Por: André | 11 Mai 2015
Até onde vai a “Igreja da misericórdia”? Quais são os limites, se é que eles existem? É possível uma abertura a todas as realidades, ou estamos diante do risco de um cisma na Igreja católica? A oposição às reformas, capitaneadas pelo cardeal Burke, vislumbra-se como uma tempestade nas deliberações sobre o Sínodo sobre a Família. As repostas dos bispos alemães, a partir de outro ponto de vista, também.
A reportagem é de Jesús Bastante e publicada por Religión Digital, 08-05-2015. A tradução é de André Langer.
Na semana passada, foram divulgadas as respostas da Igreja alemã ao questionário da Secretaria do Sínodo, cuja segunda sessão será no próximo mês de outubro. Sobre o tapete, os acordos de uma notável maioria de padres sinodais sobre uma maior escuta, atenção e compreensão das realidades sofredoras. Sem atingir os dois terços, mas aprovados por uma grande maioria – e como tal, temas de debate nesta próxima reunião –, a possibilidade de abrir a comunhão às “situações irregulares” (divorciados recasados, casamentos civis, uniões civis), ou uma maior atenção ao mundo homossexual.
A Igreja alemã, que historicamente marcou tendência teológica em relação às mudanças, vive nos últimos anos uma pulsão entre reforma e tradição que se pressente imprescindível para entender as mudanças que sairão do próximo Sínodo sobre a Família. As disputas entre os cardeais Marx ou Kasper com o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o também alemão Müller, mostram sem sombra de dúvida as “duas almas” que convivem na Igreja católica. E que o próprio Papa Francisco quer que enfrentem ideias, procurando alcançar acordos sem romper a comunhão e sendo fiéis à mensagem de Jesus.
Sendo assim, os bispos alemães apóiam dar a comunhão aos divorciados recasados, ser tolerantes e dar a bênção às segundas núpcias, acolher com um novo espírito as convivências e aprovar as uniões homossexuais. De fato, há anos, muitas paróquias do país não pedem o Livro da Família para dar ou não a comunhão aos seus fiéis.
“A Igreja deve dialogar com a sociedade plural do nosso tempo”, afirmou o cardeal Reinhard Marx, arcebispo de Munique, e um dos colaboradores do Papa argentino. Marx é membro do grupo dos nove cardeais dos cinco continentes que ajudam o Papa Francisco a governar a Igreja.
Do lado contrário, o cardeal Gerhard Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, mostra suas reticências em relação a estas mudanças, a ponto de, em uma recente entrevista ao La Croix, afirmar que era necessário “estruturar teologicamente” o papado de Francisco.
Müller intervém cada vez com mais frequência e protagonizou há pouco um sério incidente no centro do ringue vaticano com o cardeal Marx. Os bispos alemães, sabendo da contestação que lhes sobrevém por parte dos conservadores, disseram que “não somos uma filial de Roma. Cada Conferência Episcopal é responsável pelo cuidado pastoral na sua área e deve proclamar o Evangelho à sua própria maneira. Nós não podemos esperar por um Sínodo para dizer como devemos formar o nosso cuidado pastoral nos campos do casamento e da família".
O cardeal Müller respondeu escandalizado que era “anticatólico” defender uma posição de soberania absoluta de uma conferência episcopal, quando prima justamente a comunhão com Roma e a subordinação à autoridade do Papa.
Os alemães já abriram o fogo da mudança radical no ano passado. Sandro Magister, o influente vaticanista do L’Espresso, que comunga mais com os conservadores do que com o Papa Francisco, escreveu na quinta-feira 07 em seu blog que “os fatos falam por si. Em quase todas as dioceses da Alemanha já se dão a absolvição sacramental e a comunhão eucarística aos divorciados recasados”
A maioria dos 24 milhões de fiéis católicos da Alemanha, que tem 80 milhões de habitantes, é a favor das grandes aberturas. O dogma de direito divino estabelece que o casamento é indissolúvel até que a morte separe os cônjuges e os que se divorciaram e casaram no civil não têm acesso a vários sacramentos, entre eles o da comunhão.
A maioria dos fiéis e bispos alemães acredita em um “caminho penitencial” que, segundo parece, é curto, e percurso no qual os divorciados recebem a absolvição e o acesso aos sacramentos. As segundas núpcias, civis, podem ser abençoadas, embora não sejam aceitas como um matrimônio. Os cônjuges não católicos também podem receber os sacramentos em muitas igrejas e são reconhecidas com simpatia e tolerância as uniões “das pessoas do mesmo sexo”.
O abismo entre as duas posições é profundíssimo, enquanto de fora chegam contínuos pronunciamentos. O ultraconservador cardeal norte-americano, Raymond Burke, na prática exilado da cúria romana para a Ordem de Malta pelo Papa, impulsionou uma petição assinada por quatro cardeais, 22 bispos e 225.000 fiéis que pedem ao Papa para que defenda a doutrina tradicional. Quinhentos padres ingleses também pediram a Francisco para que se mantenha na linha doutrinária tradicional.
Muitos cardeais estão nas fileiras, com a maioria que pede que tudo permaneça como está e que se encontrem alternativas que não toquem na doutrina. Bergoglio disse e repetiu que não tocará nos princípios doutrinários. O cardeal canadense Marc Ouellet, outro “ministro” estratégico da cúria, que se ocupa dos bispos, esclareceu na semana passada (07 de maio) que “o carisma do Papa Francisco é muito positivo” e que “o Sínodo não quer liberalizar a doutrina”. “Devemos ser criativos, para discernir como ajudar as pessoas a viverem sua vida cristã no casamento e na família”.
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A Igreja alemã marca a pauta das reformas de Francisco para o Sínodo sobre a Família - Instituto Humanitas Unisinos - IHU