17 Junho 2025
"A referência à pluralidade de razões que estão na base da escolha feita deixa em aberto a questão de sua identificação precisa. Muito provavelmente, a relação entre Leão XIII e a congregação agostiniana, à qual Prevost pertence, desempenhou um papel importante. Ligada desde a juventude aos locais de culto por ela administrados, o Papa Pecci a revitalizou após as décadas de decadência pós-revolucionária, com especial atenção aos desenvolvimentos na província estadunidense", escreve Daniele Menozzi, historiador do cristianismo e professor emérito da Normale di Pisa, em artigo publicado por Il Regno, 15-06-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Em 10 de maio passado, o Papa Leão XIV quis esclarecer as razões da escolha de seu nome em um discurso proferido na Sala do Sínodo e dirigido aos cardeais que o haviam eleito dois dias antes.
Talvez um dia documentos pessoais revelem suas motivações íntimas. No plano público, a explicação foi apresentada como consequência de uma direção precisa no governo da Igreja.
Prevost inicialmente lembrou que pretende seguir as linhas traçadas pelo Concílio Vaticano II. Em seguida, afirmou que adere à interpretação que seu predecessor deu "magistralmente" na exortação apostólica Evangelii gaudium. Em seguida, declarou: "Precisamente porque me senti chamado a continuar nessa linha, pensei em assumir o nome de Leão XIV". Por fim, acrescentou que, embora houvesse muitas razões, uma acima de todas o levou a essa decisão: a memória de Leão XIII. Assim como o Papa da Rerum Novarum (1891) enfrentou "a questão social no contexto da primeira grande revolução industrial", hoje a Igreja é chamada a haurir de "seu patrimônio de doutrina social, para responder a uma outra revolução industrial e aos desenvolvimentos da inteligência artificial".
A referência à pluralidade de razões que estão na base da escolha feita deixa em aberto a questão de sua identificação precisa. Muito provavelmente, a relação entre Leão XIII e a congregação agostiniana, à qual Prevost pertence, desempenhou um papel importante. Ligada desde a juventude aos locais de culto por ela administrados, o Papa Pecci a revitalizou após as décadas de decadência pós-revolucionária, com especial atenção aos desenvolvimentos na província estadunidense.
Mas não podemos aqui aprofundar os laços sólidos e disseminados entre Leão XIII e os agostinianos, nem investigar outros nexos, como a encíclica de 1899 sobre o "americanismo", que presumivelmente conectam o novo pontífice à figura de seu predecessor oitocentista.
Em vez disso, vale a pena deter-se no testemunho direto sobre a autoimposição do nome. De fato, põe fim a muitas especulações que, após a eleição, foram feitas na tentativa de extrair indícios sobre suas orientações programáticas.
Por exemplo, cai por terra a sugestão sugestiva de identificar o motivo da escolha no desejo de se referir ao Frei Leão, companheiro de Francisco de Assis que, após a morte do santo, se tornou o mais rígido intérprete de seu legado espiritual, a ponto de entrar em conflito com o sucessor de Assis à frente da ordem.
A intenção de sublinhar a continuidade com o Papa Francisco, que Prevost não hesita em recordar – ainda que de forma seletiva – não parece ter desempenhado qualquer papel.
Da mesma forma, pode-se descartar a hipótese – avançada com autoridade, mas na verdade um tanto arriscada – de que o papa quisesse se referir a predecessores prestigiosos como Leão I e Leão III. Observadores sensíveis aos cenários políticos atuais haviam vinculado a escolha do nome à intenção do pontífice estadunidense de retomar, diante dos impulsos imperiais desordenados de várias figuras políticas do mundo atual, à atitude de quem bloqueou o avanço de Átila, ou de quem coroou Carlos Magno.
Como teologia política, Leão XIV esclareceu explicitamente que o impulso fundamental para sua decisão veio da memória do exemplo personificado pelo Papa Pecci na definição da relação entre a Igreja e a Revolução Industrial. E afirmou que essa perspectiva se insere numa linha de continuidade, diante dos desafios postos pelas revoluções sociais, econômicas e informáticas em curso no planeta, com a atualização eclesial iniciada pelo Concílio Vaticano II.
A indicação parece tudo menos banal. Enquanto aguardamos o desenvolvimento do ensinamento papal para esclarecer suas implicações e aprofundar o conteúdo, podemos, entretanto, fazer algumas reflexões sobre a resolução de se reportar ao modelo da encíclica de Leão XIII como paradigma exemplar para o esclarecimento da posição da Igreja em relação à revolução digital atual.
O tema, de fato, não está isento de aspectos problemáticos.
Uma primeira questão diz respeito à própria representação histórica proposta pelo Papa. De fato, Pecci não interveio no contexto da primeira revolução industrial, a do carvão e do ferro, que da Inglaterra, na segunda metade do século XVIII, passou para a Europa continental; mas no período da segunda, a do petróleo, do aço, da química e da projeção de imagens em movimento, que afetou, a partir das últimas décadas do século XIX, alguns países do Velho Continente e os Estados Unidos.
Além disso, o tema da encíclica leonina não era propriamente a questão social (a estrutura geral da vida coletiva), mas a questão operária (a relação entre empresários e trabalhadores), ainda que tenha lançado as bases do que, ao longo do século XX, expandindo-se para os problemas gerais da sociedade civil, viria a ser chamado, a partir da encíclica Quadragesimo anno de Pio XI, de "doutrina social da Igreja".
A reconstrução histórica aproximada proposta pelo Papa pode, no entanto, ser considerada marginal. Embora confirme a pertinência do convite de Francisco a dar maior atenção à cultura histórica na trajetória da formação eclesiástica, não compromete o cerne da argumentação papal.
A escolha do nome é ditada pelo desejo de dar continuidade à atualização da Igreja, iniciada com o Vaticano II e continuada por seu predecessor, segundo o modelo de relação entre Igreja e sociedade proposto pela Rerum novarum de Leão XIII.
Mas, apesar dos ditirambos entusiasmados imediatamente suscitados pela referência à encíclica de 1891 nos círculos que lutam para reconhecer as raízes intransigentes do catolicismo social, essa proposta levanta um problema teológico-político. Não há dúvida de que só o curso do pontificado poderá dizer se e como será abordado, mas é importante já estar plenamente consciente disso.
Pecci, de fato, tratou a questão operária à luz daquele neotomismo que, desde o início de seu governo, apresentou como ponto de referência fundamental e inalienável para toda elaboração cultural dentro da Igreja (a ponto de afastar das universidades pontifícias os professores que não se adequavam). Dessa releitura de São Tomás, ele derivou o conceito de que a lei natural – colocada por Deus para governar a criação e corretamente interpretada apenas pela autoridade eclesiástica – estabelece a ordem da convivência civil.
Ele deduziu a “terceira via” católica para resolver o conflito que dividia empresários e trabalhadores. O projeto socialista parece inadequado porque nega o direito natural inalienável à propriedade privada. As propostas do liberalismo – que confia tudo ao mercado – minam o direito natural a um salário adequado para garantir a sobrevivência do trabalhador e de sua família.
Em vez disso, a Igreja pode estabelecer aqueles direitos naturais que garantem – se o Estado se limitar a garantir seu exercício, como é chamado a fazer por natureza – a feliz resolução da questão operária.
Os sucessivos pontífices construíram a doutrina social da Igreja respondendo aos novos problemas da vida coletiva com a integração aos direitos socioeconômicos, primeiro os direitos civis (Pio XI) e depois os direitos políticos (Pio XII). Mas, de qualquer forma, deduziram-nos da lei natural, da qual a Igreja se proclamava guardiã e intérprete.
A trajetória sofreu uma reviravolta com o Vaticano II. A abertura ao diálogo com o mundo moderno – tornado inevitável pelo afastamento dos fiéis – levou a Igreja a reconhecer direitos naturais que, tendo amadurecido ao longo da história humana, teve o cuidado de não atribuir à lei natural. O direito à liberdade religiosa é seu testemunho mais evidente.
Isso abriu o problema da autoridade exclusiva da Igreja na definição da tabela de direitos naturais em que se baseia a comunidade. Isso se expressou na natureza conflituosa que caracterizou as modalidades da atualização conciliar promovidas pelos pontificados de João Paulo II e Bento XVI.
Francisco então ofereceu uma solução. A verdade que a Igreja propõe é hierarquicamente ordenada. Em seu ápice está a mensagem evangélica, cujo núcleo é a misericórdia. Portanto, a lei natural, que ela ainda assim continua a ensinar como base para um correto arranjo da vida coletiva, deve ser aplicada à luz desse critério superior. Leão XIV não esclareceu – mas, no início de seu pontificado, não era uma necessidade premente – se quer seguir o exemplo de Bergoglio na atualização da relação entre Igreja e sociedade. A explicação dada para a escolha do nome, pela referência à Rerum novarum, indica simplesmente que, como Pecci, ele não pretende manter a Igreja alheia aos problemas que emergem da história, mas sim abordá-los, oferecendo propostas para sua solução. A famosa encíclica com a qual Leão XIII indicava o caminho para resolver a questão operária baseava-se naquela teologia política neoescolástica que atribuía à Igreja, como única depositária autêntica da lei natural, o poder de indicar sempre, em todos os lugares e para todos as regras para a organização da comunidade.
O tempo dirá se a referência de Prevost a Pecci implicará também a absorção de seus pressupostos culturais.
Entrementes, pode-se esperar que um papa cuja formação cultural remete a Agostinho não siga o caminho cujos limites Paulo VI já havia começado a expor na carta apostólica Octogesima adveniens, emitida em 1971 pelo 80º aniversário da Rerum novarum.