17 Junho 2024
Era necessário o Papa Francisco para revelar a verdade do G7 realizado na Puglia e mostrar que o rei está nu, quebrando todos os costumes ao ir a um encontro de Poderosos.
O artigo é de Raniero La Valle, jornalista e ex-senador italiano, publicado por Chiesa di Tutti, Chiesa dei Poveri, 15-06-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
No suntuoso cenário de Borgo Egnatia, que não é uma aldeia antiga, mas um hotel de luxo construído sobre as escavações arqueológicas no município de Fasano, em Brindisi, foi encenada uma ficção (não só a aldeia era falsa), aquela de um poder mundial coordenado por sete grandes Potências do Ocidente (incluindo o oriental Japão) que acreditam ter o mundo nas mãos e poder dispor dele à vontade e, acima de tudo, representar o auge da civilização e da sabedoria como se fossem o novo Império Celestial. Em vez disso, só são capazes de oficializar os decrépitos ritos da guerra, levada ao limiar da guerra mundial, porque a paz é "indecente", como titula a manchete de página inteira do Repubblica, e para zelar sobre a agonia de um mundo fora de controle, devastado pela crise climática e ambiental.
Uma série de fraquezas foi na realidade a exibição do poder dos Grandes: havia Biden que com pernas instáveis e o desafio de Trump nos EUA prometeu segurança futura à Ucrânia para os próximos dez anos, aceitando efetivamente para hoje as conquistas russas do Donbass e da Crimeia, algo que quando é pedido por Putin é definido como uma "rendição": mas foram a Ucrânia e o Ocidente que quiseram que a questão fosse resolvida não pelas negociações (como havia sido feito em Istambul), mas com a guerra, e na guerra há aqueles que vencem e aqueles que perdem, e a Rússia, que deveria ter sido derrotada, ao contrário, venceu.
Havia Macron e Scholz que, por sua vez, se viram com urnas lotada de votos soberanistas e neonazistas de eleitores que na França e na Alemanha privilegiam os horrores do passado ao invés das supostas virtudes democráticas dos senhores da guerra de hoje.
Havia Meloni que aproveita as efusões de convidados extasiados diante dos paraquedistas que descem do céu com as suas bandeiras, para relançar o mito dos primeiros-ministros fortes e inquestionáveis, esquecendo os exemplos em curso de governantes inamovíveis e suicidas como Zelensky e Netanyahu.
E prova de fraqueza foi também a submissão geral aos interesses geoestratégicos dos Estados Unidos, que, tomando Zelensky como mascote e flautista trágico, ansioso como está de atestar para si o fim do mundo, querem jogar o jogo de derrotar primeiro a Rússia e depois da “competição estratégica” com a China (mas ainda na próxima década).
É no meio dessa concentração de fraquezas e veleidades que explodiu a verdade do Papa Francisco: para onde estão indo? O Papa Francisco chegou numa cadeira de rodas, mas com olhos de criança, gritou: “o rei está nu”, e avisou todos os reis da Terra que estão passando do humano ao pós-humano, tendo inventado uma Inteligência Artificial que não se torna instrumento, mas substitui a inteligência humana e é muito mais irracional e descontrolada do que a inteligência natural, tanto que leva o mundo à tempestade. A máquina, explicou Francisco, foi treinada para a escolha entre diversas possibilidades, mas a decisão não pode ser transferida do homem para a máquina, que é animada não pela razão e pelo Espírito, mas pela álgebra e pelos algoritmos.
“Condenaríamos a humanidade a um futuro sem esperança se tirássemos às pessoas a capacidade de decidir sobre si mesmas e sobre as suas vidas, condenando-as a depender das escolhas das máquinas”, afirmou o Papa, e perder o controle sobre elas significaria perder a própria dignidade humana.
Já podemos ver isso nos conflitos armados onde se usam dispositivos como as chamadas “armas letais autônomas” quando “nenhuma máquina jamais deveria escolher poder tirar a vida de um ser humano”. E sabemos que Israel confiou à Inteligência Artificial a identificação dos alvos a atingir, e matou 37.000 deles, sem distinguir adultos e crianças, e talvez até sem distinguir reféns a salvar e reféns a deixar morrer com os “terroristas”.
Sem falar no uso da inteligência artificial pelos magistrados, como exemplificou o Papa, quando nas decisões relativas à concessão da prisão domiciliar, pedem àquele cérebro inatural que avalie a probabilidade de reincidência dos condenados “a partir de categorias pré-estabelecidas (tipo de crime, comportamento na prisão, avaliações psicológicas e outros)”, arriscando “delegar efetivamente a palavra final sobre o destino de uma pessoa a uma máquina”, eventualmente também com base em “preconceitos inerentes às categorias de dados - (como pertencer a um determinado grupo étnico) – utilizados pela inteligência artificial”. De fato, um uso descontrolado das máquinas que nos controlam apenas exacerbaria a submissão do homem à coisa, que é a verdadeira forma de dominação da era moderna.
É interessante em relação a tudo isso notar que ao apelar ao escrutínio da ética para decidir os critérios com os quais utilizar a inteligência artificial, o Papa não invocou o “conjunto único de valores globais”, considerados normativos pela Igreja Católica, mas afirmou que “na análise ética também podemos recorrer a outros tipos de instrumentos” ou seja, “encontrar princípios compartilhados com os quais enfrentar e resolver quaisquer dilemas ou conflitos da vida”.
E por fim a indicação do instrumento universal de controle: a política, como alternativa e “baluarte” contra a expansão do paradigma tecnocrático. “O mundo pode funcionar sem política? Pode encontrar um caminho eficaz para a fraternidade universal e a paz social sem uma boa política? A nossa resposta é: não! A política é necessária! A grandeza política se mostra quando, em momentos difíceis, se opera com base nos grandes princípios e pensando no bem comum a longo prazo”, concluiu o Papa Francisco.
Assim, foi posta uma pergunta ao G7, ou melhor, aos governos da Terra, e foi-lhe confiada uma responsabilidade crucial no momento dessa nova mudança absoluta: cuidado com o que fazer quando as máquinas em substituição ao ser humano estão abrindo uma nova fase na história do mundo, ainda mais do que fez a invenção da bomba atômica, que segundo o Papa João na "Pacem in Terris” inaugurou uma nova “era que se vangloria o poder atômico”. Quão importante seria que esse aviso, que na época não foi ouvido no deserto de Alamogordo, fosse ouvido agora, assim como ressoou em Borgo Egnatia!
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A inteligência acabou. Artigo de Raniero La Valle - Instituto Humanitas Unisinos - IHU