16 Outubro 2024
"Ser revolucionário é agora uma instrução do Magistério. Onde quer que possamos, devemos habitar essas ilhas insurgentes do novo Mar da Galileia, que tem suas margens em todo o mundo", escreve Marcello Tarì, pesquisador independente italiano, em artigo publicado por Settimana News, 14-10-2024.
Vivemos tempos agitados. Deveria ser precisamente o tempo dos revolucionários. Mas alguém, com razão, poderia me dizer que hoje estamos, no entanto, imersos nos escombros de todas as tradições e ambições revolucionárias modernas, enquanto a frente reacionária está na ofensiva, uma ofensiva sangrenta. E isso é verdade.
Portanto, devemos repensar muitos conceitos, categorias e palavras para penetrar na realidade. O que realmente significam hoje democracia, Estado, nação, capitalismo, povo, religião, comunismo, anarquia, fascismo? E o que significa também um movimento, uma insurreição, uma revolução? Tudo isso ainda faz sentido? Confesso que não sei, e discernir é muito difícil. Então, como fazê-lo? Por onde começar? Proponho começar questionando uma grande palavra nossa: a Comuna.
Parafraseando uma antiga e sábia sentença sobre a Igreja, poderíamos dizer: "Commūne semper reformanda". Onde por Commūne – a Comuna – entendo ideias e modos de ser, agir, lutar e amar, uma forma de vida situada na história e orientada para uma transformação radical do mundo e de si mesmo através de um projeto "comunionista" O segundo número de The Reservoir [Autonomedia, 2023], a revista editada pelos camaradas de Woodbine no Brooklyn, Nova York, intitulado Comunhão, no qual tive a honra de participar, é uma visão muito interessante sob esse ponto de vista; por semper reformanda – em contínua reforma – podemos entender um processo interminável de conversão interior a partir da própria maneira de viver essa transformação à luz dos tempos.
Na minha opinião, finalmente, a Comuna é o lugar de um processo, mas não algo estático ou definido espacialmente. Em outras palavras, a Comuna é mais uma questão de tempo ou, com uma antiga palavra grega, kairós. Ou seja: a Comuna é um processo que, no entanto, só se torna plenamente visível em relação ao kairós. Além disso, nós, que somos fiéis católicos, devemos tentar pensar e agir nossos projetos comunionistas em comunhão com a reforma sinodal em curso na Igreja. Afinal, o que é um Sínodo, que significa "caminhar juntos", senão um kairós católico e uma Comuna itinerante, guiada pelo Espírito Santo?
Na verdade, creio que o que realmente precisamos é da criatividade espiritual e da determinação na caridade com a qual São Paulo, por exemplo, foi capaz de retomar conceitos e categorias helenísticos e subverter seu significado à luz da Revelação.
Pensemos, por exemplo, no katechon, antigo conceito estoico que indicava a ação que convém ao homem na medida em que está inscrita em sua natureza. Ele se transforma, em São Paulo, em uma misteriosa força restritiva do Mal, personificada no Anticristo, tornando-se assim um dos conceitos teológico-políticos mais poderosos no sentido moderno do termo. A saber: uma subversão total e transcendente do significado estoico original. Assim como no Evangelho de João ocorre uma inversão da clássica hierarquia aristotélica entre bios e zoé estabelecida pela polis, mudando radicalmente o significado do que é viver. Na situação de morte em que o mundo se encontra hoje, não seria nada mal voltar a São João e repensar essa mudança, essa vida. Aliás, é o que celebramos todo domingo na missa.
Paulo diz: "Anunciamos a Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios" (1Cor 1,23). Sim, de fato, é a força subversiva do Evangelho em ação: "Já não há judeu nem gentio, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, porque todos vós sois um em Cristo Jesus" (Gal 3,28). Derrubem os muros! Uma e outra vez, o Espírito age, o Império começa a ruir e surge um novo tipo de unidade. Uma unidade que em sua própria definição implica diferenças, mas em um nível de qualidade de realidade superior, que é a realidade trinitária.
Uma Comuna, em um sentido revolucionário cristão, creio que é um dos frutos desse tipo de unidade. E a forma como ela funciona é o que poderíamos chamar de comunionismo, que vem do grego koinoìa usado nos evangelhos para significar "comunhão". Assim, poderíamos ser "comunionistas", como diz o próprio São Paulo na Primeira Carta a Timóteo (1Tm 6,18): [einai]koinonikous, sois comunionistas.
São Paulo foi um incrível gerador de novos conceitos que expressavam a nova vida em Cristo. É toda uma obra de transfiguração em todas as ordens da realidade que ele aponta com sua poderosa teologia messiânica. Em São Paulo podemos ver como as palavras podiam ressuscitar em e através da Palavra. Porque até mesmo as palavras, os conceitos, as filosofias e as políticas, como tudo o que é humano, morrem. Mas a morte não é o último ato, como sabemos e esperamos.
Tenhamos sempre presente: o uso e a transformação dos conceitos filosóficos é algo bom se fizer parte do uso e da transformação de uma forma de vida voltada para o Bem, o Verdadeiro e o Belo. Todo conceito pensado apenas por si mesmo, ou para aumentar o próprio poder e a própria gratificação, é inútil no mínimo, e mau no máximo. Abaixo os escribas!
Por exemplo, a grande novidade em relação ao marxismo que apresentaram o operaismo (ou obrerismo) e os novos movimentos autônomos na Itália dos anos 60 e 70, história da qual sou filho, foi algo assim, uma transfiguração de alguns conceitos da luta contra o capitalismo, um esforço coletivo para construir uma forma de vida mais justa e alegre, e foi genial. As faíscas do Espírito estão sempre presentes nas lutas dos que têm fome de justiça, mesmo que não sejam reconhecidas.
De fato, falta-lhes algo importante que, poderíamos pensar, foi uma das razões de sua derrota. Em primeiro lugar, a transcendência, que de fato esteve no centro do pensamento de Mario Tronti nas últimas décadas de sua vida: "Podem o conflito e a transcendência estar juntos? Acho que devem estar juntos, porque o conflito é o que arma a subjetividade para que possa crescer, se auto-organizar, ou ser organizada de cima, como eu prefiro; enquanto que com a transcendência deve-se olhar além do presente e da história". Estas palavras pertencem à última intervenção pública de Mario Tronti, em 10-06-2023, um longo diálogo-entrevista com o filósofo Adelino Zanini.
Notemos o que o Papa disse recentemente em Verona: "Um conflito é, na verdade, um desafio à criatividade (...) de um conflito só se sai 'de cima'".
Esse "de cima" me parece uma clara indicação de um movimento transcendente, que parte da base, que não evita o conflito; isso pode nos ajudar muito em nossa investigação.
A outra coisa que faltava era o amor, no sentido agápico, que Toni Negri em seus últimos trabalhos relacionava frequentemente com a figura de São Francisco: "Há uma antiga lenda que pode servir para iluminar a vida futura da militância comunista: a de São Francisco de Assis (...) Novamente na pós-modernidade nos encontramos na situação de Francisco, colocando frente à miséria do poder a alegria de ser. Trata-se de uma revolução que nenhum poder controlará, porque biopoder e comunismo, cooperação e revolução permanecem juntos, no amor, na simplicidade e também na inocência". Embora eu acredite que, na verdade, não seja São Francisco, mas o comunismo uma antiga lenda, e isso também seria fácil de demonstrar.
De qualquer modo, creio que devemos aprofundar essas intuições, que podem ser consideradas um início de conversão espiritual do logos revolucionário contemporâneo, mas fazê-lo sob a inspiração do Espírito, tentando progredir todos juntos, crentes e não crentes, "não buscando o mínimo denominador comum, mas por transbordamento, mirando no que mais 'faz arder os corações' (cf. Lc 24,32)", como maravilhosamente se afirma no segundo Instrumentum Laboris para o Sínodo Universal (IS 2ª sessão, out 2024, 63). Uma grande tentativa nessa direção é a do jovem filósofo francês Guillaume Dezaunay com seu Le Christ rouge (G. Dezaunay, Le Christ rouge, Salvator, 2023), assim como o seu [Novo Personalismo] através de uma transfiguração militante do Personalismo.
Acredito que seja uma tarefa apaixonante para nós. Vamos fazer isso!
Portanto, e isto é o que realmente quero sugerir, os diversos conceitos e categorias que herdamos da tradição revolucionária, mas também do pensamento filosófico radical de hoje, que muitas vezes nos parecem esgotados, deveriam passar por um sério trabalho de reformulação, utilizando obviamente todas as disciplinas e ciências à nossa disposição, incluindo a teologia, mas também especialmente através de um trabalho de purificação, à luz das Escrituras em primeiro lugar, depois em relação à história da salvação e, como católicos, sem perder de vista a Tradição viva da Igreja.
Seguindo o conselho paulino: "Examinai tudo; retende o que é bom" (1 Ts 5, 21). Porém, nesse caminho, se faltar uma dessas três referências teológicas e espirituais, acredito que a tarefa se tornaria facilmente um fracasso, quando não uma perversão. Pense, por exemplo, no "messiânico sem Messias" tão em voga há várias décadas em diversos círculos radicais. De fato, só pode levar a algum tipo de niilismo maligno. Como disse Jacob Taubes, comentando o fragmento escatológico de Walter Benjamin: "uma coisa está clara: há um Messias. Nada de shmontses [bobagens] como 'o messiânico', 'o político', nada de neutralização, mas sim o Messias" (J. Taubes, The Political Theology of Paul, Stanford University Press, 2003, p. 70). O caminho, a verdade e a vida são uma Pessoa, não simples conceitos.
Assim, podemos ler a insurreição à luz da ressurreição, como fazem os camaradas do coletivo cristão francês Anastasis. Eles dizem em seu Manifesto:
"Anastasis é uma palavra grega que significa 'ressurreição' e 'insurreição'. Do nosso ponto de vista, designa as duas polaridades-chave da vida cristã. Um polo é nossa crença em um Deus de amor que morreu na cruz e ressuscitou dos mortos e que é a promessa de salvação para todos os seres humanos. O outro polo é nossa crença de que esse Deus nos convida a lutar em todos os lugares e sempre pela justiça. E o Seu reino já está atuando naqueles lugares onde o amor se põe concretamente em ação".
Esse tipo de visão já foi trabalhado de alguma maneira por teólogos como Hans Urs von Balthasar quando, durante uma homilia radiofônica no tempo da Páscoa, quis sublinhar o valor absolutamente revolucionário do cristianismo:
"O cristão, junto com todos aqueles que têm verdadeira esperança, abre caminho através do absurdo do mundo. Estabelece células, ilhas de conspiração, de insurreição, redes de esperança no reino do senhor das trevas do mundo. Desde o início, o cristianismo foi visto como uma revolução total e altamente perigosa. Por que teria sido tão perseguido, se não fosse por isso? É a revolta do sentido contra o absurdo de morrer, que lança uma sombra de absurdo sobre tudo o que vive. É a rebelião da Ressurreição contra a finalidade da desintegração corporal. A rebelião do amor absoluto contra toda resignação do coração. Tudo depende da força da fé, do amor e da esperança" (H.U. von Balthasar, Tu coroni l'anno con la tua grazia, Jaca Book, 1992, p. 74).
Por fim, citando o Papa Francisco: "Nestes tempos, se os cristãos não forem revolucionários, não são cristãos".
Ser revolucionário agora é uma instrução do Magistério. Onde quer que possamos, devemos habitar essas ilhas insurgentes do novo Mar da Galileia, que tem suas margens em todo o mundo. Buscando uma ampla "conspiração do Bem" é uma expressão usada frequentemente nos últimos anos por Luca Casarini, ex-militante dos movimentos autônomos italianos e atualmente convidado especial do Sínodo, para imaginar uma rede de resistência a partir de sua experiência na ONG que cofundou, a Mediterranea Saving Humans, que lida com o resgate de migrantes e refugiados no mar Mediterrâneo, como gosta de dizer meu amigo Luca.
Mais uma vez, os céus atacarão a terra!
Nosso desafio, como cristãos, é que não podemos realizar esse tipo de operação confiando apenas nas capacidades da nossa razão ou do nosso poder imaginativo, embora a tentação seja forte e aparentemente convincente: é o Espírito Santo quem está dentro e por quem todo processo de destituição e restituição, invenção e clarificação pode e deve ocorrer. Como o Papa Francisco costuma repetir: sem o Espírito, não podemos fazer nada.
Claro, hoje existem pensadores radicais famosos ou militantes que tentam utilizar a tradição cristã dentro de seu itinerário teórico pessoal, confiando apenas em sua grande inteligência, sua grande cultura e seu pensamento excepcional, e frequentemente esse poder pelagiano/gnóstico nos fascina. É compreensível. Mas, analisando bem, o resultado de suas especulações muitas vezes aparece como algo kitsch, além de sofrer uma terrível forma de megalomania. A humildade, por outro lado, não é a menor das virtudes do revolucionário.
Afinal, não é através dessa frágil humildade que o poder de Deus sempre atuou? "Basta-te a minha graça, pois é na fraqueza que a minha força se revela plenamente" (2 Cor, 17,9). E tanto pior para os ressentidos seguidores de Nietzsche!
O Espírito sempre nos precede e nos acompanha. A oração pessoal e comunitária, a oração do coração, é, portanto, um momento chave em nossa vida militante. Devemos, então, ter sempre em mente uma equação como esta: sem Espírito, não há revolução, e sem espiritualidade, não há revolucionário.
Não é Deus quem deve se encaixar em nossos paradigmas de pensamento e ação – essa imposição me parece ter sido o limite trágico de muitas experiências revolucionárias, até mesmo cristãs –, mas sim nós que devemos tentar escutar e compreender qual é o pensamento e a ação de Deus na história e em nossas próprias vidas, os célebres "sinais dos tempos". Por isso, pensemos nos movimentos sociais que se movem de forma análoga ao movimento eterno de Deus-Trindade, tradicionalmente chamado perichorese, um fluxo de amor divino entre o Pai, o Filho e o Espírito, que, em consequência, define também o ser humano como criatura relacional fundamentada no amor.
Como proclama belamente São Paulo aos filósofos atenienses: "Nele vivemos, nos movemos e existimos" (At 17, 28). A Paixão, a Cruz, a Ressurreição, a efusão do Espírito, tudo é uma revolução ontológica que deflagra no coração do mundo e da nossa própria vida. Então, por que os movimentos sociais não estariam implicados nesse tipo de movimento e relação trinitários?
Assim, devemos imaginar o que pode ser um movimento trinitário de mulheres e homens que lutam pela paz e pela justiça, o que ele pode fazer e, acima de tudo, como pode fazê-lo. Trinitizar é um neologismo da Serva de Deus Chiara Lubich e estudado em profundidade pelo teólogo italiano Piero Coda, que escreve: "Isso significa que toda realidade só pode ser conhecida em verdade quando é conhecida como contendo em si todas as outras realidades em uma relação trinitária" (P. Coda, Chiara Lubich e a teologia de Jesus. A Trindade como lugar, método e objeto do pensamento, in: Claritas. Journal of Dialogue & Culture, v. 3, n. 2, out. 2014, p. 32).
Em outras palavras, podemos verificar a sinceridade de um movimento através da presença ou ausência do Amor-Ágape como sua principal força impulsionadora. A nosso ver, parece muito interessante o trabalho que alguns teólogos e filósofos estão realizando sobre a ontologia trinitária. Até mesmo o velho Personalismo, que hoje se pretende renovar, ganharia em termos teológicos.
Em julho, eu e outros nove amigos estivemos na residência Santa Marta para uma visita ao Santo Padre. Entre nós estavam três jovens emigrantes, que haviam chegado à Itália vindos da África depois de terríveis jornadas: jogados no deserto, vendidos como escravos, torturados em campos de detenção na Líbia, deixados à deriva no mar Mediterrâneo e, finalmente, resgatados. Um deles havia perdido a esposa e a filha na viagem, que morreram de sede no deserto, cuja fotografia deu a volta ao mundo, e já havia conhecido o Papa no ano passado, logo após chegar à Itália. De fato, o Santo Padre lhe disse que o leva e a sua história no coração e que mantém a foto de sua esposa e filha em sua mesa.
Um dos três, o que estava sentado mais próximo do Papa, em determinado momento de seu relato levantou a manga da camisa para mostrar as marcas da tortura e Francisco, fechando os olhos, colocou por um longo tempo a mão sobre essas marcas. Nesse gesto e na longa escuta, ele parecia assumir o sofrimento, transformando-o em esperança: "Ânimo, agora é preciso seguir em frente. Sem deixar que a amargura permaneça no coração, porque ela se transforma facilmente em desejo de vingança... Lembrem-se de que todos somos irmãos... E me diga, como posso te ajudar? O que posso fazer por você?". Realmente, pensei enquanto ouvia essas palavras: "Agora entendo por que ele é chamado o Servo dos servos de Deus".
Então, alguns de nós entregamos a ele um documento, um texto que traçava o caminho de uma "fraternidade" que chamamos, inspirando-nos em um discurso do Papa aos movimentos populares, de "O samaritano coletivo". Finalmente, rezamos todos juntos, em círculo, sentindo que em seu centro, no meio de nós, estava a Presença do Espírito de Jesus.
Ao sair, todos emocionados, dissemos entre nós que é assim que imaginamos a própria vida sob o Espírito das primeiras comunidades cristãs: ouvindo uns aos outros, amando os pobres, compartilhando seus recursos e possibilidades, rezando juntos a Deus, espalhando a fraternidade, a ternura, a comunhão e a justiça. A "essência do cristianismo" como forma de vida.
Por uma hora, fomos uma ilha insurgente na força tranquila de um mar revolucionário de Amor. Sem dúvida, foi uma indicação do Espírito para todos nós.
Fraternalmente em Cristo Jesus!