29 Fevereiro 2024
"Não podemos permanecer passivos ao destino que estão preparando para nós. E se até ontem pensávamos que a solução estava em promover uma bela Constituição única para toda a Terra, agora pensamos que a solução está em depor os poderosos dos seus tronos e dar ouvido os pobres", escreve Raniero La Valle, jornalista e ex-senador italiano, em artigo publicado por Chiesa di Tutti, Chiesa dei Poveri, 28-02-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Ontem de manhã acordamos e descobrimos que o presidente Macron tinha reunido em torno de uma grande mesa mais de vinte chefes de Estado e de governo de países europeus (Alemanha, Espanha, Inglaterra à frente) e o subsecretário italiano Ciriello, para pedir a esses Estados que se preparassem para participar com as suas Forças Armadas na guerra ucraniana para derrotar a Rússia. Acrescentou que, caso contrário, muitos dos países sentados ao redor daquela mesa, mais cedo ou mais tarde, teriam sido invadidos.
Ao formular tal ameaça, o líder francês dá como certo, sem o conhecimento dos governos, Parlamentos e povos, que a União Europeia esteja em guerra com a Rússia e que essa guerra precisa terminar com a derrota desse país. Que depois de 79 anos de trégua, que nunca conseguiu transformar-se em verdadeira paz, o povo europeu acorde de manhã e descubra que foi mais uma vez jogado numa guerra que, como a anterior, iniciada com os pactos e as nefastas declarações de guerra da Alemanha e da Itália, só poderia resultar numa guerra mundial, é algo que até ontem teria sido considerado impensável e inaudito.
A Ucrânia tem todo o direito, mesmo que não a grandeza, de decidir por lei que não quer sair da guerra por negociação e por uma recomposição das relações transfronteiriças com o seu incômodo vizinho, mas uma Potência como a França, que na sua a história subjugou povos inteiros, não pode pretender num acesso de onipotência o direito de arrastar o mundo para a ruína definitiva; e isso quando outras guerras e até processos por genocídio já estão em curso.
O pedido francês não foi aceito por ninguém, resultando numa retumbante derrota. No entanto, continua sendo um perturbador sinal dos tempos. A chapa “Pace Terra Dignità” aproveitou a oportunidade para questionar o Presidente da República e alertar o governo para ter firmemente em mente que os artigos 21 e 52 da Constituição não permitiriam de forma alguma a participação da Itália em tal guerra, carecendo de qualquer pressuposto, salvo nos processos de intenções e nas fantasias doentias de uma sagrada defesa da pátria.
Pace Terra e Dignità apelou também aos jornais, às emissoras de TV, às universidades, aos centros de pesquisa, à Conferência Episcopal Italiana, às Amizades judaico-cristãs, à Tavola Valdense, às comunidades islâmicas, bem como a outras confissões, e a todos os partidos de maioria e de oposição, para que se dediquem incessantemente a tomar consciência e ilustrar perante todo o povo as razões para salvar a paz, ainda que precária, e para evitar às gerações presentes e futuras o flagelo e o massacre inumano da guerra.
Isso é tanto mais necessário porque, contrariada pelo fracasso da iniciativa francesa, Ursula von der Leyen relançou a ameaça prospectando um aumento maciço da produção de armas na Europa, um crescimento exponencial das indústrias de armamentos, um rio de dinheiro e contratos para a defesa, como foi feito para as vacinas, argumentando que a ilusão de "uma paz permanente foi destruída", "que o mundo é tão perigoso como vem sendo há gerações" e, portanto, a guerra, e não a paz, seria permanente.
Não podemos permanecer passivos ao destino que estão preparando para nós. E se até ontem pensávamos que a solução estava em promover uma bela Constituição única para toda a Terra, agora pensamos que a solução está em depor os poderosos dos seus tronos e dar ouvido os pobres. Na Sardenha, no mesmo dia, parece que isso começou a acontecer.
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Depor os poderosos dos tronos. Artigo de Raniero La Valle - Instituto Humanitas Unisinos - IHU