Por: Por Ricardo Machado | Edição Patricia Fachin | 23 Janeiro 2017
"Embora Correa tenha resgatado a premissa bolivariana, que abrange a luta pela emancipação conjunta dos povos e um enfrentamento direto aos Estados Unidos (...) seu aclamado socialismo do Século XXI resumiu-se na reconquista da capacidade estatal de absorção dos excedentes”, avalia Elaine Santos, socióloga, ao comentar o mandato de Rafael Correa como presidente do Equador.
Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail, Elaine Santos faz uma retrospectiva das principais políticas do governo Correa e comenta os conflitos em que o então presidente esteve envolvido ao longo dos últimos dez anos, como a exploração do Parque Yasuní. “A iniciativa Yasuní ITT em 2007 foi ousada, pois era uma proposta da sociedade civil que foi retomada pelo governo e consistia em deixar debaixo da terra a reserva petrolífera dos blocos ITT (Ishpingo, Tiputini e Tambococha), cerca de 920 milhões de barris de petróleo, desde que os países centrais seriam corresponsáveis no pagamento dessa não exploração, reconhecendo sua dívida ecológica. Alguns países aderiram, outros alegaram viver um momento de crise para arcar com tal responsabilidade. Tal situação clarificou a falta de compromisso dos demais países com a aclamada e modal questão ambiental. Posto isso, em 2013 o governo voltou atrás e resolveu explorar o bloco petrolífero utilizando a alegação que a exploração era necessária para manter os investimentos em estradas, serviços públicos e educação”, relembra. Por outro lado, critica, “os movimentos indígenas e ecologistas, que defendiam a não exploração do bloco, não apresentaram uma contraproposta concreta como alternativa de desenvolvimento para este país, que possui uma economia pautada no extrativismo e ao se beneficiar da subida dos preços de petróleo, conseguiu viabilizar essa renda em programas sociais importantes”.
No próximo dia 19 de fevereiro, os equatorianos escolherão seu novo presidente e, segundo Elaine, o sucessor de Correa, Lenin Moreno, tem aparecido na frente nas últimas pesquisas. “Ele é o candidato escolhido para suceder Rafael Correa, portanto sua plataforma principal é dar prosseguimento àquilo que alguns denominaram Socialismo do Século XXI, mas que agora já aparece como um conceito um pouco perdido nas brumas”. A socióloga informa ainda que há uma “grande fragmentaçao entre os setores da esquerda” que elegeram Correa e que parte da esquerda descontente aposta no candidato Paco Moncayo, mas ele aparece nas pesquisas com 7% das intenções de votos.
Elaine Santos | Foto: Arquivo Pessoal
Elaine Santos é socióloga, mestre em Energia, Sociedade e Meio Ambiente, pela Universidade Federal do ABC – UFABC e atualmente cursa o doutorado em Sociologia no Centro de Estudos Sociais – CES, na Universidade de Coimbra, em Portugal.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Qual o atual cenário político e econômico no Equador?
Elaine Santos – Não há dúvidas de que Correa foi de longe um dos melhores presidentes que o Equador já teve, garantiu estabilidade política, como afirmou Boaventura de Sousa Santos . Em 10 anos ele derrotou os sharks midiáticos, enfrentou uma tentativa de golpe policial militar, venceu referendos, assembleias constituintes e aprovou uma das Constituições mais bem elaboradas da América Latina, com institutos de democracias participativas internos que também tiveram grande relevância neste processo.
Em 2015, com a queda dos preços de petróleo, o governo sofreu uma forte crise, viu sua receita cair e consequentemente diminuiu os investimentos em políticas sociais. A alta do dólar também prejudicou o país, uma vez que dolarizado desde 2000, quando deixou de ter uma moeda própria, teve problemas na obtenção de novos financiamentos. Atualmente o país vivencia a preocupação com a crise mundial, a incerteza perante um novo governo e a reconstrução de sua área litorânea atingida por um terremoto em 2016.
IHU On-Line – Após dez anos de mandato, qual o legado deixado por Rafael Correa?
Elaine Santos – Acredito que o atual presidente deixará um legado importante para o Equador. Considerando que o país viveu um período de ingovernabilidade muito marcante no período de 1992 a 2006, por exemplo, em que nenhum presidente havia conseguido cumprir seu mandato até o final. Neste sentido, já é histórico que ele tenha se mantido 10 anos no poder.
Em 2006 Correa foi eleito com grande apoio dos movimentos sociais e indigenistas representando a mudança e o alento para este povo que seguiu assolado desde a onda neoliberal da década de 90.
No início do seu mandato (2007) o Equador passou por reformas importantes, entre elas, o estabelecimento de uma nova Constituição aprovada em referendo popular e considerada uma das mais avançadas da América Latina. O texto constitucional se movia no sentido de uma maior intervenção estatal na economia, principalmente no que se referia à exploração dos recursos naturais, bem como alocar o povo, a vida e a sociedade como razão de ser do Estado. Neste sentido o texto aprovado se pauta na Refundação do Estado em termos etnicamente mais justos, na plurinacionalidade (reconhecimento dos povos e suas culturas), no Buen Vivir e no reconhecimento da natureza como um sujeito de direitos. Deste modo, permitiria um desenvolvimento embasado em outro tipo de relação com a natureza, a partir das reivindicações de igualdade e de justiça social.
O grande desafio do presidente durante todos os seus mandatos foi conciliar a Constituição aprovada, alicerçada no respeito ao meio ambiente e aos povos tradicionais, com o desenvolvimento econômico do país. Nesse sentido o presidente realizou uma batalha incisiva na justiça contra a Chevron, denunciando a empresa em relação à contaminação de vasta área amazônica quando explorou petróleo no país (1964-1992). Auditou a dívida pública e constatando inúmeras irregularidades conseguiu reduzir o valor do pagamento, revertendo tais benesses em políticas sociais, fato que melhorou muito os índices sociais e segurou a economia perante o cenário mundial de crise.
Correa modernizou o capitalismo equatoriano, apesar disso não alterou o modelo de acumulação, tampouco criou estruturas para tal. Por outro lado, realizou políticas de cunho social relevantes. Nos últimos oito anos 1,3 milhão de equatorianos saíram da pobreza por meio do consumo (segundo dados do INEC), sete de cada 10 habitantes tiveram acesso à água potável, o PIB (Produto Interno Bruto) aumentou de 1,6 mil para US$ 6 mil e a pobreza que em 1999 atingia 80% da população foi reduzida em 2012 para 30%. O desemprego, que beirava 10% há nove anos, hoje está em torno de 4,6%.
Firmando os objetivos de desenvolvimento do Milênio, também executou uma série de políticas voltadas à transferência de renda às famílias. Ainda que estas sejam políticas voltadas para cumprimento de uma das sanções da Organização das Nações Unidas, iniciada no ano de 2000, para erradicação da pobreza como item prioritário, não podemos discutir que a implementação desta política fez diferença para o pobre.
A questão central aqui não é redistribuição de renda, e sim, o que gera a vergonhosa pobreza? Dessa resposta teremos uma política mais efetiva que não seja a de assegurar um patamar mínimo de reprodução social, e sim vencer a pobreza.
IHU On-Line – Em contrapartida, como compreender o desgaste de Rafael Correa frente às comunidades indígenas, sobretudo no que diz respeito à extração de petróleo no Parque Yasuní e o descumprimento de outras promessas?
Elaine Santos – Os dois primeiros mandatos de Correa tiveram algumas perturbações e até uma tentativa de golpe, mas por fim foram exitosos. No seu último mandato houve uma grande fragmentação entre os setores da esquerda que o elegeram. Esses setores passaram à oposição e os setores da direita, obviamente, aproveitaram-se desses flancos para desgastar a imagem do presidente.
Correa atravessou diversos momentos incompatíveis entre discurso e prática, por exemplo, quando tratou a questão de gênero e homossexualidade como uma anomalia; quando ameaçou se demitir diante da despenalização do aborto; quando deixou de dialogar com as bases sociais indígenas que o elegeram agindo com truculência. Assim, houve críticas, protestos e manifestações contra o presidente, que foi um dos poucos na América Latina que se titulou anticapitalista e antineoliberal.
Diante de tais equívocos, o atual presidente angariou um amplo leque de opositores dentre ecologistas, movimentos indígenas, políticos da esquerda e da direita, como era previsto. O Parque Yasuní foi um ponto central nesse debate, já que o presidente deliberou sua exploração ante o não pagamento da Moratória que ele havia proposto aos países centrais. A iniciativa Yasuní ITT em 2007 foi ousada, pois era uma proposta da sociedade civil que foi retomada pelo governo e consistia em deixar debaixo da terra a reserva petrolífera dos blocos ITT (Ishpingo, Tiputini e Tambococha), cerca de 920 milhões de barris de petróleo, desde que os países centrais seriam corresponsáveis no pagamento dessa não exploração, reconhecendo sua dívida ecológica. Alguns países aderiram, outros alegaram viver um momento de crise para arcar com tal responsabilidade. Tal situação clarificou a falta de compromisso dos demais países com a aclamada e modal questão ambiental. Posto isso, em 2013 o governo voltou atrás e resolveu explorar o bloco petrolífero utilizando a alegação que a exploração era necessária para manter os investimentos em estradas, serviços públicos e educação.
Correa foi acusado de extrativista intransigente, uma vez que essa decisão deveria passar por referendo popular. E mesmo garantindo que usaria as melhores técnicas com o menor impacto possível, o presidente enfrentou uma série de manifestações que o acusavam de desrespeitar a Constituição por ele aprovada em 2008, que proíbe a exploração de recursos não renováveis em áreas protegidas. Dessa contenda, Correa perdeu apoios importantes e acabou por beneficiar os chineses que aguardavam a exploração do Parque Yasuní em acordo previamente firmado.
Por outro lado, os movimentos indígenas e ecologistas, que defendiam a não exploração do bloco, não apresentaram uma contraproposta concreta como alternativa de desenvolvimento para o país, que possui uma economia pautada no extrativismo, e ao se beneficiar da subida dos preços de petróleo, conseguiu viabilizar essa renda em programas sociais importantes. Como realizar tais melhorias sem a exploração?
E nessa lógica cabe acrescentar que, mesmo por meio da exploração e da melhoria dos índices sociais, Correa não enfrentou os constrangimentos estruturais e históricos do subdesenvolvimento do Equador. A meu ver este é ponto central da crítica que deveria ser feita ao atual presidente, já que, mesmo defendendo a natureza com base na premissa da Pacha Mama, como discursam os defensores da natureza ontológica, não conseguiremos disciplinar o capital. Não temos sequer uma solidariedade internacional acerca da questão ambiental, quiçá uma mudança de consciência imediata; essa é uma utopia importante, porém pouco exequível.
IHU On-Line – Analisando em um sentido mais amplo, de que forma podemos entender a gestão de Rafael Correa no contexto latino-americano?
Elaine Santos – Dos trabalhos recentes que fazem esta avaliação, o que acompanhamos durante o período de Correa foi um remodelamento das relações de dependência. Embora Correa tenha resgatado a premissa bolivariana, que abrange a luta pela emancipação conjunta dos povos e um enfrentamento direto aos Estados Unidos, por meio da recusa do fornecimento de petróleo e da afronta diplomática dando asilo a Julian Assange (fundador do Wikileaks e buscado pelos EUA por revelar informações sigilosas), seu aclamado Socialismo do Século XXI resumiu-se na reconquista da capacidade estatal de absorção dos excedentes.
Segundo James Petras, “ele afirma ser socialista, mas condena as FARC marxista e louva o ‘neoliberalismo’ do regime colombiano; questionou a dívida externa ilegal (reduzindo-a em 60%) e ao mesmo tempo mantém o dólar como a divisa do Equador e abre territórios indígenas à exploração do capital estrangeiro”.
No contexto latino-americano, os países fortaleceram parcerias em alguns setores importantes, como o energéticos, por exemplo. Correa também procurou alianças com os países asiáticos e africanos, propondo instalação de embaixadas. Além disso recebeu empréstimos altíssimos a juros baixos da China, em troca de investimentos petrolíferos.
IHU On-Line – Por que é tão difícil, mesmo promovendo mobilidade econômica e social para as camadas mais empobrecidas da população, modificar as macroestruturas políticas e sociais da América Latina, especialmente no caso equatoriano?
Elaine Santos – Há um rebaixamento do nível teórico e da própria prática transformadora nos partidos considerados à esquerda. Como afirma James Petras, para Washington as políticas extrativistas nacionais e populistas são compreendidas como um regime socialista radical de Correa, até por sua aproximação com a Venezuela. A aposta de Correa, baseada na exploração de recursos naturais, cria um ciclo dinâmico, entretanto o país permanece suscetível às oscilações dos preços de petróleo e crises mundiais, ou seja, permanece subordinado aos desmandos imperialistas.
Neste capitalismo de laços e de coalizão, quando o “centro-esquerda” conquista o poder, ao invés de múltiplas transformações, o que aparece são contratos com multinacionais, com construtoras e seus megaprojetos favorecendo o grande capital com um verniz de distribuição social. Distribuição esta que desemboca na marginalização de qualquer possibilidade de transformação estrutural. Nesta conjuntura permanecem apenas as transferências de rendas pautadas em programas sociais, um Estado “democratizado”, todavia facilmente penetrável pela classe dominante, que hoje atualmente faz uso apenas das leis para destituir governantes quando estes não atendem seus interesses.
Tal análise transcende o contexto Correísta e perpassa toda América Latina, claro, respeitando os particularismos do modo como o grande capital age em cada país. A esquerda do Socialismo do Século XXI abandonou a luta por um novo ser humano e isto ocorre devido a uma carência doutrinária, decorrente do descarte do marxismo soviético, aliada à urgência de solucionar os problemas deixados pelo neoliberalismo da década anterior. Isto é, solucionar, mas sem enfrentar e criar mecanismos contra as ofensivas da direita. Em suma, acabam por governar o subdesenvolvimento melhor que a direita, já que aliviam a situação dos mais pobres, deixando as estruturas econômicas intactas. O que opera na América Latina é a continuidade da contrarrevolução capitalista em desfavor dos assalariados e conforme a continuidade aprofundada da subordinação imperialista da nação, nossa subalternidade historicamente construída.
IHU On-Line – Nós, os latino-americanos, estamos condenados ao subdesenvolvimento e suas mil faces ou há vida politicamente sustentável fora da “Ordem mundial”? Como?
Elaine Santos - É complicado responder assim de imediato, como futurologia... (risos). Entretanto, em uma análise dialética, podemos dizer que nosso desenvolvimento ocorre somente por meio do subdesenvolvimento. E a historiografia aparece como um dado fundante neste caso, já que é ela que nos vai permitir entender a especificidade da situação latino-americana e a essência dos problemas aqui existentes, e esta não é uma tarefa simples.
A economia latino-americana possui singularidades que a impedem de desenvolver-se como nos países centrais, fato que está condicionado a sua própria inserção do capitalismo, realizada sob a égide colonial.
Minha leitura é que aqui, no nosso continente, o capitalismo só é possível de maneira subordinada, porque fomos incapazes de criar um estatuto nacional autêntico. Ou seja, herdamos estruturas coloniais e neocoloniais constrangedoras que nos amarram e ao mesmo tempo temos que fazer frente ao capital monopolista. Logo, quando a correlação de forças se altera para o bem e para o mal, aparece como um freio para mudanças maiores, seja por via de golpes, de mudanças constitucionais e da manipulação de forças que possam barrar qualquer possibilidade de alteração.
Mas... a história continua e como dizia Debray, “cada vez que a cortina se levanta, é preciso deslindar novamente os fios da trama”, logo não estamos condenados... o que define as alterações sociais e o amadurecimento da luta e consciência da necessidade de transformação e a certeza da sua possibilidade.
Tal questão faz parte da tese que estou desenvolvendo no Centro de Estudos Sociais em Coimbra, sob a orientação do Prof. Boaventura de Sousa Santos, em que desenvolvo uma pesquisa acerca dos limites das políticas de esquerda durante o período de Correa. Considerando que o Equador, devido ao seu caráter colonial e não obstante seu atraso ainda maior que o brasileiro, também enfrentou um processo de economia colonial-exportadora numa economia tipicamente extrovertida. Isto posto obviamente em termos teóricos, em termos práticos analiso as políticas de extração de petróleo, matéria-prima que é historicamente o grande motor econômico do país. As políticas públicas necessitam ser combinadas com um projeto reformista e condicionadas ao cofo do horizonte revolucionário, caso contrário, estamos fadados ao fracasso.
IHU On-Line – Qual é o clima no que diz respeito às eleições no Equador?
Elaine Santos - Aparentemente o clima é tranquilo, as campanhas eleitorais começaram na última semana e sinceramente acredito que os opositores a Lenin Moreno (Alianza Pais), que é o candidato que tenta suceder Rafael Correa, são débeis em termos de proposta política para conseguir convencer a população nas urnas.
IHU On-Line – Como se identificam ideologicamente cada um dos candidatos ao pleito presidencial? Quais são suas propostas centrais?
Elaine Santos - Focarei nos mais relevantes.
Lenin Moreno é o que aparece na frente nas últimas pesquisas divulgadas. Segundo a agência de pesquisa Centro de Estudios e Datos – Cedatos, ele aparecia, em dezembro, com 35,6% dos votos, sendo a maior parte deles em Cuenca, Guayaquil e Quito. Ele é o candidato escolhido para suceder Rafael Correa, portanto sua plataforma principal é dar prosseguimento àquilo que alguns denominaram Socialismo do Século XXI, mas que agora já aparece como um conceito um pouco perdido nas brumas.
O segundo candidato e talvez o maior adversário de Lenin na eleição de 2017 é o banqueiro e Dirigente da Associação dos Bancos Privados, Guilhermo Lasso Mendoza, candidato do Movimento Criando Oportunidades – Creo. Na última sondagem ele apareceu com 22,3% das intenções de voto.
Cynthia Viteri é formada em Direito e atualmente é apresentadora de televisão e aparece com 10% dos votos. Representa a coalizão do Partido Social Cristão junto com os Movimentos Soma, Podemos e Avança. É oposição incisiva ao atual presidente e já chegou a ofendê-lo por meio das redes sociais. Foi expulsa da Venezuela por intromissão em problemas internos e por desrespeitar as normas migratórias. A candidata representa a ideia de um Estado de direito que não comporta ideologias, embora até agora não esclareceu como isso calharia.
Paco Moncayo representa a esquerda descontente e foi definido por Correa como um “homem honesto”; é o terceiro candidato com 7% dos votos. Em 1998, quando saiu do exército, foi eleito deputado nacional através do partido Izquierda Democrática. Foi prefeito da capital Quito de 2000 a 2009, tem o apoio da esquerda insatisfeita com Correa e é muito forte em Quito. Isso é positivo caso aconteça um segundo turno. Sua candidatura tem apoios importantes como o de Alberto Acosta, que foi ministro da Energia de Correa logo no primeiro mandato, Gustavo Larrea, Roxana Palacios, União Nacional de Educadores - UNE, Morocho, que é atual presidente da Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador – Conaie, além da organização que forma o acordo Nacional pela Mudança composta pela Esquerda Democrática, Unidade Popular, Pachakutik, os movimentos Ação Social e Solidária - Mass, Vive, Democracia Sim, entre outros. Atualmente ele se define como crítico das políticas correístas e busca, em conjunto com seus apoiadores, uma alternativa política à chamada Revolução Cidadã.
Os outros candidatos não representam nem 4% das intenções de voto e estão amadurecendo seus diálogos na disputa eleitoral política, vislumbrando as próximas disputas nas cidades.
Mauricio Rodas é assumidamente da direita, algo positivo neste caso, pois evita enganos caso seja eleito algum dia. Ele renunciou a sua candidatura em 2016 e declarou apoio ao candidato Lasso, caso exista um segundo turno. Outro é Ivan Espinel Molina, médico de profissão, com um mestrado em administração.
O iniciante Washington Pesántez começou sua carreira política após se desempenhar como Promotor Geral da Nação e apresenta sua candidatura em movimento fundado por ele mesmo, a União Equatoriana. Ele se mostra progressista, todavia muito distante do Alianza País de Lenin Moreno.
IHU On-Line – Qual o grau de maturidade democrática do Equador? Acabaram os riscos de golpes de estado ou a permanência de Correa durante seus dois mandatos é fruto de sua desenvoltura política?
Elaine Santos – Sim, as políticas correístas criaram um nível de governabilidade importante. Contudo, é necessário acompanhar o desenrolar e a correlação de forças no país, já que mesmo tendo amadurecido em alguns aspectos, as esquerdas também passam por um momento de dispersão e perda de suas forças - isto fica evidente nas militâncias e seus comportamentos desorientados ante as derrotas.
IHU On-Line – Quais sãos os desafios e as garantias para a manutenção do Equador como um Estado Plurinacional e defensor dos Direitos da Natureza?
Elaine Santos – O reconhecimento da natureza como um sujeito de direitos trouxe à tona uma série de questões, ainda que seja por meio da mudança na dogmática jurídica, que foi realizada a partir de uma demanda social indígena de mudar a visão sobre a natureza e sua relação com ela, nos permitindo questionar a lógica atual em que a natureza é compreendida apenas como uma cesta de matérias-primas disponíveis infinitamente à exploração para o enriquecimento de uma minoria. Em um pano de fundo, isso pode ser vislumbrado como resistência e questionamento ao sistema econômico vigente.
Quanto ao Estado Plurinacional, é um exemplo importante, plasmado nas Constituições da Bolívia e do Equador e apesar de representar um desenvolvimento no reconhecimento dos direitos tradicionais, a Constituição também possui contrapontos, pois serve como mecanismo de inclusão dentro do aparelho do Estado, que mesmo quando governado pelas classes não burguesas, acaba por ser engolido pela essência estatal arraigada das relações capitalistas. No caso equatoriano em especial, temos o reconhecimento como um marco, entretanto sua efetividade ainda é falha e parece existir uma diferença abissal entre defender a reorganização do Estado e sua representação na diversidade dos povos e a inserção e reconhecimento destes povos apenas como cooptação, ou seja, estão representados de forma limitada, sem qualquer intervenção realmente autêntica. Vale relembrar o quanto os direitos indígenas reconhecidos na Constituição Equatoriana de 2008 foram desrespeitados ao longo desta década, repousando-se apenas sob o papel.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?
Elaine Santos – Sim. Gostaria de enfatizar que apesar de estarmos cansados frente a esse ciclo de esgotamento que nos fatiga diariamente no capitalismo que “tira onda” de justo, nossas energias utópicas também se renovam. Principalmente quando percebemos a quantidade de jovens estudiosos debruçados na temática latino-americana, em especial no Equador, empenhados com afinco, por meio de ideias e lutas, que nos levem à transformação/emancipação social das classes oprimidas. Entre eles destaco o colega Jefferson Pecori Viana, que possui um trabalho bastante significativo acerca das Relações Exteriores no Equador, meu companheiro no Centro de Estudos Sociais – CES, Fabian Cevallos, que é equatoriano e que está ativamente ao lado dos que sofrem. Além de muitos outros, Josilane Lima, Aline Vasconcelos, Rafael Fernandez, Daniel Faggiano, Patrick Mariano, Rodrigo Chagas, Felipe Henrique, Vladmir Silva, Thais Lapa, Marcio Mendes e Socorro Silva, que é da educação popular na América Latina, todos os companheiros que buscam construir uma sociedade edificante mais justa e que talvez muitos de nós, apesar de jovens, não viveremos.
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Socialismo do Século XXI, um conceito perdido nas brumas. Entrevista especial com Elaine Santos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU