24 Junho 2024
"Até o momento, a ameaça de cisma diz respeito apenas a Viganò, a dimensão da questão está a uma distância sideral em comparação com Lefebvre e os tempos do Vaticano II. Para o Papa, trata-se de encerrar o assunto aqui", escreve Gian Guido Vecchi, jornalista italiano, em artigo publicado por Corriere della Sera, 21-06-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Era preciso vê-lo, Francisco, enquanto o avião que decolara do Madagascar sobrevoava o Kilimanjaro, os jornalistas perguntavam-lhe se temia um cisma nos Estados Unidos e ele explicava tranquilo, como se fosse a coisa mais simples do mundo: “Sempre houve muitos cismas na Igreja. Eu rezo para que não haja mais. Mas não tenho medo." Era 2019, a tempestade do ano anterior em torno do “dossiê” Viganò, com o relativo pedido de renúncia do Papa já havia desvanecido, mas não os rumores de um “cisma estadunidense”.
Não era nenhum mistério que a Igreja nos Estados Unidos estivesse dividida, como ainda está. Quando foi divulgado o "dossiê" contra Bergoglio, cerca de vinte bispos fizeram comentários que lhe davam crédito. Além disso, há tempo era evidente a intolerância da direita católica dos EUA, hostil a Francisco e rica de financiamentos e redes de contato.
A resposta do Papa soava desdenhosa: “houve muitos cismas”, se quiserem, vão em frente.
No entanto, não é assim tão simples. Porque um cisma pode se tornar um problema com o tempo. A Igreja reconhece a "sucessão apostólica", os bispos são os sucessores dos apóstolos e cada bispo transmite a autoridade aos que vêm depois, são os bispos que impõem as mãos e assim ordenam outros bispos. Mas é o Papa quem nomeia os bispos, por isso, se um bispo ordena outro bispo sem a permissão do Papa, aquela ordenação é ilegítima. Ilegítima, mas ainda assim válida: esse é o problema. É a razão pela qual Bento XVI tentou solucionar o cisma com os lefebvrianos: não era uma nostalgia conservadora, era uma questão de estancar a hemorragia dos seminários tradicionalistas, a multiplicação de sacerdotes e bispos cismáticos. Não conseguiu, no final continuaram a não aceitar o Concílio.
O caso de Viganò é diferente, estamos apenas no começo. Na ermida de Sant'Antonio alla Palanzana perto de Viterbo, o ex-núncio iniciou uma arrecadação de fundos para reformar o prédio e acolher quem contesta o Papa. Há algum tempo chegaram cinco sacerdotes de uma comunidade tradicionalista, a Familia Christi, que nesse interim havia sido oficialmente dissolvida pela Santa Sé. Não foram atingidos por nenhuma disposição canônica, no entanto. Assim, a convocação de Viganò ao Santo Ofício mostra-se como uma espécie de cordão sanitário colocado em torno do ex-núncio: um aviso dirigido a quem quisesse segui-lo num caminho que há tempo é aquele do cisma.
Houve e ainda há algumas perplexidades no Vaticano: corre-se o risco de “fazer um favor” a Viganò, que nesse meio tempo caiu no esquecimento. Até a galáxia tradicionalista aposta em outras, menos inclinadas às divagações conspiratórias. Permanece o fato de que, até o momento, a ameaça de cisma diz respeito apenas a Viganò, a dimensão da questão está a uma distância sideral em comparação com Lefebvre e os tempos do Vaticano II. Para o Papa, trata-se de encerrar o assunto aqui.
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Viganò. A medida decidida pela Santa Sé para desencorajar quem quer segui-lo. Artigo de Gian Guido Vecchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU