino ou o Concílio de Trento), mas nas lentes tardo-modernas através das quais os lemos. Por essa razão, hoje devemos desenvolver lentes mais nítidas e apropriadas, capazes de sintetizar onde antes só se viam antíteses.