06 Janeiro 2025
A franciscana diocesana: ”Francisco de Assis já recomendava que os religiosos e as religiosas ficassem sozinhos quando se sentiam amargurados. E os santos às vezes escondiam vidas complicadas. Momentos de amargura acontecem, mas os cristãos devem proteger a alegria”
O lembrete feito pelo Papa a um grupo de freiras para que não tenham ‘cara azeda’ vale para todos os cristãos para que protejam a ‘alegria’ cristã das tentações da ‘amargura’. Quem explica isso é a irmã Roberta Vinerba, teóloga franciscana, que lembra como São Francisco de Assis já recomendava aos religiosos e às religiosas que não saíssem da cela quando se sentiam amargurados. O tom “um tanto seco, direto e coloquial” do Pontífice argentino, diz ela, “tem o mérito de se fazer entender”.
“Às vezes, em minha vida, encontrei algumas freiras que tinham um rosto azedo e isso não é afável, isso não é algo que ajuda a atrair as pessoas”, disse Jorge Mario Bergoglio durante uma audiência ao capítulo geral da União Santa Catarina de Siena das Missionárias da Escola. “O vinagre é ruim e freiras com cara azeda, nem se fala!”, disse o Papa, desejando que as freiras cultivem “santidade, preparação e afabilidade”. “É claro que o testemunho que não só as consagradas, mas qualquer pessoa, ainda mais os cristãos, têm como dívida para com o mundo a alegria, a atitude interior de alegria de quem sabe que o mundo já está resolvido em Jesus Cristo”, explica a irmã Vinerba, franciscana diocesana de Perugia, professora de teologia moral e diretora do Instituto Superior de Ciências Religiosas de Assis.
A entrevista é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Repubblica, 04-01-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Pode acontecer de ter uma “cara azeda”?
“Na vida podem acontecer situações, temas, histórias que podem contaminar a alegria com o espírito da amargura. Nesse sentido, tomamos o apelo do Papa como um lembrete, que eu estenderia a todos os batizados, de uma sentinela que nos lembra de estar sempre atentos para proteger essa alegria em nós, para purificar a alegria do espírito de amargura que poderia contaminar a alma”.
O Papa Francisco, de fato, repetiu várias vezes ao longo dos onze anos de seu pontificado esse convite a todos os cristãos para não terem “cara azeda”...
É um convite que ele faz a todos: ter um rosto sereno, um rosto sorridente - o que não significa que necessariamente as coisas estejam indo bem, mas que fala de uma esperança, uma certeza, a esperança de sermos testemunhas críveis dessa salvação que chegou até nós. Mas esse é um convite a todos. São Francisco de Assis também exortava à serenidade, a ter um rosto sereno, e dizia: "Não saiam de sua cela quando se sentirem amargurados". Isso não é uma novidade. A respeito de muitos santos somente após a morte é que se descobriu a vida interior conturbada que tiveram, mas externamente sempre tiveram um rosto sereno.
Isso se aplica somente a padres e freiras?
É uma exortação válida para toda pessoa batizada, mas eu gostaria de dizer para todo homem e toda mulher, a de não se deixar contaminar pelo espírito da amargura e da tristeza um tanto ressentida, da tristeza pungente que talvez se apodere de nós em certos momentos difíceis da vida que se acaba tendo que enfrentar. É isso, mesmo nesses momentos, a novidade cristã é que a história é resolvida em Cristo, e esse lembrete serve para evitar ceder a momentos de amargo desânimo. As palavras do Papa são sempre exortativas, nunca punitivas.
Nem todos apreciam a linguagem imaginosa de Jorge Mario Bergoglio, mas todos a entendem.
Cada um tem sensibilidades diferentes, a linguagem do Papa pode ser mais agradável para alguns e mais hostil para outros, como normalmente acontece nas relações humanas. Dito isso, ela tem o mérito de ser imediata. Como toda linguagem imediata, deve ser contextualizada, deve também levar em conta a forma cultural do Papa, que não é europeu e não é italiano: nós sempre raciocinamos no nosso pequeno mundo, mas quando o Papa fala, ele fala para o universo. E essa linguagem, que para nós é nova, um pouco seca, direta, coloquial, tem o mérito de se fazer compreender: uma frase desse tipo provoca reações.
Falando de amargura e alegria, como devemos abordar o jubileu que o Papa Francisco quis dedicar à esperança porque, como ele explicou, há bem pouca esperança no mundo de hoje?
O sinal da porta aberta me parece a melhor resposta para todos os questionamentos que até mesmo frases desse tipo podem provocar. Cada palavra é um convite para cruzar a soleira. Este é um momento lindo, mesmo para os não crentes, a porta que se abre é um momento lindo. Como diz o profeta Isaías: "Eis que faço uma coisa nova; agora está saindo à luz; porventura não a percebeis?" Gosto de pensar, para mim e para todos, que há um novo tempo, que a graça do jubileu é real, é efetiva.
Nesse sentido, qual é a importância de sua espiritualidade franciscana?
Eu gosto particularmente da virtude da esperança. A bula de indicação do jubileu é muito bonita e é dedicada à 'esperança que não decepciona': há esperanças que decepcionam, desejos que decepcionam, mas, também, há uma esperança que não decepciona: não é uma coisa boba, há algo que não decepciona, mesmo neste tempo. É isso”, conclui a irmã Vinerba, “creio que é importante ver a porta que se abre, caso contrário, todos nos sentiremos azedos: educadores, pais, jovens".
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
“Freiras com cara azeda? O Papa quer dizer: deixem a tristeza na cela”. Entrevista com Roberta Vinerba - Instituto Humanitas Unisinos - IHU