Presidente não vê “nenhuma contradição” entre sua fala pró-descarbonização na ONU e sua reunião com a petroleira, que está de olho na foz do Amazonas.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 27-09-2024.
“A gente não está em um mundo em que a gente pode dizer que pode acabar o combustível fóssil, que vai ter combustível alternativo. É preciso que, quando a gente fale isso, a gente aponte como é que vai viver o planeta Terra sem energia fóssil até a gente se dotar de autossuficiência de outro tipo de energia.”
A fala acima não é do secretário-geral da OPEP, Haitham Al-Ghais, do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, ou da presidente da Petrobras, Magda Chambriard, estrelas do “Saldão do Fim do Mundo” [ou Rio Oil and Gas, evento da indústria fóssil que acabou ontem]. As palavras saíram da boca do presidente Lula.
Foi uma das respostas de Lula ao ser questionado por ter feito um chamado global para a descarbonização de economias em seu discurso na Assembleia Geral da ONU um dia depois de uma reunião com o CEO global da Shell, Wael Sawan, e o presidente da empresa no Brasil, Cristiano Pinto da Costa. O encontro não estava em sua agenda oficial e causou mal-estar entre membros da sua comitiva. Para o presidente, não havia “nenhuma contradição”, informam BBC, Correio Braziliense, Folha, Valor e Poder 360.
Tem mais. Lula afirmou que a Shell “tem investimentos há cem anos no Brasil, é sócia da Petrobras e ela só vai para a Margem Equatorial [leia-se foz do Amazonas] quando o governo brasileiro autorizar a Petrobras a fazer a pesquisa [leia-se exploração de combustíveis fósseis] na Margem Equatorial [foz do Amazonas]”.
No encontro, o CEO da Shell – que já anunciou interesse em explorar a foz – entregou ao presidente um estudo que defende a necessidade do Brasil avançar na exploração de petróleo, relata Caio Junqueira na CNN. O título do documento de 80 páginas: “Brasil: liderando o mundo rumo à neutralidade de emissões” [????].
Além de querer abrir mais frentes de exploração de combustíveis fósseis no Brasil, o documento afirma que “muitas bacias ao longo de sua extensa costa mal foram exploradas além das atividades da Petrobras”. Esta é uma alusão especial à foz do Amazonas, onde já foram perfurados quase cem poços, todos eles secos ou com volume baixo de petróleo e gás.
De fato, presidente, não se trata de contradição e sim de escolha, pela manutenção de grossos investimentos em energia suja e pelo contínuo aquecimento do planeta.
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