09 Abril 2025
"Por isso, está na hora dos defensores da educação e, principalmente, dos formadores de opinião nas nossas Universidades saírem na defesa da verdadeira liberdade: aquela que não se impõe pela força das armas, nem do capital e tampouco pela doutrinação religiosa. Mas, pela consciência e pensamentos livres e autônomos", escreve Robson Sávio Reis Souza.
Robson Sávio Reis Souza é doutor em Ciências Sociais, com pós-doutorado em Direitos Humanos, é professor do Departamento de Ciências da Religião da PUC Minas; presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos de Minas e assessor do Centro Nacional de Fé e Política Dom Hélder Câmara.
As instituições autônomas (como as universidades) são rivais de autocracias, teocracias e todos os modelos autoritários de poder político porque formam cidadãos críticos e produzem conhecimento livre, que são uma ameaça a regimes que dependem da obediência cega e da manipulação da verdade. Por isso, governos autoritários buscam subjugá-las ao controle político.
Ataques à educação superior são um sinal claro da erosão da democracia. Governos autoritários frequentemente atacam as universidades e o ambiente acadêmico por várias razões, todas relacionadas à manutenção do poder e ao controle sobre a sociedade. Afinal, as universidades são espaços de debate, questionamento e produção de conhecimento independente e governos autoritários buscam suprir ideias dissidentes e impor uma narrativa única, algo incompatível com a liberdade acadêmica e com o intento dos projetos educacionais emancipatórios.
Ademais, o autoritarismo depende da doutrinação e da limitação do acesso a informações críticas e universidades, ao promoverem o pensamento científico e a análise crítica, ameaçam esse controle.
Também nas universidades, historicamente, parte dos estudantes e professores lideram e se associam a protestos reivindicatórios e movimentos de resistência. Governos autoritários não aceitam mobilizações contra seu regime.
A história nos ensina que os regimes autoritários frequentemente propagam pseudociências, negacionismo e ideologias sem base factual. A ciência independente, produzida nas universidades, desafia narrativas oficiais manipuladas e distorcidas.
Exemplos históricos de ataque às universidades aconteceram durante a Ditadura Militar no Brasil (1964-1985), com a perseguição a professores, censura à livre docência e intervenção nessas instituições de ensino. O Nazismo (na Alemanha) se caracterizou pela perseguição de opositores das universidades e queima de livros.
E durante o governo Bolsonaro presenciamos uma série de ataques às universidades e à ciência.
Desde que Donald Trump retomou a presidência dos Estados Unidos, em 2025, seu governo tem intensificado medidas que ameaçam a autonomia universitária e a liberdade acadêmica naquele país. Embora algumas políticas ainda estejam em implementação, já há ações concretas que mostram o viés autoritário do governo na perseguição às universidades.
Em relação ao controle político e o financiamento de Universidades Federais, Trump condicionou fundos federais (como bolsas de pesquisa e auxílios a estudantes) à adesão a um "código de patriotismo", que inclui proibir discussões sobre teoria crítica da raça, estudos de gênero e justiça social. O Departamento de Educação está pressionando universidades estaduais a nomear administradores conservadores, mesmo sem experiência acadêmica.
Uma Ordem Executiva (2025) classificou cursos sobre racismo estrutural, colonialismo e LGBTQIA+ como "doutrinação antiamericana" e universidades públicas foram obrigadas a dissolver centros de estudos afro-americanos ou perder financiamento.
Após a Suprema Corte banir cotas raciais em 2023, o governo Trump criou uma força-tarefa para processar universidades que usam critérios "racialmente tendenciosos" em admissões ou contratações.
Trump cortou verbas da NSF (National Science Foundation) para pesquisas sobre aquecimento global, alegando "viés alarmista". Universidades como o MIT e Stanford tiveram projetos cancelados e os NIH (Institutos Nacionais de Saúde) agora exigem aprovação política para estudos sobre vacinas, transgêneros e aborto.
Num ataque frontal à liberdade de cátedra, no país que se vangloria de ser a terra da liberdade, professores que discutem socialismo, direitos trans ou crítica ao governo estão sendo denunciados. Há uma espécie de "Disque-Patriotismo", ou seja, o incentivo para que os cidadãos denunciem uma suposta "doutrinação". Uma verdadeira “caça às bruxas”.
Alguns estados governados por republicanos (como Flórida e Texas) passaram a exigir que professores universitários assinem um termo contra "comunismo e globalismo" para manter emprego.
O governo Trump está usando de cortes de verba, censura ideológica, controle político e perseguição a docentes para transformar universidades em espaços alinhados ao nacionalismo autoritário. Essas medidas lembram táticas usadas por regimes como Hungria de Viktor Orbán ou Rússia de Vladmir Putin, onde a educação superior é sitiada pelo Estado.
E, por mais de uma vez, Trump ameaçou fechar o Departamento de Educação. O projeto político dos reacionários que governam com Trump é implantar largamente o “homeschooling”, para facilitar a doutrinação ideológica das crianças por seus pais e pelas instituições religiosas. Ao contrário da doutrinação, as escolas e as universidades trabalham com educação. E educação rima com liberdade e autonomia (das mentes e dos corações)
Observando o que acontece nos Estados Unidos podemos prever o que ocorreria no Brasil se a extrema-direita retornar ao poder.
Por isso, está na hora dos defensores da educação e, principalmente, dos formadores de opinião nas nossas Universidades saírem na defesa da verdadeira liberdade: aquela que não se impõe pela força das armas, nem do capital e tampouco pela doutrinação religiosa. Mas, pela consciência e pensamentos livres e autônomos.