24 Mai 2018
Papa Francisco incentiva novamente os bispos italianos. Abrindo os trabalhos da Conferência Episcopal Italiana (CEI), o pontífice relacionou a queda nas vocações ao sacerdócio e à vida religiosa, não só à "cultura do provisório" que parece marcar a época contemporânea, mas também a fenômenos negativos que ocorrem na Igreja: "escândalos e testemunhos mornos". Francisco se antecipou: sua intenção, disse ele, é compartilhar com os bispos algumas preocupações "não para castigar", mas para encontrar soluções. Na verdade, mais uma vez o pontífice argentino repreendeu a hierarquia da igreja. A pobreza, ressaltou, deve ser um verdadeiro estilo de vida. "Pobreza evangélica e transparência" são fundamentais. "Sem pobreza não existe zelo e não há vida ao serviço aos outros." Depois, a frase mais afiada: "Quem tem fé não pode falar sobre pobreza e viver como um faraó". E continuou: "Às vezes você vê coisas assim. É um contra-senso falar sobre pobreza e levar uma vida de luxo; e é muito escandaloso tratar o dinheiro sem transparência ou gerenciar os bens da Igreja como se fossem bens pessoais."
A reportagem é de Marco Politi, jornalista vaticanista, publicada por Il Fatto Quotidiano, 23-05-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
O Papa confessou que para ele são dolorosas as notícias que falam de eclesiásticos que acabam sendo manipulados em matéria econômica colocando-se nas mãos erradas, ou pior, que “administraram de maneira desonesta" os bens confiados à Igreja. "Nós - concluiu ele - temos o dever de gerir com exemplaridade, mediante regras claras e comuns."
São intervenções a partir das quais emerge mais uma vez a linha profética de Francisco e seu esforço para estimular uma "conversão da Igreja". O problema que surge, no entanto, é que uma vez esclarecida a estratégia de uma "Igreja pobre para os pobres" (como o Papa Bergoglio disse poucos dias depois de sua eleição para a imprensa internacional, para que a sua mensagem atravessasse o mundo) é necessário estabelecer e promulgar as regras necessárias. Na Alemanha, para citar um exemplo, as Igrejas e confissões religiosas têm a obrigação de publicar os balancetes financeiros de todas as suas propriedades. Caso contrário, não podem solicitar subsídios estatais. Na Itália, uma única diocese - a de Pádua - até agora instaurou essa regra de transparência total. Ou a CEI decide ir por esse caminho, que permite aos fiéis católicos e à opinião pública controlar eficazmente a administração dos bens da Igreja, ou até mesmo as advertências papais correm o risco de serem desconsideradas.
Para o próprio Papa se impõe a necessidade de prestar muita atenção na adoção de regras mais rigorosas em todo campo onde se manifestam "escândalos". Seria um erro acreditar que o episódio chileno, o mega-escândalo dos abusos, conivências e encobrimentos, possa ser considerado concluído com a demissão em massa e o mea-culpa coletivo dos bispos chilenos após os encontros com o papa no Vaticano.
Primeiro, porque há algo opaco nesse aparente gesto de humildade. Renunciando coletivamente, os bispos do Chile de fato renunciaram a começar a trabalhar na própria conferência episcopal para elaborar sérias orientações válidas para o futuro. Ao mesmo tempo, também renunciaram a assumir a responsabilidade de comunicar aos fieis chilenos e à opinião pública da nação, quem entre eles perpetrou abusos e quem manteve o silêncio. Concretamente eles jogaram tudo nas mãos do papa, deixando o trabalho difícil para ele.
O Papa Francisco, por seu lado, conhece muito bem e tem repetido oficialmente que o problema não se resolve apenas eliminando algumas cabeças (coisa, aliás, absolutamente necessária, para fazer justiça às vítimas), mas também à Santa Sé compete enfrentar a questão dos abusos estruturalmente.
Isso significa estabelecer, antes de tudo, a obrigação geral para os bispos de denunciar às autoridades civis os autores de crimes dentro das estruturas eclesiais. E depois significa retomar a ideia de tribunais do Vaticano descentralizados nos vários continentes para os quais as vítimas possam recorrer. Continua válida a solicitação que, há seu tempo, em 2015, a Comissão do Vaticano para os menores encaminhou para o papa para instituir um tribunal especial para o qual denunciar os "bispos negligentes".
O discurso também atinge na CEI, que, finalmente, com a presidência de Bassetti criou uma comissão para enfrentar o problema dos abusos em nível central. É importante, porém, que se chegue logo a conclusões operacionais. Acreditar que a Itália seja uma ilha de felicidade é uma ilusão. Muitos, muitos erros jazem sob as cinzas.
Mas não é só a Igreja a ser chamada para cumprir o seu dever. O novo governo Verde-Estrelado, que se perfila e que promete maior rigor na aplicação da lei, deve tomar a via legislativa da França e dos Estados Unidos, onde a hierarquia não pode se esconder por trás de falsos pretextos de autonomia, mas tem o dever de denunciar o padre-predador. Para os dióscuros Di Maio e Salvini seria uma excelente prova de coragem e seriedade.
Leia mais
- O "pensamento" do Papa Francisco. Entrevista com Massimo Borghesi
- O Papa, durante 3 horas, em diálogo com a Conferência Episcopal Italiana. Os bispos não concordam sobre a fusão das dioceses
- Papa Francisco aos bispos italianos. Suas três preocupações
- “Galantino, secretário geral da Conferência dos Bispos Italianos, e o dogma do conservadorismo social dos católicos”. Entrevista com Massimo Faggioli
- Gualtiero Bassetti, novo presidente dos bispos italianos, um pastor "com cheiro de ovelha"
- "Estilo Francisco”. Papa nomeia novo secretário da Conferência dos Bispos Italianos
- Papa Francisco e as vítimas de abusos no Chile: uma autocrítica radical e pública, mas apenas um primeiro passo
- Chile. Sacudida de bispos católicos pelo Vaticano?
- "Digam a verdade, senhores bispos do Chile", pede leigo da diocese de Osorno
- Chile. Dos 32 bispos no cargo, 30 entregaram ao Papa suas renúncias
- Chile. Irmãos maristas respondem: “Esses abusos ferem a alma; os responsáveis devem ser punidos”
- Todos os bispos chilenos apresentam sua renúncia ao Papa após o encontro de Roma
- O Papa exige dos bispos chilenos um “firme propósito de reparar os danos causados”
- Começam os encontros do papa com 34 bispos chilenos. Em pauta, as muitas faces do declínio da Igreja chilena
- “O Papa me pediu perdão e está espantado com os abusos; isto é um tsunami”. Entrevista com Juan Carlos Cruz
- Chile. Murillo e a renúncia dos bispos: “A Igreja deve transformar-se de abrigo para abusadores em abrigo para as vítimas”
- Todos os bispos chilenos apresentam sua renúncia ao Papa após o encontro de Roma
- "Fato histórico, assim querem chegar às raízes". Entrevista com Hans Zollner
- Caso Karadima. “Punir os nefastos acobertadores é um tratamento de choque para bispos surdos e tontos”. Entrevista com Juan Carlos Cruz
- Francisco confessa ao Episcopado sua “vergonha” pela “perversão” da Igreja chilena
- Papa Francisco e o futuro da Igreja no Chile: um plano de renovação, cura e renascimento
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Papa Francisco dá um ‘puxão de orelha’ nos bispos, mas contra escândalos e abusos não basta cortar algumas cabeças - Instituto Humanitas Unisinos - IHU