25 Setembro 2025
A reação antiecológica infecta cada vez mais o esforço mundial para conter a crise climática.
As palavras negacionistas de Donald Trump e o atraso nos planos da UE prejudicam a cúpula especial da ONU, prevista para impulsionar a ação contra o aquecimento global.
A informação é de Raúl Rejón, publicada por El Salto, 25-09-2025.
Um preâmbulo de uma cúpula especial convocada pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, para "acelerar" a luta contra as mudanças climáticas: a União Europeia, que protagonizou um motim diplomático na Cúpula do Clima do Egito em 2022 para forçar mais ambição, agora teve que emitir uma declaração de intenções inédita porque não conseguiu chegar a um acordo sobre o novo plano climático que deveria apresentar à ONU.
A corrente antiecológica não para de se infiltrar nas políticas ambientais: a ascensão da extrema direita e algo mais.
Nesta quinta-feira, o mundo deveria saber o quanto está disposto a se comprometer para evitar os piores impactos das mudanças climáticas. A ferramenta? Os compromissos nacionais de redução de emissões (NDC). Esses planos deveriam ter sido entregues para análise em fevereiro, o prazo foi estendido para junho e, mais uma vez, para o final de setembro. Antes do encontro de líderes na sede da ONU, apenas 50 dos 150 signatários do Acordo de Paris os haviam depositado, segundo a contagem do Climate Watch.
A ONU pressiona, mas as resistências aumentam. "Supunha-se que este encontro em Nova York deveria ser um passo chave para avançar nas negociações", explica Javier Andaluz, coordenador da área de mudanças climáticas da Ecologistas en Acción. "Em teoria, os países deveriam ter colocado seus compromissos na mesa em fevereiro para que pudessem ser analisados e para chegarem agora preparados para iniciar um diálogo que se concretizaria na COP do Brasil", acrescenta. Desta forma – continua o ecologista – "dariam o tiro de partida para essa nova revisão ascendente dos compromissos nacionais e saberiam para onde esses planos nos levariam".
Neste contexto, o otimismo vem, por exemplo, de Simon Stiell, secretário executivo da Convenção das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, que insiste: "Na década que se passou desde o Acordo de Paris, testemunhamos mudanças incríveis". Até 40% da eletricidade gerada globalmente é feita por meio de fontes renováveis.
— Javier Andaluz, Coordenador da área de mudanças climáticas da Ecologistas en Acción.
A CEO da European Climate Foundation – e arquiteta do Acordo de Paris – Laurence Tubiana também aponta que "a trajetória global mudou: sem o acordo, caminharíamos para um aumento do aquecimento global de 5ºC", embora admita que "vemos os custos da inação: os efeitos das mudanças climáticas estão nos afetando duramente. O desafio é político", ressalta.
Como resposta política, o presidente dos EUA, Donald Trump, apresentou nesta terça-feira na Assembleia Geral da ONU uma série de argumentos completamente anticientíficos e negacionistas: chamou as mudanças climáticas de "a maior fraude perpetrada no mundo" e disse que "todas essas previsões, feitas por pessoas estúpidas, estavam erradas e custaram fortunas a esses países e os deixaram sem oportunidades para ter sucesso. Se vocês não se afastarem dessa farsa verde, vocês vão cair".
A corrente adversa
A corrente não é favorável. "Recentemente, testemunhamos rachaduras no apoio popular e político à transição climática", afirma uma recente revisão da literatura científica realizada pela Universidade Bocconi de Milão. Uma crescente desafeição relacionada à "distribuição das consequências das políticas climáticas" por um lado e, por outro, a um fator cultural "que se conecta com o ceticismo em relação às elites políticas e científicas". O que a nova direita americana rotulou e expandiu como "woke".
Uma das autoras deste trabalho, Valentina Bosetti, insiste que a base deste fenômeno é a falta de conhecimento: "Os dados nos dizem que os cidadãos não têm ideia de quais políticas climáticas estão sendo desenvolvidas, o que elas implicam e em que ponto da transição energética estamos. Eles acreditam nas histórias que lhes são contadas. A narrativa importa mais que os fatos".
Estes pesquisadores concluíram que a reação antiecológica entre os cidadãos que são afetados por políticas climáticas – como a eliminação dos privilégios fiscais do diesel – ou aqueles que têm medo de ser no futuro "beneficiou os partidos populistas de extrema direita", que, além disso, puderam usar este assunto – acrescentam – em sua "estratégia para politizar através de temas divisivos que quebram consensos sociais, onde a política climática se conecta com outros assuntos utilizados dessa maneira, como a imigração".
Por essas rachaduras se infiltraram – e as ampliaram – políticas como a saída dos EUA do Acordo de Paris ou o redobramento da extração, venda e uso de combustíveis fósseis. Uma tendência em que estão os 20 maiores produtores mundiais de carvão, petróleo e gás, como os próprios EUA, Rússia, Brasil ou Arábia Saudita.
Na Europa, de acordo com o que os pesquisadores da Bocconi compilaram, foi constatado o "impacto adverso que a ascensão da extrema direita teve na ação para mitigar as mudanças climáticas". Ela "enfraqueceu as medidas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, a incorporação de fontes renováveis e o abandono dos combustíveis fósseis".
E esse ambiente arrasta, por exemplo, o mundo empresarial, que parece ter perdido a vontade de caminhar para um modelo mais verde e abandonou os compromissos climáticos.
"Os países falharam novamente", reflete Javier Andaluz, que analisa que "é especialmente preocupante a postura da União Europeia com essa virada negacionista para a direita que existe no Parlamento Europeu e que coloca um futuro digno em ainda mais risco. O atraso da UE em apresentar seu plano climático envia um péssimo sinal, pelo qual a Europa perde a liderança e se junta à ala "retardatária"".
O 'big money' perde a vontade de parecer verde.
Quando os chefes de estado e governo se despedirem nesta quinta-feira, faltarão 15 dias para começar a Cúpula do Clima em Belém do Pará (Brasil). E é assim que está o campo de jogo.
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