13 Mai 2022
"Em outras palavras, Pequim parece estar em graves dificuldades para enfrentar todos esses desafios e riscos e, como muitas vezes acontece em tais situações, comete mais erros do que deveria. Nestas condições, talvez seja ainda mais importante a Santa Sé buscar o diálogo e o entendimento com Pequim. Se a Igreja não fala com quem erra e talvez não o saiba e não o veja, com quem vai falar?", questiona o sinólogo italiano Francesco Sisci, em artigo publicado por Settimana News, 11-05-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
A prisão do Cardeal Joseph Zen hoje em Hong Kong agrava automaticamente a posição internacional de Pequim sem sequer conceder qualquer vantagem à China, muito pelo contrário.
O cardeal era o maior inimigo na Igreja do acordo assinado em 2018 entre a Santa Sé e a China e nestes três anos e meio com desenvolvimentos lentos, mas concretos nas relações, também por isso havia se tornado marginal no debate interno da Igreja sobre a China.
Hoje sua prisão o traz de volta ao centro e lhe dá um palco que coloca toda a Igreja em dificuldade e constrangimento. O papa tentou manter uma posição alta no conflito na Ucrânia, frustrando as tentativas da Igreja Ortodoxa Russa de transformar a invasão em uma guerra santa. A Santa Sé defendeu firmemente o acordo com a China, mesmo quando o governo estadunidense do presidente Donald Trump exerceu enorme pressão nesse sentido.
Agora isso complica tudo para a Santa Sé e cria um novo problema sobre algo que parecia resolvido.
Dito isto, justamente esta prisão demonstra o quanto fosse oportuno e necessário ter um acordo. Hoje, com um acordo, pelo menos existe um canal de comunicação e o destino de milhões de católicos chineses tem pelo menos um mínimo de tutela.
Caso contrário, o risco poderia ser o de colocá-los diante das difíceis escolhas dos anos 1950, de renunciar à sua fé ou renunciar a ser chineses.
Dito isto, não está claro por que Pequim decidiu hoje a prisão.
Pequim já errou ao acreditar na propaganda russa de uma vitória fácil de Moscou na Ucrânia, e isso está criando constrangimentos internos e externos.
Pequim está enfrentando um enorme desafio do Covid com dezenas de cidades e centenas de milhões de pessoas em lockdown total e parcial, e uma contração econômica sem precedentes na história recente.
Neste momento, talvez não tenha sido a atitude mais sensata prender um homem de 90 anos que, por mais que seja, não pode ser muito perigoso e que só se torna perigoso depois dessa prisão.
Em outras palavras, Pequim parece estar em graves dificuldades para enfrentar todos esses desafios e riscos e, como muitas vezes acontece em tais situações, comete mais erros do que deveria.
Nestas condições, talvez seja ainda mais importante a Santa Sé buscar o diálogo e o entendimento com Pequim. Se a Igreja não fala com quem erra e talvez não o saiba e não o veja, com quem vai falar?
Leia mais
- Hong Kong: O Arcebispo Chow falou com o Card. Zen, “está bem e pede para não se preocupar”
- Sobre a prisão do Card. Zen as palavras dos porta-vozes do Vaticano e da Casa Branca
- Hong Kong, preso o card. Zen
- Cardeal chinês recorre a Francisco em nome de bispos chineses leais ao Vaticano
- China. Cardeal chinês diz: ‘Estou pronto para ser preso’
- China. Decano dos cardeias, cardeal Re, acusa Zen de mentir descaradamente
- O Papa Francisco e a nomeação de bispos na China. A reação do cardeal Zen
- O cardeal Zen pede que a “Igreja clandestina” não seja abandonada
- Joseph Zen e o acordo com a Santa Sé – China
- O Papa responde à acusação de Zen de trair bispos
- Papa Francisco, operação Pequim: por que é tão difícil o acordo com a China
- A China precisa de mais do que da diplomacia do Vaticano
- China: depois do acordo os bispos e fiéis rezam pelo Papa
- Francisco escreve aos católicos chineses: “A fé muda a história”
- Papa envia mensagem de fé aos católicos chineses
- O que há de novo na relação entre a China e o Vaticano?
- Hong Kong está sozinha diante do punho de ferro da China
- Hong Kong. China elogia a não condenação do Papa
- Hong Kong escreve o manual dos protestos no século XXI
- O Vaticano rejeita as ingerências dos EUA: “O acordo com Pequim segue em frente”
- Faíscas entre EUA-Vaticano sobre a China. Pompeo opõe ao Papa Francisco (que não o recebe) João Paulo II
- Mike Pompeo, secretário de Estado dos EUA, fala a diplomatas vaticanos para que sejam “audaciosos” (como João Paulo II) sobre a China
- Enquanto Mike Pompeo chega em Roma, nós atravessamos o espelho
- Trump pede ao Vaticano para romper relações com a China: uma pretensão sem motivos. Aliás, existe um
- Os Estados Unidos presumem de suposta “autoridade moral” e pedem ao Vaticano para que não renove o acordo com a China
- Não há soluções fáceis: uma resposta à crítica de Weigel ao acordo China-Vaticano. Artigo de Massimo Faggioli
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A prisão do Cardeal Zen. Artigo de Francesco Sisci - Instituto Humanitas Unisinos - IHU