26 Abril 2025
“É justo fazer a inquietante pergunta: o que acontece quando recordes históricos após recordes continuam a se acumular, e com que objetivo? E o que pode ser feito para interromper o flagelo implacável dos extremos climáticos prejudiciais? Talvez os líderes mundiais precisem enfrentar essa realidade convocando os cientistas do clima. Mas será que Trump convocará os cientistas do clima para pedir conselhos sobre como os Estados Unidos podem ajudar a impedir que o maior e mais violento trem de carga da história da humanidade desça a montanha a toda velocidade?” A reflexão é de Robert Hunziker, em artigo publicado por CounterPunch.org e reproduzido por Voces del Mundo 18-04-2025. A tradução é do Cepat.
Robert Hunziker, que tem mestrado em História Econômica pela Universidade DePaul, é escritor freelancer e jornalista ambiental.
O mundo entrou numa nova era climática que ameaça o tecido da civilização porque é o contrário do sistema climático no qual a sociedade foi construída. A biosfera está começando a se desintegrar à medida que o sistema climático normal do mundo dá sinais claros de colapso, enquanto o calor planetário deixa os cientistas surpresos. O comportamento normal do sistema climático ao longo de décadas desapareceu.
De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (que Trump não pode fechar, como fez com a NOAA), o ano passado foi o ano mais quente dos 175 anos de registro observacional, com recorde de calor no oceano e aumento recorde do nível do mar. 90% do aquecimento global está escondido da sociedade, absorvido pelos oceanos. Surpreendentemente, os oceanos do mundo quebraram recordes de temperatura todos os dias durante 12 meses consecutivos (BBC). Agora, a quantidade se tornou tão excessiva que os cientistas estão preocupados com uma “vingança”.
Tudo está na corda bamba. Grandes ecossistemas como a Antártida e a floresta amazônica estão regurgitando anos de abusos; a Antártida Ocidental foi recentemente colocada em estado de Alerta Vermelho por cientistas polares assustados e grandes áreas da floresta amazônica estão emitindo CO2, competindo com carros, trens e aviões pela primeira vez na história da humanidade, enquanto as precipitações na Summit Station (a 3.200 metros de altitude) ofereceu uma estranha e perturbadora reviravolta para a Groenlândia. Esta é a decomposição do clima a cores.
Um artigo recente publicado na Science/Alert de 9 de abril de 2025 está repleto de exemplos alertando sobre o colapso climático: ‘Exceptional’ – Ongoing Global Heat Defies Climate Predictions (Excepcional – Calor global contínuo desafia as previsões climáticas).
Coisas estranhas estão acontecendo com o sistema climático que nunca aconteceram antes na história da humanidade. Por exemplo, de acordo com o Serviço de Mudanças Climáticas do Copernicus, desde julho de 2023, o mundo tem mantido uma sequência quase ininterrupta de temperaturas recordes todos os meses, com março de 2025 sendo o março mais quente já registrado no continente europeu. E todos os meses dos últimos 21 ultrapassaram o temido limite de 1,5°C, a saber: “março ficou 1,6°C acima dos níveis pré-industriais, prolongando uma anomalia tão incomum que os cientistas ainda estão tentando explicá-la completamente. O fato de ainda estarmos 1,6°C acima dos níveis pré-industriais é realmente notável”, afirmou Friederike Otto, do Instituto Grantham para as Mudanças Climáticas e o Meio Ambiente do Imperial College de Londres (Science/Alert).
Não muito tempo atrás, os cientistas do clima acreditavam que ultrapassar o limite de temperatura pré-industrial de 1,5°C, classificado como “zona de perigo” pelo IPCC, levaria décadas. Adivinham? Ainda é muito cedo para isso já estar acontecendo!
O comportamento climático anômalo/anormal agora é o novo normal. Eventos climáticos extraordinários ocorreram recentemente em todo o mundo com apenas 30 dias de diferença, eventos descritos como os piores da história, ou como um recorde histórico, ou como algo sem precedentes, ou ainda como algo que acontece uma vez a cada 100 anos, etc. Hoje, o planeta é como o roteiro de um filme intitulado Desastre Climático, com desastres climáticos ocorrendo simultaneamente, independentemente da sua localização ou estação do ano. É um roteiro maluco, com pessoas fugindo, procurando um lugar seguro.
Na vida real, as evidências desse sistema climático maluco estão em toda parte; por exemplo, em março de 2025, diferentes partes do continente europeu experimentaram “o março mais seco já registrado”, enquanto outras partes do continente experimentaram “o março mais chuvoso já registrado”. Ao mesmo tempo em que os europeus não sabiam qual lado estava para cima, as mudanças climáticas estavam afetando a Índia, que sofria com um calor escaldante sem precedentes, enquanto a Austrália estava sendo inundada por enchentes sem precedentes, e a Ásia e a América do Sul estavam atingindo novos recordes históricos de calor devastador. Este estranho sistema climático global ficou descontrolado de forma sincronizada. Por que isso está acontecendo? A queima de combustíveis fósseis gerada pelos humanos está causando muitos desastres climáticos simultâneos para continuar ignorando a necessidade de reduzir drasticamente essa queima de combustíveis fósseis ou sofrer com um planeta explosivo. Nada mais é normal. Superem isso!
As manchetes a seguir são evidências de eventos climáticos simultâneos, ocorridos em um intervalo de 30 dias, que batem recordes mundo afora (Nota: não está incluída a Antártida, que está clara e assustadoramente começando a entrar no “modo emergência”, assim como a mundialmente famosa floresta tropical amazônica e o permafrost do Ártico e da Groenlândia):
Bigger than Texas: The True Size of Australian’s Devasting Floods (Maior que o Texas: o verdadeiro tamanho das devastadoras enchentes na Austrália), The Guardian, 04-04-2025. “A extensão das águas que inundaram Queensland nas últimas duas semanas é tão grande que cobriu uma área mais de quatro vezes maior que o Reino Unido. A enchente é maior que a França e a Alemanha juntas, e até mesmo o Texas”.
Dry Topsoil Across Germany Could Impact Crop Yields Following March Dry Spell (Solo seco na Alemanha pode afetar a produtividade das colheitas após a estiagem de março), Clean Energy Wire, 11-04-2025.
Floods Batter Italy after Florence Sees a Month’s Rainfall in One Day (Inundações atingem a Itália após Florença registrar chuva equivalente a um mês em um único dia), The Watchers, 16-03-2025. “Alertas vermelhos foram declarados na Itália, incluindo Florença e Pisa, devido a inundações extremas que provocaram vários deslizamentos de terra e danos generalizados”.
Heavy Rains Hit Spain for Third Consecutive Week (Fortes chuvas atingem a Espanha pela terceira semana consecutiva), Reuters, 18-03-2025. “Os espanhóis seguem apreensivos depois que chuvas torrenciais há quatro meses na comunidade valenciana oriental desencadearam o desastre natural mais mortal do país em décadas”.
Record-breaking March Heat Reminds Us That Adaptation Cannot Wait (Calor recorde em março nos lembra que a adaptação não pode esperar), The Indian Express, 20-03-2025.
Record Heatwaves Hits South America (Ondas de calor recordes atingem a América do Sul: Apelo urgente por ação climática), Green.org, 05-03-2025. “Este ano, a América do Sul registrou as temperaturas mais altas já registradas, com algumas regiões experimentando níveis de calor sem precedentes. Países como Argentina, Brasil e Uruguai registram temperaturas acima de 40°C. Isso não é apenas desconfortável, mas também representa sérios riscos à saúde e perturba a vida cotidiana”.
Extraordinary March Heatwave in Central Asia up to 10° C Hotter in Warming Climate (Extraordinária onda de calor na Ásia Central chega a ser 10°C mais quente em um clima cada vez mais quente), World Weather Attribution, 04-04-2025. “Em março de 2025, a Ásia Central sofreu uma onda de calor excepcionalmente intensa, com temperaturas atingindo níveis recordes em toda a região”.
Nos EUA, os tornados de março foram mais que o dobro da média mensal, e três surtos distintos produziram mais de 200 tornados (National Centers for Environmental Information, março de 2025). Mais especificamente, o surto de tornados de 13 a 16 de março de 2025 foi o maior já registrado para o mês de março. Enquanto isso, os incêndios florestais devastam o sul dos Apalaches, agravados pelo combustível adicional disponível a partir de árvores caídas após o furacão Helene (cujo custo é estimado em até US$ 250 bilhões). É um fato: as águas oceânicas mais quentes, resultado direto das mudanças climáticas, alimentam furacões mais fortes, com ventos mais fortes, chuvas mais intensas e marés de tempestades mais destrutivas. Hum.
Como afirma Bill McGuire, um cientista climático da University College London, na Science/Alert, os extremos contrastantes “mostram claramente como um clima desestabilizado significa mais e maiores extremos meteorológicos… À medida que a crise climática avança, somente mais recordes podem ser quebrados” (Science/Alert).
Portanto, é justo fazer a inquietante pergunta: o que acontece quando recordes históricos após recordes continuam a se acumular, e com que objetivo? E o que pode ser feito para interromper o flagelo implacável dos extremos climáticos prejudiciais? Talvez os líderes mundiais precisem enfrentar essa realidade convocando os cientistas do clima. Mas será que Trump convocará os cientistas do clima para pedir conselhos sobre como os Estados Unidos podem ajudar a impedir que o maior e mais violento trem de carga da história da humanidade desça a montanha a toda velocidade?
E o que vai impedir essa loucura?