04 Dezembro 2017
Uma dezena de perguntas. Por expressa vontade do papa, todas concentradas na viagem a Myanmar e Bangladesh. Apesar do cansaço da visita dupla, também nesta ocasião Francisco não se isentou da já tradicional coletiva de imprensa no avião, entretendo-se com os jornalistas por quase uma hora.
A reportagem é de Mimmo Muolo, publicada por Avvenire, 03-12-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ele disse que, por enquanto, uma viagem à China não está em preparação, enquanto gostaria de ir à Índia no ano que vem. Ele contou como nasceu o seu pedido de perdão aos Rohingya e explicou por que usou essa palavra apenas na sexta-feira à noite (“O que me interessava era que chegasse a mensagem”, em síntese, não queria que esse uso obstaculizasse o diálogo com as autoridades que, ao contrário, ocorreu e, de sua parte, foi muito claro: “Eu não negociei a verdade”, afirmou).
Além disso, ele também apontou que, mesmo com o general birmanês Hlaing, a mensagem chegou claramente (não se pode voltar atrás) e que, hoje, no Myanmar, antes de fazer julgamentos sobre o governo democrático, é preciso se perguntar o que ele pode fazer e o que ele não pode fazer naquela situação.
O papa também enfatizou que sempre preferiu o diálogo às denúncias, porque, com o diálogo, a mensagem pode chegar mais facilmente.
Sobre a posse das armas atômicas, por fim, o papa reiterou o seu pensamento: estamos no limite da legalidade moral, porque são armas capazes de destruir a humanidade.
Palavras pronunciadas no voo de volta, que concluiu no aeroporto romano de Fiumicino às 21h40 (hora local) desse sábado à noite, com uma antecedência de uma hora em relação ao programa oficial.
Eis, aqui, um resumo das suas respostas mais significativas.
Francisco lembrou que não foi a primeira vez que a pronunciou em público, mas especificou que escolheu “comunicar passo a passo”, porque, para ele, “o mais importante é que a mensagem chegue”.
“Estou muito satisfeito com as conversas que pude ter, porque tive a satisfação de dialogar, de fazer o outro falar, de dizer a minha opinião, e, assim, a mensagem chegou. E chegou a tal ponto que continuou e terminou ontem, com aquele encontro”, razão pela qual se disse agradecido ao governo de Bangladesh, que acolheu 700 mil refugiados, enquanto há países mais ricos que fecham as portas.
Quanto ao pedido de perdão, ele se deixou guiar pela inspiração e também ficou um pouco com raiva, porque queriam logo mandar embora os 16 Rohingya presentes.
“Depois de ouvi-los um por um com o intérprete, comecei a sentir algo dentro de mim e me disse: não posso deixá-los ir embora sem uma palavra. Pedi o microfone, mas não lembro o que eu disse. Eu sei que, em certo ponto, pedi perdão. Naquele momento, eu chorava, tentava que não se visse. Eles também choravam.”
A ideia do envolvimento na oração dos outros líderes religiosos também lhe veio de repente. “No entanto – concluiu – a mensagem chegou”, e “ninguém fez críticas”. Francisco também especificou que gostaria de ter visitado os campos de refugiados, mas que não foi possível por várias razões.
Por fim, um golpe contra o pequeno grupo de fundamentalistas em um povo que, ao contrário, é pacífico: eles desencadearam a reação do Exército, que não fez distinção entre bons e maus.
Foi ele quem pediu o encontro, disse Francisco. “E eu consenti, porque, com o diálogo, sempre se ganha”. “Foi uma boa conversa”, acrescentou. “Não posso entrar em detalhes, porque foi uma conversa privada. Mas eu não negociei a verdade. Mas fiz com que ele entendesse que um caminho como era nos maus tempos [isto é, no tempo da ditadura militar], renovada, hoje, não é mais viável. Foi um belo encontro, civil, e também lá a mensagem chegou.”
À pergunta se a antecipação do encontro escondia, por parte do general, a vontade de dizer: “Aqui quem manda sou eu”, Francisco respondeu que, mais do que a intenção, importava para ele o diálogo.
Também lhe perguntaram se, na conversa, ele usou a palavra Rohingya, e ele respondeu assim: “Eu usei as palavras para chegar à mensagem e, quando vi que a mensagem era aceita, ousei dizer tudo o que queria dizer. Intelligenti pauca”.
Para julgar, é preciso considerar que a situação está em um ponto de viragem. “Não será fácil seguir em frente, mas não será fácil voltar atrás”, disse o papa. E a defesa contra os retornos ao passado é justamente uma renovada consciência internacional, além do fato de que a ONU disse que os Rohingya são os mais perseguidos no mundo.
Quanto ao governo democrático, o Myanmar “é uma nação politicamente em crescimento, em transição. Por isso, as possibilidades devem ser avaliadas também nessa ótica. Neste momento de transição, teria sido possível fazer isto ou aquilo? Em Myanmar, deve-se olhar para a construção do país. Dois passos para a frente, um para trás: a história nos ensina isso”.
A esperança é sempre a de ir até lá, mas uma viagem não está em preparação, que também “faria bem a todos”. Enquanto isso, porém, intensificam-se os contatos em nível cultural, político e no que se refere à situação da Igreja.
“É preciso ir passo a passo com delicadeza, como está sendo feito, lentamente. Eu acredito que, nestes dias, começará em Pequim uma sessão da comissão mista. É preciso paciência, mas as portas do coração estão abertas.”
À Índia, por sua vez, a viagem poderia se concretizar no ano que vem. Neste ano não foi possível, embora, inicialmente, a visita devia ser à Índia e Bangladesh. “Mas foi providencial – disse Francisco –, porque a Índia requer uma viagem para si mesma”, dando a entender que quer visitar diversas regiões do país.
“Estamos no limite da legalidade da sua posse, porque, hoje, elas podem destruir toda a humanidade”, lembrou o papa. Devemos aprender a lição de Hiroshima e Nagasaki.
Por isso, existem fortes dúvidas sobre a legalidade moral da sua posse. Na verdade, Francisco deu a entender que essa posse não é mais justificável de modo algum, nem mesmo com o equilíbrio da dissuasão, como era nos tempos do magistério de João Paulo II.
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''Eu não negociei a verdade.'' A entrevista coletiva com Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU