16 Agosto 2025
Um apelo aos judeus de todo o mundo para que se unam e se dirijam ao Tribunal Internacional de Justiça contra Israel pelo uso do judaísmo como cobertura de crimes de guerra. O apelo foi lançado na semana passada por Avraham Burg, ex-presidente do Knesset e uma das figuras mais proeminentes do pacifismo israelense e da luta comum com os palestinos.
A entrevista é de Chiara Cruciati, publicada por Il Manifesto, 12-08-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
O apelo tem como título "Judeus, rebelem-se. Agora" e visa reunir "um milhão de judeus, menos de dez por cento da população judaica global": "Não permitiremos que o Estado de Israel, que inflige sistematicamente violência contra a população civil, fale em nosso nome", escreve Burg. Conversamos com ele por telefone.
Por que esse apelo?
Sou um intelectual, contribuo com meus pensamentos. Estou vivenciando um momento na minha vida de colisão total entre o comportamento do meu Estado e os valores da minha cultura. Se você é uma pessoa de bem e com integridade intelectual, deve se perguntar de que lado está: se apoiar os crimes do seu país ou oferecer uma alternativa. Como não posso apoiar nem justificar nada do que Israel está cometendo em Gaza, devo oferecer uma alternativa. Acredito que "cultura judaico-cristã" seja uma definição problemática, mas não tenho dúvidas de que a universalidade do direito internacional é o resultado dessa relação. Pertenço ao sistema de valores do universalismo e também pertenço a Israel. Voltei-me para o meu lado universal e fiz o apelo.
Pede para se dirigir a Haia porque Israel alega estar agindo em seu nome. Israel conseguiu vender a ideia de que Estado e religião coincidem?
Nada do que Israel fez aos palestinos em cem anos justifica os crimes do Hamas de 7 de outubro. E nenhuma das atrocidades cometidas pelo Hamas em 7 de outubro justifica o que Israel está cometendo em Gaza. Se esperamos que os palestinos, e os muçulmanos, porque o Hamas se define assim, digam que aquele não é o caminho do Islã, eu, por minha vez, digo que esse não é o caminho do povo judeu. O que Israel está fazendo é uma traição dos valores judaicos; não representa nem a antiga ética judaica nem o que está escrito na declaração de independência de Israel. Não acredito em uma palavra do que meu governo diz; ele é liderado por um mentiroso, Benjamin Netanyahu, o pior líder político que os judeus já tiveram, e é composto por ministros que são, na melhor das hipóteses, constrangedores, e, na pior, primitivos. Acredito no que vejo diante dos meus olhos: uma linha ideológica que visa completar a Nakba de 1948. Eles o disseram abertamente e estão se movendo nessa direção.
Setores da sociedade israelense, a começar pelo exército, se opõem ao novo plano para Gaza. Essas divergências podem abrir brechas no establishment político e militar?
É verdade que, ao longo dos anos, o exército tem sido o elemento mais moderado na equação política, tentando encontrar soluções que não fossem a guerra. Ao mesmo tempo, é o mesmo exército que vem matando tantos inocentes há quase dois anos. Não importa o que dizem a portas fechadas ou para a mídia. O que importa é o que fazem.
Qual é o verdadeiro objetivo de Netanyahu? Ficar no poder? Completar, como dizia antes, a Nakba de 1948?
Há três explicações para suas políticas. A primeira: ele não perdeu a razão, mas a consciência, e o resultado é uma política assassina. A segunda: é prisioneiro dos extremistas em seu governo e de seu próprio afã de permanecer no poder. As pessoas inocentes são o custo da sobrevivência política de Netanyahu. A terceira: é o espelho do ultranacionalismo israelense, cujo objetivo declarado é impedir a criação de um Estado palestino nos Territórios Palestinos, particularmente na Cisjordânia. A guerra em Gaza é uma guerra contra o Estado palestino. Um primeiro-ministro fantoche do extremismo, desprovido de consciência e ideologicamente contrário a qualquer Estado palestino: a combinação desses três elementos explica o presente.
Protestos estão ocorrendo na sociedade israelense, muitas vezes por razões distintas, contra o governo, mas, ao mesmo tempo, as pesquisas mostram uma grande maioria a favor da expulsão dos palestinos. Qual é a sua impressão?
A opinião pública israelense mudou muito; o choque de 7 de outubro ainda vibra. A maioria dos israelenses não sabe o que está acontecendo em Gaza; eles ainda estão sob o efeito do choque e da vingança. Ainda veem isso como uma reação legítima ao que aconteceu há dois anos, sem realmente entender a que ponto estamos. É também uma sociedade profundamente dividida e em conflito consigo mesma: por um lado, 70% consideram que a prioridade é trazer os sequestrados para casa; por outro, um número quase idêntico quer continuar a guerra.