15 Julho 2019
Designada para anotar o que estava sendo discutido, Danielle Roberts correu para manter o ritmo ao escrever as ideias de outros jovens católicos oferecidas enquanto eles imaginavam uma Igreja dos EUA que abraçasse mais os pilares ecológicos da sua fé.
A reportagem é de Brian Roewe, publicada por National Catholic Reporter, 11-07-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ao todo, quatro grandes folhas brancas de papel exibiam ideias ousadas que jovens católicos propuseram para fazer com que a sua Igreja se volte para a preocupação ambiental, particularmente para as mudanças climáticas, sobre a qual o Papa Francisco falou na sua encíclica “Laudato si’, sobre o cuidado da casa comum”, de 2015.
Dioceses e universidades católicas que se tornam neutras em carbono. Campi universitários que desinvestem em combustíveis fósseis. Um conjunto de padrões da Laudato si’ para as paróquias e dioceses adotarem, com um aplicativo para acompanhar o progresso. Pessoas que não perguntam mais se você leu a carta apostólica do papa, a primeira sobre o ambiente.
O brainstorming foi uma das sessões finais de uma série inaugural de conferências copromovidas pelo Catholic Climate Covenant e pela Creighton University, que visa a integrar mais profundamente a Laudato si’ e suas mensagens sobre o cuidado da criação na experiência diária dos católicos dos EUA.
De certo modo, para encontrar maneiras de transformar as grandes ideias em uma realidade mais ampla.
O congresso entre os dias 27 e 29 de junho em Creighton, intitulado “Laudato si’ e a Igreja Católica dos EUA”, representou um dos esforços mais significativos da Igreja dos EUA para assumir o documento do papa, hoje com quatro anos de idade. Congressos de acompanhamento estão definidos para 2021 e 2023.
O esforço intencional de se inspirar de modo mais pleno na Laudato si’ representou um “fechamento de ciclo” para o Covenant, formado em 2006 como parte de um esforço para implementar mais amplamente o próprio documento dos bispos dos EUA sobre mudanças climáticas, de 2001.
Desde então, os efeitos de um planeta em aquecimento tornaram-se mais claros. Os cientistas disseram que as mudanças climáticas foram um fator que contribuiu para as inundações que devastaram partes do Centro-Oeste dos EUA na primavera – incluindo áreas nos arredores de Omaha onde alguns campos agrícolas ficaram submersos – em que as águas do oceano mais quente levaram a uma atmosfera mais quente capaz de provar chuvas mais significativas de uma só vez.
Apenas duas semanas antes do congresso católico sobre o clima nos EUA, Francisco disse a executivos do petróleo e da energia no Vaticano que o mundo está enfrentando uma “emergência climática” que requer uma ação imediata e direta.
“Eu acho que é um momento realmente interessante”, disse Roberts, responsável pelo programa para o envolvimento das universidades com o Catholic Relief Services, que liderou conjuntamente a discussão sobre a pastoral para jovens adultos. “Nós falamos sobre o fato de que este é realmente um ponto de virada no movimento das mudanças climáticas globais e na necessidade de realmente agir.”
A ação esteve no centro dos três dias de evento no campus da Creighton.
Os mais de 200 participantes convidados pelos organizadores compartilharam experiências e recursos sobre o que funcionou e o que não funcionou em seus esforços para impulsionar uma maior consciência ecológica dentro de suas comunidades eclesiais locais. Oito oficinas exploraram temas como engajamento, gestão de energia, liturgia, formação na fé de adultos, pastoral com jovens adultos, educação escolar, ensino superior e criação de equipes de cuidados. Duas sessões adicionais se focaram no ministério hispânico e na justiça ambiental.
Os grupos examinaram as melhores práticas e o que pode ser expandido para que a Igreja possa contribuir mais para mitigar os piores impactos das mudanças climáticas.
Na conferência de abertura, o bispo de San Diego, Robert McElroy, disse que o estranhamento – em relação a Deus, à natureza, um ao outro e até mesmo em relação à própria verdade – hoje “reverbera na nossa relação com a Terra, que é a nossa casa comum”.
“Para nós, nos Estados Unidos, neste momento perigoso da nossa história nacional, os temas centrais da Laudato si’ são especialmente urgentes. Ficamos profundamente afastados uns dos outros, fervilhando em divisões e indispostos a nos reconciliarmos”, disse McElroy. “Somos a nação mais poderosa da história da Terra, mas rejeitamos os únicos caminhos realistas que surgiram para curar o nosso planeta quebrado.”
Os participantes de todo o país abrangiam várias pastorais, formações e idades, com um número considerável de jovens católicos. Entre eles, estavam cientistas, especialistas em energia, líderes ambientais, ministros da pastoral universitária, ativistas, liturgistas, clérigos e religiosos, e empregados de várias conferências católicas estaduais, junto com a Conferência dos Bispos dos EUA, três bispos e um representante do Vaticano.
Muitos trouxeram as suas próprias histórias, sejam de sucesso na redução da pegada de carbono da sua instituição ou dando vida aos extensos ensinamentos ambientais da Igreja. Para alguns, foram as duas coisas.
Martin Susz, que liderou conjuntamente a área de gerenciamento de energia, compartilhou como a Arquidiocese de Nova York concluiu mais de 70 projetos de eficiência energética em suas paróquias. A Ir. Carolyn McWatters, das Irmãs da Misericórdia, descreveu como a sua ordem religiosa levantou o argumento moral para que o sistema Mercy Health eliminasse a água engarrafada das suas instalações em quatro Estados. Dois jovens empregados Southeast Pastoral Institute, um ministério hispânico dos bispos do Sudeste dos EUA, compartilharam os esforços de evangelização com católicos hispânicos em torno das questões ambientais.
“Os hispânicos estão preocupados com o cuidado da criação. Os hispânicos querem trabalhar no cuidado da criação”, disse Nelson Araque, professor católico de Ensino Médio do sul da Flórida que liderou as discussões pastorais hispânicas. Ele esperava que o congresso tivesse mais recursos voltados para os hispânicos e talvez um palestrante hispânico em uma das futuras reuniões.
Cada uma das oficinas criou relatórios que foram compartilhados com o Catholic Climate Covenant, resumindo suas conversas, assim como ideias para os próximos passos. No futuro, a equipe do Covenant planeja elaborar esse feedback, disse o diretor executivo Dan Misleh, com a esperança de desenvolver novos programas e recursos, “e ver como podemos integrar mais plenamente a Laudato si’ na comunidade católica”.
Em uma carta ao congresso, o embaixador do papa nos EUA, arcebispo Christophe Pierre, expressou as esperanças de Francisco de que “esse congresso e os que se seguirão não contribuam apenas para o debate em curso sobre as mudanças climáticas, mas também fomentem um maior envolvimento de toda a sociedade” na busca de soluções abrangentes e integradas que protejam a natureza e abordem a pobreza e a exclusão
Discursando no congresso no dia 28 de junho, o padre salesiano Joshtrom Isaac Kureethadam, coordenador do setor de ecologia e criação do Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral do Vaticano, disse que o Vaticano acredita que “o ano de 2020 pode ser um ponto de inflexão” para a ação global sobre mudanças climáticas.
Ele disse que a Santa Sé começou a explorar uma série de possibilidades para o quinto aniversário da encíclica, que coincide com o 50º aniversário do Dia da Terra. Ele lembrou aos participantes do congresso que os EUA há muito tempo lideram as questões ambientais e, “com a providência de Deus”, poderiam liderar novamente.
“Nós somos a última geração que realmente podem fazer algo, então temos que agir”, disse Kureethadam.
No congresso, não faltou energia ou otimismo. Mesmo assim, os participantes expressaram um sentimento de que a conversão ecológica generalizada dentro da Igreja dos EUA não ocorrerá sem um clero mais franco e direto sobre o cuidado da criação – e particularmente a partir do púlpito.
“Para as pessoas que ainda frequentam a missa, reunir-se no domingo é o lugar onde elas ficam sabendo sobre as coisas que estão acontecendo na Igreja e no mundo, e onde temos a maior oportunidade de influenciar as pessoas”, disse McWatters, diretor de liturgia e musical da St. Francis Xavier College Church, na Saint Louis University. “Para o bem ou para o mal, é o nosso momento.”
Ao longo das discussões, a frustração circulou entre os bispos. Embora alguns bispos individuais tenham feito grandes progressos – e, no caso da Califórnia, uma declaração pastoral sobre a Laudato si’ foi emitida por todos os seus bispos – o sentimento foi de que o órgão inteiro ainda tem que assumir uma posição de liderança mais visível sobre as mudanças climáticas.
“Eu acho que parte do assunto sobre o qual estamos falando é sobre como os bispos têm estado muito quietos sobre isso”, disse Aaron Salzm, professor recém-chegado do Boston College e líder do Catholic Divestment Movement. “E, em vez da sua resposta a essa crise, eu acho que o que vemos aqui é um grande número de leigos engajados.”
McElroy, que participou de todos os três dias do congresso, disse que não discordava da avaliação dos bispos, mas a caracterizou como uma questão de foco: embora poucos bispos desafiem os elementos da Laudato si’, as diferenças surgem quando o foco muda para questões como prioridade e estratégia.
Em uma entrevista, ele disse ao NCR que acredita que a encíclica do papa deveria ter um lugar mais central dentro da Conferência Episcopal, observando que a devastação que as mudanças climáticas podem provocar no planeta também representam sérias ameaças para a dignidade humana.
“É algo tão gigantesco em suas consequências que tem uma reivindicação legítima como prioridade”, disse.
A primeira noite destacou várias prioridades legislativas ambientais para os bispos no Capitólio. Megan Goodwin, diretora associada do escritório de relações governamentais da Conferência dos Bispos dos EUA, descreveu o apoio a dois projetos de lei bipartidários: na Câmara, uma proposta de um dividendo de carbono e, no Senado, uma medida sobre a eficiência energética em organizações sem fins lucrativos.
Goodwin exortou os católicos a levantarem a questão da política ambiental junto aos candidatos políticos mais cedo e com frequência, para que o ambiente não se torne uma questão que divida os legisladores nas linhas partidárias. “O caminho mais rápido para a falta de ação significativa sobre qualquer questão é torná-la uma questão divisiva.”
Além da legislação, Goodwin descreveu o trabalho de desenvolvimento interno e externo dos bispos para ajudar aqueles que enfrentam as consequências da degradação ambiental.
Em um exemplo, uma doação do Catholic Campaign for Human Development ajudou um grupo liderado por estudantes no sul de Baltimore, já convivendo com algumas das piores emissões de ar tóxico do país, em seu posicionamento de bloquear os planos para a construção do maior incinerador de lixo do país a menos de uma milha da sua escola.
Essa vitória para o bairro de Curtis Bay, que rendeu a um estudante o Goldman Environmental Prize de 2016, mostrou o impacto que algumas poucas pessoas podem ter em sua oposição à injustiça ambiental, disse Sacoby Wilson, professor associado de Saúde Ambiental Aplicada da Universidade de Maryland. Ele desafiou os participantes a se engajar em suas próprias comunidades e formar relações com grupos como o NAACP no trabalho para combater o racismo ambiental.
Disse Goodwin: “Como católicos, em primeiro lugar, precisamos de uma renovação espiritual que envolva a inclusão radical, especialmente dos pobres, dos marginalizados e dos mais vulneráveis, com intencionalidade em nosso comportamento e seu impacto sobre a Terra”.
Em seu discurso de encerramento, a Ir. Patricia Siemen, das Irmãs Dominicanas de Adrian, defendeu a importância das histórias para fomentar a conversão ecológica, citando o uso de parábolas por Jesus.
“O desafio para todos nós é contar histórias que convidem outras pessoas a entrar na experiência de querer se envolver na proteção da criação e do nosso mundo ecológico”, disse ela.
Sieman, um advogado civil que fundou o Centro de Jurisprudência da Terra, na Faculdade de Direito da Barry University, pediu aos participantes do congresso que considerassem o que os levou a Creighton a passar um fim de semana enraizado em questões de ecologia e fé.
Para Katie Starasinich, sua jornada começou quando ela participou de uma palestra na Diocese de Joliet, Illinois, sobre o Sínodo do ano passado sobre os jovens e os jovens adultos. Isso inspirou a especialista em sustentabilidade ambiental a fazer um curso de animação sobre a Laudato si’ do Global Catholic Climate Movement, que a levou a se conectar com outras pessoas envolvidas nas questões ambientais em sua diocese natal. E isso, finalmente, levou-a a Omaha.
“Somos os protagonistas da Igreja, e nós somos agora”, disse ela ao NCR. “Então, eu acho que isso é algo que ressoa em mim. Que eu realmente posso fazer a diferença, que eu preciso fazer alguma coisa.”
McElroy enfatizou a importância de capacitar os jovens como “a voz profética da justiça ambiental em nossa nação”, capaz de abrir as mentes dos mais velhos aos danos que estão causados pelas mudanças climáticas às futuras gerações.
“As nossas paróquias e escolas devem se tornar centros em que se diz a verdade sobre a existência da criação de Deus, que estão indiscutivelmente surgindo em nosso mundo”, disse o bispo de San Diego. “E devemos chamar particularmente a atenção da nossa própria nação, pois deixamos os Estados Unidos, que por tanto tempo foram líderes na investigação científica, apoiarem a disseminação por atacado da pseudociência que foi criada e está a serviço dessas indústrias e interesses econômicos que saqueiam o nosso planeta.”
Mas, apesar de todo o consenso de que as mudanças climáticas representam uma crise, o modo de falar sobre isso com os menos convencidos foi um tema de debate.
De acordo com uma pesquisa de 2018 do Pew Research Center, 60% dos católicos reconhecem que o mundo está se aquecendo principalmente devido à atividade humana. Mas uma divisão maior aparece entre aqueles que participam da missa semanalmente, que são menos propensos a ver as mudanças climáticas como um problema sério ou que requer uma resposta moral de sua parte, de acordo com um estudo de 2017 do Centro de Pesquisa Aplicada no Apostolado da Georgetown University.
Erin Lothes, uma teóloga especializada em ética energética do College of St. Elizabeth, em Morristown, New Jersey, citou esse estudo ao criticar os argumentos combativos sobre as mudanças climáticas e para falar, ao contrário, da comunicação positiva que enfatiza as soluções, como na recente transição para 100% de energia solar por parte da Igreja da Imaculada Conceição, no sudeste da Virgínia.
Afinal de contas, foi a busca de soluções para uma Igreja mais ecoconsciente que os levou para Creighton em primeiro lugar.
“Em uma Igreja, as normas se espalham”, disse Lothes. “Novas práticas que as pessoas compartilham, passam de uma para outra. É por isso que é tão importante falar sobre aquilo que você está fazendo.”
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Em meio à ameaça climática, católicos buscam uma conversão ecológica na Igreja dos EUA - Instituto Humanitas Unisinos - IHU