04 Outubro 2023
Em entrevista ao Il Timone, o cardeal Pietro Parolin espera um mundo livre de armas nucleares. E está em continuidade com Casaroli.
A reportagem é de Nico Spuntoni, publicada por Il Giornale, 03-10-2023.
A missão do Papa para aliviar as tensões na fronteira russo-ucraniana tem o rosto do presidente da Conferência Episcopal Italiana, o cardeal Matteo Maria Zuppi. No entanto, a iniciativa ocorre em conjunto com a Secretaria de Estado, que é responsável pela atividade diplomática da Santa Sé. Na narrativa das questões do Vaticano, muitas vezes procurou-se sustentar a tese de que existe uma diferença de pontos de vista entre a Secretaria de Estado e o Papa no que diz respeito à guerra na Ucrânia e suas possíveis implicações. Recentemente, porém, o cardeal secretário de Estado, o veneto Pietro Parolin, usou palavras e conceitos que fazem parte do vocabulário geopolítico de Francisco.
Entrevistado por Lorenzo Bertocchi no Il Timone, Parolin lançou o alerta ao dizer que "o mundo parece ter regredido para uma nova dinâmica de Guerra Fria, com características diferentes das do século anterior". O prelado apontou para as novas tecnologias que "aumentam os riscos associados à posse de armas nucleares, cujas detonações intencionais ou acidentais teriam consequências humanitárias e ambientais desastrosas". A pergunta do jornalista se referia exatamente aos riscos de uma escalada nuclear no contexto do conflito na Ucrânia. Poucos dias atrás, por ocasião do Dia Internacional para a Eliminação das Armas Nucleares, Francisco condenou mais uma vez a ameaça do uso de armas nucleares em suas redes sociais. "A posse de armas nucleares é imoral, pois, como observou João XXIII na Pacem in terris, 'não se exclui a possibilidade de um evento imprevisível acionar o aparato de guerra'. Sob a ameaça de armas nucleares, todos nós sempre perdemos!", escreveu o Papa.
Essa oposição foi reiterada pelo secretário de Estado, que no Il Timone enfatizou que "a Santa Sé é fortemente a favor de um mundo livre de armas nucleares", listando também os motivos para essa posição. Entre eles, está "a inadequação dos sistemas de defesa baseados em armas nucleares", bem como "os impactos humanitários e ambientais catastróficos resultantes do uso de dispositivos nucleares", refletindo a atenção ecológica vista no atual pontificado. O cardeal veneziano também destacou "as consequências negativas decorrentes de um clima persistente de medo", que traz à memória o que foi vivido no pós-guerra nos tempos da oposição entre o bloco ocidental e o oriental.
A visão do contexto geopolítico apresentada pelo cardeal Parolin reflete a abordagem multilateral na diplomacia que a Santa Sé adotou desde os tempos do pontificado do Papa Paulo VI. Durante os anos de Montini, de fato, ocorreu tanto a nomeação do primeiro observador permanente da Santa Sé nas Nações Unidas em 1964, quanto a aceitação do convite para participar da Conferência de Helsinque. Essa participação se mostrou útil para incluir a liberdade religiosa entre os direitos humanos em um período em que a Cortina de Ferro ainda estava de pé e perseguições anticristãs estavam ocorrendo nos regimes comunistas.
Na linha adotada pelo chefe da delegação na Conferência, o então D. Agostino Casaroli, que mais tarde se tornaria secretário de Estado, encontramos a mesma desconfiança em relação ao equilíbrio baseado no medo expressado hoje por Parolin. Na época, assim como hoje, a corrida armamentista era vista como um erro como garantia de paz, com base no princípio do equilíbrio de poder, porque cedo ou tarde esse desafio poderia levar a alguma tragédia. Portanto, a centralidade do tema da paz na visão geopolítica da Santa Sé não é uma novidade causada pelo evento de guerra na Ucrânia, mas é uma herança da nova abordagem à diplomacia internacional inaugurada nos anos do Papa Montini e interpretada pelo predecessor de Parolin, Agostino Casaroli.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O Vaticano teme o espectro de uma nova Guerra Fria - Instituto Humanitas Unisinos - IHU