Inteligência Artificial e a Igreja: desafios e possibilidades. Conferência de Moisés Sbardelotto

A partir de documentos pontifícios, o pesquisador observa que o papel da religião nessa discussão transcende as questões de fé, devendo estar no cerne de um cristianismo inserido no mundo e num tempo presente

Foto: PxHere

Por: Edição: João Vitor Santos | 20 Mai 2023

Não é de hoje que a Igreja tem protagonismo nos debates acerca das novas tecnologias de informação, como bem observa o professor e pesquisador Moisés Sbardelotto. Agora, em tempos de grandes avanços e da naturalização da inteligência artificial em nosso cotidiano, discutir a relação com essas máquinas é pensar também na integridade do ser humano e do próprio planeta Terra. “Há o risco de nós cairmos numa perspectiva muito tecnicista, em que, por ser uma inteligência artificial que, portanto, difere da inteligência humana, e é mais poderosa, mais rápida, mais complexa do que a inteligência humana”, observa, em conferência promovida pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

Segundo Moisés, não se trata apenas de refletir no âmbito da fé e tão pouco de negar a própria tecnologia, mas de olhar para essas transformações a partir de uma ética humana de vida. Aliás, sobre qualquer forma de vida na Terra. Para ele, “a Igreja está resguardando esse aspecto ético de que o desenvolvimento tecnológico é importante, é reflexo da grandeza divina, mas ele tem que seguir esse desígnio, portanto, de bondade e amor é em relação à humanidade”. O que significa reconhecer “que esses resultados são positivos, que são até sinal e consequência da própria grandeza divina, do ser humano como continuador da própria criação divina. E o desafio é que essa atividade humana sempre deve corresponder, segundo o desígnio de Deus, ao bem da humanidade”.

Abaixo, reproduzimos a palestra em que Moisés mergulha nos documentos da Igreja que servem de lastro para o desenvolvimento desse debate, inclusive sinalizando caminhos a partir de práticas bem concretas. “A Igreja pode ser um desses corpos sociais intermediários, fundamentais para condicionar esse desenvolvimento tecnológico. Talvez ela não consiga transformar totalmente, porque é um ator entre diversos outros atores sociais que estão também se questionando sobre tudo isso. Mas, sem dúvida, pela sua história, pela sua sabedoria, pela sua capilaridade social, a Igreja tem um papel muito importante a realizar não só do ponto de vista de Santa Sé, mas também nas várias igrejas locais”, aponta o pesquisador.


Moisés Sbardelotto (Foto: Pascom Brasil)

Moisés Sbardelotto é professor adjunto na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas, onde atua como pesquisador membro do Núcleo de Estudos em Comunicação e Teologia – NECT, professor do Departamento de Comunicação da Faculdade de Comunicação e Artes, professor do projeto de implantação do Mestrado Profissional em Teologia Prática e professor colaborador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião.

É mestre e doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, com estágio doutoral na Università di Roma La Sapienza, e bacharel em Comunicação Social/Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.

Colaborador do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, é escritor, tradutor e consultor em comunicação para diversos órgãos e instituições civis e religiosos. Entre suas publicações, destacamos: Comunicar a fé: por quê? Para quê? Com quem? (Vozes, 2020), E o Verbo se fez rede: religiosidades em reconstrução no ambiente digital (Paulinas, 2017) e E o Verbo se fez bit: A comunicação e a experiência religiosas na internet (Santuário, 2012).

Confira trechos da conferência.

A temática da interface entre inteligência artificial e Igreja é desafiadora, até mesmo porque não temos uma relação diretamente evidente. Se perguntarmos para as pessoas em geral: “O que a inteligência artificial tem a ver com a Igreja?”, parece ser um tema fora do comum. Entretanto, não é bem assim. Também a Igreja - e estou abordando temática  dentro da perspectiva da Igreja Católica - vem trabalhando essa questão e propondo aspectos relevantes para esse debate.

Quero me focar especificamente nessa interface entre inteligência artificial e a Igreja, mostrando alguns desafios e algumas possibilidades. Parto de alguns usos pitorescos e folclóricos que vêm ocorrendo nesses últimos tempos.

Um deles tem a ver diretamente comigo. Aproveitei o hype [a moda, a onda] do ChatGPT e fiz duas perguntas iniciais ao sistema, para ver como reagiria diante da pergunta básica: quem sou eu? Quem é Moisés Sbardelotto?

 Todas as imagens são reproduções da apresentação do palestrante.

Nas duas primeiras tentativas, o sistema respondeu que é um nome extremamente comum e que não teria mais informações específicas sobre mim. Até pedia que eu mesmo desse mais informações, para que, caso alguma outra pessoa fizesse essa mesma pergunta, pudesse encontrar uma resposta.

Depois, tentei especificar um pouco a pergunta, ajudando-o no desafio. Perguntei: quem é Moisés Sbardelotto, professor da PUC Minas? E então ele respondeu que é professor da PUC Minas, algo não tão difícil de afirmar, já que estava indicado na pergunta, e continuava a resposta explicando o que é a PUC Minas. Mas, depois, o sistema "alucina" - isto é, inventa informações aleatórias.

Ele diz que sou bacharel em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Catarina, o que não é verdade. Segue dizendo que sou mestre e doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o que também não é verdade. Depois, diz que sou autor de artigos e livros da área de filosofia, errando o alvo novamente. Ele acerta ao afirmar que tenho colaborações com a revista eletrônica IHU On-Line, mas erra de novo ao dizer que sou colaborador da Revista Cult - nunca publiquei nenhum texto nessa publicação. Também diz que eu sou conhecido pela defesa dos direitos humanos. É claro, sem dúvida, essa é uma pauta relevante na minha vida, mas acredito que eu não seja reconhecido publicamente por isso.

Fiz essa introdução em um tom quase de brincadeira, pois ela me permite trazer à tona algumas questões mais sérias e relevantes, que aparecerão depois sobre o aspecto da "inteligência". Ou seja, afinal, de que inteligência estamos falando?

IA e a construção de imagens

Uma outra produção da inteligência artificial que circulou bastante, e que tem a ver diretamente com a Igreja, são estas fotos e imagens do Papa Francisco. Tudo começou pela foto da esquerda, a maior, que inicialmente gerou dúvidas: será que o Papa Francisco realmente usou essa jaqueta bastante chamativa? E, depois, começaram a circular as outras fotos. As pessoas aproveitaram para entrar na onda e fazer outros tipos de apropriação da imagem do papa.

As imagens não correspondem a fatos verídicos, mas revelam um risco, porque são fotos bastante reais. Mesmo sabendo que o fato não ocorreu, a qualidade da imagem, de certa forma, é uma amostra de um realismo que pode ser usado para outros fins bem diversos.

Criando realidades e vigilâncias

Há outros dois fatos recentes que também têm a ver com as inteligências artificiais e algumas práticas da Igreja. Um deles é uma notícia que veio da Hungria.

Um padre resolveu pedir ao ChatGPT que gerasse uma homilia e, na Celebração Eucarística, ele leu o texto sem informar que havia sido produzido pela inteligência artificial. E nenhum fiel se deu conta, nenhum fiel reclamou. Depois ele revelou isso publicamente, e, obviamente, gerou um debate, levantando questões como: até que ponto isso seria pertinente, no mínimo, para um presbítero da Igreja Católica em plena celebração litúrgica?

O outro caso, mais grave, diz respeito a um grupo vinculado ao catolicismo (ou pelo menos autointitulado católico) que produziu um sistema que rastreia dados com a ajuda de inteligência artificial em aplicativos de relacionamento. O objetivo era investigar possíveis padres que estivessem usando esses aplicativos, particularmente padres homossexuais. Então, eles desenvolveram uma tecnologia de rastreamento, via inteligência artificial, para "pegar no flagra" padres que estariam cometendo algum tipo de pecado, na opinião desse grupo.

Outros usos da IA

Assim, podemos ver usos atuais da inteligência artificial que já estão ocorrendo hoje, seja em um nível mais folclórico e pitoresco, mas também em outros níveis bastante relevantes – e até preocupantes. Sem contar uma série de outros fenômenos ligados à inteligência artificial e que já fazem parte da vida da Igreja, entendendo-a aqui como o conjunto de fiéis que vive a fé católica e também como as diversas instituições ligadas ao catolicismo.

Do ponto de vista da medicina, em hospitais e instituições de saúde vinculados à própria Igreja, vemos que a inteligência artificial já se faz presente no diagnóstico, na prevenção, no tratamento e no acompanhamento dos doentes, por meio de sistemas que auxiliam no combate a determinadas doenças, assim como de robôs que oferecem um certo cuidado personalizado aos pacientes. Há também usos diversos na educação, seja nas salas de aulas escolares, seja na pesquisa em universidades. Além disso, temos o próprio uso do ChatGPT, como demonstrei, no nosso dia a dia e as consequências que isso pode trazer para o âmbito da fé.

Nessa imagem, vemos a sigla Gamam. São as cinco grandes empresas que praticamente controlam todo o mercado digital: Google, Apple, Meta, Amazon e Microsoft, que também controlam os dados das pessoas que usam essas plataformas, por meio de suas inteligências artificiais. Portanto, também têm uma afetação direta na vida da Igreja, no cotidiano de todos os cristãos e cristãs.

E, por fim, existem as preocupações que estão presentes de modo significativo no magistério social da Igreja, como a questão da paz. Já existem diversas aplicações de inteligência artificial em robôs. Uma delas é o uso da robótica para o desenvolvimento de armas letais autônomas, nas quais, em nenhum momento do processo de ataque, um ser humano precisa intervir. Ele tem apenas que configurar um desses minitanques, como o exibido na imagem, e soltá-lo no campo de batalha. A partir daí, o pequeno tanque vai assumir por conta própria quem deve matar ou quem deve manter vivo. Essas armas letais autônomas estão gerando um grande debate: até que ponto isso é lícito, ético, moral? - se é que podemos usar tais adjetivos em um contexto de guerra.

Inteligência? Que inteligência?

Portanto, não precisamos esperar por um futuro distante. Há muitos usos da inteligência artificial que já vêm afetando o nosso cotidiano. Daí a pergunta: de que inteligência estamos falando, afinal?

Parto de algumas interpretações possíveis, porque, em primeiro lugar, quando falamos de inteligência artificial, logo nos vem à mente o ChatGPT ou outros aplicativos pautados por uma inteligência lógico-matemática. Assim, acabamos simplificando o conceito de inteligência a um único ponto de vista, que é o lógico-matemático. Mas, se tomarmos os estudos do Howard Gardner e de outros psicólogos, veremos que o ser humano têm múltiplas inteligências. Há a inteligência interpessoal, a intrapessoal, a corporal, a espacial, a musical, a linguística - à qual o ChatGPT até se aproxima um pouco - dentre outras.

Enfim, podemos estar simplificando um pouco essa riqueza do ser humano quando chamamos esses processos de inteligência. Sem dúvida, eles manifestam aspectos que se assemelham à inteligência humana, simulando-a. Mas até que ponto isso é inteligência ou não?

O Papa Francisco também fala da inteligência da cabeça, das mãos e do coração, que precisam estar intimamente ligadas. É uma inteligência complexa, não apenas sob um único ponto de vista.

Depois, dentro dessa mesma linha, manifesta-se nas inteligências artificiais uma inteligência pautada pela razão. Mas uma razão novamente lógico-matemática, uma inteligência racional, em que o cérebro ocupa o papel principal. Novamente, perde-se de vista a relação entre cérebro, mente, corpo e espírito. Ou seja, o valor e a dignidade do ser humano vão muito além de seu cérebro.

É, depois, uma compreensão iluminista da inteligência, porque percebemos no debate sobre inteligência artificial um foco muito grande na liberdade e na privacidade dos usuários. Tivemos esse recente caso envolvendo os ataques das escolas e a solicitação dos órgãos públicos para que o Twitter colaborasse no controle e na fiscalização das pessoas que emitem esse tipo de informação falaciosa sobre possíveis ataques. Mas o Twitter disse que a tarefa solicitada não está contemplada em seus termos de uso, porque estes justamente defendem a liberdade e a privacidade do usuário. É uma perspectiva iluminista porque defende valores como a liberdade e a privacidade, deixando de lado outros valores igualmente importantes, como a solidariedade e a justiça nas inter-relações sociais.

No debate sobre inteligência artificial, também se manifesta uma perspectiva muito futurista. Tivemos recentemente essa carta de grandes nomes da ciência chamando a atenção para os riscos futuros que a humanidade pode ter com a inteligência artificial. É uma perspectiva que vários estudiosos chamam de “longo-prazista”, como se a preocupação em relação à inteligência artificial envolvesse problemáticas de longo prazo.

Com isso, acabamos perdendo de vista aquilo que já está acontecendo aqui e agora. Essa perspectiva longo-prazista é enfatizada por pessoas que até assinaram aquela carta, como Elon Musk, dono da Tesla e agora também do Twitter. Ele assina a carta preocupado e horrorizado com os perigos da inteligência artificial no futuro, mas, aqui no Brasil de hoje, ele não consegue tomar nenhuma atitude para resolver a grave problemática da violência contra as escolas e da disseminação de falsas ameaças em sua plataforma digital. Ou seja, os riscos da inteligência artificial já estão presentes

Há também uma perspectiva muito funcionalista, como se a única questão fosse: para que serve a inteligência artificial? A única questão seria essa, como se o critério de avaliação ética da inteligência artificial fossem seus fins práticos. Pensando assim, perdemos de vista todo o restante, e podemos acabar justificando os meios, levando em conta apenas as finalidades imediatas e, em geral, em vista do lucro.

Limites do artificial

Por outro lado, falamos que essa inteligência é artificial, mas até que ponto? Podemos chamar essa inteligência de artificial?

Primeiro, há o risco de cairmos em uma perspectiva muito tecnicista, em que - por ser uma inteligência artificial que, portanto, difere da inteligência humana, e é mais poderosa, mais rápida, mais complexa do que a inteligência humana - o ser humano estaria sendo necessariamente determinado por essa inteligência. Acabamos lendo a própria presença do ser humano como uma mera peça dentro desse processo. Perdemos de vista a autonomia do ser humano frente a essa inteligência e o papel da cultura, dos grupos, dos coletivos, da sociedade, da capacidade de invenção social sobre as inovações tecnológicas.

Observe-se que, querendo ou não, a inteligência que criou isso, que nós chamamos de inteligência artificial, é a do próprio ser humano e que, portanto, é consideravelmente maior do que a inteligência artificial. Então, o risco de cairmos nesse tecnicismo é que acabemos crendo que não há saída possível e que a técnica acabará nos dominando. Porém, ao longo da história, sabemos que isso nem sempre foi necessariamente verdade. Basta revisitar os temores de certos futurólogos frente à invenção da escrita, do livro impresso, do computador pessoal, da internet e assim por diante.

Esse ponto de vista tecnicista também pode nos levar a uma leitura neoludista, que diz respeito ao ludismo clássico da Revolução Industrial, em que as pessoas literalmente destruíam as máquinas industriais, porque estas estariam tirando seus empregos e atrapalhando a vida social. Também nós vemos um pouco isso em manifestações que afirmam: “Acabemos com essas máquinas, acabemos com a inteligência artificial, ela só vai gerar problemas”. Há um certo dualismo que não percebe que, ao longo de toda a história humana, o ser humano viveu intimamente relacionado com tecnologias. Alguns autores dizem: só há humano porque existem tecnologias. Essa dupla hélice - a convergência estreita entre humano e tecnologia - é fundamental para entender como chegamos a este período contemporâneo de inteligência artificial.

Riscos do antropocentrismo

No outro lado da moeda, o risco é cair em uma leitura antropocêntrica, assumindo que o ser humano é o centro de todos os processos tecnológicos e, portanto, controla tudo. Só que isso não é verdade. Vários desses processos de inteligência artificial podem escapar do controle humano, ou seja, podemos perder de vista a agência, a capacidade de ação dessa inteligência artificial.

E isso não no sentido de que ela vai assumir o controle dos processos (em uma suposta antropomorfização da tecnologia, como na ficção-científica), mas no sentido de que ela já está afetando a vida social, já está agindo sobre a nossa realidade hoje (em uma tecnicização acelerada do ser humano e da vida social). Voltemos aqui ao exemplo do Twitter. É uma inteligência artificial que, por não ser controlada pelo ser humano, já está afetando a vida social, inclusive do ponto de vista da violência e da segurança pública.

Quando colocamos o ser humano totalmente no centro, como se fosse o senhor de todos esses processos, acabamos perdendo de vista o que estes sistemas nos fazem fazer. Não se trata só do que eles fazem, mas do que eles nos fazem fazer ou até o que nos fazem sentir: por exemplo nesse caso da violência e do ódio em rede, e nos modos como tais plataformas nos fazem agir, sob um certo condicionamento também da própria sociedade.

Virtualismo e seus riscos

Uma última leitura da inteligência artificial é aquela que eu chamo de “virtualista”. Quando falamos de inteligência artificial, muitas vezes entendemos como algo que é totalmente imaterial. Só que, também do ponto de vista ambiental e ecológico, existe muita materialidade em jogo para que esses sistemas funcionem. A pegada ecológica dessas máquinas é gigantesca. Este é um tema que veremos mais adiante, também do ponto de vista da reflexão eclesial, ou seja, a relação do avanço tecnológico com a destruição do planeta.

As inteligências artificiais demandam gigantescos bancos de dados que ocupam muito espaço físico, muitos fios, muitos cabos, muito silício, muito metal. Em 2012, havia 500 mil centros de processamento de dados no mundo. Em 2019, já eram mais de 8 milhões deles. O maior desses centros de processamento de dados, localizado em Hong Kong, ocupa 715 mil metros quadrados. É o equivalente a praticamente cinco estádios de futebol de pura alvenaria, cheio de máquinas para processar essa quantidade enorme de dados.

Sem contar todo o consumo de energia. Sabemos que nosso computador em casa consome energia e esquenta. Então, precisamos de energia tanto para alimentar a máquina quanto para resfriá-la. Então, imaginemos uma área de 715 mil metros quadrados cheio de máquinas a serem alimentadas e resfriadas, consumindo energia por horas a fio. Qual será esse consumo? Já se fala que todo o sistema digital, desde a produção de máquinas até o uso de internet, é o sistema mais poluidor do sistema industrial, ultrapassando até o setor de aviação, que era considerado o mais poluente até então. Aqui está o risco de cair nessa leitura virtualista, que perde de vista todas as materialidades em jogo.

O pensamento da Igreja sobre o desenvolvimento tecnológico

A partir dessa releitura de um panorama amplo em torno da inteligência artificial, podemos agora buscar entender como a Igreja vem pensando especificamente essa evolução tecnológica. 

Para entender como a Igreja foi evoluindo em seu pensamento tecnológico, José Marques de Melo (1943-2018) publicou um livro acerca da "Comunicação eclesial: utopia e realidade", para perceber como o magistério católico foi lidando com a evolução especificamente dos meios de comunicação. Estamos falando de uma tecnologia - a inteligência artificial - que vai além dos meios de comunicação, mas acredito que esses grandes marcos destacados por Marques de Melo valem também para entendermos como a Igreja vem se posicionando hoje em relação à inteligência artificial.

Marques de Melo observa que, no início da Idade Moderna e fim da Idade Média, com a invenção da imprensa – e talvez nesse caldo possamos colocar também todo o desenvolvimento ciência, da astrofísica, no período de Galileu até chegar a Gutenberg – o posicionamento da Igreja era muito forte no sentido da censura e da repressão a tudo que dissesse respeito à evolução tecnológica, particularmente do ponto de vista da comunicação, como a imprensa da época.

Como o surgimento do rádio e do cinema, no pré-Concílio, já se tem uma aceitação maior. Mas, ainda desconfiada com os riscos e os perigos que esses meios podiam trazer para a vida social.

No período do Concílio Vaticano II, podemos citar o decreto Inter mirifica, um dos 16 documentos magisteriais aprovados no Concílio. Ela aborda os meios de comunicação social e, no próprio título – "Entre as maravilhosas invenções da técnica” –, já revela que começava um período de deslumbramento ingênuo, como afirma Marques de Mello. E a televisão em cores aprofundou essa leitura. É um deslumbramento ingênuo com as possibilidades que os meios de comunicação traziam à tona.

E, com a evolução da digitalização, a Igreja, de certa forma, retoma uma perspectiva crítica, agora equilibrada. Marques de Melo chama esse período de "avaliação crítica", em que a Igreja percebe que o desenvolvimento tecnológico é importante, mas que também tem consequências que podem ser prejudiciais.

Acredito que ainda nos encontramos nesse período, em que essa avaliação crítica, às vezes, reforça os tons mais escuros, trazendo mais à tona as problemáticas. No entanto, a Igreja, sem dúvida, também reconhece as potencialidades que, especificamente, a inteligência artificial pode trazer para a sociedade.

Doutrina social da Igreja

Destaco três grandes documentos que nos ajudarão a entender isso. Primeiro, é o Compêndio da Doutrina Social da Igreja, que faz uma síntese de tudo o que a Igreja pensa do ponto de vista do desenvolvimento técnico e tecnológico, partindo principalmente dos documentos do Vaticano II.

A Igreja reconhece que esses resultados são positivos, que são sinais e consequências da própria grandeza divina, do ser humano como continuador da própria criação. O desafio é que essa atividade humana, na leitura eclesial, sempre deve corresponder ao desígnio de Deus, ao bem da humanidade.

A Igreja resguarda esse aspecto ético de que o desenvolvimento tecnológico é importante, é um reflexo da grandeza divina, mas precisa seguir o desígnio divino de bondade e amor em relação à humanidade. O citado Compêndio reconhece que, quanto mais poder, mais responsabilidade, tanto individual quanto coletiva, para que esse poder não se totalize sobre outras pessoas, grupos e sociedades.

Fundamental no Compêndio é a ideia de “reta aplicação”, pois se reconhece que a técnica não é neutra. Ela nem boa nem necessariamente má, mas também não é neutra e, portanto, precisa ser retamente aplicada pelo ser humano. Nesse sentido, o Compêndio afirma que “é preciso manter uma atitude de prudência e examinar com olhos atentos todo esse desenvolvimento tecnológico” (n. 458).

Outro aspecto que o Compêndio ressalta é que “o ponto de referência central para toda aplicação científica e técnica é o respeito ao ser humano”. Mas o próprio documento reconhece que esse respeito “também deve se estender para as demais criaturas viventes”. Por quê? “Porque o ser humano não deve dispor arbitrariamente da Terra, porque quando ele se comporta assim, o ser humano acaba se substituindo a Deus e, desse modo, acaba por provocar a revolta da natureza”. São aspectos que Francisco também destaca na Laudato si’.

IA e doutrina social

O Compêndio sintetiza o ensino social da Igreja em cinco princípios. Podemos fazer uma rápida reflexão sobre como a inteligência artificial pode ser compreendida a partir desses cinco princípios.

O primeiro é a dignidade da pessoa humana. Sabemos que, muitas vezes, nessas inteligências artificiais, como no exemplo dos padres sob investigação no uso dos aplicativos de relacionamento, uma questão fundamental é a privacidade e a segurança dos nossos dados. As empresas de tecnologia da informação precisam de enormes bancos de dados para o funcionamento de seus sistemas de inteligência artificial, e esses dados muitas vezes são pessoais, são produzidos por cada um de nós. Para resguardar a nossa dignidade, é fundamental que nossa privacidade e a segurança sobre os nossos dados sejam efetivas.

Um segundo princípio é a ideia de bem comum. Não só dos seres humanos, mas também da Casa Comum como um todo, como afirma Francisco. Pensando especificamente no ser humano, percebemos que estamos vivendo um período de "capitalismo de vigilância", como afirma Shoshana Zuboff. Ou seja, essas empresas precisam de dados e, portanto, lucram com esses nossos dados. Isso faz parte do processo capitalista contemporâneo. Assim, quando nossos dados pessoais estão sendo usados para gerar lucros para poucos conglomerados ou poucas grandes empresas, a ideia de bem comum acaba sofrendo muitos reveses. E isso também do ponto de vista ambiental, pois, como o foco dessas empresas muitas vezes está apenas no lucro, não interessa nem importa a origem de seus recursos, sejam eles tecnológicos ou energéticos, para manter em funcionamento todos esses sistemas.

Além disso, a doutrina social católica defende o destino universal dos bens. Os bens da Criação devem ser acessíveis para todos e todas, seu destino é universal. Como pensar isso dentro de um cenário digital fortemente marcado por poucos "gigantes", como as empresas da sigla Gamam, mais algumas do ponto de vista da China e do Oriente, que controlam praticamente todo o cenário digital global? Como falar em destino universal dos bens, quando essas poucas empresas controlam todo o mercado e praticamente toda a circulação de informações do planeta?

Há também a ideia de subsidiariedade. Como falar de subsidiariedade quando vivemos um período de "colonialismo de dados", minerados em plataformas digitais com pouquíssimos controles externos, como estamos vendo nos atuais debates aqui no Brasil em torno da transparência e da responsabilidade na internet? Grandes empresas do Hemisfério Norte colonializam e mineram dados que vêm do mundo inteiro, sem muito respeito pelas questões de privacidade e segurança. Sem falar na soberania digital: como o Estado brasileiro defende seus dados para que não sejam utilizados por outros países? E isso não só do ponto de vista geopolítico da nação brasileira, mas também da vida concreta de seus cidadãos: nossos dados são enviados constantemente para os Estados Unidos, para poucos países da Europa, para a China, e são rentabilizados principalmente por empresas locais desses países e regiões.

E, depois, como falar de solidariedade - o quinto princípio do ensino social católico - quando sabemos que todo esse processo acaba se restringindo a uma pequena parcela da população mundial que tem acesso a tais tecnologias - embora tenha até crescido numericamente aos poucos ao longo dos últimos anos? Ainda há uma enorme parcela da população mundial excluída por não ter acesso logístico ou financeiro ao maquinário digital e seus sistemas ou por não estar letrado e alfabetizado para usar as linguagens digitais. Aqui já se percebem questões fundamentais que aparecerão em seguida em outros documentos da Igreja.

Caritas in veritate

Um segundo documento fundamental nesse período mais recente em que todo esse processo de digitalização foi avançando é a Caritas in veritate, de Bento XVI.

Esse documento reconhece a técnica como um dado profundamente humano. Isso é importante, pois significa que a Igreja reconhece que o ser humano é fundamentalmente tecnológico, e a técnica é fundamentalmente humana. Segundo Bento XVI, a técnica expressa a autonomia e a liberdade do ser humano. O desenvolvimento tecnológico, quando retamente aplicado, expressa essa autonomia e liberdade do ser humano.

O Papa Bento XVI diz que na técnica o ser humano não só reconhece a si mesmo, mas também realiza a própria humanidade. É interessante perceber que a própria ideia de "humano" também vai sendo atualizada ou passando por processos de evolução, pelo próprio desenvolvimento tecnológico. O ser humano, em 2023, certamente não é o mesmo de 1980, de 1500, da época de Cristo. Vários aspectos da humanidade vão sendo revelados a partir dessa relação com a tecnologia, porque é a partir dela que reconhecemos aspectos que talvez não estavam identificados até então.

No entanto, é preciso considerar as emergências, aquilo que não é apenas efeito de uma causa, mas emerge do processo como novidade. Bento XVI aponta que, por causa disso, é preciso superar uma visão materialista e entrever um “mais além” que a técnica não pode dar. A técnica é fundamental para entender o ser humano, é claro, porém ela não é a única explicação do ser humano. Existe um “mais além”, que justamente vai além da técnica. Além disso, por ser ambivalente, a técnica apresenta o risco de visões utópicas e ideológicas.

É a chamada "ideologia tecnocrática", que já aparece nessa encíclica de Bento XVI, ao resgatar o pensamento do Papa Paulo VI. Trata-se de visões utópicas e ideológicas tanto para os que apostam tudo na tecnologia quanto para os que defendem que devemos voltar ao passado, para outros períodos históricos, freando, de certa forma, o próprio desenvolvimento tecnológico.

É justamente aquilo que Bento XVI diz no número 14 da Caritas in veritate. Assumir o progresso técnico como um ídolo, como um deus, e absolutizá-lo ideologicamente é um grande risco, pois tira do ser humano a responsabilidade frente às consequências disso, colocando-a na própria técnica. É a postura que Umberto Eco chamaria de "integrada" [cf. "Apocalípticos e integrados" (Perspectiva, 2008)], isto é, a postura daqueles que apostam tudo no desenvolvimento da tecnologia. Os "apocalípticos", seguindo a nomenclatura de Eco, são aqueles que querem voltar a um estado originário da natureza, a um "Éden" perdido. Só que, ao fazerem isso, igualmente deixam de lado sua responsabilidade, sua apreciação moral.

Se o progresso técnico é um absoluto, então o ser humano pode se lavar as mãos, porque quem manda no processo é a própria técnica, desvinculada da dimensão sociocultural. E se, pelo contrário, o ser humano quer retornar para um passado que já não é mais acessível, ele também pode se lavar as mãos e se isentar de sua responsabilidade no presente, naquilo que já ocorre no desenvolvimento tecnológico. Por isso, considero que esse é um número fundamental para a reflexão que a Igreja propõe.

Apreciação moral e ética

E depois temos este outro parágrafo da Caritas in veritate que é muito importante [que reproduzimos abaixo em imagem].

É como uma tradução do parágrafo anterior: preocupar-se apenas com o como fazer. É uma visão funcionalista e instrumentalista do processo tecnológico, que não se pergunta sobre os porquês, as razões, as motivações, os princípios, os valores a partir dos quais se quer que o desenvolvimento tecnológico ocorra. Ou seja, Bento XVI enfatiza a importância de uma apreciação moral e também ética desse desenvolvimento tecnológico.

Laudato si’

E o Papa Francisco, com a Laudato si’, novamente faz um elogio da tecnologia como uma expressão de criatividade e beleza, mas faz também uma crítica a partir dos riscos de um poder excessivo, a ponto de se tornar domínio, dominação.

A preocupação do papa é sobre em que mãos vai recair esse poder e esse domínio. Observamos o risco de tudo ficar apenas em uma parte pequena da humanidade, que terá um poder e um domínio muito grandes sobre todo o restante da humanidade. Francisco segue dizendo que, ao longo deste último tempo, pela velocidade dos processos - aquilo que ele chama também de “rapidação” -, o desenvolvimento tecnológico não foi acompanhado por um desenvolvimento na mesma velocidade do ponto de vista da consciência, da ética, da espiritualidade do ser humano.

O Papa Francisco também fala [na imagem acima] da "globalização do paradigma tecnocrático", em que o sujeito vai sendo ressignificado a partir de um processo lógico-racional e, portanto, deixando de lado outros aspectos fundamentais do ser humano. Nesse paradigma, a técnica se expressa como posse, domínio e transformação de algo que estaria "fora", como mero objeto do sujeito, como uma realidade informe, totalmente disponível para manipulação.

Do ponto de vista das grandes empresas de tecnologia, muitas vezes é isso mesmo: a sociedade, os dados da sociedade, as informações sobre as nossas vidas, as nossas buscas, os nossos interesses, os nossos gostos, tudo acaba sendo uma mera realidade informe que as empresas manipulam para seus fins, e fins muitas vezes de lucro. Isso, é claro, sem respeito à dignidade, à privacidade, à segurança de todos esses elementos que dizem respeito a nós, mas também às nossas sociedades, à nossa cultura, aos nossos países.

Esse é o paradigma tecnocrático, que também diz muito a respeito do desenvolvimento das inteligências artificiais.

Depois, há ainda aquilo Papa Francisco chama de "ruído dispersivo da informação". Por exemplo, o próprio ChatGPT, que bebe de gigantescos bancos de dados e que produz informações constantemente – qualquer coisa que jogamos lá, ele responde, mesmo que seja mentira, como mostrei no início; ele está programado e obrigado a oferecer respostas, por mais estapafúrdias e "alucinatórias" que sejam. O resultado disso pode ser aquilo que Francisco chama de "poluição mental".

É o risco de uma mera acumulação de dados, que vai gerando essa poluição mental, esquecendo que a verdadeira sabedoria é fruto da reflexão, do diálogo, do encontro generoso entre as pessoas. Assim, muitas vezes acabamos dependendo das tecnologias e perdendo de vista essas outras fontes de sabedoria e inteligência que também são fundamentais, não só para o desenvolvimento social, mas também pessoal de cada um de nós.

Sinergias e compromissos assumidos no cenário de IA

A partir desse panorama, chegamos em algumas sinergias, alguns compromissos que a Igreja foi assumindo a partir dessa perspectiva mais geral e, agora, especificamente com a inteligência artificial. Isso de que tratei aqui a partir do ensino social da Igreja é um panorama geral sobre toda tecnologia, sobre quaisquer tecnologias, mas a Igreja também propõe um debate e uma reflexão específicos sobre o desafio da inteligência artificial.

A partir disso, é importante fazer memória de uma figura fundamental nesse debate [imagem abaixo], mas que muitas vezes acaba sendo esquecida: trata-se de um jesuíta, o italiano Roberto Busa, considerado o inventor do hipertexto. Não só o hipertexto relativo aos links sobre os quais clicamos nos sites da internet, mas sim a ideia de um texto (ou de um conjunto de textos interconectados) que alcança uma dimensão "hiper".

Logo após defender sua tese doutoral na década de 1940 – seu doutorado foi sobre a obra magna de São Tomás de Aquino –, Busa teve o interesse de estudar as inter-referências em toda a obra de Tomás de Aquino. Ele estava interessado em analisar como certos termos teológicos apareciam nos diversos textos de São Tomás. Ele se questionava: em que contextos um determinado conceito aparece nesses vários textos?

Por isso, no auge da evolução da informática à época, ele viajou aos Estados Unidos para visitar a IBM. Conseguiu conversar com os diretores da empresa para propor o desenvolvimento de um sistema que pudesse fazer a indexação de textos. Ou seja, o início da digitalização de textos e da indexação de palavras começa a partir da ideia genial de Roberto Busa. Até então, os computadores trabalhavam com números; eram grandes máquinas de calcular números. Foi então, a partir da genialidade desse jesuíta, que, de certa forma, os computadores começaram a calcular palavras. É o que chegará até hoje na ideia do próprio ChatGPT, que é uma grande "calculadora de palavras", que nos responde a partir das probabilidades em torno dos termos já indexados nos enormes bancos de dados de onde ele retira essas informações.

A partir desse cálculo informatizado de palavras, surgiu o Index Thomisticus, o grande processo de digitalização e indexação de toda a opera omnia de São Tomás de Aquino e de alguns outros textos que comentam a obra, em um processo que se estendeu de 1949 até 1980. Esse religioso é uma figura fundamental para entendermos o desenvolvimento que está no centro da interface Igreja e inteligência artificial.

Roboética

Também destaco dois eventos recentes [seus banners estão reproduzidos na imagem abaixo], que foram promovidos pela Igreja por meio da Pontifícia Academia para a Vida, na figura de Dom Vincenzo Paglia. O tema da assembleia plenária, em 2019, girou em torno da “roboética”, ou seja, não só a robótica, mas também de uma ética para o desenvolvimento da robótica. De modo mais específico, foi debatida a relação entre os humanos, as máquinas e a saúde, que, aliás, é um campo onde esses processos já vão avançando enormemente, como comentei antes.

Já em 2020, pouco antes da eclosão da pandemia, outra assembleia plenária da Pontifícia Academia debateu a questão dos algoritmos. É possível um bom algoritmo? E, na ocasião, o tema foi a relação entre inteligência artificial, ética, direito e saúde.
Esses dois grandes eventos contaram com a participação do Papa Francisco, seja presencialmente, seja com um discurso enviado para as reflexões. Trago aqui alguns pontos centrais dessas participações papais, porque eles mostram como a Igreja vem pensando, a partir do Papa Francisco e de seu protagonismo nesse debate, essas questões.

Primeiramente, em seus dois discursos, Francisco destacou alguns riscos e desvios nesse processo de desenvolvimento da robótica e da inteligência artificial. Um deles é que existe um grave paradoxo entre as capacidades da ciência e da tecnologia contemporânea e, ao mesmo tempo, o aumento dos conflitos e das desigualdades. Há uma enorme lacuna aí, e isso é um paradoxo, pois como é que um ser humano consegue alcançar um grande desenvolvimento técnico-científico em diversos aspectos da vida humana, mas, ao mesmo tempo, não é capaz de (ou não quer?) resolver e conter o aumento dos conflitos e das desigualdades sociais?

Depois, o papa destaca a questão do paradigma tecnocrático: a ideia de um poder-fazer que pode obscurecer o sujeito que faz e para quem se faz. Aqui, nesse "sujeito", podemos incluir não só os humanos, mas também todas as outras criaturas viventes que sofrem os efeitos desse paradigma.

Humano tecnologizado

Afinal, quem faz esses processos? Quem é o sujeito? Às vezes, perdemos de vista que esses sistemas e essas máquinas não "caíram do céu", mas existem como fruto da criatividade e da imaginação do ser humano, de pessoas que os pensaram. Mas os pensaram a partir de quais princípios, de quais valores, de quais interesses? E para quem os fizeram? Com quais fins e interesses? Com quais objetivos? Com quais custos? E para quem? Pergunto essas coisas tanto do ponto de vista humano quanto do ponto de vista do planeta como um todo.

O Papa Francisco diz que já é real o risco de que o ser humano seja tecnologizado, ao invés de a técnica ser humanizada. Nesse ponto, ainda aparece um certo dualismo entre o humano e a técnica. Apesar disso, o que o pontífice quer destacar é justamente que, embora haja uma dualidade, existe aí também uma interface possível, que precisa ser pensada e elaborada em convergência e sinergia. Caso contrário, será apenas uma das facetas desse processo que terá a predominância, ou seja, o âmbito tecnológico, escanteando outros aspectos relevantes que compõem e moldam o humano e a realidade.

Capitalismo de dados

Depois, há uma outra série de riscos e desvios aos quais o papa aponta e que já vivemos hoje. Por exemplo, a redução dos usuários a meros consumidores subordinados a interesses privados concentrados nas mãos de poucos, a ideia de um capitalismo de vigilância, um capitalismo de dados, um colonialismo de dados a serem minerados por essas empresas, coletados, elaborados, processados para que possam gerar lucro. Nesse processo, corremos o risco de ser apenas elementos de uma máquina de geração de dados e informações.

Essa extração de dados ocorre tanto para fins comerciais quanto políticos e econômicos, e, muitas vezes, sem o nosso conhecimento e consentimento. Novamente, aparece aqui a ideia da privacidade e da segurança sobre os nossos dados que disponibilizamos nas redes digitais ou em outras plataformas específicas, como o próprio ChatGPT. Para onde vão esses dados? O que é feito com nossas fotos, nossos vídeos, nossas curtidas, nossos comentários, nossos documentos que subimos para essas plataformas?

O papa também aponta para um aumento das desigualdades devido à acumulação do conhecimento e da riqueza em poucas mãos. Essas "mãos" são principalmente as da Gamam, aquelas cinco empresas que dominam boa parte do mercado digital, aumentando as desigualdades e gerando pobreza, seja na extração mineral, para poder construir todo o maquinário necessário e mantê-lo em funcionamento, seja do ponto de vista simbólico-cultural, a partir justamente da extração de dados para usos que nós não controlamos.

É a assimetria digital para a qual Francisco chama atenção, em que poucos sabem tudo sobre nós, enquanto nós não sabemos nada sobre eles. Essas empresas sabem muitas coisas sobre nós, mas o que nós sabemos sobre elas, sobre o funcionamento dessas plataformas, sobre o funcionamento do ChatGPT, por exemplo? Quais bancos de dados ele utiliza? De onde tira as informações? A partir de que biblioteca ele gera essas respostas?

E, depois, o entorpecimento do pensamento crítico e do exercício consciente da liberdade, a partir dessa sobrecarga de informações. Com isso, o pensamento crítico e o exercício consciente da liberdade podem ficar entorpecidos, em uma “poluição mental”, como o Papa Francisco a define.

Desafios para a Igreja

A partir dessas "sombras" do desenvolvimento tecnológico recente, Francisco também lança alguns desafios para a Igreja. Em seus discursos, percebemos que o papa posiciona a Igreja para poder lidar com essa situação não apenas como um agente passivo dos processos, mas também assumindo um protagonismo nos diversos âmbitos que lhe competem.

O primeiro desafio é ao defender que esses sistemas atuem a serviço da humanidade e da proteção da casa comum. São dois aspectos fundamentais e inter-relacionados. Muitas vezes, o centro da questão ainda acaba sendo o ser humano, correndo o risco de um certo antropocentrismo também do ponto de vista eclesial – embora o Papa Francisco o critique. A ideia central, em suma, é esta: como proteger a vida do planeta dos riscos que o desenvolvimento tecnológico pode gerar?

Depois, a grande questão que emerge a partir desse debate: o que é o ser humano, afinal? Se nós chamamos esses outros sistemas de "inteligentes", então o que é a nossa inteligência? Quem somos nós, que nos consideramos sapiens? Francisco diz que é necessário compreender melhor o significado de inteligência, consciência, emotividade, intencionalidade afetiva e autonomia do agir moral. Neste tempo de inteligências artificiais, o que tudo isso significa? É preciso repensar, é preciso pôr em debate. Isso porque, como diz o papa, muitas vezes “os dispositivos artificiais que simulam capacidades humanas, na realidade, estão privados de qualidade humana”.

Novamente, no discurso, pode-se acabar caindo em um certo antropocentrismo (situando apenas o ser humano como parâmetro do universo), mas, no fundo, o que Francisco quer destacar acerca dessa questão é: o que qualifica o ser humano frente às tecnologias? A partir dessas tecnologias criadas à imagem e semelhança do ser humano, quem é o ser humano? Porque a preocupação do papa, que aparece também na Laudato si’, é a dimensão humana integral, não só cerebral, lógico-matemática, mental, mas a “complexidade da sinergia de psische e techne, a interconexão entre a consciência de si mesmo e do corpo humano”. Se o antropocentrismo situava o ser humano como "medida de todas as coisas", hoje estamos praticamente invertendo a moeda, situando as máquinas como "medida do ser humano": frente a elas, o ser humano não seria tão inteligente assim... Desse modo, nosso diferencial sapiencial, como Homo sapiens sapiens, entra em xeque. Então, volta a pergunta: o que é o ser humano, afinal?

A ênfase do papa na "complexidade da sinergia" entre tudo aquilo que constitui a nossa humanidade é muito relevante nesse debate, pois, muitas vezes, na mentalidade e no imaginário dos indivíduos e dos grupos que produzem essas máquinas (a "religião" do Vale do Silício), há uma ideia do ser humano como puro cérebro, que, como nos desenhos infantis, poderia até ser colocado em uma jarra de formol, a fim de conservar a nossa memória ad aeternum, para que futuramente possa ser "baixada" em um novo corpo sintético incorruptível.

Entre os os grandes diretores das big tech, muitos dos quais assinaram aquela moratória na inteligência artificial, há também defensores da criogenia, do congelamento de corpos humanos, a fim de serem reanimados quando a tecnologia estiver disponível. A ideia é poder realizar o download de todas as informações que estavam no nosso cérebro daqui a algumas centenas ou milhares de anos, quando a tecnologia for capaz de ressuscitar cadáveres, conseguindo novamente reunir mente e corpo.

Tudo isso é uma visão que perde de vista justamente a dimensão humana integral, a complexidade dessa sinergia, de tudo aquilo que nos compõe como pessoas humanas e a interconexão entre corpo, mente e espírito. Somos corpo, mente e espírito, de modo indissociável. A nossa mente está intimamente relacionada com essa integralidade do ser humano. São questões desafiadoras para a Igreja frente ao desenvolvimento da inteligência artificial.

Agir e refletir a partir da fé

Do ponto de vista eclesial, o desafio é agir e refletir a partir da, obviamente.

Os verbos que Francisco utiliza em seus discursos, nesse sentido, são muito interessantes [veja na imagem acima]. Ele diz: “Caminhar juntamente com os outros, escutando atentamente e pondo em relação experiência e reflexão”. Isso para que não ocorra de novo essa ruptura entre o desenvolvimento tecnológico e a reflexão sobre os princípios, os valores e os elementos éticos desse desenvolvimento tecnológico. É significativa essa imagem de uma Igreja que caminha junto com os responsáveis pelo desenvolvimento tecnológico.

Esse caminho envolve, em primeiro lugar, o gesto de se pôr a escutar, tentando entender, sem partir de apriorismos e oferecendo como dom a própria experiência e sabedoria eclesial, para que essas empresas e grupos também possam refletir – e não simplesmente agir – sobre seu próprio “poder-fazer”. Assim, entra em cena aqui a relevância não só do “poder-fazer”, mas principalmente do “saber-fazer”, do “deixar-se interpelar” para que a palavra e a tradição da fé nos ajudem a interpretar os fenômenos do nosso mundo, identificando caminhos de humanização, para que a técnica esteja a serviço do ser humano e da casa comum.

Desafios para a teologia

A partir daí, Francisco lança um desafio especificamente para o campo da teologia.

Ele aponta que é preciso haver uma renovação das disciplinas teológicas, resgatando aquilo que o próprio Concílio Vaticano II solicitou. Muito claramente, ele fala que seria decididamente contrário à tradição genuína da Igreja fixar-se em um aparato conceitual anacrônico, ou seja, tentar entender, refletir e interpretar a inteligência artificial a partir de um aparato conceitual que já não condiz com o presente. É preciso reconhecer as profundas transformações de vários conceitos fundamentais à teologia, por exemplo, natureza, artifício, condicionamento, liberdade, meios, fins; transformações que ocorrem justamente neste período da tecnologia digital.

Determinadas conceituações de natureza já não fazem mais sentido hoje, especialmente quando fica cada vez mais evidente que o próprio ser humano é profundamente tecnológico e, portanto, profundamente "artificial". Basta olhar tudo aquilo que precisamos para viver: quantos artifícios e quantos artefatos! Sem muitos deles, talvez sequer sobreviveríamos, literalmente. E, ainda, a nossa própria inteligência, as artificialidades que compõem a nossa inteligência. Para nos tornarmos pessoas inteligentes, em nossa educação e em nossa formação precisamos de lápis, papel, livros, cadeiras, lousas, toda uma estrutura chamada escola. Quantas artificialidades! Então, o que é inteligência, afinal? O que é artificial? O que é natural? São conceitos que entram em xeque também do ponto de vista da reflexão teológica.

Desafio para a educação

Francisco apresenta ainda um desafio para o campo educacional. Afinal, a Igreja tem um grande papel do ponto de vista pedagógico.

Para Francisco, “a simples educação para o uso correto das novas tecnologias não é suficiente. Não basta saber usar porque elas não são apenas instrumentos e muito menos instrumentos neutros”, elas moldam toda a vida social, os processos culturais, como a questão da violência, como eu dizia lá no início em relação ao Twitter, a questão da paz, do ponto de vista da guerra, a questão da saúde etc. Não é apenas um "bom uso" que vai fazer a diferença.
O papa diz ainda que “há uma necessidade de uma educação, de uma ação educativa mais ampla. Em outras palavras, não basta confiar simplesmente na sensibilidade moral daqueles que fazem as pesquisas e projetam todos esses dispositivos de algoritmos; é preciso, pelo contrário, criar corpos sociais intermediários que garantam a representação da sensibilidade ética dos usuários e dos educadores”.

Então, não basta apenas educar o usuário e nem só o designer, o projetista, o programador dessas tecnologias, embora sejam papéis importantes. A questão precisa ser mais ampla: como a Igreja pode criar esses corpos sociais intermediários? Como a Igreja local, aqui no Brasil ou nas diversas dioceses, nas diversas instituições eclesiais para além da educação direta, pode pensar o desenvolvimento desses corpos sociais intermediários? Ou seja, agentes sociais, instituições, grupos, coletivos, organismos que também façam a diferença no jogo tecnológico. Isso porque o desenvolvimento tecnológico, e assim foi ao longo da história, não é obra unicamente de instituições ou empresas específicas. É obra da sociedade como um todo, por meio dos diversos agentes sociais, em um processo de (re)invenção social da tecnologia. E, portanto, a Igreja tem um papel fundamental também no desenvolvimento dessas tecnologias, nas que já existem, mas também nas que poderão vir a surgir.

Algorética

Nas tensões, nas disputas, nos jogos de poder, nos lobbys, no debate sobre todas essas questões, a Igreja pode ser um desses corpos sociais intermediários, fundamentais para condicionar esse desenvolvimento tecnológico. Talvez ela não consiga agir diretamente sobre a construção efetiva das máquinas contemporâneas nem transformar totalmente o desenvolvimento tecnológico em geral, porque ela é um ator social entre diversos outros que também estão se questionando sobre tudo isso. Mas, sem dúvida, pela sua história, pela sua sabedoria, pela sua capilaridade social, a Igreja tem um papel muito importante a realizar, e isso não só do ponto de vista da Santa Sé, mas também nas várias Igrejas locais, no seu raio de alcance.

E aqui surge a grande proposta de uma algorética. Assim como há a necessidade de uma roboética, do ponto de vista da robótica, um dos elementos centrais que aparecem explicitamente nesses discursos do Papa Francisco é a importância de uma algorética. É, também, um termo que vai aparecer nas obras de Paolo Benanti, frei franciscano italiano, membro da Pontifícia Academia para a Vida.

Benanti tem diversas publicações sobre o assunto, inclusive no próprio site do IHU. Há um livro dele publicado em 2020 pela editora Unisinos [Oráculos: entre ética e governança dos algoritmos], no qual ele propõe o debate sobre uma ética para o desenvolvimento de algoritmos e da inteligência artificial.

O papa resgata esse conceito de algorética e diz que é preciso “repensar todo o processo de elaboração dos dispositivos tecnológicos, da pesquisa até o uso e as responsabilidades de cada competência específica”. Trata-se de repensar o desenvolvimento tecnológico a partir de um ponto de vista ético, desde os desenvolvedores, passando pela distribuição de seus produtos, pelas indústrias que constroem esses maquinários, por todos os agentes que estão no jogo dessas linguagens digitais, até chegar ao nosso uso diário, cotidiano, pessoal e individual.

Francisco afirma que um dos desafios é tornar justamente os princípios da doutrina social da Igreja inscritos nessas tecnologias, mediante um diálogo transdisciplinar eficaz. Um desafio gigantesco: fazer com que aqueles cinco princípios possam também se refletir nas tecnologias que nós usamos, nos usos que delas fazemos e no funcionamento do ecossistema tecnológico como um todo.

Direitos humanos

Um elemento comum de convergência para todo esse campo, que não é necessariamente religioso e muito menos católico, são os direitos humanos. É um elemento que o papa destaca também: os direitos humanos como um fundamento básico, “um ponto de convergência na busca de uma base comum”.

No fim da assembleia plenária da Pontifícia Academia para a Vida em 2020 - cujo tema central foi o bom algoritmo e a inteligência artificial - foi realizado um outro fórum [ver imagem abaixo], chamado de “renAlssance”, que propunha uma inteligência artificial centrada no humano.

Nesse encontro estiveram presentes representantes da Microsoft, da IBM, do Parlamento Europeu, da FAO e do governo italiano. Dom Vincenzo Paglia, da Pontifícia Academia para a Vida, representou a Igreja. O Papa Francisco também acolheu os participantes da assembleia em uma audiência privada.
Pois bem, aqui estava o embrião de um desses corpos sociais intermediários que o papa desafiava a ser construído. A partir daí, surgiu um primeiro fruto concreto, o “Apelo de Roma para uma Ética na Inteligência Artificial”, o “Rome Call for AI Ethics”.
No ano seguinte, como fruto desse apelo, nasceu a Fundação RenAIssance, que tem como objetivo fomentar esse debate. É uma organização sem fins lucrativos e que deseja apoiar justamente a reflexão sobre essas questões, tanto do ponto de vista antropológico quanto do ponto de vista ético, sobre a relação das novas tecnologias e a vida humana.

Essa fundação é um eixo de articulação de eventos, publicações, subsídios científicos e filosóficos, e reflexão junto a outros organismos. Ela tem uma articulação direta com organismos da sociedade civil, Estados, universidades, centros de pesquisa, empresas privadas e públicas, justamente para promover o debate e agir no próprio desenvolvimento dessas inteligências artificiais. É uma ação concreta da Igreja no campo do desenvolvimento tecnológico, para além de sua reflexão.

Em fevereiro de 2023, esse apelo ampliou seu leque de assinaturas, com a convocação de representantes das outras religiões abraâmicas. Com isso, o apelo de Roma por uma ética na inteligência artificial passou a contar também com a assinatura de um representante do islamismo, um dos membros do Conselho de Fatwa dos Emirados Árabes Unidos, um órgão importante do ponto de vista das diretrizes islâmicas, e de um representante do Conselho do Rabinato-Chefe de Israel, um dos principais órgãos do judaísmo no mundo. É outro gesto simbólico e ao mesmo tempo concreto, que também poderá gerar frutos na reflexão e na prática do desenvolvimento tecnológico.

O apelo de Roma

O documento parte de três áreas de impacto da inteligência artificial

O primeiro deles é, do ponto de vista ético, a preocupação de que esses sistemas de inteligência artificial sejam concebidos, projetados e implementados para servir e proteger os seres humanos e o ambiente.

Depois, do ponto de vista da educação, o documento diz que transformar o mundo por meio da inovação da inteligência artificial significa empreender a construção de um futuro para e com as gerações mais jovens, como educação de qualidade também.

Já do ponto de vista dos direitos, o apelo defende que é preciso proteger e resguardar os direitos pessoais e sociais, particularmente dos mais fracos, dos menos privilegiados e do planeta.

Essas são as três grandes áreas. Depois, o documento assume também seis princípios para direcionar o desenvolvimento da inteligência artificial, sob a inspiração de uma algorética.

 
Detalhando os seis princípios:

1) Transparência: os sistemas de inteligência artificial devem ser explicáveis e compreensíveis. Os algoritmos utilizados para o funcionamento do ChatGPT, por exemplo, são totalmente transparentes para o usuário? Nós compreendemos seu funcionamento básico? Eles são explicáveis para nós? É preciso essa transparência.

2) Esses sistemas também precisam ser inclusivos: não podem discriminar, não podem ser tendenciosos nas informações que produzem, porque a dignidade de todos os seres humanos deve ser resguardada. Preconceito, discriminação, violência não podem ser produtos desses sistemas.

3) Responsabilidade: se existe um sistema de inteligência artificial, alguém tem que responder por ele. Um ser humano, uma pessoa, uma instituição. Um sistema de inteligência artificial não pode ser simplesmente jogado no mercado e ninguém assumir suas consequências. É o que está ocorrendo, por exemplo, com a empresa OpenAI, desenvolvedora do ChatGPT, que muitas vezes diz que não controla os processos e não pode assumir as consequências que esse sistema traz.

4) Imparcialidade: os sistemas de inteligência artificial não podem ser tendenciosos do ponto de vista político, do ponto de vista econômico, do ponto de vista cultural.

5) Confiabilidade: os sistemas de inteligência artificial também têm que ser confiáveis. As informações e as respostas que eles oferecem não podem conter fake news, não pode mentir. Por exemplo, não podem dizer que eu, Moisés, sou formado em filosofia, porque isso é uma mentira.

6) Segurança e privacidade: os nossos dados estão seguros? Nossa privacidade está resguardada nesses sistemas? Sabemos, por vários outros escândalos, começando pelo da Cambridge Analytica na eleição do Trump, como essa questão da segurança e da privacidade é ainda muito instável dentro de todo o desenvolvimento tecnológico digital.

Esses são os seis princípios a partir daquelas três áreas que o documento traz ao debate e são fundamentais. É uma contribuição bastante concreta que a Igreja oferece para a reflexão e a prática do desenvolvimento tecnológico recente em torno das inteligências artificiais.

Assista a íntegra da conferência:

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