COP16: perda da biodiversidade é a maior crise planetária. Entrevista especial com Aliny Pires

Para a professora e pesquisadora, a perda de biodiversidade implica, também, a redução de nossas alternativas de futuro

Foto: Fernando Frazão | Agência Brasil

Por: IHU e Baleia Comunicação | 29 Outubro 2024

Entre os dias 21 de outubro e 1º de novembro ambientalistas, pesquisadores, representantes de povos tradicionais e membros dos governos de estado em torno do globo estão em Cali, na Colômbia, na 16ª Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade para construir um pacto global que garanta as condições de vida, inclusive humana, no planeta.

“A grande contribuição desta COP16 é entender os gargalos e os potenciais, os bons exemplos, da implementação do novo marco. Esse é a principal leitura que precisaremos fazer desse encontro para estabelecer diretrizes para reforçar os países que ainda estão enfrentando desafios”, pontua a professora e pesquisadora Aliny Pires, em entrevista por telefone ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

No Brasil, duas questões centrais na pauta ambiental confluem de maneira radical: a dimensão da biodiversidade e da preservação dos cursos d’água. “Há uma forte relação entre esses dois temas e isso é reflexo de um país, que é o mais biodiverso do mundo e que possui a maior porcentagem de água superficial correndo no planeta”, frisa a entrevistada.

Em termos pragmáticos, a perda de biodiversidade coincide com a perda de possibilidades de futuro. “Muito dessa percepção da crise vem do fato de que quando perdemos biodiversidade estamos reduzindo as oportunidades de soluções que já temos enfrentado, mas também aquelas que enfrentaremos, mas cujas características ainda desconhecemos”, pontua. “Muitas das soluções para as nossas sociedades virão da biodiversidade, de tal maneira que conservá-la é garantir que teremos opções e oportunidades de extrair dos processos ecológicos e biológicos serviços que, de fato, vão assegurar nossa qualidade de vida e garantir um espaço seguro para a humanidade”, complementa.

Aliny Patrícia Flauzino Pires (Foto: Arquivo pessoal)

Aliny Patrícia Flauzino Pires é bióloga, doutora em Ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ e pesquisadora associada à Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável, à Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos – PBBES, onde é coordenadora executiva, e à Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais – Rede Clima. Nos últimos anos, têm investigado qual o papel da biodiversidade em relação aos efeitos das mudanças do clima. A pesquisadora tem diversas publicações no tema, em periódicos nacionais e internacionais, capítulos de livro e documentos voltados para tomadores de decisão. 

Confira entrevista.

IHU – Qual a importância da 16ª Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade (COP16) no atual contexto?

Aliny Pires – A COP16 tem papel fundamental para garantir que o novo Marco Global para a Biodiversidade Kunming-Montreal seja, de fato, implementado. Essa será a primeira reunião pós-encontro que definiu esse marco, de tal modo que precisamos estar atentos em como cada uma nações estão avançando na implementação desta agenda, que é complexa e completa, trazendo uma série de desafios novos ao tema biodiversidade, incorporando temas como diversidade de gênero, valorização de povos tradicionais e indígenas, etc. Isso demanda uma articulação multi e interssetorial, que ilustram o desafia da pauta da biodiversidade.

A grande contribuição desta COP16 é entender os gargalos e os potenciais, os bons exemplos, da implementação do novo marco. Esse é a principal leitura que precisaremos fazer desse encontro para estabelecer diretrizes para reforçar os países que ainda estão enfrentando desafios, bem como mobilizar as estratégias, recursos e apoio técnicos de nações que já conseguiram avançar nessa temática e que poderiam contribuir no desenvolvimento de outras ações para que o marco tenha uma atuação global.

IHU – De acordo com a 15ª edição do relatório “Planeta Vivo 2024: Um Sistema em Perigo”, lançado em 9/10, o tamanho médio das populações de vida selvagem monitoradas no planeta sofreu uma redução de 73% em 50 anos, de 1970 a 2020. O que isso significa? Por que este é um dado preocupante?

Aliny Pires – O Living Planet Report é superimportante porque ele traz uma dimensão do risco da biodiversidade que nem sempre é diretamente acessada. Utiliza um indicador que se refere à abundância média das espécies, como os tamanhos populacionais estão se comportando no intervalo de tempo avaliado. Muitas das estratégias de conservação têm um olhar sobre o ambiente, temos um mirada sobre o desmatamento, falamos sobre a perda de habitat e tratamos de aspectos que indicam riscos à biodiversidade, mas indicando a vegetação nativa como um proxy disso (e, de fato, é um ótimo proxy).

Contudo, um olhar sobre as espécies e as populações permite uma visão mais direta sobre a biodiversidade que está sendo comprometida e essas transformações globais que estão ocorrendo. Os números trazidos no relatório mostram que há grupos que estão sofrendo redução populacional significativa, que é, talvez, o sinal mais sintomático de risco de perda de uma espécie. É assim que começa o processo de extinção de uma espécie.

Ter uma atenção especial ao comportamento das espécies é uma grande contribuição do Living Planet Report. Temos uma questão que é importante destacar, apesar de sua escala, não frisa que dentro dessa crise na biodiversidade há sistemas que estão ainda mais sob ameaça como, por exemplo, espécies e ecossistemas aquáticos continentais. Esta biodiversidade – aquática continental – é, entre os componentes da biodiversidade, um dos mais ameaçados. Levar em consideração que dentro da crise é possível identificar componentes mais ameaçados é uma grande contribuição do documento e como isso deverá ser incorporado nas estratégias necessárias para lidar com essas coisas.

IHU – Qual a correlação entre biodiversidade e conservação nas nascentes e cursos d’água? Como se configura, neste sentido, o atual cenário brasileiro?

Aliny Pires – Essa relação fica evidente quando olhamos para o principal instrumento legal que busca versa sobre o uso do solo brasileiro, da vegetação nativa, também conhecida como “Código Florestal” e olhamos para as regras ali postas de forma muito clara. Isso ocorre de tal modo que as Áreas de Proteção Permanente – APPs são mecanismos-chave deste instrumento legal. O que as APPs fazem? Protegem os cursos d’água, por isso elas estão à beira de rios, de nascentes, e reconhecem esses ambientes como essenciais para serem protegidos, o que é um grande acerto. Anteriormente eu ponderava sobre os riscos que são preponderantes e ainda mais acentuados quanto à biodiversidade aquática.

Além disso, versar sobre a conservação desses sistemas, garante o abastecimento e a manutenção de diversos modos de vida, pensando em diferentes organismos, desde os aquáticos que têm uma dependência estrita da manutenção desses sistemas até a biodiversidade como um todo que demanda um uso mais ou menos eventual desse tipo de sistema. Por fim, o próprio uso para o abastecimento humano. Sabemos que, por exemplo, o papel das unidades de conservação é essencial para o abastecimento dos reservatórios, que em última instância é o que garante que a água chegue às nossas casas.

Todas as estratégias que no Brasil são preponderantes à preservação da biodiversidade, relacionadas ao uso do solo e apropriação dos ecossistemas brasileiros, estão intrinsicamente ligados à questão da água. Para deixar isso ainda mais evidente, podemos destacar a política nacional para Pagamento de Serviços Ambientais, que, historicamente, buscou proteger corpos hídricos e nascentes. Quando pensamos em construir um instrumento que valoriza e compensa as pessoas que estão preocupadas com a conservação da biodiversidade e dos serviços que ela presta, sempre voltamos à água como um ecossistema fundamental e de importância vital.

Há uma forte relação entre esses dois temas e isso é reflexo de um país, que é o mais biodiverso do mundo e que possui a maior porcentagem de água superficial correndo no planeta. O Brasil é referência na questão da disponibilidade hídrica, da diversidade aquática, de ecossistemas aquáticos, possui a maior área úmida do planeta, o que nos dá a missão e o compromisso de mostrar que é possível ter essas duas preocupações sendo estabelecidas e pensadas de forma concomitante.

IHU – Como a água é considerada um serviço ecossistêmico?

Aliny Pires – Esses serviços ecossistêmicos ou benefícios podem ser compreendidos sob diferentes prismas. A água certamente é um daqueles onde fica ainda mais fácil perceber a importância da natureza e dos processos biológicos para a nossa vida. Certamente a água é um dos elementos vitais para a nossa qualidade de vida e os diversos ecossistemas associados aos ambientes aquáticos demonstram o fundamental de incluir a conservação da biodiversidade de forma integrada à água. Nós produzimos um relatório em 2020 tratando especificamente deste tema, de como podemos integrar a água nessa discussão como um serviço ecossistêmico, mas não a água de maneira isolada.

Muitos dos esforços feitos até aqui olham para água, simplesmente, como um recurso hídrico, a água que sai na torneira. Mas a água é também subsídio e habitat para inúmeras espécies, pois os ecossistemas aquáticos possuem uma variedade de serviços que precisam ser incorporados no debate sobre o uso da água e da proteção desses ambientes. Diversas populações tradicionais têm seus modos de vida diretamente atrelado aos ecossistemas aquáticos, ou seja, pesquisadores artesanais, comunidades ribeirinhas, populações indígenas nos quais os cursos d’água têm papel fundamental nas suas culturas. Estamos falando desses ambientes que são fontes de recursos hídricos e que garantem a provisão e manutenção de diversos recursos sistêmicos de proteção da água, da recreação, etc. Estamos falando de uma variedade enorme de serviços ecossistêmicos aquáticos, que passa desde serviços e benefícios de ordem imaterial, como a relação espiritual que diversas comunidades possuem com esses ambientes, quanto aspectos mais diretos, como a retirada da água desses locais como algo essencial para as pessoas. Isso tudo além da dimensão da provisão pesqueira que garante alimento para diversas pessoas em diferentes locais do Brasil.

IHU – Permita-me uma contextualização antes da pergunta: o exame de PCR, para diagnóstico da covid-19, foi desenvolvido graças à descoberta de uma enzima produzida pela bactéria Thermus aquaticus, que sobrevive a altas temperaturas nas fontes termais do Parque Nacional de Yellowstone, nos EUA. Como esse exemplo ilustra a importância das pesquisas e da preservação dos biomas aquáticos?

Aliny Pires – Esse exemplo deixa claro o quanto a biodiversidade é fundamental para a manutenção da vida em nosso planeta. Isso dialoga diretamente com o conceito de limites planetários que vem sendo construído desde 2009 e sendo repetidamente atualizado, mostrando que a perda da biodiversidade é a maior crise planetária. Muito dessa percepção da crise vem do fato de que quando perdemos biodiversidade estamos reduzindo as oportunidades de soluções que já temos enfrentado, mas também aquelas que enfrentaremos, mas cujas características ainda desconhecemos.

Muitas das soluções para as nossas sociedades virão da biodiversidade, de tal maneira que conservá-la é garantir que teremos opções e oportunidades de extrair dos processos ecológicos e biológicos serviços que, de fato, vão assegurar nossa qualidade de vida e garantir um espaço seguro para a humanidade.

Os ambientes aquáticos, como já mencionado, têm uma biodiversidade única, pois a água como meio facilita processos metabólicos e permite com que consigamos acessar uma série de produtos que podem ter impacto positivo para demandas humanas. Temos diversas espécies aquáticas que são utilizadas nas indústrias dos cosméticos, farmacêutica, alimentícia e isso destaca o potencial de constituir uma bioeconomia a partir desses recursos que são frutos da biodiversidade aquática. Isso vale também para outros sistemas biodiversos como marinhos terrestres, para os quais a biodiversidade aponta caminhos para enfrentar essas crises que, tudo indica, tendem a ser mais frequentes.

IHU – Caso a Amazônia chegue, de fato, em um ponto de não retorno, quais devem ser as consequências do ponto de vista biodiversidade aquática?

Aliny Pires – Essa é uma grande questão para o planeta: o que fazer se perdermos o funcionamento da Amazônia? Não necessariamente precisamos perder toda a floresta para perder a funcionalidade dela. Quando falamos de ponto de não retorno estamos falando de destituir funcionamentos básicos do bioma a ponto de levar o ecossistema a outro funcionamento, o que torna a sua funcionalidade que conhecemos não seja obtida novamente. A Amazônia tem um papel fundamental para a dinâmica de todo o continente e do planeta e isso tem relação direta com a água. Essa floresta tem um papel fundamental na distribuição da água e perder essa funcionalidade pode fazer com que a biodiversidade aquática não só da Amazônia, mas também de diversos ecossistemas aquáticos que dependem da precipitação que vem a partir de processos hidrológicos desta floresta sejam comprometidos.

Além disso tem a questão da biodiversidade aquática do próprio bioma. Temos passado por anos seguidos de dinâmica de seca, afetando grandes rios amazônicos, o que permite verificar que diferentes componentes da biodiversidade reagem de maneira distintas a esses eventos extremos. Há também uma relação direta com funcionalidade do bioma e com o impacto que a perda do bioma pode ter para a dinâmica climática global. Fizemos alguns trabalhos que indicam que a redução significativa do tamanho dos ecossistemas aquáticos tem impacto nas taxas de encontro das espécies que interagem e garantem o funcionamento do sistema. Ao reduzir os ecossistemas aquáticos aumentam os encontros entre predadores e presas e isso altera o balanço das populações, afetando a estrutura da comunidade e a possibilidade do sistema em fornecer diferentes serviços que têm impactos para as pessoas. Isso altera toda a cadeia que liga a conservação da biodiversidade e o bem-estar das pessoas. Isso fica totalmente evidente quando estudamos o risco de alterar o funcionamento da Amazônia de modo que devemos fazer esforços sem limites para controlar esse processo.

IHU – Thomas Lovejoy dizia que “A natureza global é feita de pequenos pedaços” e defendia que era preciso incentivar as pessoas à preservação. Como podemos, coletivamente, enfrentar os desafios do novo regime climático global?

Aliny Pires – O primeiro passo para promovermos uma mudança na relação entre as pessoas e o clima e entendermos que as crises climáticas que experimentamos hoje são resultado múltiplas ações que nos trouxeram a esse lugar próximo ao precipício. Assim como acredito que nós somos responsáveis por esse processo, também acredito que seremos os responsáveis por nos retirarmos desse lugar. Isso passar por escolhas individuais em que cada indivíduo entende que compõe um todo e é importante fazermos escolhas referentes ao nosso modelo de vida, nas formas de consumo e como lidamos com um modelo de sociedade que incentiva cada vez mais o consumo e coloca isso dentro desse sistema que subsidia os impactos que temos causado para as mudanças climáticas. Cada pessoa tem a oportunidade única de refletir sobre a maneira como quer viver a sua vida e qual o impacto que o seu modelo de vida pode ter no planeta como um todo.

Se cada uma das pessoas tomar para si essa postura a gente se torna muito mais forte para cobrar de fato quem são os responsáveis pelo que temos observado, as grandes indústrias têm uma responsabilidade enorme, em que pese coletivamente tenhamos uma responsabilidade sobre o que está acontecendo. Pois no fundo, são as grandes indústrias a responsável pelas emissões de gases de efeito estufa na atmosfera, que é o que causa as mudanças que temos observado.

Temos essas duas faces de uma mesma moeda, que está na mão de cada um de nós. De um lado uma mudança significativa nos nossos modos de vida que podem gerar transformações em larga escala, uma vez que isso pode ocorrer a partir de mudanças de hábitos, o que tem a ver com a nossa dieta, nosso consumo energético, o consumo de produtos do dia a dia. Ao mesmo tempo, do outro lado, isso tudo pode ser fundamental para fortalecer a cobrança em relação aos grandes emissores dos gases do efeito estufa, sobre a responsabilidade desses entes para resolverem esta crise. Temos a possibilidade de atuar coletivamente desde uma reflexão mais profunda individualmente para, enquanto sociedade, estabelecermos diretrizes e normas para quem de fato deve ser responsabilizado pela crise que vivemos agora.

IHU – Qual o papel que uma mudança no sistema alimentar tem sobre a preservação da biodiversidade?

Aliny Pires – A principal causa da perda de biodiversidade é a redução das áreas de vegetação nativa para a agricultura e pecuária. De alguma forma, sob a narrativa de que essas atividades são responsáveis pela garantia da produção de alimentação, os argumentos em favor do agro têm subsidiado as justificativas de ações que levam à perda do habitat de diversas espécies em uma escala sem igual na história desse planeta.

Isto posto, há uma aparente relação entre a necessidade de produzir alimentos, o que é uma grande falácia. Primeiro temos que considerar que a maior parte dos alimentos que chegam à mesas dos brasileiros vem da agricultura familiar, que é uma prática que não tem relação com as taxas de desmatamento como observamos em plantios de larga escala. A agricultura não é uma coisa uniforme, tem diferentes níveis e há parte dela que são fundamentais para a preservação da biodiversidade, como por exemplo os sistemas agroflorestais que são capazes de permitir a produção de alimentos ao mesmo tempo que têm grande apoio para a preservação da biodiversidade. A agricultura tem o papel fundamental de ser um agente transformador capaz de promover e contribuir na conservação da biodiversidade muito mais do que o discurso da aparente contradição entre produção de alimentos e proteção da biodiversidade.

De outro lado temos a questão da segurança alimentar, o quanto esse alimento produzido pode ter diferentes destinações, pode ser nutricionalmente importante para garantir o sustento e a segurança das pessoas. Até fazer com que esse alimento chegue na mesa de todos é o outro desafio. Precisamos aproximar essa potência que o Brasil tem de produzir alimentos à qualidade de vida das pessoas, especialmente os mais vulneráveis.

Outro aspecto importante do sistema alimentar como um todo é que muitos dos relatórios que apontam sobre o aumento da temperatura média do planeta exige uma mudança radical no modelo de dieta das pessoas. Isso incluir mudanças culturais que precisamos introjetar na nossa vida. Isso é difícil porque as pessoas têm uma relação de afeto com os alimentos e isso são mudanças profundas, transformações culturais, de sociedade e que são mais difíceis de acontecer no curto prazo. O que os modelos apontam é que é necessária uma mudança significativa, por exemplo, no consumo de carne, como um mecanismo que seja capaz de controlar as pressões que levam ao desmatamento e que, em última instancia, afetam o clima e a biodiversidade, seja pensando na prerrogativa da ameaça potencial da interação desses sistemas, seja na contribuição que esses sistemas podem ter para a preservação da biodiversidade, até aspectos mais profundamente relacionados à cultura.

IHU – Em que sentido defender a conservação da biodiversidade tem um aspecto, uma dimensão, ética e moral?

Aliny Pires – Todas as espécies merecem viver. A Conservação da Biodiversidade tem a ver com uma responsabilidade nossa muito mais do que um direito da espécie humana em decidir quem vive ou não. Toda a espécie tem o direito de viver. Cabe a nós garantirmos que nosso modelo de vida não comprometa esse direito que é todos.

Esse aspecto tem um papel em uma discussão ética e moral muito relevante. Precisamos nos colocar nesse lugar para garantir que nosso modelo de vida não seja a causa da perda de tantas espécies e comprometa de uma forma tão ampla a biodiversidade como conhecemos. Isso também tem um modelo de pensamento que dialoga diretamente com o fato de nós nos entendermos como biodiversidade, como natureza. Conservar a biodiversidade é conservar, de certa forma, parte do que nós somos também.

É fundamental que cultivemos na sociedade a nossa responsabilidade sobre esse aspecto. E precisamos nos valer da relação que já foi estabelecida, por exemplo, por diversos povos tradicionais e indígenas, que vivem de forma muito mais harmônica com a natureza, para que possamos, de fato, atingir a visão de 2050, que deve ser um tempo onde as pessoas vivam em harmonia com a natureza. Nós temos um grande desafio pela frente e um tempo curto para fazer a mudança de tamanho desproporcional nesse planeta – é uma mudança muito grande. Já fomos capazes de fazer essa mudança em diversos contextos e tenho certeza de que a população humana é capaz de realizar essa tarefa para o bem de todos, do planeta.

IHU – Quais devem ser os desdobramentos da COP16 da Biodiversidade?

Aliny Pires – Entendendo que a implementação do Marco Global nos países é uma das principais ações para serem discutidas e avaliadas no contexto dessa COP, teremos um papel importante a partir daí, no avanço da implementação dessas agendas. Creio que este seja o desdobramento mais esperado. Por se tratar de uma agenda extremamente complexa, teremos a necessidade de mobilização de muitos atores e setores nessa discussão. Entendendo quais são os gargalos e os potenciais da implementação dessa agenda, conseguiremos mobilizar diferentes parceiros da implementação do Marco Global da Biodiversidade nos países.

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