02 Junho 2020
"Ação das torcidas de futebol contra Bolsonaro revela como há espaço para oposição e luta democrática. E mais: número de mortes por covid-19 pode ser 140% maior; governantes insistem em reabertura irresponsável das cidades", escrevem Maíra Mathias e Raquel Torres, editoras do portal Outra Saúde, em artigo publicado por Outras Palavras, 01-06-2020.
A pandemia no Brasil divide palco, desde o começo, com as manifestações antidemocráticas impulsionadas pelo presidente da República. No sábado à noite, vídeos do ato do grupo “300 do Brasil” se espalharam mostrando gente com tochas e máscaras brancas, a la Ku Klux Klan, em frente ao Supremo Tribunal Federal. No mesmo dia, o ministro do STF Celso de Mello enviou uma mensagem a interlocutores via WhatsApp comparando o Brasil à Alemanha de Hitler.
Mas o movimento dos mascarados liderados por Sara Winter – que, aliás, ameaçou publicamente o ministro Alexandre de Morais semana passada – tinha menos de 300 pessoas em sua marcha. Bem menos: talvez uns 30, de acordo com as câmeras de segurança. A verdade é que os atos contra o Congresso e o STF, ainda que assustadores pelo simples fato de existirem, têm sido esvaziados. Os mais volumosos são as carreatas, por razões óbvias. Mesmo assim, sem nada que faça frente a eles nas ruas, costumam ficar em destaque.
Acuado pelas operações contra fake news que agora miram seus aliados, ontem Jair Bolsonaro sobrevoou Brasília em um helicóptero camuflado, nas cores do Exército, num simbolismo nada sutil. Estava acompanhado pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo. Do alto, visualizou sua meia dúzia de apoiadores antes de desembarcar. Porque símbolo pouco é bobagem, andou entre as pessoas montado a cavalo. Acenou, sorriu, pegou crianças no colo. “Estarei onde o povo estiver“, escreveu mais tarde nas redes sociais, compartilhando um vídeo com as imagens.
Mas o povo tinha outros planos, e partiram de torcidas organizadas de futebol as convocações para os primeiros grandes atos de rua pró-democracia. Há várias semanas, as manifestações capitaneadas em Brasília por grupos assumidamente armados e que objetivam derrubar o Congresso o o Supremo não provocam grandes reações das polícias. Os atos de ontem, por outro lado, terminaram em repressão.
Em São Paulo, os grupos chegaram à Avenida Paulista no inicio da tarde, ao mesmo tempo em que os bolsonaristas costumam aparecer. Vinham em número bem maior do que os apoiadores do presidente. Em pouco tempo, vídeos transmitidos ao vivo começaram a mostrar a Tropa de Choque lançando bombas de gás lacrimogênio. Seis pessoas foram presas e a Paulista terminou com vidros quebrados, caçambas reviradas e fogo em objetos na rua. O coronel Álvaro Batista Camilo, secretário-executivo da PM, diz que a polícia não sabe qual grupo começou a confusão. Mas antes disso ele próprio havia reconhecido que pessoas que portavam bandeiras de cunho neonazista foram o estopim. Vídeos mostram uma mulher com máscara dos EUA e um taco de basebol na mão (onde se lê “Rivotril”) xingando manifestantes pró-democracia enquanto é calmamente escoltada por um PM.
No Rio, tudo começou ainda de manhã, em Copacabana, onde também houve confusão e duas pessoas foram detidas. Quem estava lá era o deputado bolsonarista Daniel Silveira (PSL-RJ), que simplesmente ameaçou matar manifestantes. Em um vídeo tuitado após a manifestação, ele diz que há muitos policiais armados participando de atos em defesa do governo: “Até que vocês vão pegar um polícia zangado no meio da multidão, vão tomar um no meio da caixa do peito, e vão chamar a gente de truculento. Eu tô torcendo para isso. Quem sabe não seja eu o sortudo. Vocês me peguem na rua em um dia muito ruim e eu descarregue minha arma em cima de um filho da puta comunista que tentar me agredir. Vou ter que me defender, não vai ter jeito. E não adianta falar que foi homicídio, foi legítima defesa. Tenham certeza: eu vou me defender”, disse.
Foi à tardinha, porém, que a cena mais marcante aconteceu: um PM apontando seu fuzil para um manifestante desarmado e descalço, por ele supostamente estar fumando maconha. “Só fica assim da minha cor. Só morre assim quem é da minha cor. Se for branco, morador de prédio, não fica. Essa é a minha revolta. Todo mundo morrendo nessa guerra inútil”, disse o rapaz. Não por acaso, era uma manifestação contra a violência policial, que não tem dado trégua nas favelas durante a pandemia. O ato “Vidas negras importam” juntou 400 pessoas e terminou oficialmente às 16 horas, justamente porque tinha gente demais. Mas as pessoas continuavam chegando. Os conflitos aconteceram na dispersão.
Na seara da mobilização virtual, começou a circular no fim de semana um improvável manifesto que reúne de Lobão a Fernanda Montenegro, de Luciano Huck a Flavio Dino, de Maria Alice Setúbal a Guilherme Boulos. Fala em “deixar de lado as velhas disputas em busca do bem comum”, em “unir a pátria e resgatar nossa identidade como nação”, em “esquerda, centro e direita unidos” e em comungar “dos mesmos princípios éticos e democráticos”. O texto não menciona o nome de Jair Bolsonaro nenhuma vez, nem convoca ninguém às ruas.
Mas vieram delas, as ruas, as únicas respostas enérgicas à ameaça antidemocrática. Parece cada vez mais inevitável que cresça esse enfrentamento direto – o entornar de um caldo que há muito começara a ferver. As consequências políticas disso são pouco previsíveis. De todo modo, é absolutamente impressionante que na semana em que o Brasil confirma meio milhão de casos de covid-19, tem quase 30 mil mortes conhecidas e continua sem ministro da Saúde, o foco precise ser (e sim, precisa ser) essa crise política.
Jair Bolsonaro já deu o tom: compartilhou no Twitter, sem escrever uma palavra, o post de Donald Trump em que ele anuncia que seu governo vai considerar o antifascismo como “uma organização terrorista”. O filho Eduardo, é claro, o acompanhou. “O Brasil deveria fazer o mesmo. Aqui eles se fantasiam de torcida organizada, mas todos sabemos que querem é desordem, baderna e confronto com manifestações pacíficas”, acrescentou.
Nos bastidores, parlamentares aliados ao presidente apostam em endossar essa narrativa e também pretendem ressaltar o fato de que os atos pró-democracia geram aglomeração. “É muita incoerência criticar Bolsonaro porque ele vai a manifestações, alegando que ele desrespeita as orientações para conter o avanço do coronavírus, e organizar protestos que também geram aglomerações”, avalia um deles, no Valor. A diferença entre ambos é muito evidente, mas o argumento, sem dúvidas, tem todos os elementos para ser explorado com sucesso nas redes.
Em tempo: os Estados Unidos, número um no ranking de casos e de mortes pelo novo coronavírus, estão há uma semana com protestos por toda a parte depois que George Floyd foi brutalmente morto por um policial branco. Cenas de violência se multiplicam e mais de 300 pessoas foram presas. Não é só no Brasil que o “black lives matter” encontra eco. Houve manifestações em Berlim, em Londres e em Toronto. A preocupação com a antecipação de novos picos de coronavírus, é claro, existe e é enorme.
A ameaça de impeachment que paira sobre Jair Bolsonaro ainda é só isso – uma ameaça –, mas já encontra respaldo em 62% da população, segundo o Datafolha. O mais interessante: entre seus eleitores, 22% apoiam a ação. Num momento em que a pandemia protegia Bolsonaro das ruas, o impeachment parecia mais distante do que agora, quando elas voltam a ser ocupadas.
Maior escudo disponível, o Centrão continua avançando sobre o governo, e agora um indicado pelo PL vai levar o comando do Banco do Nordeste. O escolhido é Alexandre Borges Cabral. A novidade vem logo depois de Jair Bolsonaro afirmar, em transmissão ao vivo, que “em nenhum momento nós oferecemos ou eles [o Centrão] pediram ministérios, estatais ou bancos oficiais”. Ao mesmo tempo, o “Centrão Verde-Oliva” se sedimenta. Na sexta, a presidência da Funasa – cujo orçamento para 2020 é de R$ 3,13 bihões – passou para as mãos do comandante da PM de Minas Gerais, o coronel Giovanne Gomes da Silva. Ele foi indicado pelo deputado do PSD Diego Andrade, após negociação capitaneada pelo ex-ministro Gilberto Kassab.
Mais da metade dos brasileiros são contra a presença de militares no governo, segundo o Datafolha. Não obstante, as Forças Armadas já acumulam quase três mil cargos, só com militares da ativa. Há um temor de que se desgastem por essa participação. “A constante alegação do presidente de ter apoio militar está deixando esses generais em posição delicada. Eles são corresponsáveis pelas trapalhadas do governo e agora não haverá mais como evitar que a imagem das Forças seja afetada. Os erros terão cor verde-oliva“, diz o historiador José Murilo de Carvalho, no Globo.
Ontem, o Brasil alcançou oficialmente a marca do meio milhão de infecções pelo novo coronavírus, somando 514.849. Sabe quando havíamos ultrapassado a marca dos 400 mil? Quarta-feira passada… A velocidade com que os casos se empilham, até na nossa muitíssimo subnotificada realidade, assusta. No domingo, registramos 29.314 novos casos. No sábado, foram 33.274 – recorde absoluto. Com isso, já estamos muito à frente da Rússia, terceiro país em número de infecções (405 mil), no tétrico ranking da covid-19.
Em número de mortes, durante o fim de semana ultrapassamos a França e passamos a ocupar a quarta posição mundial, com 29.314 óbitos registrados oficialmente. Uma reportagem da Folha, contudo, revela com dados do próprio Ministério da Saúde como esses números divulgados podem estar distantes da verdade.
Os repórteres revisaram os registros de mortes por síndrome respiratória aguda grave já consolidados, o que colocou como linha de corte a data de 2 de maio. A partir daí, aplicaram a metodologia do CDC, o centro de controle de doenças dos Estados Unidos, e olharam para as médias históricas de mortes por essa causa nos anos anteriores. Tudo o que extrapolou essa média foi incluído como óbitos de covid. Além disso, de lá para cá, 3.081 mortes antigas foram confirmadas. Somando os três fatores, teríamos até 2 de maio não 6.724 mortes, conforme o anúncio oficial naquela data, mas 16.144 óbitos – 140% a mais. A contagem foi detalhada estado por estado. Minas Gerais seria a unidade da federação com maior subnotificação de óbitos, ao invés de 88 mortes até o dia 2 de maio, deveria ter registrado 659 – uma diferença de 649%.
Se olhar para o retrovisor é desalentador, imaginar o que vai acontecer nas próximas semanas nos leva para um lugar sombrio. O recorde de novos casos vai nos levar a recordes de novas mortes. Mas a despeito de tantos números preocupantes, a flexibilização do isolamento social está a toda. O Rio de Janeiro hoje começa a discutir a reabertura gradual com setores econômicos. Segundo o colunista Bernardo Mello Franco, o índice de contágio está em 2,3. “Na Europa, os países que relaxaram o distanciamento social já haviam registrado quedas expressivas na taxa de contágio. Para os cientistas, o índice de transmissão deve cair abaixo de 1, o que significa que dez pessoas com o vírus podem infectar outras dez”, escreveu.
Marco Aurélio Safadi, infectologista da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo fez um alerta parecido. “Uma das condições inequívocas para que se faça o relaxamento é que haja um cenário consistente de redução de casos e de mortes. E quando eu falo ‘consistente’, não são dois ou três dias, que podem ser fruto do feriado ou fim de semana. São pelo menos de dez a 15 dias de queda de casos. E os números não estão mostrando isso”, explicou ao Estadão.
A América Latina tem 158 milhões de pessoas trabalhando na informalidade. O número representa mais da metade (54%) do total da força de trabalho da região. A falta de garantias e direitos que protejam esse enorme contingente em momentos como o atual, em que seria preciso se afastar das atividades econômicas não essenciais, é a razão pela qual os bloqueios de circulação não funcionam tão bem por aqui. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), nada menos do que 90% dos trabalhadores informais estão sendo atingidos de forma grave pelos efeitos da pandemia.
Na sexta, a Espanha aprovou uma renda mínima de 1.015 euros. Terão direito lares vulneráveis cuja renda mensal seja de, no máximo, 1.005 euros – calcula-se que 850 mil famílias estejam nessa situação. O benefício já existia no país, mas de forma muito heterogênea.
A pandemia e a crise também estão abrindo uma janela de oportunidade para o avanço das discussões de proteção social no Brasil. Nos últimos 15 dias, dois projetos de renda básica universal foram apresentados no Senado – um por José Serra (PSDB-SP), outro por Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Ambos são inspirados no PL de Eduardo Suplicy, defensor da ideia há 30 anos. Na Folha, especialistas foram ouvidos sobre a viabilidade da proposta. A primeira avaliação é que o auxílio emergencial de R$ 600 vai provocar uma mudança na população, jogando luz, por exemplo, sobre os valores irrisórios pagos pelo Bolsa Família, que em média repassa R$ 188. A pressão popular pode dar tração a uma reforma tributária mais progressiva. Os projetos que vinham sendo discutidos no Congresso desde o governo Temer giravam em torno da simplificação. Mas para sustentar algo como uma renda básica seria preciso redistribuir riqueza e renda. Em um dos modelos possíveis, feito por professores da Universidade Federal de Pernambuco, um benefício universal de R$ 406 seria financiado por um Imposto de Renda com alíquota única de 35,7% sobre todas as rendas.
Sergio Moro saiu do Ministério da Justiça acusando Jair Bolsonaro de tentar interferir na Polícia Federal. O presidente teria interesse em “relatórios de inteligência” de um órgão que não tem essa função. No vídeo da reunião do dia 22 de abril, citado como prova por Moro, Bolsonaro chega a dizer que o seu sistema particular de inteligência funciona… Esse preâmbulo é só para dizer como estão evidentes os interesses do chefe do Executivo diante da informação de que ao menos 47 relatórios diários da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foram sumamente ignorados por ele. O lote, analisado pelo Estadão, defende de maneira consistente o isolamento social, destacando as dificuldades brasileiras para lidar com o coronavírus, como falta de testes e leitos de UTI. Antes do jornal, o site Intercept Brasil já tinha tido acesso a alguns desses documentos sigilosos, em março.
De lá para cá, as novidades são que a Abin alertou em 13 de maio que o Brasil estava em uma fase de “aceleração da epidemia” e, embora a cloroquina seja menciona nove vezes no lote de documentos, a Abin segue o entendimento geral de que o medicamento é mais um entre muitos sendo testados, sem eficácia comprovada no tratamento da doença. A tese presidencial do “isolamento vertical” também não encontra sustentação nos relatórios, que mostram que está havendo um aumento de pacientes sem comorbidades, que passaram de 20% do total para 35% “ao contrário do que se acreditava inicialmente”. Em suma, além do Ministério da Saúde, Bolsonaro também ignora a Abin quando não lhe interessa. É parte da tal “omissão” que a medida provisória do corpo fora pretende isentar.
O governo federal não tem conseguido tirar do papel suas promessas de enfrentamento à pandemia. De 17 anúncios feitos pelo próprio presidente nas redes sociais e na TV, menos da metade (43%) foi cumprido. De três mil leitos de UTI que seriam alugados, foram contratados apenas 540. Dos 14,1 mil respiradores que deveriam ser distribuídos, só foram entregues 1.612 pelo Ministério da Saúde. “A instabilidade de gestão do governo federal cria uma dificuldade na ponta“, resume Wilames Bezerra, presidente do Conasems, conselho que representa os secretários municipais de saúde na gestão do SUS.
Os secretários municipais e estaduais, contudo, parecem estar bem impressionados por Eduardo Pazuello. O general que está no comando interino do Ministério participa de reuniões diárias com os gestores e tem conseguido fazer os processos administrativos andaram com mais celeridade. O maior elogio é na recuperação do tempo perdido em relação à habilitação de UTIs, quando o governo federal financia parte do valor desse leito. Pazuello teria praticamente zerado as habilitações pendentes, ultrapassando a barreira dos sete mil leitos habilitados.
Na sexta, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou oficialmente o grupo de acesso à tecnologia da covid-19, um esforço de compartilhamento de informações que ajudem no desenvolvimento de vacinas, testes, medicamentos e outras descobertas científicas no combate ao novo coronavírus. A ideia vem da Costa Rica. O país tentou emplacar a proposta antes da Assembleia Mundial da Saúde, mas a ideia sequer chegou a ser discutida no fórum por seu caráter anti-patentes e de acesso universal. O grupo – que será conhecido pela sigla em inglês C-TAP – reúne até agora 37 países, incluindo o Brasil.
Na mesma sexta, durante um pronunciamento na Casa Branca marcado para tratar de outro assunto, Donald Trump anunciou o “fim das relações” entre os Estados Unidos e a OMS. O presidente dos EUA afirmou que vai “redirecionar” o dinheiro desembolsado pelo país no funcionamento da Organização em outros “fundos”. Em 2019, os Estados Unidos direcionaram US$ 553 milhões para a OMS, entre contribuições formais e extras, o que representou cerca de 15% do orçamento do organismo.
A decisão é profundamente política e funciona como uma cortina de fumaça para o desempenho do próprio Trump na coordenação de uma resposta nacional robusta à pandemia. Diante de uma trágica cifra que já ultrapassa as 102 mil mortes, o presidente americano voltou a acusar a OMS de ser controlada pela China e de não ter implementado – em menos de 30 dias – as “reformas” propostas unilateralmente e de maneira pouco objetiva pelos EUA em uma carta divulgada no dia 18 de maio.
Os próximos passos não estão claros, já que a adesão dos EUA ao tratado que constituiu a OMS, feita em 1946, passou pelo Congresso americano. A saída do país do organismo poderia ter de seguir o mesmo caminho. O anúncio gerou reação negativa entre sociedades de especialistas e políticos democratas.
A União Europeia disparou um comunicado no sábado, pedindo que os EUA reconsiderem a decisão. “Diante desta ameaça mundial, é o momento de reforçar a cooperação e de encontrar soluções comuns. É preciso evitar atitudes que fragilizem os resultados em nível internacional”, diz o documento. Já a Alemanha, que assume a presidência do bloco europeu em julho, anunciou que pretende reforçar a presença da UE na Organização.
Aliás, na sexta-feira, Angela Merkel recusou o convite de Trump para participar da cúpula do G7 por causa da pandemia. O evento, que iria acontecer por videoconferência, foi desencavado pelo presidente dos EUA na semana passada. Ele propagandeou que a realização presencial seria um “exemplo de reabertura”. Austrália, Índia, Coreia do Sul e Rússia seriam convidados por Trump a participar da cúpula em um movimento político que criaria uma espécie de G11 com o propósito de isolar a China.
Mais de 120 especialistas de vários países divulgaram uma carta endereçada ao editor da Lancet, Richard Horton. Os médicos e estatísticos apontaram um conjunto de inconsistências no estudo observacional publicado no dia 22 de maio, que concluiu que não há eficácia da cloroquina e hidroxicloroquina no tratamento da covid-19 e que há riscos no seu uso. Eles pediram a publicação dos dados brutos do estudo, que analisou informações de 96 mil pacientes, o que foi atendido pela revista científica. Alguns reparos foram feitos ao texto publicado, mas as conclusões continuaram as mesmas. Os especialistas querem que o estudo passe por uma revisão independente.
A propósito: a Casa Branca anunciou o envio de dois milhões de doses de hidroxicloroquina para o Brasil. Vários hospitais americanos teriam suspendido o uso do remédio no tratamento da covid, seguindo o princípio da precaução depois de estudos como o da Lancet – o que faz com que haja excedente do medicamento. Em comunicado, a Casa Branca informou que a droga será usada profilaticamente em profissionais de saúde brasileiros, além de empregada no tratamento dos doentes.
Em entrevista ao El País, o médico alemão Clemens Wendtner traz um alerta nada irrelevante. Ele foi o primeiro a tratar pacientes com covid-19 no país e diz que, na clínica onde trabalha, todos os ex-pacientes acompanhados refizeram testes para identificar a presença de anticorpos. Eles ainda existem, mas estão caindo. “Observamos em alguns desses casos uma queda nos anticorpos neutralizadores, e isso é uma informação importante e preocupante. Passaram-se três meses desde que esses pacientes chegaram e já vemos um potencial defeito na imunidade“, diz Wendtner, completando: “Isto nos indica também que é difícil desenvolver uma vacina para a covid-19. Não digo que seja impossível, mas é difícil. Pode ser, por exemplo, que quando houver uma vacina seja preciso administrá-las aos pacientes em várias doses para reforçá-la”.
O novo coronavírus está se aproximando de povos indígenas isolados. No Vale do Javari, onde há a maior concentração de povos não contatados do mundo, já foram registradas as primeiras infecções, informa a Época. Foram dois casos conhecidos e uma morte. A multiplicação das infecções, um perigo real, era totalmente evitável: “A narrativa de uma tragédia anunciada é confirmada no episódio envolvendo dois recém-contatados da etnia korubo, moradores da Terra Indígena Vale do Javari. Uma criança foi levada para Atalaia do Norte depois de ter sido picada por uma cobra. Ficou em observação na unidade básica de saúde onde trabalha a gerente de enfermagem, que testou positivo para coronavírus. A própria coordenação do Distrito de Saúde Indígena (Dsei) não seguiu o protocolo de quarentena ao levar os korubos para a base de proteção no rio Ituí-Itacoaí, porta de entrada para a Terra Indígena, onde há maior fluxo de ingresso para as aldeias”, narra a reportagem.
Organizações indígenas estão mapeando e registrando o número de casos, de povos afetados e de óbitos pelo novo coronavírus há meses. A partir de dados de secretarias de saúde e de distritos sanitários especiais indígenas, até agora, são quase 170 mortes e 1,7 mil indígenas infectados. Pela Secretaria Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, são apenas 51 mortes.
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Os acontecimentos da semana. A esperança que ressurge em meio à pandemia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU