20 Fevereiro 2025
Cerca de 26.000 crianças serão afetadas pela ordem, incluindo aquelas que foram "vítimas de tráfico" e que, sem um advogado, correm um risco maior de serem deportadas.
A informação é de Antònia Crespí Ferrer, publicada por El Salto, 20-02-2025.
Crianças migrantes, algumas com apenas dois anos de idade, ficaram sem advogado diante dos juízes de imigração depois que a administração de Donald Trump suspendeu a assistência legal para os menores migrantes não acompanhados. Entre os 26.000 menores não acompanhados que serão afetados por essa ordem, estão crianças que foram "vítimas de tráfico", conforme denunciado nesta quarta-feira por organizações que prestam assistência legal a esse grupo. Todos eles correm um risco maior de ser deportados se ficarem sem advogado.
Na noite de terça-feira, o Departamento do Interior ordenou que os advogados financiados pelo governo "interrompessem seu trabalho imediatamente". Tanto o Florence Immigrant & Refugee Rights Project, do Arizona, quanto o Immigrant Defenders Law Center (ImmDef) - o principal fornecedor de serviços legais para menores não acompanhados - confirmaram que receberam o documento. O governo Trump cortou abruptamente o Programa de Menores Não Acompanhados, que é financiado federalmente e cujos fundos são alocados pelo Congresso. A principal função do programa é oferecer assistência legal aos menores não acompanhados que foram detidos e entraram no sistema de imigração, onde muitos correm o risco de ser deportados.
"O que se supõe que nossa cliente, uma menina de dois anos sem sua advogada, fará? Quem falará por ela no tribunal? Quem explicará a ela e a todos os nossos outros clientes no sistema de acolhimento, que literalmente não têm nenhum adulto nos Estados Unidos que cuide deles, que agora terão que enfrentar sozinhos um sistema de imigração extremamente complexo?", denuncia Daniela Hernández, uma advogada de imigração que representa cerca de 60 menores em Pasadena, Califórnia, que foram afetados pela ordem de suspensão.
Hernández expôs sua situação durante uma coletiva de imprensa organizada nesta quarta-feira pelas principais ONGs que trabalham com menores migrantes e que foram impactadas pela ordem: ImmDef, Amica Center for Immigrants Rights, Immigrant Defenders Law Center, Florence Project e Michigan Immigrant Rights Center. "Este é o ataque mais significativo contra as crianças imigrantes desde a separação familiar", afirmou Michael Luken, do Amica Center, referindo-se ao momento em que Trump aplicou em seu primeiro mandato o programa "Zero Tolerance", no qual separava pais e filhos menores na fronteira.
Hernández relatou como os menores com os quais trabalha são "solicitantes de asilo" e também há "vítimas de tráfico", que poderiam se qualificar para um status especial de imigrante juvenil, mas que agora se encontram "em uma situação de extrema vulnerabilidade". "Não abandonaremos nossos clientes, mas esta ordem de suspensão de trabalho nos coloca em uma posição em que teremos que nos reestruturar e responder", afirmou a advogada.
"Ontem, todas as nossas organizações receberam uma ordem da administração Trump nos dizendo para abandonarmos essas crianças", relatou Linda Tozelski, diretora executiva do ImmDef, que atualmente oferece representação legal a mais de 2000 crianças no Programa de Menores Não Acompanhados, e cujo cliente "mais jovem tem apenas cinco meses de idade". Tozelski expôs como também estão representando "meninas que são sobreviventes de tráfico, algumas das quais foram estupradas em seu caminho para os Estados Unidos, e a administração Trump está nos dizendo para parar de lutar por elas".
Tozelski denunciou que, se a assistência legal for retirada, essas crianças se verão sozinhas diante das perguntas do juiz de imigração, enquanto "um advogado do governo, cujo único trabalho é argumentar a favor de sua deportação, se enfrenta a elas". "Como podem imaginar, sem um advogado ao lado, essas crianças não têm nenhuma chance de se defender", apontou, adiantando que o ImmDef levará o caso aos tribunais.
Nos Estados Unidos, as pessoas que estão lutando contra a deportação não têm o mesmo direito a um advogado que aquelas que estão em um processo penal, embora possam contratar advogados privados. Embora com o tempo tenha sido reconhecido que as crianças que passam pelo sistema judicial de imigração sem um pai ou tutor são especialmente vulneráveis, em 2008 a Lei de Proteção de Vítimas de Tráfico de Pessoas criou proteções especiais para os menores nessa situação. Ela estabeleceu que o governo deveria facilitar a representação legal das crianças submetidas a procedimentos de deportação, embora não tenha exigido que todas as crianças tivessem um advogado.
"Embora nem todas as crianças que passam pelo sistema da Oficina de Reassentamento de Refugiados (ORR) recebam uma representação completa e direta, a cada uma delas é oferecida a proteção de poder se reunir com um provedor de serviços legais e receber informações absolutamente vitais, às vezes salva-vidas e sempre transformadoras, para que entendam onde estão, em que parte do procedimento se encontram e, o mais importante, para que tenham uma chance real de se defender e poder permanecer seguras nos Estados Unidos", explicou Tozelski.
Embora as organizações insistam que não abandonarão seus clientes por razões éticas, também reconhecem que a ordem de suspensão os coloca em uma situação de maior vulnerabilidade econômica e, eventualmente, algumas poderão ser obrigadas a retirar seus casos e despedir seus funcionários.
A razão pela qual há menores não acompanhados de idades tão baixas quanto dois anos ou cinco meses é porque na fronteira as famílias continuam sendo separadas. Como já explicava ao elDiario.es Chelsea Sachau, advogada do Florence Project, no mês passado, os agentes de imigração só consideram como unidade familiar os progenitores com filhos biológicos menores de idade. Quando esses menores são detidos enquanto viajam com familiares de segundo ou terceiro grau, como tios ou primos, eles são separados desses familiares e tratados dentro do circuito como menores não acompanhados.
Isso faz com que o caso deles seja tramitado separadamente dos de seus outros parentes e corram o risco de serem deportados sozinhos. Se houver opção de reunificação desses menores com um familiar dentro dos Estados Unidos, a reunificação é feita enquanto o processo migratório durar. "No caso de uma criança que recebe uma ordem de deportação, essa ordem deve ser executada. Isso significa que, de fato, as crianças podem ser separadas de seus familiares se não conseguirem obter uma solução legal para permanecer no país", explicou Lillian R. Aponte, do Florence Project.
A ordem de pôr fim à representação legal dos menores migrantes não acompanhados é um dos últimos golpes da administração Trump em sua dura campanha contra as pessoas migrantes. No primeiro mês de seu mandato, o presidente autorizou as operações em escolas e igrejas, lançou uma campanha de medo contra as pessoas sem documentos e iniciou as primeiras deportações para Guantánamo sem fornecer provas de que os migrantes deportados para lá realmente são criminosos perigosos, como afirma a Casa Branca. Segundo publicou a EFE, familiares de três migrantes venezuelanos detidos pelos Estados Unidos e enviados para Guantánamo denunciam que eles não têm nenhum histórico criminal que os associe à gangue Tren de Aragua, como afirma o governo.