01 Julho 2025
"Só em Milão, na última semana, duas crianças judias foram espancadas e cuspidas na rua e o aparecimento inquietante de cartazes com os dizeres 'Israelenses não são bem-vindos' que se espalharam pela cidade."
O artigo é de Davide Assael em Domani, judeu italiano, fundador e presidente da associação lech lechà, professor de filosofia e escritor de 29-06-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Não podemos ignorar a corajosa investigação conduzida pelo jornal Haaretz, que denuncia a morte indiscriminada de civis palestinos em filas diárias por pão desde o início das atividades da Fundação Humanitária de Gaza, com a qual Israel, em colaboração com o lobby judaico-evangelista que a sustenta nos EUA, esperava trazer ordem ao caos da distribuição de ajudas à população extenuada após a incapacidade, para alguns causada por infiltrações de todos os tipos, das Nações Unidas de manter as ajudas a salvo dos saqueios do Hamas.
Dir-se-á que o Haaretz utiliza fontes anônimas. E, como não, pode-se pensar. Mais moderadamente, outros dirão que a investigação denuncia casos específicos, focando em particular na atividade da Divisão 252, sob as ordens do Brigadeiro-General Yehuda Wach, 1979, nascido e criado em Kyriat Arba (Hebron), um dos assentamentos mais antigos, problemáticos e por tudo isso simbólicos de toda a Cisjordânia.
Ele se formou na yeshivá sionista-religiosa Bnei David em Eli, que também é um mechinà (campo) de treinamento pré-militar para jovens religiosos. Em suma, uma expressão paradigmática daquela estratégia de décadas de penetração no exército israelense conduzida por grupos extremistas lotados na Cisjordânia.
A investigação, que fique claro é digna e obrigatória para um jornalismo que se quer definir tal (pelo menos, vamos dar crédito à sociedade civil israelense por ainda ter alguma consciência), na realidade acende os holofotes sobre o que é óbvio para qualquer um que não tenha os olhos tapados de preconceitos: o caos reina em Gaza, com gangues armadas, muitas vezes financiadas pelo próprio Israel, que querem tomar um pedaço de território que o exército nunca controlou porque Bibi teria que enviar centenas de milhares de homens para lá, que não pode se dar ao luxo de enviar porque traria para casa muitos caixões, que, de qualquer forma, estão chegando e chegarão, como todos os conflitos urbanos prolongados ensinam.
Além disso, há o Hamas, que rouba, atira e ameaça qualquer um para sobreviver, para mostrar que ainda está no comando. É uma Líbia, uma Somália, um caos sem fim que piora a cada dia. Um magma sustentado pelas duas lideranças no poder, que têm igual necessidade da guerra infinita para sobreviver politicamente, e não só. De um lado, a necessidade de Netanyahu de empurrar um pouco mais a situação para evitar ter que acertar as contas com as suas responsabilidades históricas, até a esperança de vencer a sua guerra travada há anos contra todos os poderes do Estado e consolidar definitivamente seu poder por meio da guinada iliberal que o protegeria de processos, investigações e o impediria de cumprir seu destino: ser o bode expiatório de todo mal, na realidade bastante profundo, que a sociedade israelense desenvolveu nas últimas três décadas, desde aquele fatídico 1994 em que Rabin foi assassinado.
É claro que Israel o processaria, tanto porque ele merece e seus rivais políticos o odeiam como o diabo, mas também porque pouparia o país daquelas investigações internacionais que se assemelham a um carimbo de infâmia. Que seja bem-vindo o bode expiatório (perdoe-me, René Girard), se servir para um novo começo para um país que teria a possibilidade histórica de se legitimar na área em que vive. Não choraremos por ele.
Do outro lado, questionamo-nos por que o Hamas não entrega os reféns e se rende, como exigem em alto e bom som todas as chancelarias árabes e a ANP. Talvez pensa que pode vencer a guerra? Pergunta retórica, a resposta é conhecida. Um magma terrível do qual se desprendem as lógicas de exportação do conflito, no qual desempenha um papel de destaque o imaginário antijudaico sobre o qual se apoia desde sempre a propaganda islamista.
Só em Milão, na última semana, duas crianças judias foram espancadas e cuspidas na rua e o aparecimento inquietante de cartazes com os dizeres "Israelenses não são bem-vindos" que se espalharam pela cidade. Ações de grupos organizados, que desenham, imprimem centenas de cópias e as espalham por toda a cidade numa só noite. Para os profissionais do "A culpa é de Netanyahu", limitamo-nos a lembrar que não há vestígios de cartazes semelhantes contra os turcos por causa de Erdogan, ou contra os chineses por causa dos uigures (e muito mais). Ali não existe a monstrificação de um país inteiro e certamente não temos os níveis de mobilização social que vemos em Israel. Em vez disso, deveriam ser apoiadas as facções de ambos os lados que se rebelam contra suas próprias lideranças, mas os preconceitos são por demais arraigados. Caos, em cima caos, em cima caos.