- Protocolado no recurso extraordinário pela Conectas Direitos Humanos, documento cita soluções propostas pelo ministro como “inadequadas e incompatíveis com a Constituição” e se manifesta contrário à indenização prévia;
- Julgamento no Supremo será retomado na próxima quarta-feira (30/08).
A reportagem é divulgada pela assessoria de comunicação da Comissão Arns, 29-08-223.
Em parecer elaborado a pedido da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos D. Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns e protocolado no recurso extraordinário (RE 1017365) pela Conectas Direitos Humanos no início do mês, o professor Daniel Sarmento, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, criticou o voto do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), no âmbito da ação sobre o marco temporal das terras indígenas. No documento, Sarmento avaliou as soluções propostas pelo ministro como “inadequadas e incompatíveis com a Constituição”, pois geram “graves danos” aos direitos dos povos indígenas, à segurança jurídica e à proteção do meio ambiente. O Supremo retomará o julgamento na próxima quarta-feira (30/08).
Em seu parecer, o constitucionalista se manifesta contrário à proposta de indenização prévia formulada no voto. Conforme disposto pelo ministro Alexandre de Moraes, diante de controvérsias judiciais, a União deve pagar indenização prévia aos ocupantes não indígenas das terras a fim de garantir a segurança jurídica. Os pagamentos seriam “em dinheiro ou em títulos da dívida agrária, tanto em relação a terra nua quanto as benfeitorias necessárias e úteis realizadas”.
O professor Daniel Sarmento argumenta que, embora considere legítima a preocupação com a segurança jurídica dos ocupantes não indígenas que tenham agido de boa-fé, a indenização da terra nua na demarcação foi “expressamente vedada” pela Constituição. Para ele, essa proposta resultaria em gastos vultosos para os direitos territoriais dos povos indígenas e causaria uma série de atrasos nas demarcações, que poderiam se tornar inviáveis.
Além disso, o caráter prévio das indenizações demonstraria uma “inversão de valores constitucionais”, priorizando os interesses patrimoniais dos não indígenas em detrimento dos direitos territoriais dos povos indígenas. “Tal sistema, além de afetar severamente os povos indígenas, prejudicaria também o meio ambiente, em cenário de emergência climática, já que os povos originários são os verdadeiros guardiões das florestas”, diz o parecer.
“Caso o marco temporal seja aprovado, caberia a hipótese da indenização se o aspecto prévio fosse eliminado, e apenas após minuciosa análise de caso a caso, para garantir que o ocupante não indígena da terra esteja agindo de boa-fé há muitas décadas, mas que tenha sido atraído por ato ilegal do Poder Público com aparência de regularidade”, diz o advogado Oscar Vilhena Vieira, membro da Comissão Arns e diretor da Escola de Direito da FGV (Fundação Getúlio Vargas), em São Paulo.
Outra proposta do voto do ministro Alexandre de Moraes, a concessão de terras equivalentes aos povos indígenas afetados também não encontra lastro constitucional, de acordo com o professor Sarmento. Além disso, “não se sustenta, diante da natureza espiritual da relação dos indígenas com o seu território tradicional, o que torna a respectiva área absolutamente infungível”. Os requisitos de “interesse público” e “paz social”, defendidos no voto para essa proposta, são considerados vagos e insuficientes para garantir a proteção dos direitos dos povos indígenas, conforme o documento.
Confira o parecer na íntegra neste link.
Sobre a Comissão Arns
Criada em fevereiro de 2019, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns busca dar visibilidade e acolhimento institucional a graves violações da integridade física, da liberdade e da dignidade humana, especialmente as cometidas por agentes do Estado contra pessoas e populações discriminadas – como negros, indígenas, quilombolas, pessoas LGBTQIA+, mulheres, jovens, comunidades urbanas ou rurais em situação de extrema pobreza. A Comissão Arns trabalha em rede com outras organizações sociais para detectar casos, dar suporte a suas denúncias públicas, encaminhar questões aos órgãos do Judiciário e organismos internacionais, promover ações específicas junto a lideranças políticas e mobilizar a sociedade. Seu trabalho é apartidário e congrega figuras públicas de formações distintas, mas complementares, todas elas comprometidas com a defesa da dignidade da pessoa humana.
Em seu nome, a Comissão destaca a figura do Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016), Arcebispo Emérito de São Paulo. Em 1972, Dom Paulo criou a Comissão Justiça e Paz de São Paulo, porta aberta no acolhimento das vítimas da repressão política e policial no país. Ao homenageá-lo, a Comissão reconhece esse exemplo de resistência, resiliência e, sobretudo, de esperança para os brasileiros em tempos difíceis.
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