17 Dezembro 2024
Prisões do general Braga Netto e de ex-assessor agregam novos elementos para desvendar articulações que tentaram impedir Lula na presidência da República após derrota de Bolsonaro.
A reportagem é Marcelo Menna Barreto e Gilson Camargo, publicado por ExtraClasse, 16-12-2024.
Os mais de 30 pendrives apreendidos com o coronel da reserva do Exército Brasileiro Flávio Botelho Pelegrino são uma das apostas da Polícia Federal (PF), no momento, para identificar pistas sobre o “pessoal do agro” referido na delação do tenente-coronel Mauro Cid.
Segundo o então auxiliar de ordens de Jair Bolsonaro (PL) na presidência da República, os integrantes do grupo seriam os financiadores da tentativa de golpe de estado que incluía o assassinato do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu vice, Geraldo Alckimin, e do, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes.
Pelegrino foi preso no sábado, 14, na mesma operação que fez do candidato a vice da chapa de Bolsonaro em 2022, Walter Braga Netto, o primeiro general de quatro estrelas preso em virtude de um inquérito policial no Brasil. Pellegrino foi assessor-chefe de Comunicação Social da Casa Civil comandada por Braga Netto.
Agentes da PF estão se dedicando para identificar a origem dos R$ 100 mil entregues pelo general em sacolas de vinho ao major Rafael de Oliveira para financiar a operação.
Outra possível porta para as pistas está nos celulares apreendidos na operação. O que se sabe é que os conteúdos dos aparelhos apreendidos já foram extraídos e já estão sob análise dos investigadores.
O envolvimento de setores do agronegócio já havia sido registrada em outras situações críticas após a derrota de Bolsonaro nas urnas. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) chegou a apontar a participação de produtores rurais na articulação de atos antidemocráticos como os acampamentos em frente a quartéis em várias regiões do país e no bloqueio de rodovias.
Áudio de Mauro Cid enviado no dia 16 de novembro explicitou ainda mais o papel de empresários do agronegócio em toda a trama para impedir a posse do presidente eleito.
Segundo o relatório da PF entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF), o tenente-coronel registrava que “empresários do agro” estavam “financiando” e “colocando carro de som em Brasília”.
Outra conversa exposta pelas investigações segue a mesma linha. Uma das investigadas, que esteve no QG do Exército em Brasília, relatou o apoio de empresários do setor para fretar 3 mil ônibus direcionados à capital do país às vésperas dos atos de 8 de janeiro. “Pessoal do agro lá de Goiânia, dos arredores de Brasília e tudo. O agro botou aí um apoio aí pra três mil ônibus”, se ouve no áudio interceptado pela PF.
De acordo com a delação de Cid e de outras investigações, a PF acredita que o dinheiro vivo entregue por Braga Netto ao major Oliveira foi usado para a compra de um celular usado por integrantes das Forças Especiais do Exército, os “kids pretos”, para monitorar autoridades em 2022, logo após a vitória de Lula.
O aparelho, segundo a PF, foi comprado pela esposa de Oliveira em Goiânia também com dinheiro vivo. A PF ainda rastreou cinco recargas de crédito para os celulares que faziam parte do grupo “Copa 2022”, responsável pela operação “Punhal verde e amarelo” que tramava o sequestro e o possível assassinato de Moraes.
Ao todo, só nesta parte da operação, estavam sendo usados “seis telefones celulares descartáveis”, de acordo com documentos apreendidos nas investigações da PF.
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de decretar a prisão do general Walter Braga Netto, na manhã de sábado, 14, foi fundamentada pela tentativa de ele tentar obter detalhes da delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, para a PF em setembro do ano passado. Segundo a PF, a ação pode ser caracterizada como obstrução de Justiça. As informações foram prestadas na última audiência de Mauro Cid à PF, no dia 21 de novembro.
A decretação da prisão, assinada pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito, a investigação, conforme a PF, demonstra que houve contatos de Braga Netto com o pai de Mauro Cid, o general Mauro César Lourena Cid.
A PF apontou “fortes e robustos elementos de prova” que demonstram a participação ativa do general Braga Netto na tentativa de pressão aos comandantes das Forças Armadas para aderirem à tentativa de golpe. Segundo a PF, o general também teria atuado para obter informações sobre a delação premiada de Mauro Cid e na obtenção e entrega de recursos financeiros para execução de monitoramento de alvos e planejamento de sequestros e, possivelmente, homicídios de autoridades.
Ao analisar pedido da PF, o ministro apontou que as investigações da operação Contragolpe e depoimentos do colaborador Mauro Cid “revelaram a gravíssima participação de Walter Souza Braga Netto nos fatos investigados, em verdadeiro papel de liderança, organização e financiamento, além de demostrar relevantes indícios de que o representado atuou, reiteradamente, para embaraçar as investigações”.
Em relação aos dois investigados, o ministro determinou ainda a proibição de contato com outros investigados e ordenou a retirada do sigilo da decisão, da representação da Polícia Federal e do parecer da Procuradoria Geral da República.
Os contatos “tinham a finalidade de obter dados sigilosos, controlar o que seria repassado à investigação, e, ao que tudo indica, manter informado os demais integrantes da organização criminosa”, aponta a decisão de Moraes.
O ministro é relator do inquérito que investiga a tentativa de golpe de Estado para impedir a posse do presidente Lula.
Outro argumento aponta que a PF, no dia 8 de fevereiro deste ano, data da deflagração da operação “Tempus Veritatis”, encontrou papeis na mesa do coronel Flávio Botelho Peregrino, assessor de Braga Netto, que orientariam perguntas e respostas sobre delação de Mauro Cid.
“Foi identificado na sede do Partido Liberal (PL), sob a mesa do coronel Flávio Botelho Peregrino, assessor do general Braga Netto, documento com perguntas e respostas acerca da colaboração premiada realizada pelo investigado Mauro Cid”.
Na decisão de Moraes, há trechos de como Cid informou à PF sobre as ações do general.
“Basicamente isso aconteceu logo depois da minha soltura, quando eu fiz a colaboração naquele período, onde não só ele como outros intermediários tentaram saber o que eu tinha falado”.
Outra novidade que Mauro Cid trouxe, na audiência no último dia 21, foi sobre o financiamento das ações de forças especiais por parte de Braga Netto.
“O general repassou diretamente ao então Major Rafael de Oliveira dinheiro em uma sacola de vinho, que serviria para o financiamento das despesas necessárias à realização da operação”, apontou Cid.
Isso foi confirmado pela PF que descobriu a compra de celular e carregamentos de chip, com pagamentos em espécie em estabelecimento na cidade de Brasília. A defesa do general divulgou nota na tarde de sábado na qual nega que o militar tenha agido para obstruir as investigações e informa que vai se manifestar no processo.
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PF segue o rastro do dinheiro para identificar financiadores da tentativa de golpe - Instituto Humanitas Unisinos - IHU