04 Março 2020
Segundo Emanuelle Góes, doutora em saúde pública e pós-doutoranda do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde, a violência baseada em gênero ocorre, por exemplo, quando as mulheres não têm direito a decidir sobre a maternidade.
A reportagem é de Rachel Quintiliano, publicada por EcoDebate, 03-03-2020.
A garantia do exercício dos direitos sexuais e reprodutivos em todo o mundo ainda tem sido um desafio que incide diretamente nos projetos de vida de mulheres, meninas e jovens. O Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), orientado pelo Programa de Ação do Cairo, de 1994, trabalha diretamente com esse assunto no sentido de assegurar que todas as pessoas possam decidir sobre ter ou não filhos/as, quantos e quando tê-los/as, e se tê-los/as que possam vivenciar o processo da gestação e parto de forma segura.
Entretanto, as diversas formas de violência existentes influenciam diretamente nos caminhos destas pessoas. Segundo dados da 13ª Edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2018, 1.206 mulheres foram vítimas de feminicídio, sendo 61% delas mulheres negras e 52,3% dos assassinatos cometidos por arma de fogo. Em 88,8% dos casos, o autor era o companheiro ou o ex-companheiro da vítima. Já dados do Ministério da Saúde (DATASUS) apontam que, em 2017, cerca de 481 mil bebês nascidos vivos no Brasil eram de mães com idade entre 10 e 19 anos.
O Relatório de Situação da População Mundial 2019 (SWOP), lançado globalmente pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e intitulado Um trabalho inacabado: a busca por direitos e escolhas para todos e todas, aponta que para alcançar o desenvolvimento e para que todas as pessoas desfrutem de direitos, a violência baseada em gênero precisa ser enfrentada. Violências como a sofrida por Elitânia de Souza Hora, 25, violentamente assassinada a tiros, a despeito de uma medida protetiva, em um caso suspeito de feminicídio, no interior da Bahia (confira nota pública de repúdio emitida pelo UNFPA Brasil).
Segundo Emanuelle Góes, doutora em saúde pública e pós-doutoranda do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde, a violência baseada em gênero ocorre, por exemplo, quando as mulheres não têm direito a decidir sobre a maternidade, seja para ter ou não ter filhos. “O patriarcado ainda incide sobre os corpos das mulheres, na nossa autodeterminação e na autonomia reprodutiva. Vivemos em um estado estruturado pelo racismo e pelo sexismo. E isso irá determinar a forma como as mulheres, de forma interseccionalidade, irão experimentar as suas histórias reprodutivas”.
Emanuelle acredita que “para o enfrentamento a essas violências são necessárias muitas frentes, diálogos sobre igualdades de gênero nas escolas, superação de estereótipos de gênero e enfrentamento ao racismo e o sexismo institucional”. Ações como as desenvolvidas pelo UNFPA Brasil, sobre planejamento reprodutivo, direitos sexuais e reprodutivos, acesso aos serviços de saúde sexual e reprodutiva de qualidade e métodos de contracepção eficazes, através de projetos desenvolvidos pelo escritório nacional, em Brasília, e regionais nos estados da Bahia, São Paulo e Roraima.
De acordo com a representante do Fundo de População da ONU no Brasil, Astrid Bant, é essencial que o UNFPA trabalhe com violência baseada em gênero, não apenas oferecendo serviços básicos essenciais para vítimas – como o processo de escuta e encaminhamento à rede de serviços feito em contexto de assistência humanitária, por exemplo, e a distribuição de Kits Dignidade – mas também trabalhando a mudança de cultura da sociedade. “Este é um fenômeno que tem tantos aspectos que é preciso trabalhá-lo de vários ângulos”, afirma.
(Consenso de Montevidéu, 2013)
• O direito a uma sexualidade plena, em condições seguras e saudáveis;
• O direito de tomar decisões livres, informadas, voluntárias e responsáveis sobre a sexualidade;
• O respeito à orientação sexual e à identidade de gênero, livre de coerção, discriminação e violência;
• O direito à informação e aos meios necessários para a garantia da saúde sexual e reprodutiva;
• Os direitos reprodutivos incluem
(Programa de Ação do Cairo, 1994)
• O direito de decidir livre e responsavelmente sobre se querem ter filhos, quando e quantos filhos ter;
• O direito a desfrutar de uma vida afetivo-sexual satisfatória e segura, livre de doenças e infecções, exercida sem violência, com respeito mútuo, igualdade e o pleno consentimento entre os parceiros;
• O direito de homens e mulheres de serem informados e de terem acesso aos métodos modernos, eficientes, seguros, aceitáveis e financeiramente adequados de planejamento reprodutivo;
• O direito de acesso a serviços apropriados de saúde que propiciem às mulheres as condições de passar com segurança pela gestação e parto.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Violência de gênero é obstáculo para garantia de direitos sexuais e reprodutivos de mulheres e jovens - Instituto Humanitas Unisinos - IHU