25 Mai 2023
À luz da comemoração do Dia Mundial da África no dia 25 de maio, o filósofo católico Roger Ekoué Folikoue, do Togo, sugere um caminho para a Igreja africana ocupar seu lugar de direito na comunidade eclesial global.
Folikoue é professor pesquisador na Les Universités Sociale du Togo. O artigo é publicado por La Croix International, 23-05-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A África, como entidade, tem demandas. Uma das mais fundamentais delas diz respeito a seu lugar nas várias instituições do mundo. Assim, ela quer, por exemplo, uma maior visibilidade dentro das Nações Unidas, especialmente no Conselho de Segurança, onde são tomadas as decisões mais importantes.
A Fifa, a entidade internacional que rege o futebol, tem feito ouvir sua voz em relação ao aumento do número de seleções africanas na Copa do Mundo. Pelo fato de ser um continente que sofre por ser esquecido e desprezado, a África quer fazer ouvir sua voz porque já não quer ser o continente subjugado, onde muitas vezes tudo já está pensado para ele. Ela acredita que tem uma identidade a defender, valores a partilhar e uma contribuição a dar em todas as áreas.
A questão do lugar da África nas instituições do mundo não pode poupar a Igreja, ainda que seja uma instituição ao mesmo tempo humana e divina. Normalmente, se existe uma instituição que deveria atuar antes mesmo dos apelos que a África fez às outras instituições, essa instituição seria a Igreja, uma comunidade reunida por Deus, Salvador de todos os homens e mulheres criados à imagem divina por amor, e aos quais a liberdade e a igualdade são reconhecidas como elementos constitutivos do seu ser. Como tal, todas as pessoas desfrutam da mesma dignidade que é o fundamento da fraternidade que o Papa Francisco apresenta e defende em sua encíclica Fratelli tutti, de 2020.
Dentro da Igreja, a questão do lugar da África também é posta e levantada com mais força.
A partir dos fatos e das estatísticas, pode-se pensar que se trata de um simples problema de números ou de representantes africanos nos mais altos órgãos da Igreja. Entre os 122 cardeais eleitores, apenas 16 são africanos, enquanto pelo menos 60 são europeus – a maior parcela de todos os continentes.
Esse desequilíbrio, que certamente tem razões históricas que a Igreja compartilha com outras instituições mundiais, como a ONU e a Fifa, mencionadas anteriormente, pode rapidamente parecer injustificado se nos colocarmos em outros níveis, especialmente no nível em que a Igreja poderia reivindicar ser uma instituição de testemunho, devido à mensagem da Boa Nova de um Deus que ama todos os homens e mulheres de todas as nações, todos os povos, todas as raças e todos os continentes.
Mas a reivindicação da África pelo seu lugar na Igreja universal não parece ter seu verdadeiro valor levado em conta. Para além das muitas razões que existem e constituem obstáculos em uma instituição que muitas vezes demora a agir e a transformar as coisas, podemos mencionar e analisar um elemento dessa lentidão observada.
No contato com o Ocidente, especialmente com a colonização e a chegada dos primeiros missionários, a África foi considerada território de missão. E ir em missão era ensinar, evangelizar, difundir a Boa Nova a fim de fazer discípulos. Os missionários nos barcos acreditavam ter descoberto um continente virgem, sem estruturas etc. Eles viam os povos locais como se eles não tivessem uma cultura ou tivessem uma cultura que precisava ser mudada.
Eles encontraram práticas que precisavam ser eliminadas e mudadas, ou adaptadas às dos colonos e dos missionários, consideradas como as boas e as mais civilizadas. A falta de estruturas e a pobreza pareciam tão gritantes que facilmente se podia ter a impressão de que tudo tinha que ser inventado ou importado, não só para a evangelização, mas também em nível humano.
A falta de estruturas socioculturais (escolas, centros de formação, centros de saúde etc.) era prova disso. Assim, a primeira evangelização se baseava em um paradigma que permitia aos missionários funcionarem e darem o melhor de si mesmos, apesar de uma visão às vezes problemática em alguns aspectos. Esse território de missão produziu, então, muitos batizados. No entanto, a África, que se tornou provedora de vocações, não ocupa um lugar importante na Igreja universal.
A demanda da África por um lugar maior pode ter sucesso se não mudarmos a nossa visão sobre ela, especialmente se não mudarmos o paradigma com o qual operamos?
A eleição de Barack Obama como primeiro presidente afro-americano dos Estados Unidos não mudou muita coisa no continente africano. Assim, no que diz respeito ao papel de liderança da África na Igreja Católica, não se trata necessariamente de ter um papa negro ou africano.
Isso certamente é necessário, mas não é o mais essencial, caso contrário, permaneceremos no nível simbólico e cosmético. O mais importante é olhar para a África de forma diferente, como um continente que tem sua voz em nível teológico e litúrgico, com a questão essencial dos ritos e dos símbolos para enfrentar os problemas da inculturação, para que a Boa Nova não “desestruture” a cultura africana em busca de identidade, mas seja uma mensagem que nos permita acolher Cristo como a Palavra que ilumina todo ser humano que vem a este mundo.
A Palavra de Deus deve ser uma palavra libertadora e energizante. Será que toda a teologia dos “semina verbi” não deveria ser repensada olhando para o vínculo entre a Boa Nova e as nossas culturas com seus ritos e símbolos? Mas será que a África poderá ocupar o seu lugar se não ousar cada vez mais passar de uma Igreja na África (o paradigma de uma instituição estrangeira) para uma Igreja da África (o paradigma do particular que justifica a existência do universal)?
Essa passagem precisa de um trabalho teológico arrojado e consistente, para que, por exemplo, o próprio conceito de Igreja-família seja um vetor de vida e não um slogan teológico. Será que a parábola do operário que chegou na última hora (Mt 20,1-16), mas que recebeu o mesmo salário que o primeiro, não poderia servir para desconstruir certas ideias que impediriam o reconhecimento do lugar da África na Igreja universal?
Será que uma certa compreensão do universal não liberaria energias para uma nova organização da Igreja institucional, que tem em seus textos o princípio da colegialidade? E se, a partir do Sínodo sobre a Sinodalidade, o “caminhar juntos” fosse uma graça para que a instituição reflita sobre todas essas questões, sem tabus?
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É preciso ajudar a Igreja na África a se tornar verdadeiramente a Igreja da África - Instituto Humanitas Unisinos - IHU