28 Junho 2022
"A castidade é a arte de nunca tratar o outro como objeto, instrumento do próprio prazer. A sexualidade é algo bom, a Bíblia chama de coisa santíssima, mas seu exercício pode ser liturgia ou blasfêmia. A sexualidade nos impele à relação com o outro, ao conhecimento do outro - insiste a Bíblia - mas depende de cada um buscar nessa relação comunhão ou posse, sinfonia ou prepotência", escreve Enzo Bianchi, monge italiano e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por La Repubblica, 27-06-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Mais uma vez um documento do Vaticano fornece indicações sobre o exercício da sexualidade entre homem e mulher durante o itinerário que pode conduzir ao casamento e depois na vida conjugal.
As diretrizes do Catecismo da Igreja Católica estão de volta, mas também diversas exortações do Papa Francisco.
Reaparece a palavra "castidade", que está entre as menos compreendidas, empregada até com um significado distorcido, palavra que as novas gerações associam à abstinência da sexualidade, confundindo a castidade com o celibato.
Deve-se dizer logo que querer dar uma mensagem sobre o tema através da forma de comunicação usada pelo documento do Vaticano resulta errado e ineficaz. Porque a castidade, ou disciplina da sexualidade, é um assunto sério, um caminho necessário para a humanização e o crescimento de uma pessoa na afetividade e nos relacionamentos.
A etimologia sugere que castus é aquele que rejeita o in-cestum, que é a negação da distância, a não aceitação da alteridade, que não é apenas diferença. Não é casto quem busca a fusionalidade, a posse, e um sinal dessa busca é a agressividade que se inflama, se manifesta com ímpeto e às vezes se torna violência.
O exercício da sexualidade deve ser vivido no espaço do dom, pois exige dar e acolher na relação viva de dois sujeitos que sabem sentir, falar, fazer, com o corpo e com a própria interioridade. De fato, não se limita apenas à genitalidade, mas envolve toda a pessoa e suas relações.
A castidade é a arte de nunca tratar o outro como objeto, instrumento do próprio prazer. A sexualidade é algo bom, a Bíblia chama de coisa santíssima, mas seu exercício pode ser liturgia ou blasfêmia. A sexualidade nos impele à relação com o outro, ao conhecimento do outro - insiste a Bíblia - mas depende de cada um buscar nessa relação comunhão ou posse, sinfonia ou prepotência.
Quando os corpos se encontram e se entrelaçam, acendem um conhecimento mútuo que não é comparável a outras formas de conhecimento. Sim, grandeza e miséria da sexualidade! Isso deve ser dito porque é árduo amar-se com o corpo, tornar o corpo "palavra", e uma palavra verdadeira, uma palavra capaz de abrir uma história de amor. O Cântico dos Cânticos, no coração das Escrituras judaicas e cristãs, é o livro incandescente que celebra o amor, todo o amor. Amor como encontro de beleza, arrebatamento de corações, paixão ardente abençoada por Deus, canto dos cânticos.
Isso deve ser anunciado em sua transparente incandescência e então a castidade pode ser compreendida como instância de libertação das paixões egocêntricas e idólatras, aceitação da diferença e da distância em cada estação da vida, em cada história de amor: porque é um cântico de liberdade.
Onde a consciência e a inteligência estão presentes, onde reina o respeito pelo outro, o amor tem as asas da liberdade.
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Porque a castidade é uma arte. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU