15 Agosto 2018
Encontro da Conference of Major Superiors of Men (CMSM, sigla em inglês para Conferência dos Superiores Maiores Masculinos), é marcado por debate entre jovens e padres sobre os valores da Igreja Católica.
A reportagem é de Brian Roewe, publicada por National Catholic Reporter, 14-08-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
"Fui forçado a ser católico quando criança. Não foi alguma coisa que eu escolhi", disse Holly.
"Não penso em mim como religioso. Me considero uma pessoa boa", afirmou Edward.
"Eu realmente me sinto bem por não ter um apego à Igreja Católica - e isso é um peso a menos na minha vida", ressaltou Grace.
Os depoimentos, juntamente com uma série de pesquisas e estudos prepararam o palco para conversas durante a assembleia anual de quatro dias - que ocorreu entre os dias 31 de julho a 3 de agosto -, da Conference of Major Superiors of Men (Conferência dos Superiores Maiores). A organização, que representa os líderes das ordens religiosas masculinas sediadas nos Estados Unidos, organizou sua reunião visando o Sínodo para os jovens e jovens adultos, - que o Papa Francisco convocou para outubro, no Vaticano.
O envolvimento de jovens com a fé católica gira em torno de toda Igreja, inclusive de ordens religiosas que dependem de novas vocações para continuarem seus carismas.
"Eles estão procurando um lar", disse o irmão Marista Sean Sammon.
"Os jovens estão se perguntando se a Igreja pode fornecer isso [um lar]. Acredito que sim, mas nós precisamos dar uma perspectiva diferente da Igreja às vezes", disse ele.
Capuchinho John Pavlik, diretor executivo da CMSM, disse ao NCR que "aprendeu a apreciar mais a vida na Igreja, embora a maioria dos jovens pensem o contrário”. Para Pavlik, isso representa o retrocesso da Igreja.
"É dos Evangelhos que estamos falando aqui. Para onde foi Jesus? As pessoas sofrem sem a fé em Deus ", completou Pavlik.
Um workshop pré-conferência, no dia 31 de julho, dedicou um dia inteiro para examinar o motivo pelo qual os jovens estão deixando a Igreja.
O "Going, Going, Gone" pesquisou católicos de 15 a 25 anos. O estudo foi publicado pela St. Mary's Press em janeiro.
"Há cerca de dois anos, minha maneira de pensar mudou. Passei a acreditar - por conta própria - em um poder superior, mas não completamente em uma única religião organizada, porque isso segrega as pessoas ao invés de juntá-las”, disse Beatriz.
“Há pontos interessantes na Bíblia, mas acredito que o verdadeiro significado não foi traduzido corretamente", completou ela.
Embora o momento atual apresente muitos desafios, Bob McCarty, coautor do estudo e coordenador do projeto, o descreveu como "um momento emocionante" para o Ministério da Igreja, "especialmente se você gosta do caos".
"Eu acho o espírito de Deus está presente no caos, pois nele encontraremos as sementes da nova criação", disse McCarty à plateia de religiosos.
McCarty, que trabalhou no ministério profissional por 45 anos - em grande parte com a juventude - disse que o ministério para os jovens mudou esse cenário [a falta de interesse dos jovens na Igreja] rapidamente. “Se tentarmos entender esse processo com métodos antigos, não seremos eficazes", afirmou.
"Os jovens de hoje estão buscando desesperadamente uma visão convincente do significado de ‘ser humano’, algo que talvez eles não estejam achando nos círculos da Igreja".
No encontro, cerca de 12 jovens adultos se tornaram fontes populares para confirmar ou ampliar as informações apresentadas sobre seus pares.
Emma Lii, uma estudante da Universidade de Washington e ministra do Centro Católico de Newman, ressaltou dois fatos importantes: o de que sua perspectiva ser relevante e o fato de jovens católicos estarem ansiosos para falar abertamente sobre sua fé. Lii concordou com uma observação mencionada no estudo sobre "se aprofundar mais rapidamente", considerando que a idade mais delicada para o desinteresse pela Igreja é aos 13 anos.
"Acho que os jovens realmente têm perguntas, e simplesmente não sabem como fazê-las", disse Lii ao NCR.
Howard Stamps III, um jovem adulto que se encontrou com o clero durante um programa sobre justiça racial na Igreja St. Alphonsus Liguori, disse que os jovens querem mais desenvolvimento comunitário na Igreja.
"Na paróquia de Santa Isabel, envolvemos a juventude de várias maneiras, seja através de projetos de serviço, grupos de jovens e do conselho paroquial. Deixamos eles a vontade para se sentirem parte da Igreja", disse Stamps, auxiliar no ministério de jovens.
Comunidade e acompanhamento foram temas consistentes ao longo da conferência. O rabino Jonathan Sacks elogiou a comunidade apresentada: um lugar onde as pessoas sabem quem você é e se importam uns com os outros.
Por mais que os jovens estão deixando a religião, sua busca por significados e propósitos ainda os levam a algum tipo de comunidade. John Vitek, coautor de "Going, Going, Gone" (Indo, Indo, Foi, em tradução livre) e presidente da St. Mary's Press, observou a crescente popularidade do CrossFit, não apenas como um exercício para entrar em forma, mas também para forjar relacionamentos.
Os pesquisadores levantaram três questões críticas que deixam os jovens distantes de um ministério transformador: Quem são os desfiliados? Eles estão perdidos? Eles sabem que estão perdidos?
A partir da primeira pergunta, foi solicitado aos participantes da conferência que se apresentassem a um jovem que não mais se identificasse como católico. Bobby Pantuso, leigo salvatoriano e diretor de vocações associado da Sociedade do Divino Salvador, em Milwaukee, lembrou do caso de um amigo de longa data, que foi católico até o momento em que seu pai - também católico - adoeceu e morreu. Após o ocorrido, o jovem deixou de acreditar na religião.
"Eu não sei o que posso dizer ou o que fazer para recuperá-lo", disse Pantuso.
McCarty alertou que não há um único modo claro ou uma solução para trazer de volta aqueles que deixaram a religião e nem de evitar mais perdas. A pesquisa revela que não há nenhuma razão plausível do motivo pelo qual os jovens católicos desacreditam da fé.
O estudo "Going, Going, Gone" mostrou que os escândalos da Igreja e alguns ensinamentos específicos aparecem menos como um fator determinantes para a desfiliação dos jovens. Uma justificativa mais recorrente foi a descrença em Deus - ou em qualquer religião - e ao fato de que você pode levar uma vida plena e significativa sem religião.
Ainda assim, McCarty destacou a não aceitação do casamento entre pessoas do mesmo sexo - por parte da Igreja católica - como uma questão-chave para a resistência dos jovens à religião - algo que eles consideram uma injustiça e que viola os direitos humanos.
Em meio a discussões e conversas paralelas, leigos e participantes do clero tentaram entender melhor os fatos, e o que eles significam tanto para o futuro da Igreja, quanto às vocações de suas ordens religiosas.
Alguns reconheceram prontamente a necessidade de um acompanhamento mais adequado aos jovens, e que eles devem apenas escutar e não questionar. "Queremos deixar isso acontecer?", observou um dos padres, acreditando que ainda há o interesse do jovens pela religião.
Sammon, ex-presidente do CMSM e superior geral dos Irmãos Maristas que agora trabalha no Marist College, em Poughkeepsie, Nova York, achou "incrivelmente esperançoso" que os jovens estivessem fazendo perguntas e procurando um significado mais profundo.
"Para mim isso está ligado a fé. Devemos encontrar um novo vocabulário para chegar a melhores resultados", disse Sammon.
O Padre franciscano Gregory Plata disse ao NCR que observou os jovens buscando uma Igreja mais acolhedora e autêntica. Entendendo a insatisfação deles com as instituições, Plata descreveu que suas escolhas definem suas próprias identidades espirituais.
"A forma como eu aprendi os ensinamentos da Igreja é diferente dos jovens de hoje", disse Plata ao NCR.
Ainda assim, outros padres expressaram frustração com o motivo pelo qual os jovens deixam a Igreja. Alguns eram céticos em relação à credibilidade da pesquisa e questionavam se deveriam se importar com os resultados. Outros disseram que o problema com os jovens é que eles são mal informados - e mal educados - sobre o que a Igreja prega.
Um frade franciscano questionou em voz alta por que esses jovens - que representam uma minoria levando em conta os 2 mil anos da Igreja - deveriam decidir como e de que forma os valores católicos devem mudar.
Em uma reunião de jovens - pré-sínodo - no mês de março, em Roma, Fr. Javier Hansen, um dos três delegados juvenis dos Estados Unidos, disse que sua participação nesse evento foi mencionar que a Igreja tem "uma enorme responsabilidade em pregar a fé".
Dando voz a preocupações citadas, Hansen perguntou ao bispo David Konderla, de Tulsa, Oklahoma, "como equilibrar as informações de ambos os lados e permanecer fiel à Igreja, ao catecismo e ao que a instituição ensina?"
"Acho que saber para onde estamos indo é essencial para sermos líderes. Estamos ouvindo todos, mas não por estarmos desorientados, e sim porque temos esse dever".
O bispo, de 58 anos de idade, concentrou sua palestra em suas impressões ao longo de sua jornada - entre 2005 e 2016 - como padre do Centro Católico St. Mary na Universidade A & M do Texas. Ele descreveu que o objetivo do ministério no campus é de ajudar os jovens a se encontrarem com Jesus e enfatizou o chamado de Francisco para os acompanhar.
Konderla encorajou as comunidades religiosas a colaborar entre si e com as dioceses, além de oferecer sugestões de como encontrar jovens - espiritualmente e geograficamente - para participarem de eventos juvenis e os envolver mais em ministérios e organização de retiros e viagens - como a "corrida de freiras" para visitar os conventos locais.
O que definitivamente não funciona com os jovens, acrescentou Konderla, é o clericalismo, a condescendência, a falta de autenticidade e o julgamento.
"Eles são muito sensíveis em relação a serem julgados, por isso temos que ter muito cuidado com nossa própria tolerância à ambiguidade", disse Konderla.
McCarty desafiou a Igreja a não ver os jovens como um problema a ser resolvido, e sim uma forma de "graça".
"O que o Espírito Santo está dizendo à Igreja através das vidas e histórias daqueles que a deixaram não é uma questão de juventude. O que temos é um desafio da comunidade de fé em geral", disse McCarty, observando que os 5,4 milhões de jovens católicos que deixaram a Igreja (entre 15 e 25 anos) representam apenas uma fatia dos 30 milhões de ex-católicos.
Lii, a estudante da Universidade de Washington, disse esperar que o Sínodo forneça à Igreja uma solução para abordar todas as dúvidas dos jovens.
"Pelo que sinto agora, a Igreja parece estar muito estagnada. Eu acho que estamos presos, porque muito do que fazemos é tradição. Isso ainda é importante, mas para que a Igreja melhore, é preciso haver uma mudança real", ressaltou Lii.
Sammon disse que foi encorajado ao sínodo pelo instrumentum laboris, e espera que isso resulte em um processo que reconheça as experiências dos jovens e promova um plano para envolvê-los com a Igreja, além de criar " um futuro melhor".
"Acho que publicar um documento não será efetivamente útil, a menos que tenha certa praticidade", disse Sammon.
Pantuso, o diretor de vocações salvatoriano, disse que os dados sobre os católicos podem ajudar a Igreja fazendo perguntas de autorreflexão sobre o por que das pessoas estarem perdendo a fé e como elas podem se tornar mais acolhedoras.
"Um padre sem um rebanho é apenas uma pessoa caminhando à toa. Então, acho que precisamos mudar a conversa, fazer perguntas certas e sermos inclusivos”, afirmou Pantuso.
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EUA. Ordens masculinas focam Sínodo dos Jovens em assembleia anual - Instituto Humanitas Unisinos - IHU