26 Novembro 2024
Mais de três décadas depois da criação da UNFCCC no Rio de Janeiro, caberá ao Brasil liderar os esforços para recuperar o sistema multilateral para o clima.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 26-11-2024.
A COP29 de Baku não colapsou, mas nada indica que o sistema multilateral para o clima resistirá a mais um fracasso dessa magnitude no futuro. Em uma ironia do destino, a missão de resgatar esse sistema caiu no colo do Brasil, o mesmo que testemunhou a criação da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) durante a Rio-92. Caberá ao governo brasileiro, enquanto anfitrião da próxima COP30, liderar o esforço de recuperação do diálogo multilateral entre países ricos e pobres para o clima.
“A diplomacia brasileira terá de trabalhar a partir de amanhã por acordo que tenham relevância para a crise climática, e não apenas nos que já estavam em seu mandato”, comentou Paulo Artaxo, professor da Universidade de São Paulo (USP) e integrante do Painel Intergovernamental da ONU sobre Mudanças Climáticas (IPCC), à Folha.
Como outros países em desenvolvimento, a meta financeira definida em Baku desagradou aos negociadores brasileiros, mas a perspectiva de novas dificuldades na COP30 convenceram a delegação a apoiar o texto costurado pelo Azerbaijão. O não fracasso de Baku facilita a agenda de negociação de Belém, mas cria empecilhos próprios que podem dificultar as discussões sobre a ambição das novas metas nacionais de mitigação.
“Mais financiamento incentivaria os países a apresentarem novas metas [NDC] mais ambiciosas no ano que vem”, afirmou Karen Silverwood-Cope, do WRI Brasil. “Ao assumir a presidência da COP30, o Brasil terá o dever de continuar sendo um exemplo positivo e cobrar maior ambição dos demais países, assim como recuperar a confiança das partes após um processo decisório desgastado e em um contexto geopolítico mais desafiador”.
“A COP 29 teve um resultado fraco em finanças e até pior em mitigação. Mas teria sido bem pior se em Baku não tivesse chegado a acordo nenhum sobre financiamento”, disse Mark Lutes, do WWF Internacional, ao Valor. “Neste caso, a COP em Belém precisaria recuperar o tempo perdido, consertar o erro da COP29 e a agenda não teria chance de avançar”.
O “poderia ter sido pior” também considera a realidade do sistema multilateral global, encabeçado pela ONU, que sofre há anos com uma crise existencial. Ao mesmo tempo em que os países concordam que o modelo pós-1945 não faz mais sentido hoje, não existe qualquer concordância sobre o que poderia substituí-lo.
“A ONU não pode invadir a soberania dos países. Não tem como obrigar países a cumprirem aquilo que eles mesmos prometeram. Tudo repousa na boa vontade ou vergonha dos países. Não acho que isso possa ser reformulado”, avaliou Shigueo Watanabe Jr., do Instituto ClimaInfo, ao Estadão.
Mas não dá para ignorar o amargor do resultado final de Baku na questão financeira. “O mundo em desenvolvimento exigia ao menos US$ 1 trilhão em recursos públicos na COP29. Mas terminou com um acordo para a mobilização de US$ 300 bilhões anuais de várias fontes para a ação climática e a promessa de um dia atingirmos US$ 1,3 trilhão, sabe Deus como. Um imenso ‘na volta a gente compra’”, escreveu Claudio Angelo, do Observatório do Clima, no jornal O Globo.
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Reconstrução da confiança entre países será desafio para o Brasil na COP30 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU