27 Setembro 2022
Yes we can. Na origem do Terra Madre está a mesma convicção com que Barack Obama viveu a campanha eleitoral de 2008. “Mas por que compramos a salada pré-lavada que custa nove vezes mais; e ainda por cima, a lavamos novamente? Precisamos mudar e podemos fazê-lo! Grandes desafios se vencem a partir de baixo", alertou ontem de Turim Paolo Di Croce, diretor geral do Slow Food International, ao apresentar o diálogo à margem de Terra Madre entre Marco Tarquinio, diretor do Avvenire, Raj Patel, economista e estudioso das políticas alimentares, anteriormente no Banco Mundial e na OMC e hoje intelectual 'contra', Rupa Marya, médico da Universidade da Califórnia, onde promove a deep medicine, a medicina profunda da descolonização, que pode restabelecer as relações com a Terra e os outros seres humanos, Michael Moss, que em 2010 ganhou o Prêmio Pulitzer de Jornalismo com uma investigação sobre os riscos associados aos processos de conservação de alimentos; e por fim Bela Gil, chef e ativista, vice-presidente do Instituto Brasil Orgânico, criado para promover o movimento orgânico brasileiro.
A reportagem é de Paolo Viana, publicada por Avvenire, 25-09-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
"Precisamos criar uma nova narrativa, contra o colonialismo e o patriarcado", começou Raj Patel, autor do livro 'Inflamação' com Rupa Marya - a gordura está envenenando minha família porque na Grã-Bretanha os asiáticos adoecem de diabetes seis vezes mais, e isso porque o diabetes afeta as comunidades de baixa renda. Claro, seria bom se todos pudessem se permitir o slow food, mas forças mais importantes e sombrias nos levam à desigualdade, até mesmo quando comemos”.
Patel convida a desmontar a narrativa oficial que sustenta o 'sistema', que financeiriza o alimento. Rupa Marya, por sua vez, acusou ontem o sistema econômico de "destruir os nossos corpos". A saúde não é uma característica de uma pessoa, mas depende “da harmonização com os sistemas ecológicos, econômicos, familiares... quando se pensa em buscar a saúde individual, somos enganados pelo capitalismo colonial. A agricultura regenerativa, da mesma forma, é uma conexão com a rede da vida”. Agora os salmões desapareceram e a Califórnia está queimando. “Estamos ajudando as populações indígenas tentando restaurar essa forma de saúde. Nossos agricultores devem ser pagos melhor porque cuidam da nossa saúde”, acrescentou.
Até a tecnologia para a transformação e a conservação de alimentos, explicou Moss, por sua vez, faz parte dessa estratégia: "As indústrias não apenas querem que apreciemos esses produtos, mas garantem que consumamos mais: descobriram que, combinando gorduras e açúcares em produtos que não se encontram na natureza conseguem desabilitar o controle do cérebro sobre o apetite, jogando com a chamada densidade calórica. É uma guerra comercial travada com armas científicas”.
Alimento que anula a vontade, 'projetado' para penetrar as nossas defesas; como uma droga: esse é o cotidiano do supermercado global. Sabores, receptores, variedades, custo: os inputs que orientam nossas escolhas alimentares são inúmeros. Como mudar tudo isto, ontem o explicou Bela Gil: “Vamos mudar a forma como produzimos, distribuímos e consumimos os alimentos: o que colocamos no prato define o futuro da humanidade. Vivemos em uma ditadura empresarial e temos que lutar.
Hoje, graças à internet, temos acesso ao conhecimento: precisamos saber o que estamos comendo.
Mas também é preciso um acesso físico à comida, deve chegar ao seu mercado. E isso não é tudo: você deve poder pagar. Finalmente, para comer bem é preciso ter tempo: cozinhar não é fácil para uma trabalhadora que trabalha em dois turnos e leva duas horas de ônibus para voltar para casa... no final ela vai comprar algo já pronto para colocar na mesa”.
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O supermercado “global” alimenta as desigualdades - Instituto Humanitas Unisinos - IHU