09 Agosto 2024
As condições quentes e secas que agravaram os incêndios no Pantanal brasileiro em junho foram cerca de 40% mais intensas e de quatro a cinco vezes mais prováveis por causa das mudanças climáticas, diz pesquisa publicada nesta quinta-feira (8) pela Rede Mundial de Atribuição (WWA, na sigla em inglês). O estudo foi conduzido por 10 pesquisadores e revisado por outros sete.
A reportagem é de Priscila Pacheco, publicada por Observatório do Clima, 08-08-2024.
Para avaliar as condições climáticas que favoreceram os incêndios de junho, o grupo analisou variáveis meteorológicas que compõem a classificação diária de severidade (DSR, na sigla em inglês): temperatura máxima, umidade relativa, chuva e velocidade do vento. “A maioria dessas variáveis quebrou recordes em junho de 2024. Foi o junho mais seco, quente e ventoso desde o início das observações. Apenas a umidade relativa foi a segunda mais baixa registrada”, diz o artigo.
Em seguida, a equipe analisou como as mudanças do clima alteram a probabilidade e a intensidade das quatro variáveis. Foi observado uma forte tendência de seca e temperaturas cada vez mais altas acompanhadas pela redução na umidade relativa. Por outro lado, não houve uma tendência clara nas velocidades do vento. “Assim, o aumento do DSR pode ser explicado pelo aumento das temperaturas, impulsionado pelas mudanças climáticas, e pela diminuição das chuvas”. A análise considerou um aumento de 1,2 °C no aquecimento global.
Segundo a pesquisa, em um clima sem o aquecimento global de 1,2 °C, as condições climáticas semelhantes para incêndios em junho seriam extremamente raras. Filippe Santos, coautor do artigo e pesquisador na Universidade de Évora, em Portugal, e na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), comenta que a situação é preocupante, pois junho não era um mês com queimadas intensas. O pico de incêndios no Pantanal é em setembro.
“Os incêndios no Pantanal deste ano têm o potencial de se tornarem os piores de todos os tempos. Espera-se que as condições fiquem ainda mais quentes ao longo deste mês e nos meses seguintes, e há uma ameaça considerável de que os incêndios possam queimar mais de três milhões de hectares”, diz. O ano de 2020 ainda é o recordista no Pantanal, com 3,9 milhões de hectares queimados. É estimado que 17 milhões de animais vertebrados morreram pelo fogo naquele ano. Até quarta-feira (7), os incêndios de 2024 haviam destruído 1,3 milhão de hectares no bioma.
O estudo lembra que o desmatamento em outros biomas, especialmente na Amazônia e no Cerrado, afetam a dinâmica climática no Pantanal. Globalmente, o uso de combustíveis fósseis é o principal responsável pela intensificação das mudanças climáticas. “Nosso estudo deve ser visto como um alerta. Se o mundo continuar a queimar combustíveis fósseis, ecossistemas preciosos como o Pantanal e a floresta amazônica podem atingir pontos de inflexão em que a recuperação natural de incêndios florestais e secas se torna impossível”, diz Friederike Otto, coautora do artigo e professora sênior de ciência climática na Imperial College London, Inglaterra.
Roop Singh, também coautora da pesquisa e chefe da área de urbanismo e atribuição no centro climático da Cruz Vermelha e Crescente Vermelho, ressalta que, enquanto a sociedade não parar de queimar combustíveis fósseis e alcançar emissões líquidas zero, são necessárias ações práticas para reduzir o risco de incêndios devastadores, incluindo a redução da ignição (processo que inicia o fogo) e o fortalecimento das ações para combater as queimadas.
Segundo o artigo, a principal fonte de ignição do fogo no Pantanal é de origem humana, como as queimadas mal geridas para “limpar” a terra para a pecuária intensiva e a monocultura. Os raios são responsáveis por apenas 1% dos eventos. Além disso, as mudanças no uso e na cobertura do solo, como o desmatamento da vegetação natural para as pastagens e agricultura, contribuem para condições mais secas e aumentam a disponibilidade de vegetação que se torna combustível para o fogo. “Historicamente, o Pantanal evoluiu com incêndios naturais, mas nas últimas décadas, mudanças no uso da terra, impulsionadas pela expansão das atividades de pecuária, aumentaram a sensibilidade da região aos extremos climáticos relacionados ao fogo”, diz o texto.
Na segunda semana de julho, o número de focos de incêndios diminuiu no Pantanal. O Mato Grosso registrou 21 focos entre os dias 7 e 13 de julho, enquanto o Mato Grosso do Sul, estado mais atingido, não teve nenhum registro. Alguns dias depois, o número de focos no bioma voltou a aumentar. Entre 1 e 7 de agosto foram registrados 1.899 focos, número 27,2% maior do que o registrado no mesmo período de 2020.
Uma projeção do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) para agosto alerta para um agravamento da seca em diversas regiões do Brasil. Mato Grosso e Mato Grosso do Sul estão entre os estados com destaque. “Essa situação exige atenção e ações preventivas para minimizar os impactos socioeconômicos e ambientais”, diz o boletim. Os dois estados que abrigam o Pantanal também estão com alertas de “perigo potencial para umidade baixa”, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
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Mudanças climáticas pioraram incêndios no Pantanal em junho, diz estudo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU