11 Outubro 2022
"Esta guerra nascida como um conflito territorial transformou-se depois numa guerra entre valores, entre diferentes éticas. Isso também é triste, muito triste, e é um conflito acompanhado de profunda hipocrisia", escreve Enzo Bianchi, monge italiano e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por La Repubblica, 10-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Se "apocalipse" significa "levantar o véu", estamos realmente diante de um apocalipse nesta guerra que começou entre a Rússia e a Ucrânia, mas que depois se revelou uma guerra que à Rússia opõe a OTAN, o Ocidente e também a Itália. Justamente graças às nossas armas sofisticadas e "inteligentes", a Rússia ainda não atingiu nenhum dos objetivos declarados pelo Kremlin, no entanto anexou quatro regiões. Mas o que parece ser o verdadeiro resultado de oito meses de guerra é o inútil massacre de civis inocentes, especialmente ucranianos, é a devastação daquelas terras, a fuga ou a deportação de habitantes e a barbárie dos massacres perpetrados.
Agora a hipótese de uma negociação parece surgir no horizonte. As palavras do Papa Francisco, que várias vezes denunciou o apocalipse que acompanha esta guerra, não foram acolhidas, mas assim chegamos a uma hora terrível: aquela em que se é tentado a recorrer às armas nucleares. Diante dessa catástrofe iminente, o Papa voltou a fazer um apelo, desta vez diretamente a Putin e a Zelensky. Ele pediu ao primeiro que parasse o conflito e ao segundo que "estivesse aberto a propostas sérias de paz".
Também foi concreto: na negociação pela paz será necessário garantir os direitos da minoria de língua russa, levar em conta os legítimos interesses de segurança da Rússia e, portanto, não armar as fronteiras, respeitando a integridade territorial de cada nação. No entanto, resulta claro para todos que essas hipóteses do Papa das negociações pela paz também devem ser aceitas pelo Ocidente e principalmente pelos EUA, por isso será necessário renunciar a cenários de humilhação da Rússia.
A única saída é o diálogo e a negociação pela paz. Os recentes Prêmios Nobel da Paz mostram que é sempre um caminho viável. Caso contrário, a destruição se torna possível, a aniquilação com o uso de armas nucleares. Não nos iludamos: a história do século XX nos lembra que essas armas já foram usadas contra uma população indefesa. As bombas táticas que hoje podem atingir pontos nevrálgicos cruciais de maneira mais circunscrita sem destruir cidades inteiras, são apenas o primeiro passo de uma escalada descontrolada. Mas caso se comece um conflito desse tipo, então será a terceira guerra mundial.
Enquanto isso, esta guerra também está sendo vivida aqui na Itália em alinhamentos que com violência e intolerância se acusam mutuamente: uns são pró-putinianos, os outros apoiadores dos EUA. A guerra é realmente um vírus cujo contágio se espalha facilmente mesmo entre aqueles que não participam diretamente dela.
A mera postura de fazer perguntas parece um alinhamento.
Quem é contra a guerra, toda guerra, porque sua fé cristã lhe impõe, entendida hoje à luz da mensagem de Jesus de Nazaré, é desprezado e apontado como traidor dos valores do Ocidente.
Esta guerra nascida como um conflito territorial transformou-se depois numa guerra entre valores, entre diferentes éticas.
Isso também é triste, muito triste, e é um conflito acompanhado de profunda hipocrisia.
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O caminho da paz. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU