15 Junho 2020
Ela teria sido enterrada na inconsistência, se a carta não tivesse obtido o aplauso e o relançamento com um tuíte do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Dom Carlo Maria Viganò, ex-secretário da Governatorado, ex-núncio em Washington, ex-moralizador, escreveu ao czar do Ocidente no dia 11 de junho para lhe reconhecer o título de filho da luz, intrépido lutador contra as fileiras de Satanás, arauto da liberdade religiosa. Algumas laudas que lembram o clamor da batalha do Armagedom (Ap 16,16), o confronto com o Anticristo, a resistência à dissolução da civilização.
A reportagem é de Gabriele Passerini, publicada por Settimana News, 14-06-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O que está acontecendo é que forças internacionais não mais bem especificadas (uma suposta nova ordem mundial), desprovidas de qualquer princípio moral e ávidas de dinheiro e de poder, atentam contra os valores da pátria, da família e do povo. Trump encarna a resistência, e os seus críticos são servos do poder obscuro. É o confronto entre Deus e Satanás. O contexto da pandemia é a oportunidade propícia.
Não se trata de uma pandemia (nem contagiosa, nem perigosa, nem resistente), mas sim de uma “colossal operação de engenharia social” em benefício de alguns poucos contra a vontade dos povos.
As normas de confinamento e de distanciamento atentam contra os princípios fundamentais da liberdade e da democracia. Opõe-se ao Estado democrático um super-Estado de um mundo sem liberdade.
A épica batalha tem uma resposta precisa na tensão interna da Igreja e das Igrejas, entre os “fiéis pastores que cuidam do rebanho de Cristo” e os “mercenários que tentam dispersar o rebanho” e matar a fé.
O sinal é fornecido pela intolerável dissidência do bispo de Washington, Dom Wilton Gregory, e de outros bispos estadunidenses em relação à “visita eleitoral” de Trump, no dia 2 de junho, ao santuário dedicado a João Paulo II – construído e gerido pelos Cavaleiros de Colombo, a parte mais conservadora do catolicismo estadunidense. No dia anterior, o presidente havia brandido a Bíblia em frente à igreja episcopal da cidade (com a discordância dos responsáveis).
O desdobramento mais amplo da visão de Viganò está em um documento datado de 7 de maio, no qual, depois de defender o projeto político mortífero vinculado à suposta pandemia, convidam-se os pastores “a reivindicar firmemente a própria autonomia de governo, de culto e de pregação” contra as ilícitas disposições da saúde e dos governos dos vários países. Aqui também se recorda a escolha de campo: “Com Cristo ou contra Cristo”.
Algumas assinaturas do documento do dia 7 de maio são indicativas dos apoiadores de Viganò. Dos anti-islâmicos (Cristiano Allam, Guy Pages) aos antieuropeus (Jean-Pierre Maugendre); dos antissemitas (Massimo Viglione) aos antitudo (Vittorio Sgarbi); dos “no vax” (Stefano Montanari) aos “no pol” (política) (Claudio Messora); dos pró-direita (André Bonnet) ao anti-Vaticano.
Entre estes últimos, destacam-se os já clássicos anti-Francisco: os cardeais Zen e Müller, os prelados Peta, Lenga, Gracida, Laun, Negri e Schneider.
Agora, somou-se também Trump, que finalmente encontrou o seu Rasputin. Imagino que ele espera ter mais sorte do que o mentor do místico russo, o último czar Nicolau II.
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Trump-Viganò: o Rasputin italiano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU