07 Mai 2021
A virada estava no ar, após o agravamento da crise indiana e a multiplicação das pressões internacionais: os Estados Unidos anunciaram que são a favor da suspensão das patentes das vacinas Covid-19, a fim de acelerar a produção e distribuição de doses em todo o mundo. A mudança de rumo foi anunciada pela representante EUA para o comércio Katherine Tai, que nos últimos dias já havia antecipado a possível abertura da Casa Branca, após meses em que os Estados Unidos permaneceram firmes ao lado das empresas farmacêuticas, desde o início contrárias à hipótese de uma suspensão das proteções à propriedade intelectual.
A reportagem é de Giulia Belardelli, publicada por Huffington Post, 06-05-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
"Trata-se de uma crise de saúde mundial e as circunstâncias extraordinárias da pandemia exigem medidas extraordinárias", disse Tai em um comunicado, afirmando que Washington participará "ativamente" das negociações em andamento na OMC. As ações das principais empresas farmacêuticas que produziram vacinas – entre as quais a Moderna, BionTech e Pfizer - caíram drasticamente depois que se espalhou a notícia da potencial suspensão das patentes.
"O governo acredita firmemente nas proteções à propriedade intelectual, mas, para pôr fim a esta pandemia, apoia o levantamento dessas proteções para as vacinas da Covid-19", destacou Tai, enquanto as discussões estão em curso na Organização Mundial do Comércio sobre o relaxamento das regras comerciais globais para permitir que mais países produzam vacinas para salvar vidas. Tai alertou que demorará algum tempo para chegar ao consenso necessário para revogar as patentes de acordo com as regras da OMC. "O objetivo da administração é fornecer o máximo possível de vacinas seguras e eficazes para o maior número de pessoas, o mais rápido possível", acrescentou a representante do governo dos Estados Unidos. “Agora que nosso suprimento de vacinas para o povo estadunidense está garantido, o governo continuará a intensificar seus esforços - trabalhando com o setor privado e todos os possíveis parceiros - para expandir a produção e distribuição de vacinas. Também trabalhará para aumentar as matérias-primas necessárias para produzir essas vacinas”.
O conselho geral da OMC, formado por embaixadores, está tratando da questão-chave de uma revogação temporária de patentes para vacinas Covid-19 e outros instrumentos, que a África do Sul e a Índia propuseram pela primeira vez em outubro. Um painel da OMC para a propriedade intelectual terá que tratar novamente da proposta em uma reunião preliminar neste mês, antes de uma reunião formal marcada para 8 e 9 de junho.
As regras da Organização Mundial do Comércio, conhecidas como Trips, foram alteradas no passado para permitir que os países produzam um medicamento em um caso de emergência, depois que a Índia e a África do Sul haviam liderado um esforço para revogar as patentes sobre os medicamentos contra a AIDS na década de 1990, que de acordo com as Nações Unidas salvaram dezenas de milhões de vidas nas nações mais pobres. A Organização Mundial da Saúde estabeleceu um pool especial de transferência de tecnologia para as vacinas Covid-19, mas até agora nenhum produtor contribuiu. "O mercado mais uma vez falhou em atender às exigências sanitárias dos países em desenvolvimento", declarou Tai, representante para o comércio dos EUA, em uma conferência sobre a equidade das vacinas no mês passado. “Tempos extraordinários exigem lideranças extraordinárias ... Este desafio também se aplica ao setor”.
Nas últimas semanas, se multiplicaram as pressões sobre Biden por uma virada. Apenas poucas horas atrás, a People's Vaccine Alliance – da qual fazem parte também a Oxfam e a Emergency – havia lançado mais um apelo dirigido aos grandes do mundo para uma suspensão das patentes, sublinhando como a medida é apoiada pela grande maioria dos cidadãos dos países do G7.
Mais de cem membros do Congresso dos Estados Unidos se manifestaram a favor da renúncia dos monopólios. Em uma recente carta a Biden, dez senadores democratas – entre os quais Bernie Sanders e Elizabeth Warren - afirmavam que atrasar a distribuição global da vacina "para blindar as proteções de patentes que geram lucros" é uma "ameaça à segurança dos cidadãos estadunidenses que no primeiro lugar financiaram as vacinas”, uma referência aos enormes recursos públicos com que foi financiada a fase de pesquisa e desenvolvimento.
“Este é um momento monumental na luta contra a Covid-19”: foi assim que o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, saudou a posição dos EUA no Twitter. "O empenho de Joe Biden e da Embaixadora Tai em apoiar a dispensa das proteções das patentes das vacinas é um exemplo poderoso para enfrentar os desafios da saúde global”. “Elogio os EUA por esta decisão histórica para #VaccinEquity, dando prioridade ao bem-estar de todas as pessoas em todos os lugares em um momento crítico. Agora vamos seguir todos juntos rapidamente, em solidariedade, com base na engenhosidade e empenho dos cientistas que produziram as vacinas que salvam vidas”.
Depois de ganhadores do Prêmio Nobel, ex-chefes de Estado e de governo e líderes religiosos, nos últimos dias também foram a campo as celebridades que participaram da gravação de “Vax Live: o concerto para unir o mundo”, que será transmitido no próximo sábado. O evento contou com a presença do Príncipe Harry e do próprio Presidente Biden, que enviou uma mensagem de vídeo gravada junto com sua esposa Jill. A abertura das últimas horas dá ao espetáculo uma nova luz: aquela da consciência de que diante de 3 milhões e 230 mil mortes, compartilhar o máximo possível as vacinas é a única forma de restituir à ciência seu sentido mais elevado, o do servir à humanidade.
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A virada de Joe Biden: sim à suspensão das patentes das vacinas anti-Covid - Instituto Humanitas Unisinos - IHU