02 Julho 2021
Empresas de petróleo, carvão e gás poderiam ser responsabilizadas legalmente pelos danos causados pela mudança climática se as ações buscarem se basear mais na melhor evidência científica disponível, de acordo com um novo estudo da Universidade de Oxford publicado hoje (28/06) na revista Nature Climate Change.
A reportagem é de Cínthia Leone, publicada por Instituto ClimaInfo e reproduzida por EcoDebate, 28-06-2021.
Os pesquisadores analisaram 73 casos contra emissores de carbono em 14 jurisdições e descobriram que “os demandantes forneceram provas inadequadas sobre a causalidade”. Segundo a pesquisa, “a melhoria das provas científicas tem um papel claro a desempenhar se os tribunais tiverem que aceitar argumentos causais em ações judiciais futuras”.
A maioria dos casos não quantificou até que ponto a mudança climática foi responsável pelos eventos relacionados ao clima que causaram os impactos que afetaram os demandantes, o que, segundo o estudo, é uma importante linha de evidência, já que nem todos os eventos ocorrem devido à mudança climática. Também não foram fornecidas provas quantitativas ligando as emissões dos réus com os ferimentos dos demandantes. Cerca de 73% dos casos não se referiam a estudos revisados por pares, e quase 26% alegaram que os eventos climáticos ocorreram devido à mudança climática, sem fornecer qualquer prova.
Houve mais de 1.500 ações judiciais relacionadas ao clima em todo o mundo, com o índice de reclamações aumentando. Casos de alto nível como o Native Village of Kivalina v. ExxonMobil Corp, que foi arquivado no Tribunal de Apelação dos EUA, mostraram como a forte evidência do nexo de causalidade é fundamental para o sucesso do litígio. De acordo com os pesquisadores, até o momento os autores das ações não utilizaram a ciência da atribuição mais avançada disponível.
A ciência da atribuição permite aos cientistas calcular como as emissões contribuíram para eventos específicos como tempestades, secas, ondas de calor ou enchentes. Por exemplo, pesquisas recentes descobriram que a elevação do nível do mar causada pelo homem aumentou os danos sofridos quando o Furacão Sandy atingiu a costa leste dos EUA, em 2012, em US$ 8,1 bilhões. Outro estudo concluiu que a mudança climática foi responsável por US$ 67 bilhões dos danos causados pelo Furacão Harvey, que atingiu o Texas em 2017.
Combinando a análise científica com dados sobre emissões, os autores das ações podem agora potencialmente quantificar a responsabilidade de empresas individuais de combustíveis fósseis por suas perdas. Por exemplo, pesquisas anteriores calcularam a proporção do aumento da temperatura e do nível do mar que pode ser atribuída às emissões de empresas individuais, incluindo ExxonMobil, Chevron, Shell e Saudi Aramco.
“Nas últimas semanas, processos judiciais bem-sucedidos na Holanda, Alemanha e em outros lugares têm visto os tribunais exigirem que os países e empresas fortaleçam drasticamente suas metas climáticas. O poder do litígio climático é cada vez mais claro”, afirma Rupert Stuart-Smith, autor principal do estudo.
“No entanto, muitos processos relacionados ao clima têm sido mal sucedidos”, continua Stuart-Smith. “Se o litígio em busca de compensação por perdas sofridas devido à mudança climática é para ter a melhor chance de sucesso, os advogados devem fazer um uso mais eficaz das evidências científicas. A ciência climática pode responder às questões levantadas pelos tribunais em casos passados e superar os obstáculos para o sucesso desses processos”.
Friederike Otto, diretor associado do Instituto de Mudanças Ambientais de Oxford, diz que para mudar o destino da grande maioria dos litígios climáticos, tanto os tribunais quanto os demandantes têm que perceber que “a ciência passou da verificação de que a mudança climática é potencialmente perigosa para o fornecimento de provas causais ligando as emissões a danos concretos”.
O professor Thom Wetzer, diretor fundador do Programa de Direito Sustentável de Oxford, defende que fazer as empresas responsáveis por sua contribuição à mudança climática é fundamental para proteger aqueles mais vulneráveis aos impactos da mudança climática.
“Os litígios climáticos destinados a gerar essa responsabilidade estão em ascensão, mas os resultados têm sido mistos”, afirma Wetzer, que completa: “nossa pesquisa dá motivos para o otimismo: com o uso rigoroso de provas científicas, os litigantes têm espaço para serem mais eficazes do que são atualmente. Cabe agora aos litigantes traduzir a ciência de ponta em argumentos jurídicos de alto impacto”.
Stuart-Smith, R.F., Otto, F.E.L., Saad, A.I. et al. Filling the evidentiary gap in climate litigation. Nat. Clim. Chang. (2021). Acesse clicando aqui.
Filling the evidentiary gap in climate litigation. Acesse clicando aqui.
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Estudo sugere o uso de evidência científica para responsabilizar grandes poluidores nos tribunais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU