09 Fevereiro 2023
"O fato é que quanto mais tempo ignoramos os avisos explícitos de que o aumento das emissões de carbono está aquecendo perigosamente a Terra, maior será o preço a pagar. E o que surpreende na tendência ao colapso climático é a velocidade com que a temperatura média global aumenta e se traduz em clima extremo", afirma José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e pesquisador de meio ambiente, em artigo publicado por EcoDebate, 07-02-2023.
Eis o artigo.
“Estamos na autoestrada rumo ao inferno climático e com o pé no acelerador” – António Guterres, 2022.
O aquecimento global é uma realidade inexorável e a população mundial já está pagando um alto preço com as ondas letais de calor, secas, enchentes, aumento da frequência e da força dos furacões, acidificação das águas e dos solos, etc. O período de 2014 a 2022 aglutina os 9 anos mais quentes do Antropoceno.
O gráfico abaixo mostra a temperatura global anual no período 1880 a 2022 em relação à média do século XX, indicando que até aproximadamente 1940 a temperatura média anual estava abaixo da média do século XX, mas especialmente depois de 1960 a temperatura subiu muito rapidamente e no período 2011 a 2022 aumentou em 0,27º C. Mostra também que os últimos 9 anos foram os mais quentes da série, mesmo com a predominância do fenômeno La Niña em 2021 e 2022.
(Foto: Reprodução | Monitoramento do Clima)
O gráfico abaixo mostra a variação mensal da temperatura nos últimos 9 anos – que ocorreram entre 2014 e 2022 – registrando as maiores temperaturas da série histórica iniciada em 1880. O ano de 1998 foi o mais quente do século passado e apresentou temperatura 0,65º C acima da média do século XX. O ano de 2010 registrou 0,73º C, mas em 2011 a temperatura ficou em 0,58º C acima da média do século passado, mas abaixo daquela registrada em 1998.
Contudo, o quadro muda de figura e, a partir de 2014, quando todos os anos apresentam variações de temperatura acima do registrado em 1998 e 2010. Em 2014 a temperatura foi 0,74º C acima da média do século XX. Em 2016 e 2020 ficou quase 1º C acima da média do século XX. Em 2021 e 2022, com o fenômeno La Niña, a temperatura ficou 0,84º e 0,86º Celsius, acima da média do século XX. Se consideramos o período pré-industrial a temperatura já ultrapassou 1,2º Celsius.
(Foto: Reprodução | Global Times Series)
O que tem acelerado o aquecimento global é o aumento das emissões de gases de efeito estufa provocado pelo crescimento demoeconômico do mundo. Mais pessoas consumindo mais produtos significa mais extração de recursos naturais e mais poluição. Como não existe população sem consumo e nem consumo sem população o resultado é maior concentração de CO2 na atmosfera.
Alguns países têm alto padrão de consumo e baixas taxas de crescimento demográfico, enquanto outros países possuem alto crescimento da população com baixo padrão de consumo. Evidentemente, uns emitem e desmatam mais do que os outros. Mas uma característica em comum é que todas as pessoas, em maior ou menor proporção, contribuem para a degradação ambiental. O ser humano, ao contrário da abelha, não possui uma relação simbiótica com o meio ambiente.
Com o crescimento demoeconômico a humanidade ultrapassou a capacidade de carga da Terra. Nos últimos 50 anos (1972-2022) a população mundial mais que dobrou de tamanho (passando de 3,85 bilhões para 8 bilhões de habitantes) e o PIB mundial aumentou 5 vezes. Assim, enquanto algumas pessoas consideram que o crescimento econômico teve maior impacto sobre as emissões de gases de efeito estufa do que o crescimento populacional, o fato é que a pegada ecológica já ultrapassou a biocapacidade do Planeta.
Segundo o climatologista James Hansen (12/01/2023), a temperatura da superfície global em 2022 foi de +1,16°C em relação à média de 1880-1920 na análise do GISS (Instituto Goddard para Estudos Espaciais). Os nove anos mais quentes ocorreram nos últimos nove anos. A atual fase fria do fenômeno La Niña dominou os últimos dois anos fazendo a temperatura cair em relação à 2020, mas mantendo o desequilíbrio energético planetário sem precedentes (com mais energia entrando do que saindo). Hansen considera improvável a continuidade do efeito La Niña e estima que 2023 vai ser mais quente do que 2022 e é provável que o ano de 2024 registre temperaturas na casa de 1,5º C, atingindo com muita antecedência o limite mínimo do Acordo de Paris. Por causa da inércia e atrasos de resposta nos sistemas climáticos e energéticos, o limite de 2°C provavelmente também será ultrapassado em meados do século.
O fato é que quanto mais tempo ignoramos os avisos explícitos de que o aumento das emissões de carbono está aquecendo perigosamente a Terra, maior será o preço a pagar. E o que surpreende na tendência ao colapso climático é a velocidade com que a temperatura média global aumenta e se traduz em clima extremo. Porém, por mais sombrio que seja o cenário climático, isto não deve inibir as ações para mitigar o aquecimento global para impedir que um futuro angustiante se torne ainda mais verdadeiramente cataclísmico. Se nada for feito, como mostrou o jornalista David Wallace-Wells, poderemos ter uma “Terra inabitável”.
Referêncial Bibliográfico
James Hansen, Makiko Sato and Reto Ruedy. Global Temperature in 2022, 12 January 2023. Disponível aqui.
ALVES, JED. Crescimento demoeconômico no Antropoceno e negacionismo demográfico, Liinc em Revista, RJ, v. 18, n. 1, 2022. Disponível aqui.
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Os 9 anos mais quentes e o Planeta se aproximando do limite de 1,5º Celsius. Artigo de José Eustáquio Diniz Alves - Instituto Humanitas Unisinos - IHU