28 Fevereiro 2025
''A realidade? A alta cúpula da UE, aquela que supostamente deveria colocar Trump e Putin na linha, que faz a peregrinação a Kiev para dar aos trêmulos ucranianos um monte de retórica a custo zero e um pacote de sanções, ou seja, algo cuja total inutilidade três anos provaram além de qualquer dúvida razoável", escreve Domenico Quirico, jornalista italiano, em artigo publicado por La Stampa, 27-02-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Vamos dizer logo: o sentimento que hoje dá sentido à Europa mergulhada em tempos climatéricos é o medo. Esta é a época em que começam fatos indescritíveis e difíceis de entender para o tranquilo viver atlântico de uma elite (palavra desproporcional) cujo horizonte é apenas encontrar o fio da meada de um capitalismo animado. Pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial, temos medo de ficar sozinhos. Os EUA estão nos abandonando, achando mais útil discutir os equilíbrios mundiais com as prepotentes realidades de Putin do que com os fantasmas de Bruxelas. Será que isso é realmente surpreendente? Mas como: nós, os aliados mais fiéis por excelência?
Os Estados Unidos, o bastião das democracias ocidentais por definição, tornaram-se uma sociedade balzaquiana de novos bilionários inebriados pelos batismos de um velho imperialismo digno do início do século XX sem remorsos ou hesitações. Os novos “puritanos” são homens da ordem, de inclinação autoritário-hierárquica, intolerantes, prontos à excomunhão e ao ostracismo. A situação internacional com novas potências agressivas, a ameaça ao prestígio e o enfraquecimento da prosperidade econômica criaram um fundo denso e de cores distintas, que encontra sua síntese em Trump.
O panorama atual dos Estados Unidos não pode ser transferido para definições, especialmente aquelas fixadas na imobilidade das décadas anteriores, mas só pode ser descrito, uma tarefa que se poderia dizer de romancistas mais que de cientistas políticos. Na ilusão de povos caprichosos que amam, acima de tudo, a liberdade lunar de sutilizar “in vacuo” em hipóteses inexatas, de discutir não os eventos, mas seus reflexos em uma transposição intelectual, fizemos pior do que não perceber: fingimos que isso não aconteceria.
A velha América estabilizada e bem-pensante, a cepa sólida com os recém-chegados ávidos para se estabelecer em sua glória, era perfeita para a conveniência de astutos europeus aliados acostumados ao alinhamento automático, mesmo quando o amigo estadunidense errava grosseiramente, do Iraque ao Afeganistão, para citar apenas exemplos recentes. Para alguns, é a ascensão da escória; para outros, é apenas um retorno aos grandes personagens da verdadeira América, do país real. Essa guerra dos mundos, soma vetorial de várias batalhas, os entendidos a definiriam como “delinking”, desconexão. Algo semelhante aconteceu na Europa com a Primeira Guerra Mundial: a realidade hedionda daquele massacre era tão nova que não se conseguia sequer falar dela, a ponto de desistir. Faltavam as palavras.
Com o advento de Trump e seus anúncios, o espanto se tornou o companheiro diário das cúpulas europeias, como se não coubesse a elas afastá-lo, como se fossem impotentes diante deles. Vive-se de nostalgia de 80 anos de normalidade atlântica. Aguarda-se o fim da estação ruim como uma esperança. Contentamo-nos com o fato de que o clima ficará mais ameno, que a primavera voltará, que as árvores florescerão novamente.
Ou seja, que Trump, depois das sandices, se torne realista, ou que o Aparato de Washington, que imaginamos ser renitente e hostil, se livre dele. Até mesmo alguns propõem seduzi-lo, o milionário, comprá-lo com vantagens econômicas, ele não é um comerciante? E nesse terreno ninguém nos supera... É a grande moda da baixa corte política, é a mistura reconhecível pelo cheiro. Mais toscos são outros que, tomados por crises histéricas, arremedam elegias hipotéticas sobre seus verdadeiros problemas: ou seja, fazem surgir do nada um exército fantasma, fazem acreditar que bilhões podem magicamente criar exércitos afiados e resistentes. Uma maneira patética de se verem considerados ou se considerarem como personagens ativos. Ou improvisam, em palavras, um patriotismo continental que deveria transcender e absorver, como se estivesse bebendo uma poção mágica, aquele de nações que soltam rosnados e compõem a Europa; assim, dotadas de um status de potência mundial não apenas econômica, mas também política, diplomática e militar.
A realidade? A alta cúpula da UE, aquela que supostamente deveria colocar Trump e Putin na linha, que faz a peregrinação a Kiev para dar aos trêmulos ucranianos um monte de retórica a custo zero e um pacote de sanções, ou seja, algo cuja total inutilidade três anos provaram além de qualquer dúvida razoável.
Já seria hora de a Europa não jogar a culpa de seus fracassos e fraquezas nos outros. Tanto os Estados Unidos quanto a Rússia colocam em crise tudo o que foi até agora. O risco é se salvar apenas biologicamente, não ser mais nada e não dizer mais nada. São décadas que os europeus acreditam no que pode ser, mas nunca é.