10 Março 2025
Milhares de manifestantes saem às ruas em todo o território francês neste 8 de março, Dia Internacional dos Direitos da Mulher. Cinquenta organizações sindicais e feministas promovem manifestações conjuntas em uma centena de cidades francesas – Paris, Nice, Marselha, Grenoble, Lyon, entre outras – para denunciar as discriminações persistentes no mercado de trabalho, no sistema de saúde e violências de todos os tipos sofridas pelas mulheres no cotidiano.
A reportagem é publicada por RFI, 08-03-2025.
Após o retorno do republicano Donald Trump à Casa Branca, as feministas francesas estão preocupadas com o retrocesso que representa o "discurso de masculinismo" propagado no plano político e nas redes sociais, que "inferioriza as mulheres e as confinam aos papéis de esposa e mãe", disse Anne Leclerc, integrante do Coletivo Nacional pelos Direitos das Mulheres.
Essa tendência do masculinismo ideológico cultuado pelos republicanos apoiadores de Trump faz com que ativistas francesas temam um aumento das discriminações no trabalho e nas restrições ao aborto.
Em Paris, a manifestação parte da praça da República às 14h no horário local, 10h em Brasília, na direção da praça da Nação. O coletivo Némésis, próximo da extrema direita, planeja se juntar ao cortejo, apesar das advertências das associações feministas que consideram a luta identitária incompatível com a causa das mulheres.
Uma pesquisa realizada pelo instituto Ipsos para a Federação Francesa de Hospitais, que o canal BFMTV revelou neste sábado, mostra desigualdades de gênero na assistência médica. As pacientes do sexo feminino são menos ouvidas ou levadas menos a sério do que os pacientes do sexo masculino pelos médicos. "Preconceitos sexistas" persistem entre os profissionais de saúde na hora de estabelecer um diagnóstico e um protocolo de tratamento, comprometendo o atendimento às mulheres.
De acordo com a pesquisa, mais de uma em cada duas mulheres (51%) considera que os sintomas descritos ao seu médico foram “pelo menos uma vez minimizados ou não levados a sério por serem mulheres”. Pouco mais de um terço das mulheres (34%) afirmam ter recebido “comentários inadequados sobre sua aparência física ou vida pessoal” de profissionais de saúde.
Mais de quatro em cada 10 mulheres (42%) ainda dizem que os sintomas físicos descritos "foram atribuídos pelo menos uma vez a causas psicológicas e hormonais sem investigação aprofundada".
O caso de Gisèle Pelicot, sedada durante dez anos pelo marido, Dominique Pelicot, que a estuprava ao lado de dezenas de desconhecidos recrutados pela internet, revelou esse descaso de médicos com os sintomas descritos por ela nas consultas. Durante anos, Gisèle consultou vários profissionais por apresentar sintomas misteriosos, como perda de memória, apagões momentâneos e problemas ginecológicos, como uma inflamação do colo do útero. Entretanto, nenhum desses médicos, incluindo seu ginecologista, suspeitou que ela fosse vítima de estupros.
Esses preconceitos não são isentos de consequências. Segundo a Academia de Medicina francesa, as mulheres no país são vítimas de “excesso de mortalidade” por doenças cardiovasculares, devido a “atrasos sistemáticos no tratamento” dessas patologias.
As mulheres com menos de 35 anos são particularmente afetadas por essas discriminações. O estudo conclui que "infelizmente, a saúde das mulheres continua marcada pelo estigma da medicina criada por e para homens".