19 Março 2024
Sacerdócio feminino, diaconisas, leigas na sala de controle. Centra-se em torno dessas hipóteses o debate sobre o papel das mulheres no futuro da Igreja. Seu empoderamento está entre os temas no centro do Sínodo mundial em curso desejado pelo Papa Francisco. Uma reforma gradual é pouco para as feministas católicas, demais para os conservadores. Na base das discussões, às vezes, muito técnicas sobre ministérios e carismas, o que está em jogo é muito concreto. Embora as mulheres representem a metade, ou mais, do povo de Deus, e são elas que levam adiante muitas vezes e de bom grado a vida das paróquias, o catecismo, os hospitais católicos, na hora de tomar decisões, são sempre e somente os homens que detêm o poder. Pelo menos até hoje.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Repubblica, 18-03-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
“A questão fundamental em cima da mesa é a da participação das mulheres na vida e na missão da Igreja também em funções de responsabilidade e de governo", explica monsenhor Piero Coda, secretário-geral da Comissão Teológica Internacional, que especifica: “Não é apenas uma questão de participar na decision making, o que já acontece, mas também na decision taking”. Não é apenas uma questão de contribuir com as ideias no processo de tomada de decisão, mas também assumir a responsabilidade por ele. Porque, afirma o teólogo, “a autoridade não é prerrogativa absoluta de ninguém na Igreja, mas é fruto de uma participação múltipla e se expressa de muitas formas”. A história comprova-o: “Personalidades como Catarina de Siena ou Teresa de Ávila, com sua autoridade carismática – recorda Coda – se fizeram ouvir também pelos Papas de seu tempo”.
Uma primeira hipótese, a mais improvável, é que um dia haverá mulheres padre. Tanto na Igreja Anglicana como nas Igrejas Protestantes já existem mulheres pastoras e bispas. Na Igreja Católica existe um movimento, particularmente forte nos Estados Unidos, que luta pela ordenação sacerdotal feminina: nos Evangelhos, notam os teólogos mais progressistas, a ressurreição de Jesus é anunciada por um grupo de mulheres... O Papa Francisco excluiu essa possibilidade referindo-se à carta apostólica Ordinatio sacerdotalis com a qual João Paulo II em 1994 fechou a porta ao sacerdócio feminino “de maneira irrevogável” (mas não dogmática). No entanto, na galáxia católica há quem considere a questão ainda aberta.
Monsenhor Piero Coda faz um balanço da situação recordando que São Paulo na carta aos Gálatas escreve não só que “não há judeu nem grego, não há escravo nem homem livre”, mas também que “não há homem nem mulher", sancionando assim uma "igualdade radical", conclui o teólogo: "Por um lado a Igreja tem sido a guardiã dessa profecia, por outro tem sido muitas vezes prisioneira de módulos masculinistas que abafaram em muitas expressões essa novidade radical do Evangelho de Jesus”.
Hoje é o tempo de enfrentar “sem preconceitos ideológicos”, mas também sem “zerar as diferenças", o significado profundo dessa "igualdade na distinção entre o masculino e o feminino". A assembleia sinodal – Monsenhor Coda participa como especialista e também como consultor da secretaria – pode ser um dos lugares para fazer isso. Enquanto o aprofundamento teológico sobre esse tema continua, o debate já está mais avançado sobre o acesso das mulheres ao diaconato. O Concílio Vaticano II (1962-1965) deixou a porta entreaberta: até então o diaconato era apenas o primeiro dos três degraus do ministério da ordem, primeira etapa do cursus honorum para se tornar sacerdote e finalmente bispo. O Concílio introduziu o diaconato permanente como ministério específico. Portas abertas para as mulheres? O Papa Francisco protela. Para estudar a questão criou uma primeira comissão, depois uma segunda, mas ainda não se manifesta, apesar de mais de uma assembleia sinodal lhe ter reiterado o pedido. A solução poderia não ser homogênea para toda a Igreja. Em linha geral, segundo Monsenhor Coda, “pode e deve haver uma pluralidade de expressões nos diferentes contextos, uma descentralização que vê a Igreja como comunhão de Igrejas e uma criatividade para responder às exigências da missão”.
O fato é que muitas mulheres católicas não desejam ter acesso a um ministério. Laicas e orgulhosas disso. Mas ansiosas por contar mais e quebrar o teto de vidro que permanece na Igreja.
Durante a última assembleia do Sínodo, em outubro passado, foi proposta a introdução do voto dos leigos e das leigas nas decisões tomadas em todos os níveis da vida da Igreja, desde o Concílio até aos conselhos pastorais diocesanos e paroquiais, exceto uma espécie de direito de veto do pastor (sacerdote, bispo ou Papa) que garanta a natureza “comunal” e não puramente democrática desses órgãos. Uma proposta “pertinente e exequível”, comentou monsenhor Piero Coda, que agora explica a questão teológica subjacente distinguindo o sacramento da ordem e a autoridade: “O ministério de governo pode coincidir com o ministério ordenado ou pode ser um serviço participado”.
Ou seja, deve ficar claro que tem voz na Igreja e pode assumir uma responsabilidade de governo, “em razão da participação batismal na vida de Cristo”, ou, ainda, “da santidade de vida, ou de um carisma a ser empregado para o bem comum”. Sem afastar os sacerdotes do altar, mas compartilhando com eles a sua responsabilidade pela comunidade.
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Do sacerdócio ao diaconato, aqueles caminhos para quebrar o teto de vidro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU