23 Setembro 2024
Após quarenta e três anos de espera, controvérsias e polêmicas, o Papa promove Medjugorje como um farol de fé e conversões, de bem e de paz. Mas desaconselha ir até lá em busca de “supostos videntes” e suas igualmente supostas visões de Nossa Senhora. Francisco pronuncia sua aprovação para o culto público no Podbro, a colina rochosa das aparições marianas, à luz dos “frutos positivos” gerados pela “experiência religiosa” no vilarejo da Bósnia-Herzegovina. Sem, no entanto, expressar uma opinião sobre o caráter sobrenatural dos eventos.
A reportagem é de Domenico Agasso, publicada por La Stampa, 20-09-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
A aprovação do Vaticano vem do Dicastério para a Doutrina da Fé com o aval do Pontífice. Chegou o momento “de concluir uma longa e complexa história em torno dos fenômenos espirituais de Medjugorje. É uma história na qual se sucederam opiniões divergentes de bispos, teólogos, comissões e analistas”. Começa assim “A Rainha da Paz”, a Nota assinada pelo Cardeal Víctor Manuel Fernández, conhecido como Tucho, e pelo secretário da seção doutrinal Monsenhor Armando Matteo.
A aprovação “não implica declarar como autênticos os supostos eventos sobrenaturais”, se especifica no documento, “mas apenas evidenciar que, em meio a esse fenômeno espiritual, o Espírito Santo age frutuosamente para o bem dos fiéis”. Portanto, embora não expressando um juízo sobre a moralidade das pessoas que desde 1981 afirmam ver Nossa Senhora - e, de qualquer forma, os dons espirituais “não exigem necessariamente a perfeição moral das pessoas envolvidas para poder agir” -, o Vaticano apresenta uma indicação precisa: “As peregrinações não são feitas para se encontrar com os supostos videntes, mas para ter um encontro com Maria, Rainha da Paz” e “para encontrar Cristo”. Há seis supostos videntes que receberiam mensagens da Gospa, o nome em croata pelo qual Nossa Senhora é chamada em Medjugorje. “O relacionamento com eles não é proibido, mas não é aconselhável”, afirma o cardeal prefeito.
Fiéis de todos os continentes aguardavam ansiosamente o veredicto da Santa Sé. Uma comissão internacional de investigação presidida pelo Cardeal Camillo Ruini também trabalhou no dossiê, mas a sentença só chegou agora graças às novas regras que, sobre as aparições, permitem não apenas um simples “sim” ou “não”, mas também uma gama de respostas diferentes. No caso de Medjugorje, a longa Nota do Vaticano lista os “frutos positivos, abundantes, difundidos e belos”, com pessoas se convertendo, decidindo abraçar a vida religiosa ou voltar a rezar, se reconciliar e perdoar. Ao mesmo tempo, o documento não fala de aparições, mas examina as “supostas mensagens”, a maioria das quais é considerada coerente com a doutrina católica: “Não as aceitamos como revelações privadas porque não temos certeza de que sejam mensagens de Nossa Senhora”, explica Fernández, “mas como textos edificantes que podem estimular uma bela experiência espiritual”. A paz é “a grande proposta de Medjugorje”, e passa por “amar também os não católicos. E isso faz sentido no contexto ecumênico e inter-religioso da Bósnia Herzegovina”, que foi dilacerada pela guerra na antiga Iugoslávia - uma das mais sangrentas das últimas décadas - que tinha motivações também religiosas, “como acontece hoje” na Ucrânia e no Oriente Médio.
O Vaticano também fala de “esclarecimentos necessários: algumas mensagens se afastam desses conteúdos tão positivos e edificantes e até parecem os contradizer. É preciso ter cuidado para que esses poucos elementos confusos não ofusquem a beleza do todo”. Há também “algumas mensagens problemáticas”, aquelas em que Nossa Senhora marcaria precisos encontros ou aquela em que indicaria a festa para sua data de nascimento: “É o modelo da Nossa Senhora ‘carteira’ que o Papa Francisco rejeita”, lembra o cardeal.
A Santa Sé, portanto, convida os bispos a estarem vigilantes, também porque “pode haver grupos ou pessoas que, usando esse fenômeno espiritual de forma inadequada, agem de forma errada”. E a Igreja também coloca freios prudenciais: as “supostas mensagens” da Rainha da Paz, a partir de agora, não serão mais publicadas sem autorização.
O Vaticano, portanto, remove quase todos os obstáculos para os 3 milhões de peregrinos que vão todos os anos rezar em Medjugorje. Todos os dias milhares de pessoas de todas as idades vão ao santuário, que santuário não é: para o Direito Canônico é simplesmente uma paróquia. Por enquanto. Mas desde ontem pode se imaginar a construção de um verdadeiro santuário mariano: “Com o culto público é uma possibilidade”, reconhece Tucho. Andrea Tornielli, diretor editorial das mídias do Vaticano, comenta: “Peregrinações, conversões, retorno aos sacramentos, casamentos em crise que são reconstruídos. É para esses elementos que o Papa Francisco sempre olhou, desde que era bispo na Argentina. A piedade popular que move tantas pessoas em direção aos santuários deve ser acompanhada, corrigida quando necessário, mas não sufocada”.