09 Agosto 2024
"Quando Jesus diz que o Reino dele não é deste mundo, significa que não podemos aceitar o que governantes fazem, de outro modo, poderíamos traduzir a fala para: 'meu Reino não é desta ordem social', e com isso entendermos que precisamos lutar para sobrepor o Reino de Jesus ao reino de Cesar", escreve Alvim Aran, filósofo, Seminário Provincial Sagrado Coração de Jesus, em Diamantina/MG.
A política sempre desperta certa reação nas pessoas, sendo elas religiosas ou não. Atualmente no Brasil discute-se muito a ação do ser humano dentro do campo político, e muitos resumem essa atuação em sentido partidário, uns rumam muito para o lado A e outros para o lado B. Dentro do meio Católico não é diferente, tem-se uma polaridade gritante entre os cristãos que professam tal fé. De um lado, existem aqueles que não ligam para situação política atual; do outro, existem aqueles que se afundam no partidarismo cego.
A briga partidarista não é cristã, em tese, não dá forma que ocorre, pois muitos deixam de conversar uns com os outros, e isso ocorre dentro da própria Igreja. E a comunidade de fé vai dividindo-se dentro de si mesma, com efeito, disse Jesus: “Um reino dividido não pode sobreviver”,[1] e o sentido do termo “política” vai esvaindo-se, pois este deveria levar todos os seres humanos a conviverem de forma harmônica.
Essa harmonia deve ocorrer, e a Igreja, enquanto instituição, deve prezar por uma boa formação para os fiéis, ensinar, à luz de Jesus, que fazer política é dever de todos os que se encontram professando a fé católica. O termo “política” carrega consigo o sentido de trazer o melhor para “polis”, daí surge à fusão religiosa-política, pois católicos devem buscar aquilo que Jesus, dentre tantas coisas, ensinou, que é o bem comum para todos, que se traduz no reino de Deus.
Ocorre que, por vezes, nos esquecemos que não tem como salvar a alma sem salvar o corpo. Por causa de uma divisão errônea, e uma má interpretação bíblica, postulamos que o Reino de Deus não é deste mundo (cf. Jo 18, 36), mas quando Jesus diz isto não está falando do céu, mas do reino de corrupção de poderes políticos terrenos, como do Império Romano.
Mas isso significa que não devemos nos atentar ao que governos fazem? Óbvio que não. Vamos entender melhor, o cristianismo é uma religião ética e não uma religião religiosa, isto é, tudo que os cristãos fazem deve ter implicações no mundo terreno da melhor forma possível.
Então, quando Jesus diz que o Reino dele não é deste mundo, significa que não podemos aceitar o que governantes fazem, de outro modo, poderíamos traduzir a fala para: “meu Reino não é desta ordem social”, e com isso entendermos que precisamos lutar para sobrepor o Reino de Jesus ao reino de Cesar.
Vamos definir os dois reinos. O reino de Cesar é um reino de exploração do mais fraco, ricos com muitos privilégios enquanto pobre não tem nem o que comer e precisam dar ou vender sua força de trabalho para ter o mínimo para sobreviver. É um reino onde impera uma necropolítica e o individualismo, onde morrem pessoas sem acesso a coisas básicas para o desenvolvimento humano integral.[2]
Já o Reino de Deus é o oposto do reino de Cesar, é uma terra positiva, onde não há exploração do ser humano pelo próprio ser humano, onde todos têm alimentação de qualidade, saúde e educação, não há individualismo, em suma, todos são felizes.
Nos vemos na necessidade de falar sobre isso por agora, pois se aproximam políticas municipais. E muitos de nossos irmãos católicos, guiados por um niilismo,[3] creem não ser necessário se envolver com política, pois o Reino de Deus não é deste mundo. Ora, um erro crasso, pois esquecem que o Reino de Deus começa aqui como sinal do Reino definitivo.
Se começa aqui, precisamos nos envolver com tudo que abrange o ser humano e ajuda-o a desenvolver integralmente. Não há como lutar por mudanças sem entrar no campo político, pois tudo é política. E nós, enquanto católicos, precisamos entender isso, se desprezamos esse mundo, não somos dignos do céu, pois aqui também é criação de Deus, estamos imersos no meio divino.
Que possamos olhar para política com o olhar cristão e lutar por ela e por mudanças, não podemos aceitar o reino de Cesar, um reino de explorações, precisamos lutar pelo de Deus, um lugar de amor e paz, pois como nos lembra Isaias: “Seremos libertos pelo direito e pela justiça” (cf. Is1, 27).
[1] Bíblia de Jerusalém. Mt 12, 25. São Paulo: Paulus, 2002.
[2] FRANCISCO. Fratelli Tutti. 2023. Disponível Aqui.
[3] Razão inadequada. Disponível Aqui.
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A Igreja: religiosos e a política. Artigo de Alvim Aran - Instituto Humanitas Unisinos - IHU