26 Mai 2023
As três "entregas" aos participantes do Encontro Nacional dos Representantes diocesanos do Caminho Sinodal Italiano recebidos em audiência nesta quinta-feira na Sala Paulo VI.
A reportagem é de Gianni Cardinale, publicada por Avvenire, 25-05-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
"Continuem a caminhar." “Construir a Igreja juntos”. “Ser uma Igreja aberta”. E, finalmente, "ser uma Igreja 'inquieta' nas inquietudes do nosso tempo". Essas são as "entregas" que o Papa Francisco doou aos participantes do Encontro Nacional dos Representantes diocesanos do Caminho Sinodal Italiano recebidos em audiência nesta quinta-feira na Sala Paulo VI.
Com um discurso no qual elogiou a “bela experiência de escuta do Espírito” em curso, mesmo evidenciando a “impressão” de que comunidades, cúrias e paróquias sejam “ainda demasiado autorreferenciais”, vítimas de uma espécie de neoclericalismo defensivo. E no qual reiterou que o protagonista do processo sinodal é sempre o Espírito Santo, que às vezes provoca “desordem”, mas depois recompõe tudo criando “a harmonia”.
No início do seu discurso, o Pontífice sublinhou que a audiência "se coloca no cerne de um processo sinodal que está envolvendo toda a Igreja e, dentro dela, as Igrejas locais, nas quais as Oficinas sinodais foram constituídas como uma bela experiência de escuta do Espírito e de diálogo entre as diversas vozes das comunidades cristãs".
Disso a exortação a "continuar com coragem e determinação nesse caminho, sobretudo valorizando as potencialidades presentes nas paróquias e nas várias comunidades cristãs". Exortação acompanhada de "algumas entregas".
Primeira entrega: "Continuem a caminhar, deixando-se guiar pelo Espírito", nos passos do congresso eclesial de Florença, servindo o Evangelho "num estilo de gratuidade e cuidado, cultivando a liberdade e a criatividade próprias de quem dá testemunho da feliz notícia do amor de Deus permanecendo enraizado no que é essencial”. Porque uma Igreja "sobrecarregada pelas estruturas, pela burocracia, pelo formalismo, terá dificuldade para caminhar na história, ao passo do Espírito, ao encontro dos homens e das mulheres do nosso tempo".
Segunda entrega: construir juntos a Igreja, seguindo os passos do Concílio Vaticano II. Porque “todo batizado é chamado a participar ativamente na vida e na missão da Igreja, a partir da especificidade da própria vocação, em relação com as outras e com os outros carismas, doados pelo Espírito para o bem de todos”. De fato, há necessidade de comunidades cristãs “onde todos possam se sentir em casa, onde as estruturas e os meios pastorais favoreçam não a criação de pequenos grupos, mas a alegria de ser e sentir-se corresponsáveis”.
Terceira entrega: ser uma Igreja aberta. De fato, redescobrir-se como “corresponsáveis” na Igreja “não equivale a implementar lógicas mundanas de distribuição de poderes”, mas “significa cultivar o desejo de reconhecer o outro na riqueza de seus carismas e de sua singularidade”. Nessa perspectiva, "podem encontrar um lugar aqueles que ainda têm dificuldades para ver a sua presença reconhecida na Igreja, aqueles que não têm voz, aqueles cujas vozes são abafadas senão silenciadas ou ignoradas, aqueles que se sentem inadequados, talvez porque tenham percursos de vida difíceis ou complexos". “Deveríamos nos perguntar – é o pedido de Francisco – quanto espaço abrimos e quanto escutamos realmente nas nossas comunidades as vozes dos jovens, das mulheres, dos pobres, daqueles que estão desiludidos, daqueles que na vida foram feridos”. Porque, adverte o Papa, enquanto a sua presença “permanecer uma nota esporádica no conjunto da vida eclesial”, a Igreja “não será sinodal”, mas “será uma Igreja de poucos”.
A esse ponto, o Pontífice observa que "às vezes tem-se a impressão de que as comunidades religiosas, as cúrias, as paróquias ainda sejam demasiado autorreferenciais". “Parece – acrescenta – que se insinue uma espécie de neoclericalismo defensivo, de forma meio escondida, gerado por uma atitude temerosa, pelas queixas de um mundo que já não nos compreende mais, pela necessidade de reiterar e fazer sentir a própria influência”. Francisco especifica, de improviso, que o clericalismo dos padres e dos bispos é "perversão", e aqueles dos leigos ou das leigas é "dez vezes maior", é "terrível". Mas o Sínodo, exorta Francisco, “nos chama a ser uma Igreja que caminha com alegria, com humildade e com criatividade dentro desse nosso tempo, na consciência de que todos somos vulneráveis e precisamos uns dos outros”. E a esse propósito cita uma frase de dom Primo Mazzolari: “Que contraste quando a nossa vida apaga a vida das almas! Padres que sufocam a vida. Em vez de acender a eternidade, apagamos a vida."
“Somos enviados – é o comentário do Papa – não para apagar, mas para acender os corações dos nossos irmãos e irmãs, e para nos deixarmos iluminar, por sua vez, pelos reflexos de suas consciências que buscam a verdade”. A partir da pergunta do capelão de uma prisão italiana, que lhe perguntava como fazer para que a experiência sinodal vivida numa casa prisional pudesse depois encontrar uma continuação de acolhimento nas comunidades, o Papa Francisco acrescentou uma última entrega: ser uma Igreja "inquieta" nas inquietudes de nosso tempo.
“Somos chamados – explica o Pontífice – a recolher as inquietudes da história e a deixar-nos questionar, a trazê-las diante de Deus, a imergi-las na Páscoa de Cristo”. E “formar grupos sinodais nas prisões significa colocar-se à escuta de uma humanidade ferida, mas, ao mesmo tempo, necessitada de redenção”. Assim, a comunidade cristã “é desafiada a sair dos preconceitos, a colocar-se à busca daqueles que vêm de anos de detenção, para encontrá-los, para escutar o seu testemunho e a partir com eles o pão da Palavra de Deus”. E “esse é um exemplo de boa inquietação”, “experiências de uma Igreja que acolhe os desafios do nosso tempo, que sabe ir ao encontro de todos para anunciar a alegria do Evangelho”.
Por fim, Francisco reitera que é o Espírito Santo “o protagonista do processo sinodal: é Ele quem abre à escuta os indivíduos e as comunidades; é ele quem torna o diálogo autêntico e fecundo; é ele quem ilumina o discernimento; é ele quem orienta as escolhas e as decisões. É ele, principalmente, quem cria a harmonia, a comunhão na Igreja”.
E conclui de improviso observando que, se às vezes se nota certa desordem no processo sinodal, é preciso recordar a manhã de Pentecostes, quando havia uma “total desordem” causada pelo Espírito Santo. Mas depois foi o próprio Espírito Santo que criou a "harmonia".
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Papa Francisco aos representantes do Caminho Sinodal italiano: a Igreja deve ser aberta e inquieta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU